ANO
8 |
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EDIÇÃO
2689
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Mais um dia de compromissos
significativos, que parece esboroar a sensação, que ainda na semana passada,
estava em férias no inverno europeu. Agora, a agenda está tão avassaladora, que
a Terra (dita) Santa está tão distante quanto esteve para os hebreus,
conduzidos por Moisés, que levaram 40 anos para atingi-la, quando poderiam
tê-lo feito em poucos dias.
Enquanto estive
fora do país ocorreu um acontecimento que foi muito comentado pela imprensa. Vitimado
um jornalista, parece que o corporativismo imperou. Fosse outro profissional,
certamente não teríamos a mesma repercussão. Pois para falar do acontecimento
dou voz a um colega de profissão da vítima.
José Carneiro,
que com mérito, já foi tantas vezes autor de destaque aqui, desde Belém do Pará,
traz uma bem posta reflexão. Vale lê-lo, mas antes os agradecimentos pela
colaboração enviada e o preito de respeito ao cidadão vitimado.
A morte de um cinegrafista A morte do cinegrafista Santiago Andrade, da Televisão Bandeirantes, ocorrida
poucos dias depois de ter sido atingido por um foguete do tipo rojão, além de
consternar a sociedade colocou sob estado de alerta um dos ramos dos
profissionais da imprensa. Todos lembram do que aconteceu com o infortunado jornalista,
ao cobrir, para sua empresa de televisão, as manifestações de protesto que
ocorriam nas ruas do Rio de Janeiro, contra o aumento das passagens dos ônibus
urbanos. Um dos dois manifestantes envolvidos na tragédia e já indiciados pela
policia, aparentemente sem o propósito de ferir o jornalista, disparou para o
chão um rojão aceso, que acabou, ao subir, atingindo violenta e gravemente na
cabeça o cinegrafista. As chocantes cenas gravadas por colegas que cobriam a
mobilização popular impressionaram pelo fogo e pelo choque, que provocaram
vários tipos de sequelas no jornalista, o qual, mesmo socorrido imediatamente,
não resistiu à extensão dos ferimentos. Aí surgem as perguntas que não querem
calar: o cinegrafista estaria simplesmente na hora errada e no lugar errado? As
manifestações serviriam a todas as explosões de maldades e bondades? Que
intenções moveram as mãos dos responsáveis, ambos presos?
Antes de tudo, convém esclarecer que a profissão de
jornalista não é nem mais e nem menos perigosa do que qualquer outra componente
da matriz ocupacional dos trabalhadores. Muito embora sejam alarmantes as
estatísticas a respeito dos incidentes e acidentes sofridos por jornalistas,
ainda assim a taxa de risco se mantém dentro de padrões previsíveis, tais os
problemas que a dinâmica urbana apresentam diariamente. Só do ano passado para
cá, por exemplo, há registrados no Brasil 136 casos de violência sofrida por
jornalista no desempenho de suas atividades rotineiras, onde se pode mencionar
assassinatos, acidentes, ameaças constantes e até falta de condições de
trabalho. Pode-se até afirmar que o episódio resultante na morte do cinegrafista
Santiago Andrade tem sido recorrente em coberturas jornalísticas de alto
tensionamento, por assim dizer. Casos de guerra, de guerrilha, incêndios,
desabamentos e, agora, as manifestações de rua que se espalham pelo planeta dão
a tônica dos cenários mais perigosos para esses profissionais da imprensa,
sobretudo os repórteres fotográficos e cinegrafistas.
A televisão já conseguiu captar alguns flagrantes
de raros impactos mostrando a morte de jornalistas em ação. Em alguns casos, o
próprio cinegrafista, num gesto heroico, captou o momento exato em que um
atirador o atingiu mortalmente, com a câmera descrevendo a lenta queda para a
morte. O cinema também já tratou do tema em inúmeras produções, ficcionais ou
documentais, revelando a contextualização em que o perigo rondaria a vida da
maior parte dos profissionais que cobrem os eventos públicos.
No Brasil, a repercussão dessas tragédias tem sido
a maior possível, igual a um brado retumbante, infelizmente proporcional ao
descaso das autoridades competentes.
Numa manifestação pública como as que têm ocorrido
no Brasil, nos quais persiste a violência do aparato policial beirando a
inconsequência, é previsível – e lamento afirmar isso – que cenas e fatos
lamentáveis continuem a se repetir, como o que vitimou o infeliz cinegrafista
Santiago Andrade.
Nessa homenagem que presto a um companheiro de
imprensa, afirmo que ele foi vítima não apenas de um rojão, mas de uma série de
fatores que nos ameaçam a todos. Que o sangue de Santiago Andrade ajude a
redimir esses males.
E se a mesma imprensa (grande mídia) que cobre tais eventos criminalizando-os estivesse empenhada em combater as CAUSAS das mazelas sociais? Creio que teríamos um horizonte mais brilhante.
ResponderExcluirMeus cumprimentos ao José Carneiro pela lucidez. E ao mestre pela cedência do espaço.
Grande abraço.
Na liturgia cristã, o réquiem é a primeira palavra uma de prece (Descansa em paz...) composta para um funeral (com corpo) e também para as missas de 70 ou 30º dia quando o caixão era substituído por um catafalco.
ResponderExcluirObrigado pela tua presença sempre tão desafiadora,
achassot
Caro Chassot,
ExcluirDe qualquer forma, seja na liturgia cristã ou não, Réquiem é sempre para um morto, não é mesmo?
Sem polêmica, JAIR.
Meu caro Chassot! Muito bem posta a narrativa do José Carneiro a respeito da morte do cinegrafista da Band. Realmente as estatisticas demonstram que o perigo a que se expoem estes profissionais nao sao maiores que os demais que estao proximos a eventos desta natureza. Mesmo assim é correto registrar os descaso das autoridades públicas em estudar a forma adequada de lidar com isto. Certamente, como voce destaca, não sao noticiadas outras tragédias diarias do povo brasileiro com a mesma intensidade da cobertura que se dá num caso como este. Abraço do JB
ResponderExcluirMuito eloquente, e porque não dizer, imparcial o relato do jornalista no espaço gentilmente cedido pelo Mestre Chassot. Porém gostaria de chamar a atenção a um detalhe. Quando da morte daquele jornalista alvejado covardemente no exercício da profissão por traficantes, não houve essa comoção nacional em repúdio ao fato, nem punição exemplar e lúdica como vemos agora. Não que eu ache que a morte de agora tenha menos ou mais importância, o que me causa repulsa é constatar que a morte do profissional está sendo usada como bandeira para sufocar reivindicações legítimas da sociedade. A morte foi um acidente lamentável, o que estão fazendo em torno do fato é vergonhoso.
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