ANO
7
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Porto Alegre
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EDIÇÃO
2453
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Depois de um ex/intenso dia em Frederico Westphalen já
retorno a Porto Alegre, onde devo chegar quase às 06h. Longas horas para
construir castelos.
Há textos que tem um propósito e — pelo seu significado intrínseco
— podem ter outra dimensão. Neste sábado, ofereço a meus diletos leitores uma
carta escrita por um professor conhecido aqui não apenas por seus usuais
comentários neste blogue. A ilustração,
por semelhanças históricas, é de Giordano Bruno (1548-1600) e a adito pelo pseudônimo
escolhido pelo autor. Transcrevo a carta, suprimindo o nome da escola. Preservo, a pedido, o nome do autor. Não
vou aditar nenhum comentário.
Talvez ouse: se houver sabedoria nos pedagogos da
escola, se desencadearia uma revolução anti-conteúdista.
Porto
Alegre, 17 de abril de 2012
Exmo.
Srs. Professores membros da equipe diretiva do Colégio X Y Z,
Quando
fui convidado a lecionar nesta egrégia instituição, em meados de 2012, senti-me
honrado e contente pela confiança em meu trabalho e em minha biografia
profissional. Alegrei-me ainda mais quando encontrei um colégio dotado de uma
completa e confortável infraestrutura, onde poderia desenvolver trabalhos de
Ciências fora dos limites da sala de aula e otimizar o aprendizado. Visto que
estava imerso em um ambiente educacional apropriado. Ao começar o ano letivo
vi-me acolhido com ternura e respeito por meus colegas e, para minha imensa
satisfação, fui aceito imediatamente pelos alunos. Em momento algum fui tratado
com negligência por quaisquer membros desta comunidade, tenho consciência de
que a recíproca foi verdadeira.
Apesar
de todos estes aspectos positivos, um pequeno e íntimo desconforto foi gerado
nos primeiros dias ao ser informado da assunção da escola ser abertamente
“conteudista”. Desconforto este que só fez aumentar...
Comecei
a perceber, pouco a pouco, que não sintonizava com a pedagogia vigente na
escola. Como pesquisador da Educação carrego um mosaico de princípios
educacionais do qual não abro mão. Entendo o educar como um processo de
descoberta, redescoberta, ação, emoção em um ambiente de liberdade. Sempre
contemplando as múltiplas inteligências de cada indivíduo. Distanciando-se
bastante de armazenamento de conteúdos, da memorização de conceitos, da transmissão
de informações, da cobrança e, muito menos, de penalidades e punições.
Discordo
do sistema de avaliação por notas, considero a competição e a meritocracia
“coisas de adulto”, de aspectos éticos questionáveis, das quais alunos de 6º
ano devem ser poupados. Não entendo o ensino básico como um preparo para concursos,
portanto, fazer uma prova com questões de ENEM ou vestibular para crianças de
onze ou doze anos parece-me uma ação inócua e com traços de treinamento behaviorista.
Não
tenho a pretensão de mudar os princípios pedagógicos desta ou de qualquer
escola, mas exijo autonomia total como docente. Após o fechar a porta o
professor deve ser soberano, mestre dos conteúdos e mestre de sua arte de
educar, não necessita prestar contas de cada passo que dá ou dará. Durante meus
quatro anos de docência nunca precisei assinar atas de compromisso em reuniões ou
ser monitorado em minhas ações docentes. Para trabalhar em meu ótimo preciso de
liberdade.
Por
estas profundas incompatibilidades entre mim e a escola, após longa reflexão e
minucioso exame de consciência resigno-me, em caráter irrevogável, do cargo de
professor do Colégio X Y Z na presente data.
Reitero
o mesto sentimento que me encharca por deixar meus alunos os quais me cativaram
e alegraram com sua aceitação e carinho demonstrados sempre. A estes jovens
promissores meus agradecimentos comovidos e minhas sinceras desculpas por minha
resignação precoce.
