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quarta-feira, 11 de agosto de 2010

11- Dialogando Ciência: entre sabores, odores e aromas

Porto Alegre Ano 5 # 1469

Manhã ensolarada e de céu azul. Chegamos mais uma vez ao meio da semana, assunto que há sete dias desencadeou um périplo por diferentes panteons, encontrando deuses que presidem há milênios cada um dos dias da semana. Sei que devo ter fartado meus leitores com as incursões ao hebdomadário. Prometo que o assunto ficará latente por um tempo.

Hoje tenho dois temas assuntados. Um, a minha fala de ontem no Colégio Metodista Americano; outro, aquele que se faz portada desta edição.

Ter atentos, por quase duas horas cerca de 250 adolescentes não é algo trivial. Posso creditar-me esse feito. Na manhã de ontem fiz a palestra “O que é fazer Ciência, afinal?” . O objetivo era fazer motivação à Mostra Científica do Colégio Metodista Americano, para alunos e alunas de 8ª série fundamental, 1º e 2º ano do ensino médio. Usualmente sou um crítico a essas ‘feiras’ onde estudantes, usualmente, papagueiam assuntos que se nota que não entendem. Usei como catalisador: Se acreditamos que fogo esquenta e a água refresca, é somente porque nos causa imensa angústia pensar diferente!David Hume, 1711-1776, filósofo e historiador escocês

Depois de olharmos um pouco a Ciência e compará-lo com outros mentefatos culturais (religião, mitos, pensamento mágico, senso comum, saberes primevos...) que nos são disponibilizados para ler o mundo, trouxe o interrogante título da fala: O que é fazer Ciência, afinal?” Chamei para ajudar na resposta um dos epistemólogos mais respeitados do Século 20: Tomas Kuhn. Este entre outros, foi decisivos no último quartel século passado para que entendêssemos melhor como foi / é / será construída a Ciência.

Para Kuhn, fazer Ciência é como montar um quebra-cabeça, porém com a radical violação de uma regra básica, presente naquilo que se constitui o domínio público em termos de montar um quebra-cabeça: quando se faz Ciência podem faltar peças ou podem sobrar peça. Concordemos que ser kuhniano é ter uma postura diferente daquela que usualmente nos foi / é passada em relação à Ciência. Assim, para Kuhn não há uma Ciência pronta, de uma maneira definitiva.

A Ciência pronta, isto é comprovada, que Kuhn em A estrutura das revoluções científicas chama de normal pode entrar em crise; isto é o paradigma$ que a explicava ou modelava torna-se obsoleto e deixa de ser uma descrição adequada ou um bom modelo. Então, há a necessidade de encontrar outro modelo para explicar determinado acontecimento científico. Há situações em que a mudança é tão radical que Kuhn denomina de ‘revolução científica’.

Contei que, eu enquanto professor, ensinei muitas vezes que gases raros não formavam compostos – até por isso chamados de gases nobres e com este pressuposto construiu-se a teoria do octeto e com ela se explicava com sucesso ligações químicas; especialmente as iônicas, se dizendo que elementos perdiam ou ganhavam elétrons formando assim cátions e ânions que se assemelhavam na configuração eletrônica, sempre com oito elétrons no último nível. Em 1962, o panorama mudou e numerosos manuais escolares (e também professoras e professores) se tornaram desatualizados. Neil Bartlett, da Universidade da Columbia Britânica, no Canadá, estava investigando as propriedades do hexafluoreto de platina (PtF6), um gás muito reativo. Verificou que esse gás se combinava com o oxigênio molecular, formando um composto cuja fórmula foi estabelecida como O+2PtF-6. Pouco depois, levando em conta que o potencial de ionização do oxigênio molecular era quase igual ao xenônio, Bartlett supôs que xenônio poderia reagir com hexafluoreto de platina. Isso foi prontamente confirmado e o composto identificado como XePtF-6. Estava quebrado um quase dogma. Fora sintetizado o primeiro composto de gás raro. Na verdade Bartlett fez uma radical violação de uma regra básica, presente naquilo que se constitui o domínio público em termos de montar um quebra-cabeça: (ou melhor de fazer Ciência) podem faltar peças ou podem sobrar peças, conforme aprendemos com Kuhn. Só na década de sessenta se publicou mais sobre compostos de gases nobres do que sobre qualquer outra classe de compostos inorgânicos. Este episódio nos mostra, assim, que há renovadas exigências de outras maneiras de pensar a Ciência e que esta só vai crescer se admitirmos a existência de ‘comportamentos’ diferentes daqueles constituídos como modelares.

