Mais uma semana
nestes tempos de pandemia e de pandemônio que no Brasil se faz tintada de luto.
Na semana passada, citei aqui passagens de um dos cinco primeiros livros (Gênesis,
Êxodo, Levítico, Números e Deuteronômio, que compõem o Pentateuco) da Bíblia hebraica e
do Antigo Testamento cristão). A referência fora
ao Levítico, o terceiro livro. Estranhava então — talvez,ou melhor, me
surpreendia — que normas que se dizem discursos de Deus no monte Sinai a
Moisés, que as recebeu com a missão de repeti-las aos israelitas, durante o
Êxodo (Êxodo 19:1). A surpresa é que normas macchistas, exaradas há pelo menos 5
milênios ainda vigissem.
Pois esta semana, os censores dos
crentes e dos não crentes superaram fatídicos zelos e
exigiram que seus legalismos absurdos e desumanos fossem impostos a uma menina de
10 anos vítima de estupro pelo próprio tio no Espírito Santo. Ela teve seu nome
divulgado na internet e foi alvo de ataques de hordas cristãs. É dolorosamente
perturbador quando o ocorrido se faz revelador de um movimento cada vez mais
intenso na base religiosa do bolsonarismo. A Ponto — uma newsletter semanal do Brasil de Fato —
de hoje revela que o Brasil registra ao menos seis abortos por dia em meninas
de 10 a 14 anos, e uma média anual de 26 mil partos de mães com idades entre 10
a 14 anos. Ainda que não haja uma lei específica sobre o aborto, há um conjunto
de normas que respaldam a realização do procedimento em casos de estupro.
Portanto, diante da garantia legal e da trágica frequência destes casos no
Brasil, é de se perguntar por que este caso em específico gerou tanta
repercussão.
E os indícios apontam para um
nome: Damares Alves, aquela que quando escolhida para o Ministério da Mulher, da
Família e dos Direitos Humanos do atual governo revelou que ‘conheceu’
(no sentido bíblico) Jesus numa goiabeira. A ministra já foi apontada como
possível vice de Bolsonaro em 2022.
Damares dialoga com uma imensa base
religiosa e conservadora, que não está restrita apenas aos evangélicos: a
infâmia na frente de hospital recifense foi comandada por grupos católicos e o
presidente da CNBB veio a público para condenar não o estupro, mas o aborto
realizado na criança. Há ainda o padre de Carlinda MT que culpabilizou a menina
dizendo que ela permitiu porque estava gostando.
E eu, em aula, ontem noite elogiava o
Papa Francisco por defender que as vacinas não fossem propriedades de uma nação
e também não se destinassem por primeiro aos ricos e sim aos mais vulneráveis.
Mesmo situações díspares parece que a CNBB e alguns padres não estão em
sintonia com o Papa.
Como celebrar a passagem de uma semana distante fisicamente de quem amamos seria mais fácil se o presidente, ainda nesta quarta-feira, em um Brasil já com mais de 112 mil mortos (dos quais quase 3 mil no RS), não viesse a público dizer que não adianta usar máscara contrariando, com sua insapiência, uma recomendação universal.
Não vou trazer assuntos outros pois a
situação não apenas me entristece; ela também me enoja. Talvez na próxima sexta-feira,
quando nos encontrarmos de novo, a situação não piore. Até então.
Caro Áttico, boa tarde!
ResponderExcluirTua postagem de hoje mexe com Cristãos, mas a insensibilidade de "cristãos" nos provoca asco. Há quem é capaz de acusar uma indefesa criança, e dessa forma, inocentar um repugnante criminoso por suas indescritíveis atrocidades. Quem se postou ao lado da incriminação da menina, é tão assassino quando o estuprador que mutilou a infância e a alma de uma criança. Um abraço colega.
Querido mestre,
ResponderExcluirbelo texto, como sempre.
Que surpresa ser a instituição que martirizou GB aquela que hoje é a voz da moderação e do humanismo.
Uma pena que tenha cochilado e deixado grassar o neopentecostalismo alucinado no Brasil, que paridores e párias da coisa imunda.
Um abraço, ainda esperançoso.
Quando revisitamos a História humana, é possível perceber que não poucas BARBÁRIES foram executadas em nome de Deus ou pretensamente de alguma religião. A mesma, ao que me parece, não raras vezes ao lado do PODER e da RIQUEZA... Inúmeras vezes a serviço de um MORALISMO BARATO, para não usar outras expressões...Curiosamente a proliferação destas questões e ASNEIRAS em nome de Deus, em extratos sociais com pouca escolarização...
ResponderExcluirQuando vemos um MILICIANO, TRAMBIQUEIRO e representante de tudo o que significa ATRASO civilizatório na Presidência sendo "adorado" por ditos "cristãos", então atitudes como a que assistimos é o NORMAL destes....
Será que estamos, meu caro Mestre/Amigo, no mesmo trem que esta gente??? Até quando??? Que coisa, hein???
Abraços (acima usei perfil diferente...Sou EU mesmo
ResponderExcluirmeu coração dói quando penso nessa criança e naqueles que sofrem como ela =/
ResponderExcluirComo costumo dizer, do pouco que conheço a vida, encontro muito mais cristandade nos Ateus!
ResponderExcluirabraços fraternos!