Prof. Hipatius Giordanus,
Biólogo
Professor Chassot,
ResponderExcluirum elogio, um protesto e uma sugestão:
a) Parabéns pela publicação desta carta que mesmo acobertada por pseudônimo acredito autêntica, pois conheço escolas da laia da denunciada;
b) O nome da escola deveria ser publicada seguida da advertência: ‘Esta escola faz mal a saúde das criança! Afaste-se dela;
c) O autor devi se trasvestir de Martin Luther (ou invés de Bruno) afixando sua tese na porta desta escola torturadora que adestra crianças.
Admiro este blogue
L L L
Muito estimado Laurus,
Excluirrecém chegado de Frederico Westphalen acolho com júbilo tua mensagem. Ratifico, contigo, a autenticidade da tese que sugeres ferretear em escola que fazem mal às crianças.
A omissão do nome do autor e da escola predadora foram omitidas por razões óbvias.
Adito que o nosso Lutero hodierno é desde dezembro professor de uma escola publica estadual em Porto Alegre, exultante por poder fazer nela um ensino de Biologia ‘que talvez não seja objeto de questões no ENEM/Vestibular.
Obrigado pela tua apreciação deste blogue,
attico chassot
Querido mestre, ser professor/a é, seguramente, professar a fé num saber que dignifica a vida e o com-viver. Implica em que mestres se assumam como portadores de uma Boa Nova capay de tornar um outro mundo, solidário e humano, possível. Se a escola nao possibilitar espaco para tal,há que se ocupar espacos marginais no desenvolvimento de propostas ousadas que o possibilitem. Ousemos sempre desafiar a ordem estabelecida, quando esta nao contemplar o Cuidado. Com carinho, pelo seu exemplo de mestre professor: Lia, a Ilíria que ainda le
ResponderExcluirLimerique
ResponderExcluirNo Patropi ensinar é mau negócio
E vale muito mais ficar no ócio
Estado acha que docente
É um carinha demente
E que ministrar aulas é sacerdócio.
Mestre Chassot
ResponderExcluirAinda nesta semana tambem estive envolvido com a mesma temática do professor de pseudonimo Hipatius, quando pude observar a influência de que foram vítimas alguns de meus alunos do curso técnico quando ainda frequentavam o Ensino Basico. Ao tentar faze-los entender o contexto da realidade onde vao se imiscuir na futura profissão, notei grande resistência na aceitação de conteúdos mais abrangentes. Foi o que chamei de "mentes embotadas", quem sabe herdadas de professores "conteudistas" nas escolas de onde vieram. Meus parabéns ao colega docente pela coragem e por tentar fazer da educação algo realmente transformador.
JB
Limerique
ResponderExcluirPorque essa desavença não sei
Ou mesmo a quem ampara a lei
Contudo é patente
Respeite o docente
Pois na sala professor é rei.
Professor Chassot,
ResponderExcluirParabéns pela postagem de hoje. Concordo com nosso colega Laurus, fixar essa carta nas portas das escolas seria uma ação importante.
Infelizmente poucos educadores tem coragem e condições de abandonar uma escola que adota essa filosofia. Muitos chegam cheios de paixão e acabam sufocados pelo sistema capitalista. Aplicar provas para avaliar conteúdos é fácil, garantir a aprendizagem e autonomia dos alunos é acreditar na Educação como agente da mudança.
Abraços afetuososs
Professor Chassot,
ResponderExcluirMe questiono se teria coragem de fazer o que esse professor fez. Fazer o diferente na escola que é tradicionalmente conteudista ( e que é apoiada pelos pais para isso) não é fácil. Ir contra um sistema na teoria é muito mais simples do que quando se está inserido em um grupo.
Achei muito bonita a atitude do professor, ele está de acordo com seus princípios. Mas muitos professores, que pensam como ele, não podem fazer o mesmo porque não podem perder o emprego.
Penso muito sobre isso. É um trabalho de formiguinha.
Abraço
Silvia