Ano 5 | Londres | Edição 1810 |
06/23 DIARIO DE UM VIAJOR EUROPA 2011 O indicador do diário de viagem me alerta que já passou um quarto, ou melhor, que ainda tenho de cerca de ¾ desta viagem. Nesta
segunda-feira, começo referindo a minha torcida, no mais intrínseco significado: uma maneira agnóstica de rezar pela Gelsa. Hoje na Manchester University ela, como única brasileira (das poucas em que o inglês não língua materna), para cerca de meia centena de convidados do mundo inteiro, faz sua fala. Sou testemunha, há cerca de ¼ de século, do quanto ela é rigorosamente crítica e está continuamente avançando em suas pesquisas: logo, não há como não prever sucesso. Mas tal, não descarta o ‘pensamento mágico’ da reza como tanto vi na visita a exposição “Tesouros do Paraiso: santos, relíquias e devoção na Europa medieval” no British Museu que contei ontem aqui.
Começo o relato do primeiro dos três domingos europeus, reportando-me a uma saída
que fiz cedo: de tênis e bermuda fui caminhar no Hyde Park lindeiro ao hotel. Afinal, há que cumprir as recomendações da Márcia, minha personal training. Sem rumo, terminei no Kensington Palace, uma residência real situada em Kensington Gardens utilizada pela Família Real Britânica desde o século 17. Foi residência dentre outras sete princesas, de Diana, Princesa de Gales (1961-1997). No momento, o palácio abriga a exibição fotográfica sobre ela aberta ao público desde 2005. Kensington também expõem a Royal Ceremonial Dress Collection, que exibe vestidos usados pelas princesas e rainhas britânicas desde o século 18 até aos dias de hoje. Não é qualquer lugar que sais a caminhar e encontras um palácio real. Ofereço uma foto que fiz durante minha caminhada matinal, quando o Parque, que horas depois regurgitava de visitantes, ainda estava quase deserto.
Em torno das 10h fiz uma saída com plano turístico muito definido. Síntese das seis horas: decepção e fabulosas surpresas. Tomei dois metrôs Queensway (a estação muito próxima do hotel)/ Bond Street // Westminster e atendi a sugestão mecânica da voz que anuncia as estações: descida para a Abadia e o Parlamento. Depois de muitas ascensões por elevadores e escadas (algumas rolantes) a Westminster Abbey surgia dourada por um sol medroso. Já prelibava o ingresso em cenário maravilhoso.
Estava disposto a assistir missa inteira se o horário estivesse restrito a fiéis. Apresentar-
me como devoto episcopaliano, remetendo-me às minhas origens de professor de uma escola da igreja episcopal. Me junto à massa imensa que serpenteia caminhos que dão acesso a um dos templos mais imponentes conheço. Imagino que verei os túmulos de Newton, Darwin, Rutherford. Mas em todas as possíveis entradas um aviso ameaçador.
Circundo a igreja e todas as suas quatro faces. Atravesso o Tamisa duas vezes. Resta visitar o Parlamento, onde em 1991 assistira a uma sessão em que se discutia a Guerra do Golfo. Vejo mais manifestações pedindo o retorno das tropas. Os mesmos avisos restritivos no parlamento, mesmo na entrada aos nobres.
Passeio nas imediações. Ora tem sol e de vez em vez chuvisca. Turismo é bom a dois, não apenas para dividir emoções, mas, e especialmente, incertezas. Sempre me acho muito escalado. A minha Gelsatur pensa desde os translados no metrô até detalhes do apartamento do hotel.
Não só estava sozinho como me era impossível vencer a timidez para perguntar algo no meu inglês do tipo ‘the book is on the table’. Mas mesmo incomunicável, a Gelsa socorreu-me. Na sexta-feira ela me recomendara uma galeria de nome estrambólico. Não tinha anotações em minha caderneta. Remexo mapas. Encontro o nome: Saatachi, mas apenas o endereço virtual. Localizo depois um número em mapa que não tem nome de ruas. Tenho então uma direção em uma cidade com milhares de ruas.
