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quinta-feira, 30 de setembro de 2010

30.- Dia do proto-Gutenberg

ARACAJU Ano 5 # 1519


Estou desde o anoitecer de ontem mais uma vez em Aracaju para no final da tarde encerrar aqui meu quarto dia sergipano. No meu horizonte está, quando setembro se transmutar em outubro, chegar a Porto Alegre.

Primeiro um registro muito especial de onde escrevo nesta madrugada no relógio (quase 5 horas), mas já dia claro: Estou na casa de minha ex-aluna Marilene Santos. Esta sergipana, mesmo que nascido do outro lado do São Francisco que a faz alagoana de nascimento, escreveu uma das mais significativas histórias acadêmicas enquanto fez mestrado na Unisinos, com orientação da Gelsa. Hoje ela é doutoranda em Educação na UFS e professora universitária. Para mim, ser carinhosamente acolhido em sua casa tem uma dimensão inenarrável.

Do dia de ontem há dois fazeres significativos que merecem registros. Um e outro muito prenhes de gratificação acadêmica.

Pela manhã em Itabaiana falei pra professoras da rede estadual de ensino. Por duas horas buscamos ver o quanto ‘A Escola não mudou, mas foi mudada!’. A fala foi na Diretoria Regional de Educação.

Às 18h, então já novamente em Aracaju, no Mestrado em Ensino de Ciências e Matemática, na UFS iniciou a qualificação Rafael de Jesus Santana com proposta de dissertação Formação e atuação do professor de química no contexto da transposição didática dos modelos atômicos”. O trabalho tem como orientadora Profª. Drª. Maria Neide Sobral (ao meu do na foto) e a Profª. Drª. Samísia Maria Fernandes Machado, como orientadora (em pé com o Rafael), participando também como examinadora a Profa. Dra. Ivanete Batista dos Santos. Foi um frutuoso momento de embate acadêmico. Tenho dito – e repeti ontem a noite – que não há atividade nos rituais da pós-graduação – que tenha o nome mais posto que a ‘qualificação’ pois nesta, aquilo que se faz, é tentar qualificar o trabalho do mestrando ou do doutorando.

Ontem ainda em Itabaiana, em companhia da Edinéia, a mato-grossense, que é minha anfitriã nesses dias, visitei, com o sal à pino, a feira, onde o que me impressiona que são os frutos da terra (o inhame, ao jiló, as frutas, os temperos) que ainda nos fazem locais, pois os artefatos são nacionais ou até globais. Depois almocei com Edinéia e José Carlos. Sobrou tempo para uma descansadinha no apartamento deles. Ali recebi a visita de querida colega Djalma Andrade, que homenageara nas falas que fiz aqui, como reconhecimento de sua contribuição à Educação Química na apenas na UFS e em Sergipe, mas ao Brasil. Foi memorável na nossa história ela ter reunido em 1998– em meio a uma greve na UFS –educadores de todo o Brasil e do exterior no IX ENEQ.

À noite, por convite da Prof. Dra. Sônia Meire Santos Azevedo de Jesus, que já tive o privilégio de receber em minha casa, de uma janta em um restaurante português, oferecida por Laudo Natel, que celebrava ter ontem defendido sua dissertação de mestrado. O acaso me presenteou na mesa ter a companhia mais próxima do Prof. Dr. Luiz Eduardo Oliveira, da área da linguistica. Soubemos com sabor exercer a indisciplinaridade.

Esta manhã encerro meus fazeres acadêmicos no Sergipe com a palestra: “A historia e a filosofia da Ciência catalisando ações transdisciplinares” para professores e alunos do mestrado ligado ao Núcleo de Pós-graduação de Ensino de Ciências e Matemática - NPGECIMA.

Aqui de Sergipe, na edição deste blogue que encerra setembro, registro que mais um recorde no número de visitas diferentes (logo não refiro ao número de acessos que é muito superior): SET 101,9. Se compararmos com trimestre anterior (JUN 59.5 / JUL 57,6 / AGO 78,4) este dado ganha significado.

