Ano 5 | Porto Alegre | Edição 1804 |
Havia pautado para hoje comentar notícia do fim de semana: Califórnia inclui em currículo papel de gays: Legislativo estadual aprovou implementar aulas sobre contribuição de homossexuais e associa-la trágica vida do pai da informática Alan Mathison Turing (1912-1954), até como preparação a 2012: ano Alan Turing. Ocorre que uma leitora estranhou a minha não manifestação acerca de proposta de publicação IDEB pelas escolas. Assim o assunto californiano fica postergado para agosto. Amanhã, o tema já será viagem. Agora atendo a sugestão recebida, aditando votos de uma muito boa terça-feira.
Nos últimos dias, há algo que gera celeuma: a proposta de publicar os índices do IDEB nas portas das escolas. Isto é ferretear aquelas de desempenho insuficiente e idolatrar as brilhantes. Isto de assinalar os que não são ‘normais’ ou melhor, marcar os descartáveis não é novidade.
Não faz muito tempo havia uma prática: As roupas de certas pessoas eram marcadas por triângulos de diferentes cores, com a finalidade de identificar a procedência dos prisioneiros em campos de concentração nazistas: o triângulo rosa de homossexuais; o de prisioneiros políticos eram vermelhos; o de assassinos verde; a de ciganos e marginais preto; de padres e testemunhas de Jeová era roxo; judeus usavam estrelas de Davi.
A Embratur classifica(va) hotéis: isto é algo que parece válido, pois quando o cliente pode pagar por certo conforto, ele escolhe um hotel de quatro ou cinco estrelas. Se não é um abastado ou é alguém que prefira destinar suas posses em outra direção, poderá escolher um hotel de duas ou três estrelas.
Agora com escolas, não se trata de oferecer a opção de escolher a melhor ou a pior: todos queremos a melhor Escola; então, porque classifica-las. Quando grafo escola com letra inicial maiúscula estou me referindo a qualquer estabelecimento da Educação infantil ao Ensino superior, que faça ensino formal. Claro que numa relação mercantil como muitos sonham para a Escola, há de ter clientes escolhendo produtos de diferentes qualidades. Quem pode pagar mais, escolhe uma escola melhor. Defendemos uma tese diferente: queremos uma Escola de qualidade para todos.
Talvez seja na ótica mercantil que se pretenda compelir os diretores a afixarem placas de, no mínimo, um metro quadrado na porta de seus estabelecimentos revelando a média que cada colégio obteve na avaliação nacional e ainda dizer qual foi a melhor e a pior no munícipio.
¿Mas o que é o IDEB? No famoso e badalado périplo do ‘Jornal Nacional’ para a autoridade da Globo dizer como estava e como deveria ser a Educação no Brasil, assuntado aqui na edição de 2 de junho, houve manifesta surpresa de um ‘especialista em (economia da) Educação’ com o fato de haver pessoas que não sabem o que é o IDEB. Conjecturei, então: deve haver muito doutor em Educação que não sabe. Mas para que não recaia novo anátema contra os ‘ignorantes’ eis a resposta.
O Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB) foi criado em 2007 para medir a qualidade das escolas e das redes de ensino no Brasil. É calculado a partir de dados sobre aprovação escolar obtidos no Censo Escolar e de médias de desempenho na Prova Brasil e no Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica (Saeb). O Saeb avalia, por meio de amostragem, alunos da 4ª e 8ª séries do Ensino Fundamental e do 3º ano do Ensino Médio, em matemática e português, de escolas públicas e privadas.
A Prova Brasil é um exame nacional de português e matemática aplicado à 4ª série e à 8ª série de escolas públicas do país. Em uma escala que vai de zero a 10, os resultados do IDEB são disponibilizados no portal do Ministério da Educação (http://portal.mec.gov.br). O índice é medido a cada dois anos, e a meta do Plano de Desenvolvimento da Educação é que o IDEB do Brasil seja seis em 2022, média considerada correspondente à qualidade do ensino em países desenvolvidos.
Não se pode negar que este ardor (quis escrever: esta fúria) classificatório é consequência desta transformação da Educação em mercadoria, já comentado aqui mais de uma vez. Talvez, de todas as atividades que fazemos enquanto professores é a avaliação a mais complexa e também a mais árdua.
A avaliação deveria se distinguir, especialmente, por não ser ferreteadora. Estou fazendo analogia àquela prática do Rio Grande rural de ferretear o gado para assinalar propriedade, agora abandonada, pois prejudica a qualidade do couro (não porque causava sofrimento ao gado), mas ainda presente em nossas salas de aula, quando do avaliar.
