Ano 6 *** PORTO ALEGRE *** Edição
2064
Sempre que
cumprimento alguém atrasado pelo aniversário, credito-me uma desculpa que me
parece adequada: o cumprimento atrasado
prolonga o aniversário. Para mim isto parece muito bom, e ainda soa elegante.
Claro que, talvez, para o aniversariante, pareça um desculpa esfarrapada. Aliás,
esta adjetivação para desculpa, lembra a minha mãe; ela a usava toda vez que
tentávamos justificar algo não convincente.
Mesmo que
Facebook aos domingos nos mande uma lista dos ‘nossos amigos’ aniversariantes
na semana, de vez em vez, há imperdoáveis esquecimentos. Assim, um ou dois dias
depois — se for aceito o argumento que se expande a celebração — ainda faço parabenizações.
Tenho uma inspiração:
as grandes festas religiosas tinham (ou melhor, têm; como saí do circuito, tudo
me parece do passado) a celebração da oitava. Logo cumprimentar depois pode
significar apreço ao aniversariante: sua celebração é tão importante que se
estende por oito dias, como a oitava do Natal ou oitava de Pentecostes.
A
propósito: fui conferir no sempre prestimoso ‘Priberam’; minha evocação é pertinente, pois a sexta acepção de ‘oitava’
é 6. [Religião
católica ] Cada um dos
oito dias seguintes a certas festas solenes, particularmente o último deles. No subproduto
que as consultas aos dicionários oferecem, sou recordado (pois no ginásio tive
aula de conto orfeônico) que quando vejo meus alunos do curso de licenciatura
em Música falando em ‘oitava’ estão em outra sintonia: 3. Intervalo entre duas notas musicais do mesmo nome
mas de diferente som (nos instrumentos de teclado). Não lembrava mais isto,
que deve ser algo das primeiras notas na alfabetização musical.
Aprendo, agora que existe o
verbo oitavar: 1. Dar forma oitavada a. 2. Dividir em
oitavas. Evoco, então
que, há muito, várias vezes oitavei: quando no meu primeiro ano de Porto Alegre
(1958) trabalhava em um pequeno mercado: Bar Caçula na Av. Eduardo (então, já
rebatizada de Presidente Roosevelt) esquina Ernesto Fontoura, tinha que ser
preciso no corte de tabletes de manteiga, quando as freguesas solicitavam um
oitavo de manteiga; havia (apenas) embalagens de 250g e desejavam apenas um oitavo
de quilo. Para oitavar, dividia um tablete em dois.
Um leitor deste blogue não
precisa ser muito arguto para se perguntar por que estou ‘enrolando’ com tão
longo preâmbulo. Quem deixei de parabenizar?
Pois ontem Porto Alegre fez
240 anos e houve muitas loas dedicadas à efeméride. Na verdade, e isso não é justificativa
para minha omissão, esta data natalícia é mais recente.
Houve muitas discussões entre os historiadores
acerca de duas datas uma em novembro e outra este 26 de março. Os geógrafos e
geólogos também viveram polêmicas: o que resulta da junção dos quatro rios (Jacuí,
Sinos, Caí e Gravataí) que formam um grande estuário (quase 500 km2)? um rio, uma ria ou um lago. Por quase toda a
sua existência, foi considerado um rio, porém, há pouco mais de vinte anos,
após criterioso estudo envolvendo especialistas foi classificado como um grande
lago. As áreas do lago e do município se quase se equivalem.
O Guaíba — lago, rio ou ria — é talvez uma das maiores belezas da capital
do Rio Grande do Sul. Não vou fazer aqui dar veio a bairrismo, mas Porto Alegre,
que ganhou no Império o título que ostenta em seu brasão “Leal e Valerosa” é
uma cidade muito aprazível e o Guaíba é algo muito lindo. E a minha homenagem
para cidade que me acolhe entre os seus há mais de meio século, faço com fotos de meu filho André, que é nascido aqui.
A cidade constituiu-se a
partir da chegada de casais açorianos em meados do século 18. No século seguinte
contou com grande fluxo migratório, especialmente de alemães e italianos. Hoje
tem uma população que se aproxima de 1,5 milhão de habitantes. A cidade
enfrenta, como a maioria das metrópoles de países periféricos, muitos desafios,
entre eles a grande população ainda vivendo em condições de pobreza e sub-habitação,
um alto custo de vida, deficiências sérias no tratamento de esgotos, muita poluição
e degradação de ecossistemas originais, índices de crime elevados (embora indicando
uma tendência de queda) e cada vez mais significativos problemas de trânsito.
