ANO 17*** 24/02/2023***EDIÇÃO 2072
Na edição do dia 10 deste mês causou-me estranhamento a inquisição: “Que livro estás lendo?” Fiz-me surpreso. Parecia um desvelar de minha intimidade. Hoje pretendo falar mais acerca de leituras que de livros.
Quando meus filhos eram pequenos, a um deles foi solicitado pela escola a desenhar uma cena doméstica de seu pai. Opção desenhada: o pai em uma rede lendo. Hoje, o homo lector subsiste. Mesmo tendo um cartaz na biblioteca com uma frase do poeta Manoel de Barros: a rede é a vasilha de dormir mais parecida com útero materno. Aos 83 a rede está quase aposentada.
A leitura é um perpetuum mobile no meu cotidiano. Há frações de tempos díspares. O tempo maior é para a leitura acadêmica (leituras de teses e dissertações, leituras para a produção de textos etc.), a leitura recreativa (melhor dizendo: ficção). Aqui devo reconhecer que mesmo recomendando a meus orientandos leitura ficcional, eu ainda tenho dificuldades de cumprir a recomendação. Como sou participante de um clube de leitura, este item (leitura recreativa) é bem aproveitado no livro do Mês da Tag (ver blogue de 10/11).
Desejo focar em outra modalidade leitura, que pode ser um híbrido entre a leitura acadêmica e a leitura recreativa. Não é o louvado o livro de cabeceira (há muito não leio na cama). É um livro que está num local destacado no meu scriptorium e, usualmente, me faz companhia nos intervalos, quando vou tomar um gostoso sol no jardim.
Nunca Pura: Estudos Históricos de Ciência
como se Fora Produzida por Pessoas com
Corpos, Situadas no Tempo, no Espaço, na
Cultura e na Sociedade e Que Se
Empenham por Credibilidade e Autoridade.
Editora TRAÇO FINO Belo Horizonte MG
ISBN13 :9788580541106
Páginas: 543
Publicação:2013 1a Edição
Encadernação: BROCHURA
O livro tem mais de 550 páginas, das quais cerca de 150 são de notas. Mas não são notas de rodapé. Nem são de fim de capítulo. São notas de fim de livro. Estas duas últimas me desagradam, principalmente no fim do capítulo. São difíceis de localizar.
Parece oportuno fazer o ofertório de uma sobremesa: uma palhinha de Nunca Pura: “Os ensaios de Shapin reunidos neste livro incluem reflexões sobre as relações históricas entre ciência e senso comum, entre ciência e modernidade, e entre ciência e ordem moral. Exploram a relevância dos contextos físicos e sociais na construção do conhecimento científico, os métodos adequados para se entender a ciência historicamente, a dieta como um ponto instigante de investigação histórica, a identidade daqueles que fizeram o conhecimento científico, e os meios pelos quais a ciência adquiriu credibilidade e autoridade”.
Steven Shapin argumenta que a ciência, para todos, esta imensa autoridade e poder, é e sempre foi um esforço humano, submetido às nossas capacidades e limites. Dito de outro modo, a ciência nunca foi pura. Os ensaios de Shapin coletados no livro incluem reflexões sobre as relações históricas entre a ciência e o senso comum, entre ciência e modernidade, bem como entre a ciência e a ordem moral.
Nunca Pura: Estudos Históricos de Ciência como se Fora Produzida por Pessoas com Corpos, Situadas no Tempo, no Espaço, na Cultura e na Sociedade e Que se Empenham por Credibilidade e Autoridade.Só este subtítulo (com estas maiúsculas desacertadas) já é quase uma súmula. Em que pese o tom coloquial do livro, é distante poder fazer uma resenha, mesmo porque tem 554 páginas das quais mais de um quarto (148) são de notas, das quais, muitas sumarentas.
Steven Shapin, em seu sumarento tratado acerca de estudos históricos da Ciência: Nunca pura traz narrativas excepcionais, mostrando o quanto e como os que fizeram/fazem a Ciência são seres humanos, logo esta não é uma produção incólume. Por tal, eu me atreveria rebatizar livro Nunca pura para “Maculada concepção” ou “Maculada conceição”. Aqui ouso -- de maneira respeitosa -- fazer um contraponto ao mais polêmico dos quatro dogmas marianos da igreja católica romana: Imaculada Conceição.
*** Refiro os quatro dogmas marianos numa sequenciação temporal: 1º dogna é da Antiguidade: Maria ser mãe de um Deus (Concílio de Niceia – 325); 2º dogma é do período medieval: virgindade perpétua (Concílio de Latrão – 649); 3º dogma, proclamado em 1854— o mais celebrado e o que tem mais destaque comemorativo -- este dogma decorre do pressuposto que os pais de Maria (Joaquim e Ana) a conceberam sem a mácula do pecado original, este que ferreteou a todos em consequência do pecado de Eva; 4º assunção de Maria aos céus com corpo e alma foi proclamado em 1º de novembro de 1950.
Mas para instigar, um pouco mais, a imaginação de meus leitores trago a sinopse e o sumário do livro.
Sinopse Steven Shapin argumenta que a ciência, para todos esta imensa autoridade e poder, é e sempre foi um esforço humano, submetido às nossas capacidades e limites. Dito de outro modo, a ciência nunca foi pura. Os ensaios de Shapin coletados neste livro incluem reflexões sobre as relações históricas entre a ciência e o senso comum, entre ciência e modernidade, bem como entre a ciência e a ordem moral.
Sumário
1 Baixando o Tom na História da Ciência: Um Chamado Nobre
PARTE I - MÉTODOS E MÁXIMAS
2 O Amor de Cordélia: Credibilidade e os Estudos Sociais da Ciência
3 Como Ser Anticientífico
4 Ciência e Preconceito em Perspectiva Histórica
PARTE II - LUGARES E PRÁTICAS
5 A Casa da Experiência na Inglaterra do Século Dezessete
6 Bomba e Circunstância: A Tecnologia Literária de Robert Boyle
PARTE III - A PESSOA CIENTÍFICA
7 "A Mente é Seu Próprio Lugar”: Ciência e Solitude na Inglaterra do Século Dezessete
8 “Um Scholar e um Cavalheiro”: A Identidade Problemática
8 do Praticante Científico na Inglaterra do Século Dezessete
9 Quem Foi Robert Hooke?
10 Quem É o Cientista Industrial? Comentários da Sociologia Acadêmica e de Chão de Fábrica nos Estados Unidos, de cerca de 1900 a cerca de 1970
PARTE IV - O CORPO DE CONHECIMENTO E O CONHECIMENTO DO CORPO
11 O Filósofo e a Galinha: Sobre a Dietética do Conhecimento Descorporificado
12 Como Comer Como um Cavalheiro: Dieta e Ética na Inglaterra no Início da Era Moderna
PARTE V - O MUNDO DA CIÊNCIA E O MUNDO DO SENSO COMUM
13 Confiando em George Cheyne: Expertise Científica, Senso Comum e Autoridade Moral na Medicina de Dieta do Início do Século Dezoito
14 Economias Proverbiais: Como um Entendimento de Algumas Características Linguísticas e Sociais do Senso Comum Pode Lançar Luz sobre Corpos de Conhecimento de Prestígio Maior, A Ciência, por Exemplo
15 Descartes, o Doutor: Racionalismo e suas Terapias
PARTE VI - CIÊNCIA E MODERNIDADE
16 Ciência e o Mundo Moderno
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