Devemos lamentar, mas em geral, o processo para saber se os estudantes sabem ou não aquilo que se diz que lhe foi ensinado é traumático. Aliás, um ensino (não referi uma Educação) que tem a marca ordinária de transferir conteúdos usa, muito apropriadamente, instrumentos inquisitoriais de avaliação. Estes têm marcas que estigmatizam estudantes. Há, muito provavelmente, entre leitores deste texto aqueles que detestam determinados conhecimentos escolares devido a avaliações que foram submetidos. Sublinho aqui a ação verbal de submissão.
Mas também não é isso que pretendo ampliar, mas deixo uma pergunta: quem de nós tem uma boa evocação de ao acordar ter pensado “que bom que hoje vai ter prova de química ou de qualquer outra disciplina?” Ao contrário, talvez nos lembremos de incômodos físicos e psíquicos ao recordar que ‘hoje tem prova de ...’.
Pois são a partir de resultado muitas vezes extorsivos que se quer agora fazer bandeira. O já referido economista e dito especialista em Educação encerrou há dias sua coluna em revista nacional depois de defender a exibição do IDEB das escolas públicas em locais visíveis a pais, alunos e professores, fez uma sugestão: “Mande um e-mail para seu deputado e exija essa lei”.
Pois desde o início de junho, tramita na Câmara dos Deputados um projeto de lei controverso, a proposta foi elaborada a partir de proposta do colunista da revista Veja, que argumenta: “a maioria dos pais e professores hoje não sabe se a escola do filho é boa ou ruim, e, se esperarmos que consultem o site do MEC (Ministério da Educação), seremos o país do futuro por mais muitas gerações”. De mesma opinião, o deputado do nanico Partido Social Cristão que busca fama levando adiante a ideia, afirmando de maneira ingênua ou cínica: “Entendo que, à medida que isso se torne transparente, não só haverá uma melhora na autoestima do aluno e dos profissionais como também um maior envolvimento dos pais. É um projeto simples, mas que vai gerar orgulho pra eles”.
Quem vai se orgulhar por estar em situação vexatória? A exposição compulsória de deficiências certamente há de causar mais ônus que bônus. Entre os defensores da publicação dos índices estão aqueles que “veem os direitos sociais apenas como mais um horizonte de serviços do Estado a serem definidos pela ideologia do mercado, outra forma de encolher o espaço público democrático dos direitos à educação e ampliar nele o espaço do privado [...] onde subjaz a definição da lógica de mercado como o portador da racionalidade sociopolítica e agente do bem-estar no interior da escola” como escreveu Jorge Barcellos em artigo publicado em Zero Hora em 06 de julho de 2011.
É o mesmo estudioso que mostra, no texto antes citado: “No outro campo estão os defensores da autonomia da escola que criticam o desejo de ver suas ações mediadas por termos como rendimento escolar e serem submetidos à coleta de indicadores de quantidade e não qualidade. Eles reduzem a autonomia escolar pelo estabelecimento de metas baseadas em indicadores de desempenho e a gestão de receitas e despesas. Para os que pleiteiam anotar nas fachadas escolares o conceito do IDEB, [...], autonomia escolar é sinônimo de gerenciamento empresarial da escola. Nada mais perverso”.
Uma vez mais esta diante de uma situação polêmica. Tenho imensas dificuldade em ver algo positivos nestes muitos processos classificatórios. Para mim, entretanto, não há dificuldades em defender a não publicação como caráter propagandístico e mais, discriminatório. Sou contra a estigmatização. Defendo que se encontrem alternativas para que cada Escola possa se ufanar de seus resultados. Quando todas tiverem excelência não se precisa dizer quem é mais excelente.
Caro Chassot,
ResponderExcluirem primeiro lugar é interessante que os(as) leitores nos cobrem a abordagem de qualquer tema. Demonstra a atenção e a importância que conferem às postagens que o blogueiro faz.
Como já me posicionei no dia 5 de julho em curso, entendo que a publicação do IDEB à frente das escolas irá trazer mais constrangimentos do que resultados positivo. Entendo o encaminhamento da proposta como sendo uma oportunidade de criar polêmica para ser "lembrado",especialmente nas próximas eleições.