Um registro do dia de hoje, numa referência quase almanaque, mas significativa na historia da construção do conhecimento. Hoje é dia de São Jerônimo, Tito como o proto Gutenberg, do século 4º/5º, pois como secretário do Papa São Dâmaso, e recebeu deste o encargo de traduzir para o latim os Livros Sagrados, de modo a haver uma única versão oficial das Escrituras, para que não fossem estas deturpadas pelos hereges dos séculos futuros. Essa é origem da Vulgata. Por tal hoje também é o dia da Bíblia.

Restrinjo hoje os comentários, pois preciso lapidar a fala desta manhã. Trago meus votos de uma muito boa quinta-feira. Junto o convite para nos lermos amanhã de Porto Alegre. Afortunadamente não terei chance de ficar nervoso no ‘tradicional último debate dos presidenciáveis’, nos quais a toda poderosa Globo já fez estragos históricos, pois estarei viajando. Penso que isto é melhor.

quarta-feira, 29 de setembro de 2010

29.- Praça São Francisco: Patrimônio Cultural Mundial da UNESCO

ITABAIANA Ano 5 # 1518

Dois problemas técnicos: Como ontem a parte inicial em caixa alta e a ausência de outras quatro fotos selecionadas, por sinal muito baixo de internet.



Estou desde a meia tarde de ontem em Itabaiana, distante 60 km da capital, Aracaju. É a quarta cidade de Sergipe em importância depois de Aracaju, São Cristóvão e Nossa Senhora do Socorro, as quais fazem parte da grande Aracaju. Não usufrui da cidade, mas recebo muitas turísticas em especial de sua serra. Nela se encontram cachoeiras e poços de águas cristalinas como o Poço da Moças. Alem disso recentemente a serra foi nomeada como Parque Nacional da Serra de Itabaiana, além do parque dos Falcões.

Se ontem referi aqui o ineditismo do desvio de rota em um dos meus voos, hoje posso contar das ensurdecedoras e longas carreatas políticas, que a noite pareciam invadir o quarto em um segundo andar de hotel na zona central. Nunca sofri uma agressão sonora semelhante.

Mas a registros bonitos de ontem: ao final da tarde fiz a palestra A Ciência como instrumento de Leitura para explicar as transformações da Natureza como abertura no II Encontro Estadual de Química – ENESQUIM no Campus da Universidade Federal de Sergipe UFS de Itabaiana. Foi muito grato receber as manifestações de agrado de alunos e professores, destes alguns colocando de quanto a fala tornava-se definidora de sua prática. Autografei vários exemplares de meus livros.

A manhã e parte da tarde foram preciosamente despendidas em turismo. A professora Edineia Tavares, uma mato-grossense que aqui é minha querida anfitriã e já me levou a Tangará da Serra para falar para 1.200 pessoas em um circo de lona, seu esposo, Jose Carlos Evangelista Andrade, um baiano de Ilhéus e a Professora Lia Maria Batista Lima, uma sergipana que sabe de seu Estado dedicaram-se de maneira comovente para que eu pudesse fruir da histórica São Cristovão, fundada em 1590, tem o título de quarta cidade mais antiga do Brasil. Foi a primeira capital de Sergipe, até a transferência para Aracaju em 17 de março de 1855.

São Cristóvão guarda da fase colonial alguns edifícios históricos e conserva suas tradições, como as romarias e as festas religiosas. Como a festa de Nosso Senhor dos Passos que atrai fiéis de vários estados do Brasil. Cidade histórica, considerada monumento nacional, São Cristóvão situa-se ao norte do estuário do rio Vaza-Barris, no litoral sergipano. Com quarenta e sete metros de altitude, distante 26 km de Aracaju. A paisagem urbana de São Cristóvão integra magistralmente a topografia acidentada do morro da Cidade Alta com a Cidade Baixa e o Rio Paramopama preservando a característica de implantação que herdou da época colonial.

