ANO
7
|
Serra Gaúcha
Bento Gonçalves
|
EDIÇÃO
2432
|
Esta edição é postada em Bento Gonçalves. Optamos para
curtir o feriado pascoal e ver as árvores se dourarem com os tons outonais.
Viemos ontem e voltamos amanhã. Daqui, votos de fruído sábado de aleluia,
esperando que a ‘malhação de Judas’ seja algo de antanho.
A dica sabática de leitura é de um livro que ainda
não li. Trago hoje texto que transcrevo — com autorização — do espacoacademico.wordpress.com, onde o professor
Antonio Ozaí da Silva mantém um excelente blogue. Assim, a seguir, a resenha de
um livro que já me atiça.
RICHARDS,
Jeffrey. Sexo, desvio e danação: as minorias na Idade média. Rio
de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1993, 204 p. ISBN: 978-85-71-10258-3.
Concluí a leitura da obra Sexo, desvio e
danação: as minorias na Idade Média, escrita por Jeffrey Richards. Hereges,
bruxos, judeus, prostitutas, homossexuais e leprosos, são grupos minoritários
segregados e perseguidos. Embora cada grupo tenha características
diferenciadas, o discurso condenatório que constitui o elo da corrente que
aprisiona e mortifica corpos e mentes considerados desviantes pode ser
sintetizado numa palavra: sexo. Mesmo a lepra termina por ser associada à
lascívia, ao desejo sexual, e, portanto, é vista como punição ao pecado carnal.
Por que a moral religiosa e pública condena o sexo?
Por que a sexualidade exige o controle absoluto? Na Idade Média, a Igreja
Católica foi a instituição predominante na vida moral e espiritual das pessoas.
O poder do pastorado almejava controlar todas as esferas do cotidiano,
especificando, inclusive, que atos sexuais eram permitidos, onde, quando e com
quem. O desejo sexual foi identificado como o mal maior, “um mal acima de todos
os males”, segundo Santo Anselmo (1933-1109). O ilustre arcebispo de Cantuária
apenas expressava a atitude típica e comumente aceita pela cristandade
medieval. As raízes da censura ao sexo estão nos fundamentos originários da
religião cristã:
“Pois
a cristandade foi, desde seus primórdios, uma religião negativa quanto ao sexo.
Isso significa dizer que os pensadores cristãos encaravam o sexo, na melhor das
hipóteses, como uma espécie de mal necessário, lamentavelmente indispensável
para a reprodução humana, mas que perturbava a verdadeira vocação de uma pessoa
– a busca da perfeição espiritual, que é, por definição, não sexual e
transcende a carne. É por isso que os ensinamentos cristãos exaltam o celibato
e a virgindade como as mais elevadas formas de vida” (p. 34). [1]
Na concepção cristã medieval o sexo não inclui o
prazer:
“Os
teólogos medievais enfatizaram que era um pecado mortal fazer amor com a esposa
unicamente por prazer. “Um homem que está ardentemente apaixonado por sua
esposa é um adúltero”, disse São Jerônimo no século IV, uma opinião
frequentemente reiterada no decorrer da Idade Média” (Id.).
Dessa forma, toda relação sexual “fora do
casamento, tanto heterossexual quanto homossexual, era pecado, e, dentro do
casamento, só deveria ser usado para fins de reprodução” (Id.). As autoridades
eclesiásticas chegaram ao cúmulo de prescrever como deveria ser o sexo sem
pecado, isto é, restrito a objetivos reprodutivos:
“A
Igreja prescrevia a forma apropriada da relação. A única forma permitida era a
que se conhece hoje em dia como “a posição do missionário”, frente a frente com
o homem por cima e a mulher embaixo. Todas as outras variações eram punidas. A
relação anal incorria em penitência de sete anos. Havia uma penitência de três
anos para o coito dorsal, com a mulher por cima; isto era considerado contrário
à natureza, a qual determinava que o homem deveria ocupar a posição dominante.
O sexo oral também recebia três anos, assim como a relação com a penetração
feita por trás, considerada como algo que rebaixava o homem ao nível das
bestas, porque cavalos e cães copulam desse modo. O sexo anal e oral eram
provavelmente considerados como contraceptivos, embora não seja especificamente
mencionado. Os penitenciais incentivavam os casais a praticarem sexo somente à
noite e mesmo assim parcialmente vestidos. Fica claro que o sexo era visto como
algo essencialmente vergonhoso” (p. 40).
Por outro lado, a relação sexual, ainda que com
objetivo meramente reprodutivo, era interditada sob determinadas
circunstâncias:
“A
Igreja regulamentava a atividade sexual dentro do casamento, proibindo-a em
todos os dias de festas religiosas e jejuns (dos quais havia 273 no século VII,
embora já estivessem reduzidos para 140 no século XVI), aos domingos e nos
períodos em que se considerava que a esposa estivesse impura (durante as regras
menstruais, durante a gravidez, durante o aleitamento e por quarenta dias após
o parto)” (p. 39).
A demonização do sexo na Idade Média foi também uma
forma de estigmatizar as minorias desviantes, geralmente associadas às práticas
sexuais abomináveis e em desacordo com a opinião eclesiástica e das autoridades
civis – mas também enraizadas no senso comum. Embora inaceitável, do ponto de
vista da modernidade, podemos fazer o esforço de compreender o pensamento
teológico-civil medievalista, considerando-se o contexto histórico, cultural,
etc. Mas, o que dizer da persistência dos estigmas e da postura condenatória em
pleno século XXI? Por que será que atitudes e pensamentos medievais sobre a
sexualidade persistem e sentenças de danação ainda são proferidas? Por que o
sexo continua a ser concebido como pecado? Não teria sido mais apropriado se o
Criador tivesse decidido por criaturas assexuadas?!
[1] Todas
as citações são da obra acima referida.
O sexo é tabu desde a criação. Lilith teria sido a primeira mulher, que revoltando-se quanto a sua posição por baixo de Adão na cópula revoltou-se e foi transformada em demônio. A analogia do ato de comer o fruto proibido e ato sexual também é clara. Nos apócrifos encontramos referências a um Jesus naturalmente homem, tendo assim sua companheira, Maria Madalena.Nos relatos bíblicos a todo momento há descrições de punições por comportamentos ligados ao sexo, Sodoma e Gomorra, o dilúvio etc. Existem cartas dos primeiros portugueses que chegaram ao Brasil, onde descrevem assustados como os índios se entregavam a cópula aonde estivessem, pois na época ainda não estavam contaminados pelos tabus da Igreja.
ResponderExcluirabraços
Antonio Jorge
Limerique
ResponderExcluirOnde quer o desejo esteja
Religião traça uma peleja
Num gesto sem nexo
Quer proibir o sexo
Contra o prazer é a igreja?
Meu caro Mestre Chassot: Com o passar dos tempos novas gerações vão surgindo e logicamente a forma de pensar sobre sexo também muda. É totalmente estranho pensar que antigamente se uma mulher mostrasse o tornozelo seria chamada de imoral.Só não vamos confundir liberdade com libertinagem. Um grande abraço .
ResponderExcluirqual a corrente teórica e historiográfica da obra em questão
ResponderExcluir