Porto Alegre é uma das
cidades mais arborizadas e alfabetizadas do país. Tem uma infraestrutura em
vários aspectos superior a das demais capitais do Brasil. Foi manchete
internacional quando sediou as primeiras edições do Fórum Social Mundial e foi
escolhida recentemente como uma das sedes da Copa do Mundo de 2014, que parece
que vai transformar a sua paisagem, como um exemplo do que será o cais do porto. Eis uma
discriminação que me incomoda, hoje no Brasil. Há duas categorias de capitais:
as que sediarão a copa e as outras.
Assim, dentro da oitava do
aniversário de 240 anos da capital dos gaúchos, os cumprimentos de alguém que
curte morar aqui. Parabéns Leal e Valerosa Cidade de Porto Alegre!
Caro amigo:
ResponderExcluirQuero dizer que admiro Porto Alegre a partir de seu significativo nome. Conheci-a recentemente, hóspede da "Morada dos Afagos" e mais me afeiçoei da cidade, que visitei sem roteiro programado, o que é ótimo. Gostei mais ainda do folclórico bairrismo: "quando o Guaiba deságua, forma o oceano Atlântico".
Uno-me aos festejos do dia e envio meus efusivos parabéns a heróica Porto Alegre.
Grande abraço desde Belém do Pará,
José Carneiro
Caro Chassot,
ResponderExcluirsabes que o gaúcho é muito humilde em suas colocações, mas ouvi um causo, contado por aqui que 'inventaram' o Oceano Atlântico por inspiração do Lago Guaíba. Quando à complexidade envolvendo a data de nascimento de uma cidade é absolutamente compreensível. De fato, não sabemos exatamente a nossa idade cronológica. Se for marcada a partir do nascimento é uma coisa; se for marcada a partir da concepção é outra, mas se for marcada a partir do momento em que tomamos consciência de nosso existir, será bem diferente.
Um abraço,
Garin
Caro Chassot,
ResponderExcluirParabéns para a formosa e acolhedora PA que as vezes cognominam "Cidade Sorriso". Floripa também soprou velinhas neste mês, dia 23 de março de 2012 fez 286 anos. É uma velhinha bem saudável ainda. Quanto ao Guaíba, sempre achei que eu era o único e não considerá-lo rio. No meu parco conhecimento, rios tem foz, nascente e outros atributos que faltam ao Guaíba, então por que chamá-lo rio, quando se assemelha a um lago? Na verdade um apêndice da Lagoa do Patos? Aliás, geograficamente falando, a Lagoa dos Patos não é lagoa, é LAGO. Lagos tês grandes extensões, enquanto lagoas são poças de água que dá para cuspir de uma margem a outra (simbolicamente, é claro). Será modéstia dos riograndenses chamar aquela imensidão de lagoa? Como se fosse um laguinho de jardim? Certa vez defendi a tese, junto a amigos meus aí dos pampas, que o Rio Guaíba não existia, e quase apanhei. Abraços, JAIR.
Capital da copa, e quem patrocina o jogo, mas é expulso da arquibancada, são os moradores das muitas comunidades removidas. A Lei da copa está se impondo aos direitos humanos e ambientais.
ResponderExcluirMas sobre o aniversário... Minhas crianças, de 6 7,8 anos, formando a noção de quantidade, levaram como tarefa da semana registrar a idade da pessoa mais velha que conhecem. E ficaram surpresos, que "a nossa cidade nasceu faz tempo, heim sora??" = )
Meu caro Chassot
ResponderExcluirJuro a voce que a intenção era tecer comentarios otimistas em relação à nossa querida capital, principalmente no tratamento que os orgaos publicos e a administraçao lhe presta. Mas infelizmente devo confessar que tenho colhido tristezas pelo desleixo em que se encontra essa cidade. Basta que se faça comparativos com as demais capitais do Sul: Florianopolis e Curitiba. Nossa capital está um verdadeiro lixo. Observe a avenida que dá acesso à capital pelo aeroporto. Os canteiros estao tomados pelo mato, e os meios fios totalmente abandonados.
A ladainha é muita por parte da Administração Municipal. Mas de concreto, pouca coisa tem sido feita. Saudações lastimosas pelos 240 anos deste esquecido Porto dos Casais. JB
Boa noite, Mestre!
ResponderExcluirParabenizo hoje (tardiamente)na minha querida, Leal e Valerosa Porto Alegre!
E rendo minha homenagem aos descendentes dos casais açorianos que formaram o núcleo do porto, às margens do barrento rio Guaíba, depois promovido a estuário e agora transformado em "lago", como queria o Jair!
Ter 240 anos me parece muito pouco tempo para uma cidade!
Algumas cidades européias ainda ostentam restos de prédios romanos de mais de 2000 anos!
Porto Alegre é ainda um brotinho, quente demais para o meu gosto no verão, mas muito agradável no resto do ano.
Abraços!