ANO
8 |
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EDIÇÃO
2755
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Na semana santa atendi a atencioso pedido da Luciana
Dornelles Venquiaruto, que foi minha orientanda de mestrado, para prefaciar o
livro Saberes
populares fazendo saberes escolares: um estudo envolvendo o pão, o vinho e a
cachaça que ela
produziu em coautoria com Rogério Marcos Dallago e José Claudio Del Pino originado de sua tese de doutorado.
Parece-me
sempre muito prazeroso este ritual de dar a lume. Permitam-me, por ser démodé,
traduzir essa bonita ação. “Dar a lume” é tornar
notório, público; declarar, manifestar, apresentar. Não me parece sem propósito
que escolhi algo que evoca fogões a lenha que marcavam a vida em tempos não tão
distantes, nos quais os saberes primevos que os autores evocam no livro eram
sabores construídos e compartidos.
Lume é o fogo que se faz útil, por
exemplo, para fazer o pão, tão presente na obra anunciada. Nele há produções
para o consumo humano que se transubstanciam em mentefatos culturais. É para
esses que se convida o leitor para saborear. Sim, saborear saberes.
Agora, pretensiosamente,
quero oferecer
aos meus leitores na blogada deste último sábado aprilino acepipes do
prefácio que produzi. Tratando-se de um livro de saberes e de sabores cabe
oferecer acepipes. Esses estão dicionarizados como
tipos delicados de alimento, em pequenas porções, servidas como aperitivo. Ou
como diz um dicionário de português não brasileiro: simplesmente como guloseima
ou pitéu. Assim, aqui e agora, alguns pitéus do prelúdio que compus.
Assim, acedo ao convite de meus amigos para
prefaciar a obra que acalentaram e cabe-me preludiar a epifania ou celebrar o
aparecimento ou, ainda com mais adequação, ensejar a manifestação reveladora de
um novo livro. Esse ritual quase iniciático se faz em regozijos. Talvez porque
esse cerimonial tenha marcas quase litúrgicas da epifania cristã de desvelar o
escondido. Não sem razão que somos lembrados pelos autores que “... a cozinha é considerada, praticamente, ‘um santuário’. Ali ninguém
faz nada, ninguém mexe em nada sem a autorização da matriarca”.
Há, já
no título da obra, uma aparente contaminação do sagrado — o pão e o vinho — apresentados
junto com a mundana cachaça. Talvez retifique minha afirmação: há uma
dessacralização que se faz ainda mais forte, quando componho este prelúdio numa
semana que se diz(ia) santa. Passaram os dias de enlutamento religioso, já se
canta aleluias. Isto se faz, aqui, pela alegria da parição deste livro.
E,
então vemos surpresas: a danada da
cachaça, que o sambista roga para que não lhe falte, tem, como o pão e o
vinho, histórias que remontam há mais de cinco mil anos. Mesmo que os autores
nos levem mais diretamente às terras onde se faz pão, vinho e cachaça na Região
Norte do Estado do Rio Grande do Sul — região em que se desenvolveu a pesquisa narrada
aqui — e aí percorramos roteiros turísticos, como, por exemplo, o “Caminho dos Parreirais”, em Erechim ou a
“Rota da Agricultura Familiar”, em
Marcelino Ramos, há para cada um dos três produtos estudados viagens a berços de
nossa civilização ocidental.
É
dentro desta dimensão que este Saberes
populares fazendo saberes escolares: um estudo envolvendo o pão, o vinho e a
cachaça pode
servir de catalisador, usando as saborosas realidades que estão amealhadas no livro, para alavancar propostas para tecer práticas de pesquisas que
envolvam a salutar reestruturação do Ensino Médio. A Luciana, o Rogério e o Del Pino trazem muito bons exemplos. Há agora desafios da prática para que se possa fazer outra
alfabetização científica no Ensino Médio.
Estas
são utopias quando as folhas dos parreirais, dos trigais e dos canaviais vestem-se
de um dourado outonal. Elas podem ser realidades. Tentar é preciso. Para tal,
este livro é inspiração.
Paradoxal mestre!
ResponderExcluirCachaça e vinho, quimicamente similares e, liturgicamente, tão díspare,
Uma demonizada e outro feito sangue divino.
Aguardemos o livro da Luciana!