Cheguei à cidade quando recém fora incluída a Praça São Francisco na Lista de Patrimônio Cultural Mundial da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura – UNESCO. O feito é motivo de justo orgulho para os sergipanos, pois representa “um reconhecimento à singularidade da formação do acervo cultural brasileiro”. Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional – IPHAN, ao fazer a indicação acatada pela UNESCO defendeu o Valor Universal Excepcional da praça, a melhor representação no Brasil do período da União Ibérica, no Século XVI, quando Portugal e Espanha eram uma só coroa. Para ele, “a Praça de São Francisco é exemplo único daquele momento histórico“, destacando-se ainda o contexto natural exuberante e preservado que confere à Praça uma paisagem construída singular.

s principais monumentos, na Cidade Alta, são cerca de 10 prédios em torno da praça que abriga também a Igreja e o Convento de São Francisco. A construção teve início em 1693 a partir das doações da comunidade aos franciscanos. Quando a cidade era a capital da Província, o convento abrigou a Assembléia Provincial e o salão da Ordem Terceira era ocupado pela Tesouraria Geral da Província. O Museu de Arte Sacra também fica no complexo histórico e abriga um acervo considerado o terceiro mais importante do país. Existe ainda o Museu de Sergipe composto por peças que pertenceram às famílias nobres da região. (Fonte: Consultei o sítio da UNESCO). Já na República, São Cristóvão também aquartelou as tropas do batalhão que combateu os seguidores de Antônio Conselheiro, em Canudos, em 1897.

Meus leitores poderão facilmente inferior em que mundo denso em História me inseri ontem. Visitamos primeiro o Museu, onde a Rozinha nos forneceu os mais preciosos ensinamentos acerca dos diferentes ambientes do Brasil colônia, restaurados e preservados no casarão da Praça São Francisco. Fomos recebidos também por Thiago Fragata, diretor do Museu que publicou no último número de História Viva um artigo acerca do título conferida pela UNESCO à Praça de São Francisco e, por extensão, à cidade de São Cristovão.

Depois da visita ao museu, cruzamos a Praça de São Francisco e fomos visitar sua centenária igreja e depois o Museu de Arte Sacra, instalado em ala do convento de São Francisco, fundado em 1657 e restaurado com o patrocínio da Petrobras. O museu éconsiderado um dos mais valiosos do Brasil pela qualidade das ecas históricas que detém em seu acervo. Foi dos momentos mais valiosos do dia.

Visitamos ainda outro convento onde se produz os famosos (e saborosos) bricelets, que são finos como uma folha de papel, crocantes como waffles, doces como casquinha de sorvete e dissolvem na boca. São conhecidos desde o século 16 e têm origem suíça. São biscoitos feitos à base de farinha de trigo, leite, açúcar, ovos, margarina e raspa de limão. A massa crua é colocada numa chapa de fabricação suíça e dela sai o biscoito. Por estarmos em zona de praia almoçamos peixes e camarões.

Meia tarde voltei em muito agradável conversação com o José Carlos, também o meu fotógrafo desta jornada, para Aracaju e depois para Itabaiana. Tive 45 minutos de hotel ‘para descansar e depois fui para o Campus da IFS onde preferi palestras.

Minha agenda de hoje prevê palestra para professoras e professores da Educação Básica da rede municipal e depois visita a feira. À tarde retorno a Aracaju, onde às 18h participo da banca de qualificação do mestrando Rafael de Jesus Santana Formação e atuação do professor de química no contexto da transposição didática dos modelos atômicosno Mestrado em Ensino de Ciências e Matemática, na UFS.

Encerro este relato desejando a melhor quarta-feira, que será o meu segundo dia do tríduo sergipano. Há a expectativa de amanhã nos lermos, uma vez mais de Aracaju.

terça-feira, 28 de setembro de 2010

28.- A internet estaria nos tornando burros?

ARACAJU * Ano 5 # 1517

As quatro primeiras horas de minha terça-feira foram abordo de um voo Guarulhos/ Aracaju; quando ser de 2h e 20min.

Ocorre que houve um desvio de rota emergencial para Belo Horizonte. Uma passageira, dois assentos a minha frente teve um princípio de enfarto. O comandante Felix, que já está aposentado como piloto, disse-me que hoje foi a primeira vez em sua história que teve que fazer desvio de rota. Afortunadamente deu tudo certo. Como já saíramos uma hora atrasados – que me exigiu, literalmente, passar um tempo sentado no chão do aeroporto de Guarulhos –, acumulou mais uma hora. Aliás, no primeiro trecho, mesmo saindo no horário de Porto Alegre houve um atraso de uma hora na chegada em Guarulhos, pela necessidade de ficar circunscrevendo voltas sobre o mar, esperando oportunidade para aterrissar. No aeroporto, em que pese a hora, fui atenciosamente esperado pelo prof. dr Victor Hugo Vitorino Sarmento, coordenador do Núcleo de Química, que contou que um dos primeiros livros que leu na sua formação de em História da Ciência foi A Ciência através dos tempos.

