ANO
10 |
Mais
uma vez em Paris
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EDIÇÃO
3132
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Desde a noite
desta sexta-feira, a Gelsa e eu estamos mais uma vez em Paris. Como já contei,
em outra narrativa de viagem, foi em Paris, em julho de 1989 — ano do
bicentenário da Revolução Francesa — que fiz o début em viagens internacionais (excluídas aquelas chegadinhas a alguns
países fronteiriços). Era meu presente de 50 anos.
Talvez, não tenha
sido sem razão que elegesse a capital da França para estrear nesta gostosa
paixão por viajar, que faz que nos últimos 27 anos, tenha amealhado 49 países,
em pelo menos uma viagem anual. Recordo, que quando desembarquei a primeira vez
em Paris, na Rua Gay-Lussac — algo nada trivial para um professor de Química — sentia-me
orientado na cidade, pois havia lido livros e vistos filmes, que faziam os
cenários da capital da França familiares. Depois daquele julho de 1989, estive
na cidade luz várias vezes.
Mas ao chegar aqui,
agora, senti que já fazia mais de três anos da última estada. Sentia saudades
de estar aqui. Assim, faço deste hiato rumo a Porto Alegre, que começou na
tarde da última sexta-feira em Budapeste e terminará na noite de quarta, uma pretenciosa
preparação do chegar em casa.
Na escrituração
deste preâmbulo sinto um pouco a inserção francesa em minha cultura. Há um patrimônio
de minha ancestralidade paterna que oriunda do cantão de Friburgo na Suíça
chegou ao Brasil, em novembro de 1855, falando francês; depois foi germanizado pelos
colonos alemães. Não raro, quando declino meu sobrenome sou inquieido se sou (de descendência) francês. Há que considerar que pertenço a uma geração, que na Escola
teve muito mais influência francesa, que a posterior que se abeberou fortemente
da cultura estadunidense. Minhas escolas no ensino fundamental foram de
religiosos católicos de origem francesa: as irmãs de São José de Chambery e os
irmãos maristas fundados por Marcelino Champagnat em Lavallá. Ainda, enquanto
aluno marista, estudei nos livros da coleção FTD — que chamávamos por
brincadeira de Fede Todo Dia — que na verdade significa Frère Théophane Durand,
(Superior Geral da Congregação Marista de 1883 a 1907); ainda hoje uma editora
brasileira marista fundada em 1902. Talvez, uma síntese deste franco-culturalismo
poderia ser que sabíamos entoar La Marselhesa tão bem, ou melhor, que o hino
nacional brasileiro.
O lema dos revolucionários
de 1789: Liberté, egalité, fraternité
se muito integrado aos ideais que estão, ainda hoje, quase como uma proposta de
vida. Não é sem razão que o 14 de julho transcende na ara das celebrações ao 7
de setembro e ao 20 de setembro, mesmo que no pavilhão da República Rio-grandense
esteja inscrito o mesma lema. Não é sem razão que se diz que a Revolução
Francesa extrapolou e extrapola a França.
Merece um
destaque especial no mundo ocidental: René Descartes (1596-1650), matemático,
físico e filósofo foi um dos mais importantes pensadores franceses. Se olharmos
as quatro mais significativas revoluções científicas (Copernicana, Lavoisierana,
Darwiniana e Freudiana) vemos que se considerarmos o Século das Luzes é no
Século 18 que temos a construção do conhecimento migrando da Itália para França
(e então em paralelo com a Inglaterra). Das revoluções antes citadas na França
ocorre a segunda e com a publicação por Lavoisier do Traité Elementaire de Chémie, em 1789, se diz estabelecer-se a
certidão de nascimento da Química Moderna. Ainda não se pode esquecer talvez o
tributo maior do Iluminismo para a História e Filosofia da Ciência: Enciclopédia Francesa, que teve no
mínimo na Modernidade o impacto que tem a Wikipédia na Pós-modernidade. Dentre
os iluminista vale destacar Rousseau, Voltaire, D’Alembert e Diderot.
Na literatura
merece destaque Victor Hugo, com sua obra mestra: Les Misérables. Na larga lista de autores, os mais recorrentes são
Proust, Émile Zola, Maupassant, Balzac, Flaubert, Marguerite Duras, Stendhal e
Camus. Sem esquecer, é claro, os poetas Baudelaire, Rimbaud, Valéry.
Se houvesse que
ressaltar a Ciência francesa mais recente, Pierre e Marie Curie como estrelas de
primeira grandeza. Não há como deixar de lembrar a continuada inspiração de Claude Bernard. Claro que na contemporaneidade há influencia francesa na
nossa formação é quase inumerável. Lembro, rapidamente: Durkheim Bachelard,
Bourdieu, Grignon, Passeron, Foucault, Lévi-Strauss, Simone de Beauvoir, Jean-Paul
Sartre, Elisabeth Badinter, Deleuze, Maffezzoli, Morin.
Claro que esqueci a muitos.
Assim, se faço de Paris um ponto de adaptação para transição de
uma cultura muito exótica para mim (romena e húngara) recém vivida para nesta volta à casa,
mesmo que a escala seja marcada por densos e carinhosos afetos familiares, há
uma muito forte densidade cultural. Por tudo isso é muito bom estar aqui.