ANO
9 |
Um bom DILMA!
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EDIÇÃO
2938
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Chegou o domingo nervosamente esperado. Parece que se pode crer que
mesmo com assomos de tempestades há estrelas
nos céus do Brasil — inclusive — no do Rio Grande do Sul.
Desde segunda até ontem, houve um assunto exclusivo neste blogue:
alfabetização política. Vale sempre lembrar Brecht: O pior analfabeto
é o analfabeto político.
O assunto eleições continua, mas hoje com evocações históricas. No domingo que passou, José Carneiro, conhecido dos leitores deste
blogue, publicou em O Liberal de Belém
do Pará um texto com título que fiz capitular desta edição. Junto com o artigo,
meu amigo enviou-me uma pergunta. Transcrevo a seguir alguns excertos do mesmo.
Ao final respondo a questão.
A PRIMEIRA ELEIÇÃO NÃO SE ESQUECE Lembro-me muito bem, como se tivesse sido
ontem, do meu primeiro voto, poucos meses depois de ter completado dezoito anos
de idade, em outubro de 1965. Seria a primeira eleição direta para governador do
estado após o golpe militar de 1964. Foi ainda a última eleição com a participação
dos partidos políticos oriundos da redemocratização de 1945, os quais logo depois
seriam substituídos pelo capenga e casuístico bipartidarismo brasileiro, que trouxe
para a cena politica a Arena governista e o MDB oposicionista, que duraram até o
final da década de 1970.
Enquanto ansiava pelo primeiro voto demarcador da minha idade adulta,
recebi surpreso a convocação da Justiça Eleitoral para atuar como secretário em
uma seção eleitoral instalada no interior do município. Podem imaginar o interior
de um município paraense há cerca de 50 anos, em grande isolamento? Até aqueles
idos, os integrantes das mesas eleitorais, evidentemente em número menor que os
de hoje, costumavam trabalhar sempre trajando o paletó completo. Era um costume
arraigado em todo o país. Meu pai era um deles, fazendo questão de ressaltar o caráter
de civismo daquela missão, que o orgulhava muito em seus rígidos preceitos de cidadania.
E por isso me convenceu (quase me obrigando) a seguir o seu exemplo, usando também
o paletó completo. O costume do traje na época deu origem a um chiste, de se perguntar
a alguém de paletó se estava indo votar. Obediente, segui os passos, já anacrônicos,
de meu pai e me arrependi amargamente. Ao me dirigir para o ponto de encontro com
os colegas de trabalho, fiquei atônito ao percebê-los todos de roupa esporte, inclusive
o presidente da seção eleitoral. Mas o pior estava por vir, pois naquele mesmo momento
chegou o transporte que levaria os mesários para as seções do interior e, para surpresa
geral, era um dos caminhões apelidados de “pau-de-arara”, sem acomodações para conduzir
passageiros. Subimos para a carroceria e lá fomos todos, sacolejando e em pé, em
direção aos locais de votação. Minha seção eleitoral localizava-se numa vila perdida
chamada Barro Branco, onde foi difícil até encontrar um casebre para instalar a
mesa eleitoral.
E o pior: durante todo o dia, menos de 30 eleitores compareceram,
motivo pelo qual ficamos sem nada para fazer ou ver naquele local ermo. Para completar,
o transporte só nos recolheu em torno das 20 h, quando retornamos sob chuva, com
parcos votos recolhidos e com meu terno completamente ensopado. Depois disso, trabalhei
em várias eleições como presidente de seção, mas nunca em situação tão esquisita
como aquela. Sob todos os aspectos, jamais esquecerei essa minha primeira eleição.
Eis minha resposta:
Meu querido amigo José, li mais um texto
no qual o colega abre o baú rotulado como ‘saudades’, Cativou-me a expressão ‘paletó completo’ desconhecida nestas plagas.
