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sexta-feira, 15 de setembro de 2023

ACERCA DE LEITURAS E ESCRITAS

    ANO

 17

LIVRARIA VIRTUAL em

www.professorchassot.pro.br

EDIÇÃO

2739

15/09/2023 Educação é a Nossa Praia. Nesta segunda-feira, 11/09, estive virtualmente em Caiobá, em atividade da UFPR que promove a educação superior no litoral do Paraná visando o desenvolvimento humano. Instalada em Caiobá, no município de Matinhos, ações da UFPR chegam aos sete municípios litorâneos e se estendem ao Vale do Ribeira. Liderados pelos Professores Valentim da Silva e Valdo Calvallet falei para professores de Ciências. Foi bom retornar a atividades com colegas aonde já me envolvera há uns tempos. Mais uma vez, a encíclica Laudato Si' do papa Francisco do planeta terra enquanto nossa casa comum.

Esta é a última semana do inverno, e este foi completamente atípico, pois nem terminávamos de limpar as casas e procurar corpos vítimas das tempestades, a presença quase que contínua de furacões é uma realidade inédita no sul do país. 

Assim como a pandemia também anestesiou/anestesia nosso pensar em tempos lutuosos e/ou insanos nos quais convivemos, tanto alunos como professores; não raro, somos intelectualmente incapazes. 

Muitos de nós, nestas semanas, vivemos em uma quase esterilidade mental. É quase vedado produzir um parágrafo de um texto acadêmico submetido ao aguilhão do luto. 

Essa é a razão pela qual optei trazer hoje fragmentos de textos já publicados neste blogue. Dispenso de pedir aceitação dos leitores pois não considero que esteja praticando “autoplagio”. 

Vez ou outra, recebo pedidos acerca de escrever, redigi algo que poderia trazer um mote: “Escrever é preciso! ... e é gostoso!” Aqui estão algumas linhas nesta direção. É mais uma tentativa de resposta a alguns pedidos. Adito votos de um fim-de-semana a cada uma e cada um de meus leitores e aos escrevinhadores.

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É usual dividirmos escritos (e leituras) em ficção e não ficção. Nestas estão os textos acadêmicos, os técnicos, os religiosos, os de autoajuda, os registros de trabalhos, os diários e outros mais. Há um ferrete nos mesmos: parecem que devem apresentar ‘verdades’. Na outra divisão – ficção – estão aqueles que têm como marca o significado do rótulo: ato ou efeito de fingir. Assim estes textos – descompromissados de relatar verdades – são construções, voluntárias ou involuntárias, resultados da imaginação; logo criação imaginária ou fantasiosa, até fantástica; quiméricos.

Sei, mas isto não é objeto deste ensaio, que muitos textos de ficção são marcados pela trazida de realidade. Aqui caberia também uma discussão, da qual também me abstenho: o que é realidade. Até porque, quando escrevemos ficção, não raro devemos nos policiar para não traçarmos biografias de personagens conhecidas ou até precaver-nos que não aflore nossa autobiografia. Nesse caso damos asas a nossa imaginação, sendo que muitas vezes o id disputa com o ego a autoria de nossos textos onde nos fazemos, não raro, em super-heróis.

Entre as obras de ficção também cabem os muito apreciados romances históricos, onde viajamos a tempos ou lugares tendo com cicerone a imaginação de um escritor. Este talvez seja meu gênero ficcional preferidos.

Não sei em qual das duas categorias coloco os livros psicografados. Ler obras dessa natureza de personagens históricos é, mesmo para quem não professa o espiritismo, usualmente enriquecedor.

É nesta divisão: ficção e não ficção que aparecem as listas dos mais vendidos, as bibliotecas pessoais e, especialmente, nossas definições de leituras. Estas parecem que estão associadas, respectivamente, a duas palavras: lazer e trabalho. A primeira, parecem ligadas a algo que fizemos quando, prazerosamente, nos permitimos a fugir a nossos deveres. Outra é comandada pelo feitor que nos cobra produção.

Quando insisto com meus orientandos que devem ler ficção, usualmente há surpresas. Ou mais, parece que os incito a uma transgressão. Mesmo como intelectuais que temos compromissos com nossa formação mais ampla, deleitar-nos com romance parece fazer assomar culpas, pois estamos ‘matando o horário que poderíamos estar trabalhando’.

