ANO
7
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EDIÇÃO
2429
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De repente, na manhã atarefada desta segunda-feira, uma
surpresa! Recebo um alerta do Facebook que Estácio Victor escreveu:
""Há
necessidade de tornar o nosso ensino mais sujo, isto é, encharcá-lo na
realidade" (CHASSOT, Attico)."
Logo em seguida, alguém faz uma interpretação menos ortodoxa
à afirmação:
“Até porque
inchar números com educação continuada e ProUni não é nada muito condizente com
a realidade!”
Isto recebe a contestação imediata do Victor desde Belém
do Pará:
O contexto não
era esse, mas vale a interpretação. A ideia é de um ensino menos matematizado
(inclusive para a matemática — para não tornar o termo pejorativo) e próximo de
uma realidade que não é sempre exata.
De vez em vez, enquanto acalmava impaciências de
orientandas — quatro delas resolveram no ocaso do domingo pautar minha
segunda-feira — interrogava-me onde fizera a afirmação sobre uma desejada sepsia
(e não assepsia) no ensino. Comecei a pass(e)ar por livros e artigos na busca
de pegadas. Os eficientes robôs do Google foram hábeis em dar pistas. À noite,
serenadas as solicitações, escrevia:
Estimado Estácio
Vitor, obrigado por ressuscitares uma afirmação minha há um tempo adormecida no
Alfabetização científica: Questões e desafios para a Educação, cuja 1ª edição é
de 2000 (atualmente circula a 5ª). Há um tempo não recordava está ideia.
Encontrei três artigos (dois de etnomatemática e um de etnobotânica) que a citam.
Agradeço também por zelares por uma mais conveniente interpretação.
Ontem, depois das aulas de Teorias do Desenvolvimento
Humano da tarde e da noite, havia um blogue a postar. Optei por trazer o relato
que Estácio Vitor catalisou.
As citações presentes nos três artigos antes referidos,
esta no Alfabetização científica:
Questões e desafios para a Educação, no capítulo: ‘Buscando um ensino menos
apolítico’ onde diz:
“É preciso abandonar a assepsia. Há necessidade de tornar o nosso ensino mais sujo, isto
é, encharcá-lo na realidade. Há usualmente, uma preocupação de se fazer um
ensino limpo. A matematização parece ser um indicador de quanto o que ensinamos
é para mentes privilegiadas e, portanto, desvinculado da realidade do mundo do
que se pretenderia explicar.”
Num dos artigos: Educação
matemática e geometria: possibilidades e limitações de um processo pedagógico etnomatemático,
Elaine Maria Ludwig Kerber, professora da Escola Estadual de Ensino Médio
Poço Antas, traz sua experiência como especialista em Ensino de Matemática, na
Univates, quando escreve:
De fato a escola, na maior parte das vezes, não problematiza
o currículo escolar, aceitando-o como “algo dado” e não sujeito a possíveis
modificações e contestações. Parece querer um currículo “seco”, não imbuído da
realidade e da cultura dos alunos. Nesse sentido, Chassot (2001, p. 98) afirma:
[segue a citação transcrita acima].
Um segundo artigo Reflexões
sobre inclusão/exclusão no âmbito da Educação Matemática, publicado em
2007, na Revista do ICHLA, de autoria das então doutorandas: Claudia Glavan
Duarte e Vera Lúcia da Silva Halmenschlager [esta particularmente lembrada aqui
com saudade evocando seu prematuro falecimento] traz a mesma citação, em
contexto parecido.
No terceiro texto Etnobotânica
no currículo de ciências do ensino fundamental na educação de jovens e adultos –
EJA, André Boccasius Siqueira, hoje doutor em Educação cita o mesmo
excerto, em artigo apresentado na ANPEDSUL. Relatando seu trabalho de
dissertação de mestrado, feito sob minha orientação.
Assim, agradeço ao paraense Estácio Victor me ajudou
rever alguns textos e catalisou esta blogada. Adito votos de uma curtida
quarta-feira.
Chassot,
ResponderExcluirOntem mesmo pensei, revoltado com algumas situações, neste problema grave. O expediente do vestibular é o maior subterfúgio para a higienização de conteúdos. Pouco uso o livro didático porque as questões são de uma esterilidade abjeta. Perversas por existir em sua intenção a bitolação programada. Ou seja, é a suposta qualidade a serviço da desqualificação. Estou perturbado com isso, precisamos conversar... Recentemente fui criticado por fazer questões com problematização. Abraços
Limerique
ResponderExcluirVelha educação essa dita cuja
Está a pedir merecida lambuja
Que seja encharcada
De realidade somada
Tornando-a uma educação suja.
Um comentário antigo e um problema tão atual. A realidade é que a grade escolar ainda é uma questão afeta aos políticos. Já na antuiguidade Sócrates pereceu por discordar do ensino ministrado pelos sofistas. Lá como cá, a qualidade do ensino não estava na mão de quem deveria estar. Esta questão além de alimentar a evasão escolar, desmotiva os professores, e forma pessoas inaptas já que a fase escolar se torna árdua e enfadonha para muitos. Lembro as palavras aqui já citadas de Ségio Sérvulo da Cunha; "O conhecimento não é um produto que se possa comprar, pronto e acabado, numa prateleira, mesmo que seja da melhor biblioteca. Copiar é a melhor maneira de se extraviar, pensando e criticando é que se faz ciência." (CUNHA, Sérgio Sérvulo da. Dicionário Compacto do Direito 4ª edição, ed. Saraiva 2005, introdução)
ResponderExcluirabraços
Antonio Jorge
Cara! Eu fico imaginando como Thomas Huxley deveria se sentir ao abraçar as idéias de Darwin e esbravejar os fatos, "latir" como o "bulldog" que era e tentar mostrar para as outras pessoas as belezas da explicação do funcionamento do mundo proporcionada por uma única mente humana.
ResponderExcluirGuardadas as devidas proporções (porque eu não sou Thomas Huxley, evidentemente), acho que posso dizer que experimento, hoje, um pouco daquilo que deveria ser o sentimento dele para com a pessoa e as idéias de Darwin.
Um problema que me incomoda bastante como professor de ciências, a respeito do ensino, é 'como ensinar ciências?'. E em uma análise mais profunda 'o que é alfabetização científica?'. Acho que nunca antes um livro respondeu tanto as minhas angústias do que o "Alfabetização científica: Questões e desafios para a Educação" do Mestre Attico Chassot. E, nesse exato momento em que escrevo, me sinto 1% Thomas Huxley por abraçar uma idéia e, por isso, ter a oportunidade de trocar palavras com alguém que admiro. É coisa de fã até! Mas, o que falta nesse país é reconhecer, de fato, quem ter como referência.
Obrigado pela referência, Mestre.
Meu caro Victor,
Excluirse hoje estivesse necessitando de massagem no ego, a metáfora trazida por ti me faria megalomaníaco. Muito obrigado pela parceria.
A edição desta quinta-feira do blogue é um espraiamento de ontem onde se fazia a defesa de um ensino menos asséptico, quando se amealha ligações com fossa séptica.
attico chassot