Depois disso ficou fácil mostrar para aqueles jovens atentos os diferentes passos de uma pesquisa. Foi muito bom ao final receber de professores e alunos manifestações de agrado pela fala. Voltei do Americano curtindo o sol do meio-dia numa Porto Alegre de céu azul.

Nesta quarta-feira, à noite, estarei em espírito participando do lançamento de “Dialogando Ciência entre sabores, odores e aromas - contextualizando alimentos química e biologicamente” obra inaugural de Anelise Grünfeld de Luca, Química e Sandra Aparecida dos Santos, Bióloga. Uma e outra são professoras e pesquisadoras ligadas ao UNIDAVI – Centro Universitário para o Desenvolvimento do Alto Vale do Itajaí, em Rio do Sul, onde fiz palestras em outubro do ano passado.

Escrevi, ainda em Ålborg, um extenso (7 páginas) apresentação do livro. A Editora (livraria da Física de São Paulo www.livrariadafisica.com.br) destacou de meu texto, um excerto, que vou trazer também aqui, um pouco mais estendido. Meu comentário destaca justamente o quanto as autoras souberam fugir do hermetismo no livro.

Em um de meus livros presentemente esgotados [CHASSOT, Attico. Catalisando transformações na educação. Ijuí: Editora Unijuí, (1995, 3.ed), 189p., 1993] há um capítulo “Do esoterismo ao exoterismo” onde apresento uma análise do hermetismo na linguagem corrente no ensino (de Química). Quase 20 anos depois me dou conta que talvez uma das maiores consequências do dano babélico são os textos que não entendemos, pelo seu hermetismo. Em nossa própria língua. Disse, então, que não conseguimos nos desvencilhar de nossos ancestrais alquimistas. [...] Assim, parece que se pode afirmar que no ensino em geral, mas no ensino de Química de uma maneira muito particular, existe uma linguagem dupla. Uma é a língua oficial, aquela falada pela Escola (e aqui usei propositalmente a Escola para significar apenas os emissores da língua oficial, considerando que os alunos, mesmo pertencendo a Escola, não usam a língua oficial, que eles ouvem, mas não entendem). A outra, que por analogia as situações nacionais, pode ser chamada de dialeto, que é a língua falada pelos frequentadores da Escola. [...] Pois aqui está outro mérito do livro que será lançado hoje: ele é escrito numa linguagem acessível. Dispensa tradutores ou interpretadores, como ocorrem em certos textos sobre educação, mesmo que escritos em português.

Hoje, há bom dia muito especial. Ele vai para minha irmã Tile e para meu irmão Paulo. Os geminhos estão fazendo aniversários juntos. Ainda recordo das lembrancinhas do primeiro ano de aniversário (uma ovelhinha colada em cima de um triângulo) que mãe fez para marcar a nossa despedida de Jacuí, que deixaríamos no começo de setembro. Adito aos votos de que sigam celebrando juntos,pormuitotempo, esses aniversários os desejos de uma excelente quarta-feira a cada uma e cada um de meus queridos leitores.

8 comentários:

  1. Bom texto professor. Ele me fez lembrar uma ótima frase de Jean Cocteau: "Não sabendo que era impossível, foi lá e fez".
    Abraços

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  2. Muito estimado colega Leo,
    ~~ uma vez mais me defronto com a imprecisão do remetente, pois recebo que o comentário foi postado por Léo [mailto:noreply-comment@blogger.com]. Vou a minha lista e encontro um Leo. Espero ter acertado ~~
    muito obrigado por teu tão atencioso comentário. Acertas ao trazer Jean Cocteau; se não é impossível (é apenas difícil), façamos.
    Um muito bom dia,

    attico chassot

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  3. Parabéns pelo seu Blog
    pode estar meio fora do assunto mas eu sou aluno da professora Thaiza e venho pesquisado sobre marie curie e em seu conceito sobre radio-atividade e algumas fontes se contradizem e eu gostaria de saber um pouco...
    se o senhor souber de algo importante ou alguma fonte realmente confiável por favor entre em contato
    Email-gabriel__neres@hotmail.com

