A blogada
desta quarta-feira retoma a série serendipitosa, iniciada no último sábado
quando o tema foi serendipidade. Domingo e segunda-feira — na mesma dimensão —
foram assuntos aqui: ‘princípio de Arquimedes’ e ‘estrutura do anel benzênico’.
Ontem houve uma pausa para anunciar que neste dia 18, quarta-feira, no Museu da
PUC, o professor Guy Barros Barcellos lança o livro: Manual de
implantação de museus escolares.
Agora, a série
prossegue com algo que talvez seja a descoberta mais serendípica: a penicilina
e seu autor — o escocês Fleming, que possui uma das histórias cheia de eventos,
aparentemente, casuais.
Sir Alexander
Fleming, (Lochfield, 6 de agosto de 1881 — Londres, 11 de março de 1955) foi um
farmacologista, biólogo e botânico escocês. Autor de diversos trabalhos sobre
bacteriologia, imunologia e quimioterapia, notabilizou-se como o descobridor da
proteína antimicrobiana lisozima, em 1923, e da penicilina, obtida a partir do
fungo Penicillium notatum, em 1928, pela qual foi laureado Nobel de Fisiologia
ou Medicina em 1945, juntamente com Howard Florey e Ernst Boris Chain.
De uma
história muito rica (Fonte: Roberts, citado na edição de sábado) extraio breves
detalhes.
Em 1922,
Fleming descobriu serendipicamente, um antibiótico que matava bactérias, mas
não leucócitos. Fortemente gripado, fez uma cultura com um pouco de sua
secreção nasal. Ao examinar este meio que estava infestado de bactérias
amarelas, deixou cair uma gota de sua lágrima sobre a placa de cultura. No dia
seguinte, ao examinar a cultura, ele percebeu que havia uma região limpa na
área em que lágrima havia caído. Sua percepção perspicaz estava correta: a
lágrima continha uma enzima (que denominou lisozima) que destruía bactérias,
mas era inofensiva ao tecido humano.
Em 1928,
Fleming estava empenhado em pesquisa da gripe influenza. A rotina de
laboratório envolvia observações de culturas de bactérias em placas de vidro. Notou
que havia uma placa, com uma área limpa. Notou, então que a região limpa se
desenvolveu em torno de um bolor, que havia caído quando a placa por equívoco
fora deixada aberta. A experiência com a lágrima, seis anos antes, o alertou. O
bolor era letal aos estafilococos presentes na cultura. Ele relata: “Não fosse
a experiência anterior eu teria jogado fora o material, como muitos
bacteriologistas devem ter feito antes” (Roberts, p.201). Fleming isolou o
bolor e o identificou como do gênero Penicillium,
batizando a substância antibiótica produzida de penicilina — primeira droga capaz de curar inúmeras infecções
bacterianas.
Este
antibiótico não só salvou milhares de vida na Segunda Guerra Mundial, como
estimulou as pesquisas de outros antibióticos quimicamente próximos à
penicilina, como as cefalosporinas (também descobertas acidentalmente). Vários
destes antibióticos mais novos são eficazes contra bactérias resistentes à
penicilina.
Há na história
da bacteriologia muito a narrar. Sir Alexander Fleming estava ciente de seus
encontros com a serendipidade, pois afirmou: “A história da penicilina é de
certa forma romanceada, e ajuda a ilustrar a quantidade de acaso, ou fortuna,
ou sina, ou destino, chame-o como quiser, na carreira de qualquer um” (Roberts,
p. 205).
Uma nota muito pessoal. Se a
produção da penicilina está associada ao seu uso na Segunda Guerra, infiro que
minha mãe deve ter sido na remota Estação Jacuí onde nasci, uma das primeiras
pacientes a ser tratada com penicilina. Tenho a lembrança da transferência do
soro que vinha em uma ampola para dentro do vidrinho hermeticamente fechado
onde estava a droga. Entre as crianças disputávamos os vidrinhos vazios.
Ganhava quem soubesse pronunciar ‘pe-ni-ci-li-na’.
Como ainda não estava na escola, isso deve ter sido em 1945/46, ou antes.
Há, ainda
dezenas de descobertas serendípicas, como por exemplo, o Velcro®,
uma dádiva da Ciência à vida moderna. Assim, há bons assuntos para este
dezembro.