Ano 5 | Porto Alegre | Edição 1800 |
Minha primeira evocação neste 8 de julho é a passagem de 24 anos da morte de meu pai. Ele na próxima segunda-feira estaria de aniversário. Estas datas são momentos significativos muito relevantes.
Para os que apreciam números redondos: este blogue que dia 30 completará cinco anos, tem hoje um número cheio memorável: 1800 edições.
Lembrei de frase que li quando laborava em outras searas. Parece que foi Jacques Maritain [(*1882, Paris, †1973, Toulouse) filósofo católico cujas obras influenciaram a ideologia da Democracia cristã] que me ensinou, então, ‘que Deus rege o mistério dos encontros’. Mas também se atribui a Einstein: ‘Deus não joga dados’. Assim, abandono divagações e vou à raiz.
Há uma semana, estando em Niterói, uma professora que não conhecia, ao cumprimentar-me, diz: ‘Meu marido queria ter vindo à palestra, mas tem aula hoje à noite. Mandou-lhe um presente!’ Recebo surpreso e encantado um livro com uma dedicatória de meu amigo e colega Renato José de Oliveira. Há muito nos fizéramos silentes um com o outro.
Pois o reencontro catalisado por Sueli frutificou. Renato e eu trocamos quase diariamente, nesta semana, despretensiosas mensagens. Evocamos tempos que éramos professores de Química, depois quando 1998 organizamos “Ciência, ética e cultura na educação” livro que reuniu 12 autores e igual número de pré-leitores, transmutados em apresentadores. A obra teve relativo sucesso que exigiu reedições. Comentamos o quanto um pouco mais de dez anos faz diferença em relação às condições que tivéramos então para a produção do ‘verdinho’ como era carinhosamente chamada nossa produção.
Em uma das mensagens, evocávamos a morte de René Descartes (1596-1650) na Suécia,
contei que em março do ano passado, encontrara a casa onde ele morara em Estocolmo. O Renato narrou, então, a busca da sepultura do Filósofo em uma igreja de Paris: Perguntei a uma dessas beatas que fazem serviços religiosos na igrejas: "você pode me indicar onde está o túmulo de Descartes?" E ela respondeu: "Pardon, Monsieur. Qui est-ce? Un père?" "Non, Madame, il fût un philosophe..."
Gostei das recordações. Disse que valeria a pena ele trazer algo de seu xará para os leitores deste blogue. O Renato não se fez de rogado e escreveu um texto para brindarmos com os leitores deste blogue a segunda das cinco sextas-feiras julinas.
Espero que curtam a produção de Renato José de Oliveira, que possui graduação em Engenharia Química pela UFRJ (1982), graduação em Licenciatura em Química UERJ (1984), mestrado em Educação pela Fundação Getúlio Vargas - RJ (1990) e doutorado em Educação pela PUC RJ (1996). Atualmente é professor Associado II da Universidade Federal do Rio de Janeiro, Coordenador do Grupo de Pesquisas sobre a Ética na Educação (GPEE) e pesquisador do Observatório da Laicidade do Estado (OLÉ). Suas principais áreas de atuação são Filosofia da Educação e Currículo, atuando principalmente nos seguintes temas: relações entre ética, laicidade, argumentação e educação, análise retórica do discurso e questões epistemológicas da educação.
A convite do meu querido amigo Chassot, com quem não vagava e divagava pelo ciberespaço há muito tempo, ocupo seu blogue para compartilhar com vocês uma história. Se “um conto vale um ponto”, espero fazer jus à pontuação com esse breve relato. Inicialmente, peço a paciência de vocês para “situar a questão”, vício incorrigível de todo professor.
Leciono Filosofia da Educação na Faculdade de Educação da UFRJ, tanto para os alunos de graduação quanto para os de pós-graduação. Quando abordo o tema “modernidade”, sempre faço referências a Descartes, não porque seja adepto de seu pensamento filosófico, mas porque reconheço sua importância para a filosofia e para as ciências. Ele é, portanto, o personagem desse breve relato.
