ANO
8 |
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EDIÇÃO
2730
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Abri as aulas de Teorias do
Desenvolvimento Humano da manhã e da noite de ontem com uma síntese discutida —aberta
a pontos de vista contrários — daquilo que escrevi no blogue de ontem.
Surpreendeu-me a pergunta, na turma da noite: “Não está tudo pronto para o novo golpe modelo 64?” Devo esclarecer
que não havia adesão à proposta. Mas preocupações de alguns. Justifiquei meu
não comentando a dolorosa experiência recente que vivêramos.
Ao retornar recebo da Gelsa, que não
sabia, ainda, das discussões, a charge abaixo. Talvez, ela traduza um estado de
espírito anti-golpe.
Ontem trouxe aqui uma edição evocativa do
31 de março de 1964. Comento, ainda
na esteira da recordação do meio século de acontecimentos que foram cruciais na
história do Brasil, dois recortes que poderão parecer apenas uma questão
semântica. Talvez, não. Há em um e outro algo polissêmico.
O primeiro dos recortes trazidos é
simples: logo após a vitória do movimento militar, como os golpistas estavam no
poder e eram eles (e apenas eles) que escreviam a história, qualquer referência
ao movimento ocorrido com a deposição de Jango, era sempre feita como ‘a Revolução’.
Falar em golpe militar era inadmissível.
O conceito de revolução era (ou desejava
ser) marcado como uma mudança estrutural de um paradigma, como ensina Thomaz
Kuhn. Assim como no Século 16, com a Revolução copernicana, abandonamos o
geocentrismo e migramos para heliocentrismo, com a Revolução Redentora, o
Brasil liberta-se das garras do comunismo soviético e volta ao redil capitalista
estadunidense. Na leitura dos vitoriosos jamais se admitia a menção de um golpe
militar, mesmo que um presidente eleito fosse apeado do poder.
Durante anos, a cada 31 de março, a ordem
do dia dos quarteis e te-déuns solenes nas catedrais ou as missas nas capelas
de beira de estrada agradeciam aos bravos que não permitiram que houvesse no
continente americano, descoberto sob o signo da cruz, outra nação prostituída
como Cuba, que abandonara o cristianismo e se vendera ao comunismo vermelho.
Tenho dúvida quanto o uso do
qualificativo ‘Redentora (do comunismo)’. Salvo equívoco, este sempre foi mais
usado pelos adversários do golpe, mais num sentido histriônico do que pelos
golpistas na crença de ser uma revolução, dita redentora. Mas, hoje, passada a
censura e permitida a liberdade de pensamento podemos nos referir a 31 de março
de 1964 como o dia de evocar o golpe
militar que implantou 21 anos de ditadura ou o dia de celebrar uma revolução redentora.
O segundo recorte está na manchete de
hoje: 31 de março ou 1º de abril?
Existe, ou melhor, existiu, controvérsia gerada por má fé
dos militares golpistas que não queriam a data de 1º de abril para comemorar a
Revolução Redentora. Houve quem sustentasse que a queda de Jango ocorreu em 31
de março. Este equívoco foi plantado pelos militares.
Vimos ontem: as tropas do general Olímpio Mourão Filho saíram
de Minas Gerais dia 31 de março. De manhã, as tropas ainda estavam em Juiz de
Fora. Lá, às 7h de 31 de março, o tenente Reynaldo de Biasi Silva Rocha
ministrou instrução de combate à baioneta. “Quem quer passar fogo nos
comunistas levante o fuzil!”, gritou.
Até pouco depois do meio-dia de 1º de abril, o Presidente
se manteve no Palácio Laranjeiras, no Rio de Janeiro e depois vai a Brasília. À
noite viaja para Porto Alegre, aonde chega à madrugada do dia 2. Desiste de resistir,
pelas razões trazidas ontem aqui. Na mesma madrugada, era empossado presidente
o deputado golpista Ranieri Mazzilli, que presidia a Câmara.
Logo, o dia do golpe (ou da revolução redentora) é 31 de
março só nas artimanhas golpistas, para fugir a chacota que 1º de abril é o dia da mentira. Não foram suficientemente inteligentes
para propor 2 de abril. Detalhe relevante ou não, ratifica a afirmação sobre
quem escreve a história.
Existe uma grande distancia entre a historia real e a escrita, basta observar a narrativa dos fatos atuais pela mÍdia, sempre tendenciosos procurando formar um consenso.
ResponderExcluirHá cinquenta anos
ResponderExcluirAquele cabelo cortado bem rente,
Recruta, assustado, meio bisonho
No quartel junto à estranha gente,
Em trinta e um de março me ponho.
Havia evidente insegurança lá fora,
Que nossa caserna não alcançava
Pessoas sumiam, se iam embora
De seus nomes ninguém lembrava.
Superiores alertavam sobre perigo
De comunistas soltos àquela altura
Até hoje, compreender não consigo.
Mas salvemos a nossa vida futura
Batalhemos contra o cruel inimigo
E para essa causa vale até tortura.