ANO
8 |
EDIÇÃO
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Comentou-se aqui, há dias passados, o quanto a
virada dos séculos 19/20 foi um período muito significativo
para o entendimento
do universo. Trago hoje uma descoberta de então que, pelos ecoares fora dos
meios científicos, teve muita repercussão. Parece um assunto que merece fruição
neste segundo sábado julino.
08 de novembro 1895 Wilhelm Conrad Roentgen, um físico alemão, descobre os raios X. Pela
primeira vez se ‘podia ver’ dentro do organismo humano sem precisar abri-lo.
Roentgen foi laureado por isso com o primeiro Prêmio Nobel de Física,
em 1901.
Na
Ilustração: um das primeiras ‘radiografias’. Talvez a mão da esposa de Roentgen
(ele à direita), com anel. A descoberta dos
raios-x representou um dos grandes feitos da inteligência humana — mesmo que
tenha lances de casualidade — no final do século 19, tendo uma repercussão
imediata em todo o mundo. Em paralelo aos esforços de interpretação da radiação
x, muitas especulações foram feitas, vindo a causar um grande interesse e
fascínio nos cientistas e nos cidadãos comuns. Embora a reação em geral tenha sido
de deslumbramento com aquela nova radiação, outras posturas foram observadas,
mostrando uma relação de repulsa ou de medo/insegurança pessoais.
Lima, Afonso & Pimentel (2009)*
descrevem, ao destacar as repercussões ‘quase mágicas’ da descoberta, como a
beleza foi um grande mercado para os raios-x. No fim do século 19 já se sabia
que uma exposição prolongada aos raios-x levava à queda de cabelo. Isso bastou
para que os salões de beleza dispusessem de um aparelho de raios-x para que as
mulheres removessem (sem dor) os cabelos indesejáveis na face e no couro
cabeludo, e até clareassem a pele, como era costume na moda daquele tempo. A
notícia sensacionalista de que os raios-x podiam converter um homem negro em
branco causou furor entre as mulheres e mesmo homens que desejavam uma cútis
esbranquiçada: "Extra: Raios-x
Convertem Homem Negro em Branco - Negros Etíopes Transformados em Brancos
Caucasianos!". Quando ainda se desconheciam os efeitos letais das
radiações recém-descobertas. Havia relatos de tratamentos faciais para
eliminação das rugas, acnes, cravos etc... sendo que "testemunhos" de
resultados mirabolantes buscavam seduzir novos consumidores, como neste exemplo
de um anúncio: "Os raios desse tal
de Sr. Roentgen são realmente prodigiosos. Em alguns casos o tratamento com
'banhos de luzes' mudou completamente a aparência de mulheres entre 40 e 50
anos de idade. As rugas desapareceram, a fisionomia jovial foi restaurada e os
pacientes recuperaram o frescor da vida quando eram moças!" Outros
indivíduos viam na nova tecnologia uma invasão da privacidade doméstica e da
intimidade pessoal, temendo que os raios-x pudessem ver através dos muros de
suas casas.
A esse
respeito, uma nota publicada no Pall Mall Gazette de Londres, em março de 1896
(4 meses depois da descoberta de Roentgen), descreve a atmosfera de insegurança
e desconforto que os raios-x provocavam:
"Estamos
enojados com os raios Roentgen. [...] Parece que se pode ver os ossos das
outras pessoas a olho nu, e também ver através de oito polegadas de madeira
sólida. Não há necessidade de nos estendermos sobre a revoltante indecência
disto. (...) Olhar os ossos de outra pessoa sem permissão deveria ser encarado
como uma forma grave de atentado ao pudor. (...) Talvez a melhor coisa seria
todas as nações civilizadas fazerem um pacto: queimar todos os trabalhos sobre
os raios Roentgen, executar todos os descobridores”.
Em 1902, em Nova Jérsei, Estados Unidos,
deputados tentaram passar uma lei proibindo o uso da radiação x. Denominavam-se
defensores da moralidade, e achavam que os raios-x permitiriam a qualquer um
ver os corpos nus de quem andasse pelas ruas. A lei não foi aprovada, inclusive
porque, no máximo, se veriam esqueleto.