De Brasília, um grande abraço,
Garin
http://norberto-garin.blogspot.com
Querido Attico, tive grande emoção em ler o que escreveste sobre o momento acadêmico importante vivido pela Laura, que trouxe a mim e a todos nós tanto orgulhoo e alegria. Tua sensibilidade e carinho certamente fizeram diferença na trajetória de minha neta. Um beijo, Liba
ResponderExcluirCaro Chassot,
ResponderExcluirMais uma vez, opta-se pela propaganda para "vender" um produto ruim, ao invés de investir na qualidade do que se produz. Vejo aí o mercantilismo na sua melhor (ou pior) forma. É lamentável que o poder público brasileiro deseje colocar rótulos nas escolas no lugar de melhorar a infra estrutura e no formação de professores, principalmente lhes pagando salários justos. Lembro que na minha infância, os professores eram uma classe invejada, respeitada e nobre, era uma meta altíssima ser docente de qualquer nível. Como será hoje? As escolas cumprem um mínimo do que se propõe? Os conhecimentos dos egressos de escolas públicas lhes permitem enfrentar os obstáculos da vida profissional desassombrados? Duvido! Se este fosse um pais sério estaria investindo no ensino, e não tentando enquadrá-lo em rótulos. Abraços indignados e envergonhados de ser brasileiro, JAIR.
Caro amigo Chassot
ResponderExcluirDe fato, colocar o IDEB na porta das escolas é marcá-las a ferro como você disse. Não cabe essa medida, ayté porque o IDEB, como índice que mede a qualidade da educação básica, não é algo acima de qualquer suspeita.
Um abraço do seu amigo não anônimo (escrevo de um computador aqui da secretaria da pós), Renato
Liba querida,
ResponderExcluirfiquei emocionado com tuas palavras.
Foi bom estarmos juntos em momento tão importante.
Um afago carinhoso do
attico chassot
Meu caro colega Garin,
ResponderExcluirsei de tu posição já na primeira hora contra a publicação do IDEB.
Obrigado por nos afãs conciliares em Brasília achares espaço para este Blogue
attico chassot
Meu caro Jair,
ResponderExcluirrespeito tu santa indignação, mas ainda não chego a envergonhar-me de ser brasileiro, mesmo que nunca tivesse laivos ufanistas/nacionalistas.
Com admiração
attico chassot
Meu caro Renato,
ResponderExcluirrealmente o IDEB colocada nas testada das escolas vai apenas fazer discriminações.
Obrigado pela pareceria intelectual
attico chassot
Agora na pós de gestão escolar que estou cursando, adotei como tradução da sigla IDEB - Indice da Desgraça das Escolas Brasileiras....Depois da reportagem do JN da "melhor" e "pior" escola de NH, os telefones da SEC de NH simplesmente congestionaram TODOS queriam saber quando iria ter concurso para prefeitura da cidade, se o salário era mesmo o noticiado. No que diz repeito a "pior" escola, a reportagem não auxiliou em nada, só piorou pois deixou a auto-estima dos alunos (muitos solicitaram transferencia de escola) e dos professores com o perdão da palavra abaixo do C* do cachorro como diria minha sábia vó no auge de seus 85 anos. Tanto que a SEC de NH teve de intervir, solicitar aos pais que não transferissem os alunos, visto que a maioria solicitou transferencia e agora esta sendo realizado um trabalho de valorização junto aos professores pq estes também solicitaram transferencia de escola. Afinal quem quer ser noticia do JN como professor e aluno da "pior" escola?!!
ResponderExcluirJanice Pacheco
Muito querida Janice,
ResponderExcluirrealmente é uma muito boa decodificação de IDEB. O ‘JN’ e seu especialista em ‘economia da Educação fez mais estrago nas Escolas que ajudas, pois ferreteou a umas e iconizou outras. Realizaram um desserviço.
Sucesso no teu pós e vibro com tuas aparecidas aqui,
attico chassot
Caríssimo Attico,
ResponderExcluirO tal Gustavo Ioschpe é a maior farsa da mídia escrita. Há uns 20 anos atrás, ele escrevia para o caderno Folhateen (da Folha de SP), e ficou conhecido por defender que as universidades públicas deveriam cobrar mensalidades. Agora ele escreve na Veja. Enfim, para uma boa educação basta fazer exatamente o contrário do que ele diz.
Bom, se não me engano o pai dele era um banqueiro gaúcho... Não é atoa que o menino estudou onde estudou.
Saudações desde a UFABC,
Renato Kinouchi.
pois é... e se os pais, apavorados com a possibilidade se seus filhos receberem um ensino de baixa quailidade, decidem matriculá-los em outras escolas? Quem garantirá vagas nas ditas melhores? E a exelencia é em que? dúvidas...
ResponderExcluiragora vou ler o diário de viagem!
abraço!
Marília querida, o mercado definirá escolhas.
ResponderExcluirPague em 20 meses e tenha aulas na metade do tempo.
Um afago desde Londres
attico chassot
Meu caro Renato,
ResponderExcluiré muito bom tê-lo aqui mais uma vez.
Na minha meteórica passagem com diretor do Colégio Israelita Brasileiro (Chasst, o breve: não durou seis meses) o dito era presidentene do Grêmio de Alunos e já mostrava ‘desempenho’
Um afago desde Londres
attico chassot