Assim este blogue é postado a primeira vez de Aracaju, a capital de Sergipe, uma das 27 unidades federativas do Brasil. Localizado na Região Nordeste, tem como limites o oceano Atlântico à leste e os estados da Bahia, à oeste e ao sul, e de Alagoas, ao norte, do qual está separado pelo Rio São Francisco. É o menor dos estados brasileiros, ocupando uma área total de 21.910 km², pouco maior que Israel. Sua população é mais de 2 milhões de habitantes, o sexto estado menos populoso do país.

Esta deve ser a quarta vez que venho a Aracaju. A capital do estado de Sergipe localiza-se no litoral do Oceano Atlântico. Mesmo que as praias sejam lindas optei não aceitar a ofertar de pagar R$ 46,00 a mais na diária para ter vista para o mar. A cidade é cortada por rios como o Sergipe e o Poxim. Tem cerca de 600 mil habitantes. Somando-se as populações dos municípios que formam a Grande Aracaju: Nossa Senhora do Socorro, Barra dos Coqueiros, Laranjeiras e São Cristóvão, o número passa para 800 mil habitantes. A cidade é apontada como a capital com os hábitos de vida mais saudáveis do País e a capital com menor índice de fumantes, segundo o Ministério da Saúde. O topônimo "Aracaju" deriva da expressão indígena "ará acaiú", que em tupi-guarani significa "cajueiro dos papagaios". O elemento "ará" significa "Papagaio" e "acaiú", "fruto do cajueiro".

A última vez que estive aqui foi no IX ENEQ, em 1998. A data é facilmente evocada pois foi desta cidade que assisti a comoção nacional quando o Brasil perdeu a final da Copa do Mundo para a França. Foi então, salvo equivoco meu, que houve celebre ‘caso médico’ com Ronaldo. Foi nesta estada aqui que conheci o Rio São Francisco, levado pelo prof Paulino, vice-Reitor da UFS, realizando um sonho acalentado desde os meus primeiros estudos de corografia – como era chamado o estudo da Geografia da nação, no meu currículo na Escola Básica. Em duas oportunidades anteriores estive na UFS por convite da Profa. Djalma Andrade, organizadora do Núcleo de Ensino de Química, na UFS, referida em mais de uma oportunidade na dissertação que participo da banca amanhã, em São Cristovão. Hoje, às 16h, faço a palestra de Abertura no II ENESQUIM no Campus da UFS de Itabaiana, distante 50 km de Aracaju.

Ainda um registro de ontem. Ao lado de orientações individuais com três de meus sete orientandos e atividades de tutoria no curso de filosofia, tive aula na UAM - Universidade do Adulto Maior: meu momento de paroxismo acadêmico semanal. Foi emocionante ver mais de meia centena de alunas e alunos, que viveram mais da metade do século 20, constatar como a virada do século 19 para o 20 foi marcada por certezas, enquanto a virada do 20 para o 21 tem as marcas da incerteza.

Para não dizerem que a blogada de hoje é só diário pessoal, eis um assunto que está pautado para uma das próximas edições, com excertos de uma entrevista com Nicholas Carr. Ele cutucou a onça da internet com um argumento longo e bem-desenvolvido no livro "The Shallows -What the Internet is Doing to Our Brains" (que poderia ser traduzido como "No Raso -O que a Internet Está Fazendo com os Nossos Cérebros" e será lançado no Brasil pela Agir).

Em poucas palavras, a facilidade para achar coisas novas na rede e se distrair com elas estaria nos tornando burros. O livro já vendeu mais de 40 mil cópias nos Estados Unidos. Está sendo traduzido em 15 línguas.

Carr recusa a pecha de alarmista, mas sua preocupação com as "tecnologias de tela" é tanta que ele recomenda a restrição do acesso de alunos à internet nas escolas. Não descarta que a rede possa evoluir para a veiculação de ideias menos superficiais, mas tampouco vê indícios de que irá nessa direção.

