ANO.pro.br***Edição
2378
A blogada de
hoje se faz, uma vez mais, com a colaboração de um leitor diário aqui. O
jornalista e sociólogo José Carneiro, publicou esta semana na imprensa
belenense o texto que enviou também para este blogue. Pela sua oportunidade ele
tece a blogada de quinta-feira.
Hidrantes, incêndios e recorrências:
A primeira vez que ouvi a palavra “hidrante”
aconteceu, paradoxalmente, pela falta desse artefato, usado exclusivamente para combater incêndio. Pelo
menos assim dizem os dicionários: hidrante é uma válvula de saída de água que
se conecta a uma mangueira para combater incêndio. Simples é definir, difícil é
isso existir. Agora a pergunta, antes da história e da conclusão: você que me
lê já viu algum hidrante nas ruas de Belém? Lembra, pelo menos, de uma rua com
esse equipamento? Quando eu tinha doze anos de idade, ocorreu um pavoroso
incêndio na cidade de Castanhal, um sinistro, no linguajar da imprensa
policial. Era um fim de tarde de uma sexta feira do mês de agosto de 1959,
quando uma indústria de prensagem de malva, chamada Primor, foi quase
totalmente destruída pelo fogo. Era a maior empresa local, sua estrutura
ocupava metade de um quarteirão e toda a cidade ficou sobressaltada com as
cenas vistas de perto, e também de bem longe. Não houve vítimas fatais, mas os
prejuízos atingiram vários pontos de comércios vizinhos, correndo rumores de
que algumas mercearias foram saqueadas. Os bombeiros, que no Pará só existiam
em Belém, foram chamados mas, em época de estradas ruins, demoraram várias
horas para chegar e pouco puderam fazer. O incêndio se alastrara rapidamente,
com os depósitos cheios de malva, facilitando a combustão. E as primeiras
providências de combate partiram do próprio público, nas proximidades do local.
No dia seguinte, assistindo ao rescaldo do fogaréu, eu ouvia comentários de que a falta de hidrantes teria
prejudicado a ação dos bombeiros. Além desse episódio, só vi menção a hidrantes
nas revistas em quadrinhos e, de forma
um pouco mais evidente, no cinema. Para mim o hidrante permitiria um acesso
rápido à água, que jorraria com intensidade bastante, pelo menos nessas imagens
virtuais. Em outros incêndios no Brasil, num passado não muito remoto, uma das
evidências repetidas era que, na maioria dos casos, os hidrantes não existiam
ou sequer funcionavam, faltando-lhes a pressão indispensável ao forte jorro
d’água. Creio que o da Primor foi o maior incêndio já presenciado em Castanhal.
E para terminar essa primeira parte, deve-se registrar que, até hoje, não há
hidrantes em Castanhal, cidade com mais de 170 mil habitantes, embora já
disponha de um quartel do Corpo de Bombeiros.
Vamos à segunda parte dessa história. O incêndio numa
boate na cidade de Santa Maria, no RS, que desde domingo (27JAN13) repercute no
mundo inteiro, é mais um número de uma estatística fantasmagórica a abalar a
sociedade humana, por causa de desídia, de imperícia ou, simplesmente, de
irresponsabilidade. Há sempre uma conjugação de fatores nesses casos, nunca uma
causa isolada. A televisão, com suas imagens e os comentários especializados,
já demonstrou à exaustão o que deveria ter sido feito para evitar a tragédia.
Nada há a acrescentar, apenas a lamentar. E aí chego ao final da minha
reflexão: e em Belém? Minha filha me lembrou de que há tempos existiu aqui, em
plena área central do comércio, uma boate de três andares, dispondo de apenas
uma única porta, que servia para entrada e saída. E as que existem atualmente,
estão prevenidas para o imprevisível? Inferimos que não, como deduzimos que a
tragédia de Santa Maria, ainda que momentaneamente, servirá de exemplos para os
órgãos responsáveis pela segurança cumprirem minimamente suas funções. Podemos
ter certeza, ao menos esperança, de que isso virá a ocorrer?
Professor Chassot,
ResponderExcluirexcelente o texto do jornalista Carneiro, Resta algo que ele deveria esclarecer: Por que era processado volume tão grande de malva?
Na espera de uma explicação
L L L
Caro Loureiro;
ExcluirA PRIMOR era uma espécie de entreposto. Ela comprava (as vezes financiava o próprio produtor) a malva de inúmeras fontes e os seus espaços estavam sempre abarrotados, para a sequencia de prensagem. As vezes a malva chegava molhada e a PRIMOR usava a calçada e a própria rua (pouqissimo tráfego, na década de 1950) para a indispensável secagem. Depois da prensagem, os volumes eram transportados, de trem, para Belém e de lá seguiam os seus diversos destinos. Resolvi investigar melhor a história da empresa e fiquei sabendo, pasme, que o incêndio que eu presenciei foi o segundo que a empresa sofreu, em menores proporções.
Grande abraço do
José Carneiro
Meus caros Carneiro e Loureiro.
ExcluirMinha pergunta é: para que Castanhal beneficiava este grande volume de malva?
Seria para indústria farmacêutica, pois a malva é uma planta medicinal com ações muito amplas atuando como diurético, laxante e também expectorante. Lembro de xarope e de bala de malva;
Para onde Belém a remetia? (¿exterior?) Quem e como a produziam? Hoje ainda há em Castanhal produção e beneficiamento de malva?
Boas questões para nosso jornalista que ‘ausculta a História’
attico chassot
Caros amigos:
ExcluirA malva, de melhor qualidade que a juta, era utilizada sobretudo na fabricação de sacos de embalagem. Esse valioso mercado foi ocupado pela INDIA, que produzia juta de melhor qualidade e preço, até hoje. A malva praticamente não existe mais, era cultivada a beira de igarapés, na várzea (assim como a juta) e servia ainda para a produção de corda. Acrescento que em Castanhal a malva não era beneficiada, apensa prensada para ser transportada. Amanhã vou entrevistar um castanhalense cujo pai trabalhou muitos anos na PRIMOR para melhor entender da malva. Fiquei curioso a partir da publicação do meu próprio artigo, vejam só a curiosidade.
Abs cordiais do
José Carneiro
Mestre Chassot,
ResponderExcluiro texto do professor Carneiro é muito bom.
Às causas que ele lista: de desídia, de imperícia ou, simplesmente, de irresponsabilidade há que acrescentar talvez a mais importante:
a avidez gananciosa dos proprietários que querem arrecadar com a famigerada comanda mais e mais colocando o dobro da capacidade dentro das arapucas.
Rachel Weissbaun
Ratificando os comentários anteriores acrescento um detalhe, não são as boates que tem que mudar, não são os alvarás que precisam de rigor, não são as leis que estão mal feitas. É o Brasil que tem que mudar. Enquanto esta camarilha política ai estiver, estaremos entregues a própria sorte. Aqui "tudo funciona" e nada funciona. Vivemos de escândalos e campeonatos. Nas novelas vivenciamos uma realidade com final feliz.
ResponderExcluirPanis et circenses.
abraços
Antonio Jorge
Limerique
ResponderExcluirNo Patropi onde poder é farsante
A negligência é algo arrepiante
Se há perigo de fogo
Você já perdeu o jogo
Tudo porque não existe hidrante.