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  4. Estimado Gabriel,
    primeiro agradeço teres fornecido teu correio eletrônico, numa postagem de comentários.
    Realmente o blogue de hoje não trata do assunto. Mas um aluno da querida Professora Thaiza não fica sem resposta, mesmo que venha consultar sobre a fórmula da água.
    Tenho três biografias de Maria Curie, A mais emocionante a escrita pela filha Eva Curie. Outra excelente e muito detalhada inclusive acerca da relação com Langevin escrita por Susan Quinn (Editora Scipione) Uma terceira, muito boa de Robert Reid (Salvat Barcelona). Na tentativa de atender-te folheei as duas últimas. Não vi (não significa que não tenha o assunto que desejas.
    Suplementarmente, queria recomendar-te o filme "Madame Curie" (1943), realizado por Mervyn LeRoy com Greer Garson no papel de Marie, que aparece como uma mulher brilhante, enamorada da Ciência e Walter Pidgeon como Pierre, no começo com posturas machistas em relação às possibilidades de uma mulher ser cientista, mas que se rende aos encantos e inteligência de Marie. As pesquisas para o isolamento do rádio são muito bem mostradas no filme, classificado como um drama biográfico, mesmo com algumas licenças cinematográficas aceitáveis, mesmo que ‘dourem’ alguns fatos históricos. Desse filme fica minha saudação, pela tua primeira aparecida nesse blogue: “É preciso buscar colocar as pontas dos dedos em uma estrela”
    Não respondi tua pergunta, mas matei saudades,

    attico chassot

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  5. Querido Prof!
    Já estou ficando assídua do seu blog... rsrsrsrs.
    Adoro tudo que escreve e o jogo de palavras que usa se encaixam perfeitamente. Aos poucos estou aprendendo muito com sua forma de se expressar.
    Hoje, em especial, seu texto está magnífico. Tbém critico as feiras de ciências... Penso que poderíamos fazer uma ciência de mais qualidade, mas nem sempre é possível, devido a vários fatores que envolvem uma série de fatores e que vão desde organização, preparação e principalmente envolvimento de todos.
    E olha que posso lhe dizer que grande parte dos livros didáticos estão de fato desatualizados qto aos gases nobres que nem sempre são nobres...
    Grande abraço,
    Neusa

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  6. Muito querida colega Neusa,
    tudo que um bloguista pode querer é ter leitoras/leitores assíduos. Que bom ter a tua adesão, ainda mais sabendo que este blogue é objeto de estudo de tua dissertação de mestrado. Encanta-me mais tu te fazeres comentarista aqui.
    Como orientador de doutorandos e mestrando que fui/sou algo que me encanta é estimular a escrita. A alternativa para isso é a leitura. Que bom que vês isto neste blogue.
    Tuas colocações acerca do ensino de Ciências têm sabedoria, isto é, são de alguém que sabe fazer alfabetização científica.
    Uma muito boa noite, com um afago do
    attico chassot

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  7. Bom dia Professor!
    Primeiramente, concordo com o senhor em relação às 'feiras' sem fundamento executadas nas escolas, mas infelizmente, muitas das vezes, elas são impostas e os professores são praticamente obrigados a executar, aí já viu como fica a situação dos alunos, né...
    Em segundo lugar, adorei as colocações em relação a Khun e, após as aulas de Epistemologia, me sinto muito mais à vontade com esse tipo de conteúdo!
    =]
    Por fim, mestre, agradeço a disponibilidade e apreço para com meus alunos! ^^!
    Um ótimo dia ao senhor!!

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  8. Muito querida colega Thaiza,
    que bom que gostaste de como introduzi Kuhn para estudantes de 8ª série e 1ª e 2ª séries do médio.
    Alegro-me, pois acredito que entenderam a metáfora do quebra-cabeça;
    Tomara que minha resposta acerca de Marie Curie tenha ajudado em algo. Pelo menos para mim ajudou. São Francisco, amigo de Santa Clara, lembrada na blogada de hoje diria: “É dando que se recebe!”
    Um afago reconhecido por tua presença aqui,

    attico chassot

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