Ano 6 *** www.professorchassot.pro.br
*** Edição 2036
Uma terça-feira — numa dimensão acadêmica — muito
especial. À noite estreio em duas novas turmas. Uma de Conhecimento, Linguagem e Ação Comunicativa de alunos de Educação Física
e outra de Historia e Filosofia da
Ciência de para um grupo de Ciências Biológicas.
Talvez, uma das situações mais agradáveis no
magistério seja esta não repetitividade de nossos cenários de atuação: a cada
semestre temos outros alunos, outras aulas. Na manhã de ontem tive a primeira
aula com um singular grupo de alunos da Licenciatura em Música, em sua maioria,
já experimentados músicos da noite, que evidenciaram serem portadores de grande
riqueza de saber adquiridos fora da Academia. Fiquei encantado com perspectivas
de nossas ações juntos nas manhãs de cada segunda-feira deste semestre.
Mas há algo mais que faz
esta terça-feira especial (e porque não segredar: nervosa). No turno vespertino
dou palestra para calouros de vários cursos que nesta semana iniciam a vida
acadêmica na Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre. Em
minha fala vou tentar responder a pergunta: O que é Ciência afinal?
Na esteira de busca de
respostas para esta pergunta, certamente na proposta de mostrar a Ciência como
um artefato cultural que pode ser usado também como um dos óculos para leitura
do mundo, poderei me remeter a mais uma das perguntas que me fez o jornalista Marcos Gregório Fernandes Gomes em uma entrevista para a revista Quanta de São Paulo, da qual trouxe
duas perguntas ontem aqui.
Assim, mais uma das treze
perguntas — que deve se inserir muito bem em discussões na área da saúde. Claro
que quando a respondi não a havia pensado no contexto de proposta que provavelmente
usarei hoje, relacionando com questões da área da saúde como medicinas
alternativas, placebo, acupuntura, homeopatia etc. Isto não está contemplado na
minha resposta que segue a pergunta.
Carl Sagan escreveu um livro, O mundo assombrado pelos demônios, em que defende que as pessoas devem aprender a pensar de forma
cientificamente correta, pois isso evitaria muitos preconceitos e conflitos.
Ele critica algumas modas da sociedade globalizada como a crença em horóscopo
ou no poder dos cristais, por exemplo. O que você acha dessa advertência de
Carl Sagan?
Com todo o respeito — e, antes, minha declaração de admiração por Carl
Sagan — discordo de sua advertência. Quantos foram castigados por aceitar o
heliocentrismo... Quando Freud desenvolve o que hoje chamamos de ‘psicanálise’
ao falar em sexualidade infantil, foi cuspido na face. A acupuntura já foi
considerada prática charlatã. Mesmo que nem sempre tenhamos facilidades, parece
que temos de nos acostumar, cada vez mais, a nos afiliar a Feyerabend (Contra o Método): “Dada uma regra qualquer,
por ‘fundamental’ e ‘necessária’ que se afigure para a Ciência, sempre haverá
circunstância em que se torna conveniente ignorá-la, como adotar regra oposta.
[...] Qualquer ideia, embora antiga e absurda, é capaz de aperfeiçoar nosso
conhecimento. [...] o conhecimento de hoje pode, amanhã, passar a ser visto
como conto de fadas; essa é a via pela qual o mito mais ridículo pode vir a
transformar-se na mais sólida peça da Ciência”. Assim, se for solicitada uma opção,
entre Sagan e Feyerabend, adiro ao anarquista epistemológico.
Caro Chassot,
ResponderExcluirTambém leio e sou fã de Sagan. De certa forma o vejo um pouco radical em certas atitudes e nem sempre concordo com ele também, contudo, no que toca a defender a ciência eu estou cem por cento com ele. Explico: ciência não é escrita em papel de seda, em dois testamentos, muitos livros, divididos em capítulos e versículos, então não contém verdades incontestáveis. Portanto, ela se auto renova sempre, não há necessidade de "colocar o pé atrás" toda vez que aparece uma nova teoria ou proposta científica. Abraços e parabéns pela ótima postagem, JAIR.
Caro Chassot,
ResponderExcluira diferença pode ser encontrada quando escolhemos esse ou aquele caminho, esse ou aquele método; quando faço uma viagem de carro percebo alguns cenários; se repito a mesma viagem, no mesmo dia, mas a pé, percebo cenários muito distintos. Concordo contigo: é uma questão de escolha de método (ou de não método).
Um abraço,
Garin
Ave Chassot,
ResponderExcluiradoro este tema. Rapidamente vou dar meu palpite. Estou com o Jair, o Sagan me agrada mais que o Feyerabend. Tenho dificuldade com o anarquista, também me agrado da visão do Dawkins em "Desvendando o arco-íris" e do Karl Popper. A verdade provisória, produzida pelo método, dá à Ciência uma superioridade epistemológica em relação à outras visões de mundo...
Abraços do neopositivista,
Guy.
Boa noite, Mestre!
ResponderExcluirEu admiro muito ao saudoso Sagan, mas, realmente, acho inútil tentar reprimir as tendências místicas inerentes ao ser humano, mesmo porque às vezes elas se revelam fundamentadas, embora por muito tempo se desconhecesse o seu fundamento.
Coisas que pareciam ser apenas crenças podem apresentar evidências científicas que as transformem em teses.
Olá Mestre
ResponderExcluirInfelizmente até nas nossas universidades e muitas outras, é recomendado nas disciplinas em especial nos trabalhos de conclusão de curso, assim como nas dissertações e teses, a aplicação do método científico. Nem tudo se explica por aí. Logo que conheci um pouco de das idéias de Feyerabend, comecei a entender o natural de maneira mais simples e integra. Quem sabe também por ele ter sido professor em Berkeley. Lugar que sempre apreciei e que em muitas oportunidades, a completa biblioteca do Life Science me satisfez. Como sempre, parabéns pelas argumentações.
Martin Sander