Ano
6*** www.professorchassot.pro.br ***Edição 2132
Há uma semana já mordiscava este que me parecia ser
um bom tema para uma domingueira. O título que se faz portada desta edição pode
remeter ao escândalo oriundo do sacrossanto aposento papal ou a uma controvertida
parábola bíblica. Nas duas situações há um infiel fraudador daquele de quem
recebeu toda confiança.
Em uma e outra a figura central é um mordomo...
gosto da palavra espanhola ‘mayordomo’ o maior, o mais digno da casa. Outra
acepção para mordomo é ecônomo (oikonomos da mesma
raiz grega de ecologia).
Pois parece que o
senhor Paolo Gabriele, que vestia e desvestia na intimidade Bento 16,
inspirou-se naquele que foi narrado e — pasmem — proposto como exemplo Jesus.
Recordemos primeiro o mordomo infiel, há dois mil anos narrado nas pregações
palestinas:
“Disse Jesus também aos discípulos: Havia um homem rico que
tinha um administrador; e este lhe foi denunciado como quem estava a defraudar
os seus bens. Então, mandando-o chamar, lhe disse: Que é isto que ouço a teu
respeito? Presta contas da tua administração, porque já não podes mais
continuar nela. Disse o administrador consigo mesmo: Que farei, pois o meu
senhor me tira a administração? Trabalhar na terra não posso; também de
mendigar tenho vergonha. Eu sei o que farei, para que, quando for demitido da
administração, me recebam em suas casas.
Tendo chamado cada um dos devedores do
seu senhor, disse ao primeiro: Quanto deves ao meu patrão? Respondeu ele: Cem cados* de azeite. Então, disse: Toma a
tua conta, assenta-te depressa e escreve cinquenta. Depois, perguntou a outro:
Tu, quanto deves? Respondeu ele: Cem coros*
de trigo. Disse-lhe: Toma a tua conta e escreve oitenta. E elogiou o senhor o
administrador infiel porque se houvera atiladamente, porque os filhos do mundo
são mais hábeis na sua própria geração do que os filhos da luz. E eu vos
recomendo: das riquezas de origem iníqua fazei amigos; para que, quando aquelas
vos faltarem, esses amigos vos recebam nos tabernáculos eternos.” (Lucas 16.1-9).
O pastor Google — sempre falo no quão eficiente é o Google
enquanto professor ou médico; na elaboração desta blogada conheci o Google
travestido de pastor, como uma eficiência que quase me permite dispensar meus
colegas metodistas — me ensinou que cados
e coros eram, então, duas medidas de
volume: o cado media 40 litros e o coro media 525 litros; isto permite
avaliar o tamanho do suborno que o elogiado administrador praticou.
É muito significativo como se procura justificar o mordomo (e
como consequência Jesus) dizendo que o que empregado desonesto fez foi cancelar
suas comissões, que o senhor lhe devia, ou suas participações nos lucros. Ao
cancelar suas comissões, os débitos dos devedores ele não diminuiu os bens do
patrão. Essa ação, sem dúvida, resultaria em bondade no futuro, da parte desses
credores para com o mordomo infiel. Outras leituras há que absolvem o mordomo, pois
ele só eliminou os juras, sendo correto pois a usura era proibida. Capcioso
isto.
E o outro mordomo? O escândalo que está acontecendo no Vaticano, desencadeado pelo
vazamento de informações e cartas confidenciais do papa Bento 16 teve um novo
desdobramento no último fim de semana com a prisão do mordomo do papa, que é
acusado pelo vazamento das cartas que resultaram em um livro, que descreve
manobras internas da liderança católica e até mesmo uma guerra interna na
entidade.
Gabriele é romano, e trabalha no apartamento
papal desde 2006. Sua prisão foi confirmada no último fim de semana pelo
vice-diretor da Sala de Imprensa da Santa Sé, Ciro Benedittini, pouco depois
que o porta-voz, Federico Lombardi, informou que agentes de polícia localizaram
“uma pessoa com posse ilegal de documentos reservados”. Fontes afirmam que “uma
grande quantidade de documentos reservados” foi encontrada na casa em que
Gabriele vive com sua esposa e três filhos na Via de Porta Angelica, anexa ao
Vaticano.
Para
alguns — mesmo que ele seja condenado, Gabriele é um idealista que queria
acabar com a corrupção nas raízes do Vaticano e teria sido ajudado por
cúmplices. Para outros, ele é apenas um bode expiatório dentro da complexa luta
de poder entre cardeais na Santa Sé.
Mas
a grande questão na cabeça das pessoas, incluindo os próprios amigos de
Gabriele, é "por quê?". Se for considerado culpado, porque um
católico devoto e pai de família, como o mordomo, iria trair o homem mais
importante da Igreja? Pessoas próximas a Gabriele excluem dinheiro como um possível
motivo. Eles dizem que o mordomo não conseguiria gastar a quantia recebida pela
venda dos documentos sem levantar suspeitas, a não ser que ele se demitisse e
deixasse a Itália. Além disso, por que o homem de 46 anos e pai de três
crianças abandonaria sua simples, mas confortável vida no Vaticano? Apesar dos
salários na Santa Sé não serem altos, seus funcionários têm uma série de
benefícios, como descontos no aluguel e isenção fiscal.
Parece
haver semelhanças entre os dois mordomos, mesmo que separados por dois mil
anos. Certamente um e outro preparavam o futuro quando fossem apeados das
mordomias.
Caro Chassot,
ResponderExcluirEssa fábula só faz acentuar o que todos sabemos: homens são homens em qualquer lugar em qualquer tempo, não importa se no governo da Síria ou no interior do Vaticano. E, com o homens, são iníquos, perdedores, venais, malévolos, vis, traidores, perversos, odientos, maliciosos, cruéis, pervertidos, mal intencionados, peçonhentos, rancorosos, cáusticos, virulentos, rudes, grosseiros, desalmados, truculentos, blasfemos, mexeriqueiros, intrigantes, abelhudos, bandidos, gangsteres, pistoleiros, meliantes, ladrões, larápios, invejosos, cobiçosos, escória, gananciosos, ingratos, perigosos, crápulas, perniciosos, encrenqueiros, deformados, sem caráter, viciosos, poltrões, repulsivos, promíscuos e fúteis.
Outra coisa, se o Vaticano ficou incomodado com a indiscrição do mordomo infiel no mínimo é por que tem esqueletos no armário, senão nada teria a temer. Abraços domingueiros, JAIR.
Prezados Attico e Jair,
ResponderExcluirnão creio que haja esqueletos no armário tão somente, e sim, toneladas e mais toneladas de ossos.Todos se tornam envolvidos e cúmplices de atos importam mais à instituição do que à própria fé no cristianismo:do mordomo ao camerlengo.
Nunca me conformei de o Papa ser chamado de Santo padre, mas é claro que trata-se de uma opinião particular, de um agnóstico contrário à qualquer tipo de religião.
Homens são homens.Não me espanta a suposta atitude incorreta e imoral do mordomo!
Forte abraço!
Caro Chassot,
ResponderExcluirpois é, a corrupção é essa praga que não se descola do ser humano. Nem as parábolas de Jesus ficam isentas da menção a esse desvio de conduta que parece ser inerente ao ser humano. Quem sabe, no Reino idealizado por Cristo, possa haver um lugar onde a corrupção seja definitivamente banida - apenas na concepção ideal, infelizmente.
Um abraço,
Garin
PS: se tivesse recorrido à assessoria iria cobrar!