Como se vê temos um tema no mínimo polêmico. Com votos de uma terça-feira, aceno com a possibilidade de nos lermos amanhã de Itabaiana. Até então.

segunda-feira, 27 de setembro de 2010

27- Por que Dilma, e já no primeiro turno


Porto Alegre Ano 5 # 1516

Uma segunda-feira que abre uma semana tensa politicamente. O meu dia terminará a bordo rumo a Aracaju, onde devo chegar quando a terça-feira já for adiantada. Antes de estar na noite de quinta-feira, uma vez mais em Porto Alegre, tenho em Sergipe, duas palestras em Itabaiana e uma palestra e uma banca em Aracaju. Mas antes de embarcar tenho uma jornada de manhã e tarde no Centro Universitário Metodista - IPA, com três sessões de orientações, aulas com alunos da Filosofia e na UAM - Universidade do Adulto Maior. Como desejo entregar a seguir meus leitores algo muito especial, já antecipo aqui meus votos de uma muito boa segunda-feira a cada uma e cada um. Adito a expectativa de nos lermos amanhã desde Aracaju.

Iniciamos hoje talvez a semana política mais importante do ano, que culminará com a maior – e talvez, a mais importante – eleição já realizada no país. Sempre tenho defendido que posicionar-se, é preciso. Mesmo tendo um profundo respeito a posições díspares, parece importante que o lado que ocupamos seja conhecido. Assim, nesta dimensão, trago hoje o artigo Por que Dilma, e já no primeiro turno publicado neste sábado, 25/09/2010, na excelente Revista Espaço Acadêmico http://espacoacademico.wordpress.com/ editada pelo Prof. Dr. Antonio Ozaí da Silva da UEM. O texto de Eloésio Paulo, professor da Universidade Federal de Alfenas e autor do livro Os 10 pecados de Paulo Coelho (Ed. Horizonte) é trazido aqui com autorização explicita do editor da REA.

Por que Dilma, e já no primeiro turno

Ser utopista é uma bela forma de lavar as mãos: eles só se comprometem com o melhor dos mundos possível. Deve ser com grande esperança que uma parte da classe “pensante” brasileira vê o tímido crescimento de Marina Silva nas pesquisas; não precisariam abster-se, depois de toda a campanha antiDilma, campanha na qual acreditam porque, afinal, a grande imprensa é a verdade revelada – na ausência prática de outras instituições capazes de alguma orientação. Além disso, continuam achando chique votar na mesma candidata que Caetano Veloso, aquele compositor outrora genial que se tornou um perfeccionista/saudosista magnífico cantante.

Quer saber de uma coisa? Serra nem é um mau candidato, está longe se ser o “idiota” que o destemperado Caetano disse há poucos dias. Serra, no governo, faria quase exatamente o mesmo que Dilma no plano econômico. A política social de um governo seu é que manteria a de Lula como maquiagem, mas começaria a solapá-la devagarinho por duas razões: primeiro, porque o PDSB é um partido demófobo, detesta povo; segundo, porque tem a má companhia do DEM (para não falar das outras), partido em extinção mas que, noves fora Maluf e os partidecos evangélicos, é o que há de mais retrógrado na política brasileira. São capitalistas que não conseguem admitir a mais remota distribuição de renda. Ah, sim, não podemos esquecer: o PSDB privatizaria tudo o que resta de patrimônio nacional, a precinhos bem camaradas. E Paulo Renato voltaria a ser (que horror!) ministro da Educação. De quebra, a promessa de um salário mínimo de 600 reais é apelação das mais desavergonhadas.

A direita está histérica, e isso surpreende muita gente. Nem falemos da Veja, que sempre foi assumidamente partidária (lembram-se do Stedile na capa, caracterizado como o Diabo?) A Rede Globo, que vinha fazendo de conta ter aderido ao jornalismo sério, escancarou outro dia no Jornal Nacional: 15 ou 20 minutos de noticiário editado descaradamente para prejudicar Dilma, no melhor estilo da antológica edição do debate Lula/Collor de 1989. Até aFolha de S. Paulo (já tinha tomado pito da própria “ombudswoman”) deixou cair de vez a máscara: pôs na primeira página foto de Dilma entre Zé Dirceu e Erenice, numa óbvia insinuação de que “se foi ministra da Casa Civil, é corrupta”. Sim, Paulo Henrique Amorim, desta vez o PIG (Partido da Imprensa Golpista) desfila em grande estilo na Marquês de Sapucaí da desinformação nacional.