Sabemos que apesar de católico declarado, Descartes não era bem visto pela Igreja de Roma, pois suas teses contrariavam as de Aristóteles, que à época funcionavam como espécie de “seguro social e político” do papado.
Quis o destino que Descartes, após ter aceito o convite da rainha Cristina, da Suécia, para ser o seu preceptor, chegasse a Estocolmo muito gripado em outubro de 1649. Alguns biógrafos sustentam que não chegou a iniciar suas atividades letivas, enquanto outros afirmam que ministrou algumas aulas à rainha, mesmo sem o consentimento dos médicos. O fato é que a gripe se agravou, dando origem a uma pneumonia que o vitimou em 2 de fevereiro de 1650.
A rainha teve a iniciativa de enterrá-lo com grandes honras, no principal templo da cidade, mas o embaixador francês recusou a oferta. Descartes foi então enterrado em um cemitério reservado a estrangeiros, órfãos e pagãos. Ele que nascera fora do catolicismo, fora ‘convertido à igreja romana’ por obra de sua babá. Logo, não sendo luterano não poderia ser sepultado no cemitério onde se enterravam aqueles que nasceram e foram batizados na igreja do rei: a luterana. Ainda recentemente na Suécia, todas as crianças ao nascer eram luteranas, por definição.
Os restos mortais do (quase) preceptor da rainha foram transladados para a França em 1667 e, desde 1819, estão na Igreja de Saint Germain des Près, em Paris.
Quando estive na “cidade luz” em 2006, senti-me compelido a prestar alguma homenagem a esse homem cujas ideias comento a cada semestre letivo.
Chegando à simpática igreja, perguntei a uma beata onde ficava o túmulo de
Descartes. Ela, circunspecta como os franceses sabem ser quando lidam com estrangeiros, respondeu-me com outra pergunta: quem foi ele, senhor? Um padre? balancei a cabeça indicando que não e disse-lhe que tinha sido um filósofo, passando a perceber então que teria que encontrar a sepultura por minha conta e risco.
Não sem alguma dificuldade, encontrei-a. Uma lápide simples, incrustada em uma parede, com inscrições quase apagadas que apenas mencionam o nome e as datas de nascimento e morte. Muito pouco para quem militou pela clareza das ideias na construção do conhecimento, mas certamente não refletiu sobre quão obscuros podem ser os homens.
Ave Chassot,
ResponderExcluirgostei muito da crônica de hoje.
Quando li lembrei também que Mozart foi enterrado em uma vala comum fora dos muros de Viena, como um indigente. Tanto devemos a estes ícones e no entanto morreram sem honra... e devendo.
Ola Mestre Chassot
ResponderExcluirSemanas repletas de atividades essas minhas ultimas, me impedindo o comparecimento ao teu blog para servir-me de tuas preciosas contribuições. Recentemente, falando a alunos dos cursos técnicos de segurança do trabalho, onde abordava a importância da Revolução Industrial para suas profissoes, fiz algumas ponderações a respeito de Descartes e suas idéais. Inicialmente não percebi, mas ao finalizar minha fala, notei o quanto me utilizei da vertente chassotiana como fonte. Cada acesso ao teu blog me faz um pouco mais conhecedor destes construtores das idéias de nossa sociedade e seus mentefatos. Abraços e Bom Final de Semana.
Meu caro Guy,
ResponderExcluirainda recentemente igrejas negavam ofícios religiosos e lugar no ‘campo santo’ a suicidas. Mulheres que morressem de parto, por não ter feito a ‘purificação pós-parto’ não podiam ser sepultadas em cemitério cristão.
Agradecimentos pelo comentário mozartiano postado na madrugada produtiva e abençoada hipocrisia de igrejas
attico chassot
Meu estimado Jairo,
ResponderExcluirquando vi tão longa ausência em teus comentários aqui inferi corretamente que estava assoberbado em avaliações de final de semestre.
A Descartes podemos creditar um dos mais modernos aparatos tecnológicos: o GPS.