Na mesma referência se relata as
repercussões nos jornais do Rio de Janeiro, poucas semanas depois da
descoberta:
Maravilhas do
Século
(Jornal
o Paiz, edição de 4ª feira, 14FEV1896)
"Estupenda descoberta preocupa
actualmente o mundo scientifico europeu e já della tivemos ha dias telegrammas,
cuja linguagem consisa nada explicava. Chegam-nos agora revistas scientificas e
jornaes medicos, que vieram esclarecer melhor a estupenda descoberta anunciada.”
A Photographia
Atravez dos Corpos Opacos (Jornal do Commercio
do Rio de Janeiro, edição de 6ª feira, 16FEV1896)
"O eminente professor de physica Wilhelm
Conrad Roentgen, de Wutzburgo, acaba de fazer uma descoberta destinada, se os
seus resultados se confirmarem amplamente, a produzir uma profunda revolução
nas sciencias, sobretudo na medicina e mais particularmente e immediatamente
ainda na cirurgia. Trata-se de uma descoberta realmente assombrosa, a
photographia atravez dos corpos opacos, impenetraveis à luz (...). A descoberta
delles é sem dúvida uma das maiores conquistas da sciencia, predestinada a
levantar uma ponta do véo de tantas cousas occultas até hoje aos nossos olhos,
e cuja applicação irá determinar os mais inesperados resultados. Limitamo-nos
por hoje a apresentar aos leitores as experiencias que se tem feito em tal
sentido e que, como se verá, têm sido as mais satisfatorias.
Lima, Afonso & Pimentel (2009) concluem o
artigo afirmando: “As propriedades dos raios-x, quer tenham encantado ou
desagradado às pessoas, ocultavam os perigos advindos de sua manipulação
indevida. Foi preciso um acúmulo de erros e tragédias para que se despertasse
nas pessoas a necessidade do estabelecimento de protocolos de proteção
radiológica, bem como da supressão de muitas das aplicações empíricas no
cotidiano que eram feitas no início do século 20”.
* LIMA, Rodrigo da Silva;
AFONSO, Júlio Carlos and PIMENTEL, Luiz Cláudio Ferreira. Raios-x: fascinação, medo e ciência. Quím. Nova [online]. 2009, vol.32, n.1, pp.
263-270. ISSN 0100-4042. http://dx.doi.org/10.1590/S0100-40422009000100044. [Acessado 07/JUL/2014]
Raios Roentgen
ResponderExcluirPosso ver dentro de você pelo raio X
Eu desvendo seus segredos internos
Essa técnica que alguém sempre quis
É um aparelho dos mais modernos.
Quando Roentgen o raio descobriu
De tecnologia a medicina carecia
Foi um grande avanço o que se viu
Nos meios médicos causou alegria.
Portanto agora faz parte da rotina
Roentgen nossos ossos vasculhar
E ver coisas que nem se imagina
Além da pele e da massa muscular.
Pois o corpo se tornou uma vitrina
Expondo ossos de forma invulgar.
Somos gratos a este cientista que nos proporcionou os beneficios de sua descoberta.
ResponderExcluirMuito estimado Luvander,
Excluiralegra-me seres reconhecido a mulheres e a homens que com seus fazeres melhoraram a qualidade de vida dos humanos.
Obrigado pela tua presença aqui que me evoca o dia que estive no Sepé Tiaraju e na tua casa.
A admiração do
Em todo grande avanço existem os oportunistas de plantão, que como abutres, independente do resultado procuram a melhor forma de auferir vantagens. A própria inquisição limitou-se a atirar ao fogo quem quer que representasse uma ameaça a submissão cega e incondicionada. Precisamos sair de nossas cavernas atentos à luz.
ResponderExcluirEstou constantemente em crise existencial ao refletir sobre o que movem as pessoas ao ponto de destruir seu semelhante para, conforme o Antonio, auferir vantagens, se somos reles mortais!!! Dessa (vida), o que se leva?
ResponderExcluirde humanos. Amanhã, domingo, tereemos um excelente contraponto.
ResponderExcluirAguaredem e sei que se sensibilizarão.
Será bom lermo-nos amanhã,