ANO
10 |
EDIÇÃO
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Setembro quase termina. Neste dia de
São Miguel temos, uma vez mais ‘as enchentes de São Miguel’, que lembro desde
minha infância. Domingo foi o 12º dia consecutivo de chuvas aqui. Ontem foi um
dia de sol esplendoroso, que se seguiu a uma madrugada de um plenilúnio quase
inenarrável.
Mas o assunto desta blogada não são narrativas
climatológicas. O assunto é mais complexo e muito importante. Até porque
tamanho faz diferença.
Ontem, à noite, ocorreu a 5ª das
oito sessões do Fronteiras do Pensamento
2015. Fomos brindados com uma noite de segunda-feira excepcional. Dentre os
nove conferencistas (três mulheres e seis homens) deste ano a fala foi do único
conferencista brasileiro: a neurocientista Suzana Herculano-Houzel (Rio
de Janeiro 1972). Não foi sem razão que o apresentador e quem conduziu o diálogo
com a conferencista foi o neurocientista e Reitor da UFRGS Carlos Alexandre
Neto.
Suzana Herculano-Houzel, Foto: James Duncan Davidson / TED |
Suzana é bióloga formada pela
Universidade Federal do Rio de Janeiro é autora de vários livros de divulgação
científica sobre neurociência [O Cérebro
Nosso de Cada Dia (Vieira & Lent, 2002); Sexo, Drogas, Rock and Roll... & Chocolate (Vieira &
Lent, 2003); O Cérebro em Transformação (Objetiva,
2005); Por que o Bocejo É Contagioso? (Jorge
Zahar Editor, 2007); Fique de Bem com seu
Cérebro (Sextante, 2007) e Pílulas de
Neurociência para uma Vida Melhor (Sextante, 2009)]. Possui pós-doutorado
pelo Instituto Max-Planck de Pesquisa do Cérebro na Alemanha, doutorado pela
Universidade de Paris VI na França e mestrado na Universidade Case Western
Reserve nos Estados Unidos. Em seu trabalho, analisa como os conhecimentos
gerados pela neurociência a respeito dos seres humanos podem ser aplicados na
vida diária. Foi a primeira brasileira a falar na conferência internacional TED
Global.
Sua pesquisa sobre o número de
neurônios que o cérebro humano possui ganhou destaque internacional. A
abordagem envolveu a dissolução de quatro cérebros doados à ciência em uma
mistura homogênea, chamada de “sopa cerebral". A partir de uma amostra da
mistura, contou e classificou a quantidade de núcleos celulares pertencentes
aos neurônios. Sua conclusão foi de que o cérebro humano possui 86 bilhões de
neurônios, ou seja, 14 bilhões a menos do que se acreditava anteriormente.
Suzana Herculano-Houzel é, desde
2002, professora na UFRJ, onde dirige o Laboratório de Neuroanatomia Comparada
do Instituto de Ciências Biomédicas, no qual lidera uma equipe com
colaboradores em vários países e pesquisa as regras de construção do sistema
nervoso central em humanos e outras espécies. Também é colunista do jornal
Folha de S.Paulo e da revista Scientific American Mente & Cérebro. Em 2000,
lançou o site O cérebro nosso de cada dia.
É scholar da Fundação James McDonnell, onde foi a primeira brasileira a receber
o Scholar Award para financiar sua pesquisa. Pesquisadora do CNPq, em 2004
recebeu da instituição a Menção Honrosa do Prêmio José Reis de Divulgação
Científica.
A pesquisadora brasileira sugere que
foi a invenção do cozimento pelos nossos antepassados que permitiu aos seres
humanos desenvolverem o maior cérebro dos primatas, pois o alimento cozido
produz mais energia metabólica. Atualmente, suas pesquisas estão concentradas
em cérebros de elefantes e baleias.
A palestrante da noite de ontem, que
discorreu sobre as diferenças entre o cérebro humano e o de outras espécies,
considerando o tamanho, o número de neurônios e as capacidades cognitivas,
concedeu extensa entrevista a Larissa Rosso que está publicada no caderno PrOA da Zero Hora deste domingo. Trago apenas a última pergunta que diz
muito a cada uma e cada um de nós:
O estresse intenso maltrata o cérebro? Os cérebros de hoje são “piores”
do que os de outros tempos?
A tecnologia não é ruim, assim como
o estresse não é ruim. Ruim é o mal uso que a gente faz do que tem, das
possibilidades, da quantidade de coisas que tem que conseguir resolver todos os
dias. Hoje temos como resolver mais de um problema por dia. A gente deveria
fazer isso? Acho que não. Você cobra muito mais de si mesmo, acaba exigindo
tanto de si que perde a sensação de controle, e é aí que o estresse deixa de
ser bom. O estresse pode ser extremamente saudável, positivo e trazer prazer
inclusive, mas tem que ser aquele estresse que você se propõe. É a sarna que
você arranja para se coçar. A diferença toda é a sensação de controle. Enquanto
você domina a situação e a sua vida, todos esses problemas para resolver são
ótimos. O ruim é quando você perder a sensação de controle. Aí o estresse passa
a ser crônico. Esse é ruim.
A conferencista ao final rendeu
homenagens a cozinha e aos livros, destacando o quanto o ler e o escrever são
atividades importantes e muito significativas do cérebro.