ANO
10 |
EDIÇÃO
3152
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Termina março. Talvez o
mais diferente de todos os meus marços. A marca maior de sua atipicidade é que
depois de 55 anos, na 56ª edição deste mês dedicado a Marte, deus da Guerra,
pela primeira vez não tive sala de aula. Ontem à noite, desde minha demissão do
Centro Universitário Metodista do IPA, em 12 de fevereiro, pela primeira vez ministrei
uma aula. A última fora em 11 de fevereiro para professoras e professores das
redes municipais de Boa Vista do Buricá e de São Martinho. Ontem, proferi a
aula inaugural da Licenciatura em Química do IF-RS no campus da cidade de
Feliz.
Agora, a semelhança de Boa
Vista do Buricá, estive em uma pequena cidade do Vale do Caí, com uma tradição marcada
pela colonização alemã. A língua alemã, em sua variante rio-grandense, faz
parte integral do patrimônio cultural deste munícipio de cerca de doze mil felizenses,
cujo lema é “Ser feliz é o nosso destino”.
Feliz está cerca de 80
km de Porto Alegre. Talvez, faça pelo menos 60 anos que eu não estivera nesta
cidade... esse parecia ser o tempo — quase uma vida — de minha abstinência de
sala de aula. Agradeço à Professora Dolurdes Voss, Coordenadora do curso de Química
e aos estudantes que, sem saber, ajudaram que se quebrasse tão difícil jejum. A
ida à Feliz ontem, se pareceu com 13 de março de 1961, quando nervosamente, em
Montenegro, saí da Rua João Pessoa e percorri a Oswaldo Aranha para chegar ao
Colégio Jacob Renner, para dar uma aula de Matemática para alunos do 3º científico.
Ontem, foi quase como aquela minha primeira aula.
Para mim a noite de 30 de março foi memorável. Aliás, segundo as palavras do Diretor-geral do Campus Feliz, para a
instituição será também. O professor Giovani Forgiarini Aiub, ao aplaudir de pé
a minha fala, referiu-a como um marco na história institucional.
Por cerca de duas horas,
para um auditório lotado de docentes e discentes (alguns sentados no chão em
corredor externo à sala), trouxe tentativas de respostas à indagação: “O que é Ciência, afinal?” Ao final,
fotos e autógrafos em livros, quando a montenegrina Luana Rosa Nunes, aluna do
Curso de Química, foi exímia livreira.
Mas, este março também
fez feridas que hão de ficar indeléveis. Assistir o vice-presidente da
República como arauto de um golpe; saber de movimento que faz manifestações tão
radicais, que leva às ruas cartaz não apenas pedindo o impeachment da
Presidente, mas seu fuzilamento; conhecer o corporativismo do presidente de
sindicato médico apoiando à pediatra que se negou a continuar prestar atendimento
a uma criança, por sua mãe ser petista... faz este março cruento. Não deixa de
ser sintomático que vereadora de Porto Alegre convide para um jantar hoje para
celebrar outo golpe ocorrido há 52 anos.
Espera-se que o deus
Marte não tenha, numa guerra civil, tributos de brasileiros. No horizonte, as águas
de março não apagaram as manifestações de ódio de alguns que não sabem se
conformar por derrota em eleição e agora tentam, uma vez mais, extinguir a
democracia. Vade retro, Marte!