Faz-me triste ver quanto se apequena o número de regionalismo. Aqui, diríamos ir
de terno ou de fatiota. Não sei como se diz hoje. Talvez, terno com gravata.
Perguntas-me se lembro meu primeiro voto.
Esboço uma resposta.
Como sou bem mais velho que o amigo, votei
muitos anos antes. Minha estreia como eleitor é em 3 de outubro de 1958, votando
no Clube dos Gondoleiros, que fica(va) na avenida Eduardo (Presidente Roosevelt)
em Porto Alegre. Era o meu primeiro ano na Capital. Nesta mesma rua ficava, também,
o local de meu primeiro emprego: o Bar Caçula (este, na esquina da Ernesto Fontoura).
Era próximo a igreja dos poloneses, onde cinco dias depois de minha primeira votação,
toquei sinos em dobre de finados pela morte de Pio 12, pois o capelão (talvez, Padre
João Pithon) era companheiro de carteado de meu tio Arnaldo Junges, proprietário
do bar Caçula, que funcionava em prédio próprio da comunidade polonesa.
Os pioneiros poloneses de Porto Alegre, no fim da
década de 1890, espalharam-se pelo antigo Quarto Distrito, fornecendo mão de obra
para a indústria local. Profundamente religiosos, faziam suas devoções nas igrejas
da cidade. Até que, em 29 de abril de 1934, foi realizada a primeira missa na Igreja
Nossa Senhora de Monte Claro — padroeira da Polônia (Nossa Senhora de Częstochowa
ou a virgem negra, da qual há uma imagem vinda da Polônia na capela), na
Avenida Eduardo.
Depois de minha incursão religiosa volto
às eleições. Minha primeira ação como eleitor — com título novinho — foi nas eleições
estaduais de 1958. Leonel Brizola (engenheiro, prefeito de Porto Alegre), candidato
da coligação PTB / PRP foi eleito governador derrotando Walter Peracchi Barcelos
(coronel da Brigada Militar). Para senador o vitorioso foi Guido Mondin do PRP.
Este partido fez uma inusitada aliança com o Partido Trabalhista Brasileiro, com
o qual tinha mais divergências programáticas do que afinidades. Mondin concorreu,
então, ao cargo de senador, sendo eleito e ocupando a vaga que foi de Alberto Pasqualini. Brizola sucede (também antecede no governo do RS) a Ildo Meneghetti.
Este foi sucedido por Peracchi Barcellos (antes derrotado por Brizola) nomeado governador
pela ditadura. Eis uma evocação de minha primeira eleição.
Apenas uma contextualização: Veja-se que
há mais de 50 anos já se fazia alianças esdrúxulas como agora, quando Michel Temer
vem ao Rio Grande do Sul fazer propaganda contra Tarso, do PT, partido com o qual
é candidato a Vice-presidente.
Há de se fazer uma pequena reflexão sobre o tema. No Brasil, desde a política do café com leite, passando por caudilhos e golpes e contra golpes, a política está longe do que Weber poderia de classificar como a boa política. E questionar o pleito é uma escolha, nunca um indício de imbecilidade. O próprio Brecht com a ascensão do Nazismo preferiu se exilar, pois como dito no comentário de ontem, a prudência em determinados momentos é o maior sinal de inteligência. De qualquer forma o momento é histórico, e que o bom senso seja lugar comum nessa verdadeira "cama de Procusto"
ResponderExcluirPenso que um governante não deveria ter remuneração. Apenas a manutenção do essencial para viver. Que o atrativo fosse tão somente a vontade e disponibilidade em contribuir com seus conhecimentos. Sabemos que, infelizmente, a política se transformou muito mais em disputa de interesses. Uma utopia? Provavelmente. Porém, necessária. Afinal, a política não visa o bem comum?
ResponderExcluirNa reflexão sobre os ensinamentos de Brecht e longe do senso de justiça do monstro "Procusto", um belíssimo domingo!!!