Ano
7*** PORTO ALEGRE Morada dos Afagos ***Edição 2027
Cada leitor, uma leitura. Esta é uma
máxima já longeva. Hoje a retomo, mostrando que um mesmo livro pode ter sua
leitura com diferentes óculos.
Sem querer atiçar polêmicas, posso
pensar na Bíblia como instrumento para um cristão conhecer a palavra de Deus.
Valeria o mesmo para a Torá ou o Corão para um judeu ou para um islâmico. Um
ateu poderia ler um ou outro destes livros e encontrar ali instigantes textos
de ficção científica. Assim o relato da construção de uma arca, o amealhar de
casais de animais para escaparem do dilúvio universal pode parecer uma
instigante história de ficção, assim como a situação de uma virgem ser
fecundada por um anjo e gerado um Deus.
Numa terceira situação, um crente ou
um não crente, pode ler texto de livros ‘ditos’ sagrados por deleite literário.
A mim, por exemplo, encanta ler parábolas do Novo Testamento como fruição
intelectual.
Ainda, nesta semana, elaborava um
texto que envolvia uma discussão acerca de germinação de sementes; isto ensejou
outra leitura à parábola do semeador, um texto muito bonito, ligado a minha infância:
5 Saiu o semeador a semear a sua semente. E quando semeava, uma
parte da semente caiu à beira do caminho; e foi pisada, e as aves do céu a
comeram. 6 Outra caiu sobre pedra; e, nascida, secou-se porque não havia
umidade. 7 E outra caiu no meio dos espinhos; e crescendo com ela os espinhos,
sufocaram-na. 8 Mas outra caiu em boa terra; e, nascida, produziu fruto, cem
por um (Lucas, 8, 5-8).
Pois, me lembrei de algo que aprendi
no cotidiano que reabilita aquelas sementes que foram comidas pelas aves e na
leitura bíblica foram consideradas não produtivas.
Quando nos anos trinta do século 20, no Rio Grande Sul,
especialmente nos vales do Taquari e do Caí, foi introduzido o cultivo da
acácia negra, para a produção do tanino, usado no processo de curtição do
couro, as primeiras sementes foram importadas da Austrália. Depois de várias
tentativas, sem qualquer êxito, de fazê-las germinar no usual processo de
lançá-las a terra, Júlio Carlos Lohmann, no município de Estrela, desiste e
resolve usá-las como alimento para galinhas. Ocorre então uma surpresa, que
determina uma prática para o cultivo de acácia. Ao passarem pelo trato
intestinal das aves, as sementes tiveram amolecida a quitina, membrana
celulósica que faz parte da película envoltória e se observou, em função disso,
a germinação de acácia em locais onde as galinhas alimentadas com sementes
haviam depositado fezes. Assim, se aprendeu acerca da necessidade de que
sementes de acácia devem ser previamente escaldadas em água fervente ou
tostadas levemente em um braseiro, antes de serem semeadas.
Ouvi este relato em 1962 de Hélio Alves de Oliveira. No
seu livro Acácia Negra e tanino (Porto Alegre: Mercantil, 1960) ele dá o
pioneirismo a Lohmann no cultivo da acácia, mas não refere o fato.
Ofereço esta blogada
ao meu amigo e colega Norberto Garin, um homem de fé que le a Bíblia com Ciência.
A fé é subjetiva pois depende da predisposição de cada um. Porém assim como a religião tem limitações científicas em suas afirmações, a ciência tambem não consegue explicar o grande enigma da criação. E nesse ponto o ateu fica sem resposta, perdido em seus momentos de aflição. Prefiro concordar com Sócrates: " Só sei que nada sei".
ResponderExcluirabraços
Antonio Jorge
Belíssima história para iniciar o sábado. Parabolicamente, também semeamos sementes que necessitam serem digeridas antes de fruticarem nas salas de aula
ResponderExcluirGrande abraço,
Paulo Marcelo
Belíssima história para iniciar o sábado. Parabolicamente, também semeamos sementes que necessitam serem digeridas antes de fruticarem nas salas de aula
ResponderExcluirGrande abraço,
Paulo Marcelo
Professor!
ResponderExcluirNão lhe cabe mudar a palavra do Senhor Jesus. Ele disse que: 8 Mas outra caiu em boa terra; e, nascida, produziu fruto, cem por um. Não disse que aquelas que “parte da semente caiu à beira do caminho; e foi pisada, e as aves do céu a comeram” e que estas produziram frutos. O que está escrito, está escrito e é imutável;
Arrependa-se, se quiser ter Paz;
Pastor David Crown II
Limerique
ResponderExcluirPorque livro conhecimento semeia
Sementes que crescem até na areia
Tudo que o livro traz
A alguém sempre apraz
O livro faz do mundo uma aldeia.
Mestre Chassot,
ResponderExcluirParabéns por sua releitura de uma das mais lindas histórias contadas por Jesus. Estava em dúvidas acerca do que pregaria amanhã. Vou, inspirado no seu texto, mostrar que aquelas pessoas mortas ontem em Newtown nos EUA são como as sementes comidas pelos pássaros que depois frutificarão.
O senhor é um abençoado por ouve a voz do Espírito e a põem em prática.
Pastor Eliezer de Jerônimo
Olá Professor,
ResponderExcluirAdorei o texto de hoje. Quando vou ao culto, muitas vezes sinto falta de o pastor fazer estes entrelaçamentos entre as escritura bíblica e a vida cotidiana na sua prédica... Assim, as coisas ditas na igreja atingiriam mais pessoas...
Como sempre: parabéns!
Caro Chassot,
ResponderExcluirmuito obrigado pela dedicação da tua blogada de sábado. Nesse 14/12 só consegui me liberar às 23h50min. Estava envolvino na representação (releitura) das cenas bíblicas sobre o nascimento de Jesus Cristo.
Hoje, recuperando-me da jornada de ontem, reporto-me com muita alegria e prazer à tua blogada.
Disseste bem que há diferentes olhares sobre um mesmo texto dependendo de quem à espreita: pura verdade. Mais que isso, o mesmo texto, lido diversas vezes pelo mesmo leitor, é capaz de provocar distintos entendimentos. Em alguns casos, bem diverso do anterior. Quando um texto é produzido, seja um texto sagrado ou não (é necessário questionar o que significa "sagrado"), ele pertence ao seu autor. Depois, pertence a quem o ler, com direito de entender o que desejar. Mesmo sobre um texto doutrinário (sagrado) não pode ser dominado, nem pela própria divindade a quem o texto se refere. Ele está à disposição da subjetividade do leitor. Talvez, seja essa disponibiliade que tenha gerado, no mundo inteiro e no decorrer da história, as piores manifestações de fanatismo. A "invocação" de que se está inspirado pela divindade não elimina a subjetividade de quem lê o texto. Muitas vezes, a declaração de que essa ou aquela é a vontade da divindade, não passa do desejo e da vontade de quem a declara: nisso há um tênue limite entre o charlatanismo e comprometimento científico com as prescrições hermenêuticas.
Evidentemente que, no contexto da Parábola do Semeador, trabalhavva-se com uma noção de agricultura de subsistência e precária, na qual as sementes lançadas em bom solo produziam. Aquelas que os pássaros comiam não eram consideradas produtivas porque mesmo que germinassem não seria na lavoura de quem as semeou. Porém, a tua sugestão hermenêutica está coerente pois uma semente perdida passou a ser a semente da "salvação" dos curtidores do RS.
Um forte abraço,
Garin