Obrigado por teu retorno aqui
attico chassot
Bom dia, caro amigo.
ResponderExcluirApós um desjejum frugal, próprio dos monges às sextas-feiras, acessei o seu blog e o parabenizo pela edição da matéria. Admiro sua capacidade de diagramar, compondo blocos de textos e fotos. Eu, um semianalfabeto digital, tento mexer com esses recursos, mas como diz um ex-diretor da Faculdade de Educação, que tive a honra de suceder de julho de 2006 a dezembro de 2008, cada recurso novo que aprendo em informática exige-me dispensar um pré-socrático de meus bancos de memória... Como prezo muito os pré-socráticos, meus progressos de aprendizagem na informática são muito lentos...
Gde abraço
Renato
Meu caro Renato,
ResponderExcluirdeixa estas vilezas informáticas aos que não conseguem se abeberar dos filósofos. Que bom que ainda há aqueles que recordam que dia de Vênus é dia de jejum e abstinência. A polemica se ovos galados quebram o jejum por conterem um feto não padece hoje, pois às galinhas de aviários está vedado o (fugaz) congresso sexual.
Vibrei com nosso blogue compartido, rememorando o ‘verdinho’
Obrigado pela parceria,
attico chassot.
Caro Chassot,
ResponderExcluirA narrativa do Renato só vem confirmar aquilo que sempre digo: Este blogue é um espaço de informações, cometários e opiniões de primeira ordem. Parabéns por ser o catalisador de tão doutos e articulados seguidores que dão esse tom "chassotiano" que só aqui se encontra. Abraços fraternos, JAIR.
Obrigado Jair,
ResponderExcluirreceber este afago de um polímata é precioso.
Ainda ontem aprendia no ‘Blogue que pensa’ – www.jairclopes.blogspot.com – que : “Da moa ao tico-tico: o Planeta está perdendo espécies”
Com admiração
attico chassot
Caro Chassot,
ResponderExcluirmesmo tardiamente estou comentando o teu blog. O dia está sendo bastante cheio, mas agora tenho alguns minutos.
Cumprimentos pela edição 180; não se trata apenas de um número qualquer: por trás há uma trajetória de conhecimentos compartilhados e de reflexões exercitadas - cumprimentos.
Também é muito gostoso reencontrar antigos amigos e poder repartir novas vivências na mesma proporção que revive antigos caminhares.
Um abraço,
Garin
Meu estimado colega Garin,
ResponderExcluirobrigado pelo prestígio que confere ao meu blogue e num momento da extensa pausa desta luminosa sexta-feira encontra tempo para um comentários.
Um abençoado shabath
attico chassot
Olá Professor! Nesta última semana estive imersa em cricris e bandeirinhas julinas: delegaram várias atividades para mim, por que "ela é novinha e tem disposição", e claro que eu aceitei, rsrs adooro estas oportunidades de re-conhecer melhor os alunos, nas suas, nossas "obscuridades". ^^
ResponderExcluirParabéns pelos números redondos!
RENATO recebeu
ResponderExcluirOi prof. Renato, bom dia.
Gostei muito do texto. Esse seu amigo parece ser um pessoa muito interessante a escrita dele é super envolvente, poética.
Quanto ao "verdinho" tive o prazer de conhecê-lo, li um exemplar que o Sr. enviou a biblioteca, gostei muito da forma como vcs o produziram.
Obrigada por compartilhar esse blog, vou ler as outras postagens.
Bjs
Glauria
Muito obrigado Marilia,
ResponderExcluirtu presença aqui é festejada sempre.
Recomendo a dica de leitura sabatina.
Vai te emocionar
attico chassot
Muito estimados Renato e Glauria,
ResponderExcluirobrigado pela presença nesta memorável coprodução. Como as queridas palavras da Gláuria ao Renato não podiam ficar semiocultas, fi-las comentário no blogue.
Vibro que terei na Glauria mais uma leitora que de vez em vez vai passar por aqui.
A propósito recomendo a dica de leitura de hoje.
Um bom sábado a um e a outra
attico chassot