Resolvo encarar. Estou na Lambeth Bridge. Olho uma vez mais o Big Ben e marcho num misto de entusiasmado e inseguro na direção oposta pela Millbank. Entro na Tate Britain, visito uma exposição e há um ‘alerta’ aqui não é a Saatachi. A rua da margem do Tamisa muda de nome. Estou na Grovesnor Road, que parece infindável. Pergunto pela Saatachi: nada. Volto um pouco, pensando em desistir. Não tenho informações. Chego num cybercafé e me é oferecido internet para buscar o endereço físico. Um funcionário me socorre. “Go to Chelsea Bridge and turn left!” É pouca / muita informação. Cumpro a ordem isso num ora sol, ora chuva. Dobro esquerda. Caminho muito pela Sloane Street. Agora tenho informação que estou perto. Chove mais forte. O mapa parece que não vai resistir. Vejo na movimentada King’s Road uma placa: Saatachi Galery. Julgo-me merecedor de um prêmio. E ganhei muito mais que o esperado.
Quando redijo este texto tenho condições de calcular, em outro mapa o que caminhei, depois de decidir buscar a galeria (logo sem contar os contornos à Abadia e ao Parlamento com as duas travessias do Tamisa). Cerca de quatro quilômetros. Meus leitores, pela minha descrição deviam imaginar que caminhei um dez; um também. A incerteza e chuva agrandaram o caminho. Mas valeu a pena.
Já vi obras de arte em dezenas de países em minha vida. Já tive em galerias das mais exóticas, mas nunca com impacto como o que vi na Saatachi. Vejam que não estou avaliando dizendo que achei bonito ou feio. Foi algo muito diferente.
Lembro, agora, do samba de Dorival Caimi: Você já foi à Bahia, nêga? Não? Então vá! Você já foi à Saatachi? Então vá. http://www.saatchi-gallery.co.uk/
Há dias alguém me perguntou se já pensei em uma
revista playboy em braile. Minha situação é parecida. Talvez algumas fotos ajudem. Com elas os votos de uma segunda-feira e agradecimento aos que me acompanham nesta
viagem.
Caro Chassot,
ResponderExcluirdestaco algumas coisas, dessa tua descrição. A tua 'torcida' pela conferência da Gelsa foi mesmo uma oração, ou eu estou me tornando agnóstico.
A andança em busca do Saaatchi me fez lembrar as minhas peripécias no meio da mata, só que essa sem mapas e sem indicações.
A grande diferença é que repentinamente estavas diante de um palácio, de uma catedral, de um museu com séculos de existência.
Uma boa terça-feira, que já vai 'alta' para ti.
Um abraço,
Garin
Caro Chassot,
ResponderExcluirVou usar apenas uma palavra para definir as fotos da exposição na Saatachi: IMPACTANTES. Você continua sendo um guia eficiente para os leitores, neste seu tour cultural. Aproveite, JAIR.
JOSÉ CARNEIROS escreveu desde BELÉM:
ResponderExcluirCaro amigo prof. Chassot:
Mais uma vez estou a desfrutar de sua enésima viagem internacional. Repito que eu não teria o pique que você demonstra para tantas visitas úteis e agradáveis. Fico, pessoalmente, grato pelo seu relato.
Grande abraço paraense do
José Carneiro
Meu caro Garin,
ResponderExcluirno mato tu sabes falar a língua da natureza, aqui é mais complicado.
Um agradecimento do
attico chassot
Muito obrigado Jair,
ResponderExcluira Saatachi é algo impressionante.
Os agradecimentos do
attico chassot
Meu caro José,
ResponderExcluirsaber-te meu leitor me entusiasma. Tu como jornalista sabes o valor destes relatos.
Meu agradecimento é a tentativa de não decepcioná-lo;
Até a manhã, então
attico chassot