Mas por que será que a dianteira de Dilma desgosta tanto essa turma? Será que eles morrem de amores por Serra? Não, como não morriam de amores por Fernando Collor, mas fizeram a irresponsabilidade de levá-lo à Presidência porque era impensável Lula ser presidente.

Lula tornou real o impensável fazendo-se pragmático, deixando de ser utópico. Era o único jeito, mas a consciência tranqüila dos eleitores de Marina prefere esquecer a história. Hay que meter la mano em aquello, como disse o Suplicy, o melhor político ruim de discurso que já houve. Os quase 80% cento de aprovação foram uma conquista pessoal de Lula, apesar de toda a grande imprensa, e baseiam-se no simples fato de que a vida das pessoas melhorou. Daí para a virtual vitória de Dilma no primeiro turno, é um pulinho.

Os capitalistas, muito mais beneficiados pelo governo Lula que o povo, são ingratos. Pelo menos uma parte deles, e mais especialmente o empresariado paulista – que tem o hábito de considerar-se uma realidade à parte do restante do Brasil, mentalidade que aliás se reflete no fracasso da candidatura Serra. Mais especialmente ainda, os grandes veículos de comunicação detestam a hipótese Dilma. Por que será? Que ódio tão grande é esse que os faz jogar fora seu patrimônio mais importante, a credibilidade, para tentar forçar um segundo turno?

Talvez uma das respostas seja a proposta de universalização da banda larga. Eu deixaria de assinar o provedor da Uol (pertencente à Folha) caso tivesse internet de graça proporcionada pelo governo; eu, a torcida do Flamengo, a do Corinthians e várias outras. Também a Globo tem interesses nessa área, e sabemos que Dilma – mais brizolista do que lulista – é grande entusiasta da democratização da banda larga. Será uma boa explicação? De qualquer forma, pode apostar que as razões do PIG não são a imparcialidade jornalística ou o interesse nacional.

Agora, é claro que o negócio da espionagem da Receita está errado. Mas tão errado quanto a jogada de Serra contra Roseana Sarney em 2003, que tirou a candidata maranhense de uma eleição presidencial na qual era favorita. E, pensando bem, por que tanto medo de que alguém veja o Imposto de Renda de sua filha e do genro? Erenice, a suspeita apressadamente julgada pelo PIG, abriu logo o seu sigilo. Já viram Fernando Henrique fazer isso?

É claro, também, que as práticas lobistas de Erenice e filhos – caso sejam confirmadas – são imorais. O engraçado é que ninguém da turma do Serra falava dessas coisas no governo Fernando Henrique, quando um segundo mandato presidencial foi comprado com o suborno explícito de parlamentares. De uma vez por todas: não existe governo santo, existe governo menos pior. A utopia é como o amor platônico, antes de tudo hipócrita.

Dilma vai ganhar de qualquer jeito. O PIG pode até conseguir um segundo turno, frenética e desavergonhadamente empenhado como está. Mas não terá munição suficiente para levar Serra ao Palácio do Planalto. O presidente é poderoso, e muito. Então, o que a direita conseguiria mesmo seria forçar a ampliação da aliança eleitoral de Dilma, viabilizando até mesmo a entrada de muitos antidilmistas ferrenhos no futuro governo petista. O Brasil só teria a perder com isso: já é difícil votar em Michel Temer por tabela; difícil também engolir que o pragmatismo de Lula seja tanto que nos obrigue a vê-lo cortejar (e ser cortejado) por Collor, Sarney, Hélio Costa…

Muito pior será votar em Dilma num segundo turno em que a direita estaria ainda mais infiltrada dos dois lados. É exatamente isso que ela, a direita, quer. Naturalmente, resta a opção de não votar ou lavar as mãos jogando as fichas na boazinha Marina, evangélica que não tem coragem de assumir-se como tal porque o tom de sua campanha é “descolado”. Quer um exemplo? Um programa seu, dos primeiros, dizia que “a natureza” (e não Deus) levou milhões de anos para criar o ambiente que estamos destruindo, e tal.