Tento neste texto olhar essa divisão ficção e não ficção em outra dimensão. A escrita / leitura solidária e solitária. É muito usual que um texto acadêmico seja escrito em parceria com outros colegas. Não é raro temos textos com uma litania de participantes, que quase duvidamos de tão ampla coautoria. Já um texto de ficção, usualmente é solitário.

Eu não sou dado ao escrever acadêmico em parceria. Tenho poucos textos em coautoria, estes usualmente com orientandos ou ex-orientandos. São realmente textos a dois. Não considero um texto em coautoria aqueles que são contribuições individuais em capítulos de livro. Minha reduzida experiência como organizador de dois livros me mostrou que mesmo que se insistisse na exigência de um fio condutor nos capítulos de cada um dos autores, usualmente se originam textos muito individuais.

Há que reconhecer que os textos acadêmicos não são de uma maneira geral solitários. 

Não é sem razão, que apensamos ao final uma bibliografia e no Alfabetização científica: questões e desafios para a Educação coloquei essa abertura (que retirei de minha tese de doutorado) antes de citar as obras consultadas. Encanta-me o continuado diálogo — às vezes um imperceptível sussurro — que ouço em cada um dos livros que manuseei para fazer este livro. Minha gratidão aos homens e mulheres de quem me apossei das ideias. Realmente, é muito difícil existir um texto acadêmico que não tenha pareceria, mesmo que não consultemos nenhum autor para escrever o texto. Não é sem razão, que o livro antes citado, tem os direitos autorais das cinco edições doados ao Departamento de Educação do MST, pois muitos capítulos são resultados de meu aprendizado na formação de professoras e professores para acampamentos e assentamentos.

Mesmo que ainda volte no encerramento a escrita dita solitária, quero comentar algo da leitura. Parece a esta cabe o mesmo paralelismo que fiz a escrita.

A leitura de não ficção é mais apropriada para uma leitura solidária, enquanto a ficção é mais dada a ser solitária. No primeiro caso estão os seminários acadêmicos onde todos leem – individualmente ou em grupo – um texto e depois se debate as ideias do autor. Há grupos literários que fazem isto com obras de ficção. Mesmo que menos usual, se pode prever que aí as discussões possam não ser tão críticas como, por exemplo, em um texto acadêmico.

Pode haver leituras em parcerias de cada uma das duas categorias que abrem este texto. Ler jornal a dois é muito bom. Não classifiquei os textos jornalísticos, mas eles parecem ser – ou deveriam ser –, de não ficção; até porque alguns jornais alardeiam o compromisso com a verdade.

Numa noite de sábado de inverno ‘ler hoje, jornais de amanhã, com notícias de ontem’ numa lareira com um bom vinho e um parceiro para comentar é algo quase paradisíaco. O mesmo vale para uma manhã de domingo chimarrear com uma pessoa querida num jardim lendo suplementos literários ou revistas semanais de variedades.

A leitura de ficção a dois também pode ser algo gostoso, não para um extenso romance, mas para um pequeno conto. Não sem razão, que na distribuição de livros pela casa, na alcova há geralmente selecionada biblioteca de livros e revistas eróticos. Estes usualmente de ficção. Neste gênero os dito não ficção são imaginado como ficção, pois quase não se crê em tudo que parece fantasiar o autor. Claro que obras da biblioteca da alcova são sempre mais apetecíveis a dois.

Encerro este texto com o que o catalisou. Parece que escrever ficção é um ato muito solitário. Dificilmente o fazemos em parceria. Usualmente não fazemos citações. Os dicionários são bons coadjuvantes.

Neste escrever ocorre algo muito especial. Não escrevemos apenas quando teclamos ou fizemos um apontamento em meio a outros fazeres. Quando nos embrenhamos em um texto ficcional, nossos personagens nos envolvem tanto, que vivemos viajando ao cenário de nossa história. Chegamos ser deselegante com outros, pois não conseguimos deixar de pensar no diálogo seguinte, na nova trama e no futuro desenlace. As horas insones se fazem férteis, mas o diálogo com um parceiro pode ficar sincopado.

Assim, é fácil entender porque, às vezes o outro não esteja a fim de papo. É muito bom viajar na ficção.


2 comentários:

  1. Infelizmente as mudanças climáticas passaram de ficção a não ficção e estão assolando povos mais necessitados . Ficção é que algum privilegiado abra mão para mudar isso. Excelente reflexão!

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