O cadáver da ditadura militar continua insepulto, e fede. Marco Maciel ainda perambula pelos corredores do Congresso, o espectro fanhoso de Maluf assombra nossa televisão, os Bonifácio de Andrada apresentam ao eleitor seu mais novo rebento como candidato a deputado estadual. Até quando vamos conviver com esses avantesmas?

No próximo capítulo, a bruxa Dilma será apresentada como “terrorista”. Ela pegou em armas contra os criminosos que destruíram nossas instituições democráticas em 1964, militares na vanguarda, sob as ordens do governo norte-americano. Serra também era “contra” a ditadura. Mas o que fez ele? Fugiu para o Chile.

+ texto do autor: Jesus falava palavrão

domingo, 26 de setembro de 2010

26- Dia Mundial da Prevenção da Gravidez na Adolescência.

Porto Alegre Ano 5 # 1515

Uma ainda nublada manhã do primeiro domingo de primavera. Encantava-me com a expansão das minhas quatro videiras. O sol se anuncia ainda brinca de esconde-esconde.

Um domingo que abre uma das semanas mais tensas no cenário político, na qual jornalistas do tucanato chalrarão (tive que pesquisar para saber a voz do tucano: chalrar ou chalrear) ainda mais desesperado ousando até o golpismo. Talvez até crocitarão (que é voz do corvo). Hoje sigo a proposta das blogadas dominicais: curtas. Falta a de agora a segunda marca: light. A pílula de hoje é amarga. Mas antes desta um ‘errei’.

Primeiro uma retificação à blogada desta sexta-feira, dia 24: escrevi errado o nome de uma muito querida ex-aluna Ruth Pavan. Ela – e não Rute Pavan, como escrevi –, é professora do Programa de Pós Graduação em Educação da UCDB. Ela, junto com o José Licínio Backes e vários outros colegas, nos cumulou de carinhos quando da estada da Gelsa e minha em Campo Grande por quatro dias. Faço esta retificação, pois sei o quanto o nosso nome seja, talvez, a palavra que mais nos agrada ver escrito com correção. Desagrada-me – mais, ainda,me incomoda – ver meu vocativo escrito como: Ático, Athico. Atticco, Aticco. Assim, querida Ruth, releva minha desatenção.

Hoje, pelo quarto ano consecutivo, dezenas de países da Europa, da Ásia e da América Latina participam do Dia Mundial da Prevenção da Gravidez na Adolescência. Atividades serão desenvolvidas para que as pessoas tomem consciência daquilo que se configura cada vez mais como um grave problema pessoal e de saúde pública. É algo que inclusive está reconfigurando salas de aula neste novo milênio.

Quando falamos de gravidez na adolescência, diz Moacyr Scliar, em sua coluna no Caderno Vida, da Zero Hora de ontem, estamos nos referindo ao período da vida entre 10 e 19 anos. Uma faixa etária que, com a expressiva diminuição da mortalidade infantil, tem crescido; no Brasil, corresponde a 20,8% da população geral. É muita gente. E é um problema muito sério, que está aumentando, inclusive em países desenvolvidos como os Estados Unidos. A América Latina registra anualmente 54 mil nascimentos com mães menores de 15 anos e 2 milhões com idade entre 15 e 19 anos. No Brasil, calcula-se que a incidência da gravidez nesta faixa etária esteja entre 14 e 22%.

É ainda o medico gaúcho e membro da Academia Brasileira de Letras que me socorre neste blogar: A gravidez na adolescência envolve riscos: maior incidência de anemia materna, pressão alta, parto complicado, infecção urinária, prematuridade do bebê, infecções pós-parto, dificuldade para amamentar. Além disso, a gravidez tumultua a vida da adolescente: apenas metade delas completa o Ensino Médio, enquanto que, entre as adolescentes que não engravidam, a cifra é de 95%. No Brasil, apenas 30% de adolescentes que tinham engravidado voltaram e concluíram os estudos.

A prevenção deve levar em consideração os fatores predisponentes da gravidez na adolescência: baixa autoestima, dificuldade escolar, abuso de álcool e drogas, comunicação familiar escassa, pai ausente ou hostil, pais separados, amigas que engravidaram na adolescência. Os pais das adolescentes que não engravidam têm melhor nível de educação, o que mostra a importância desse fator. Outro dado importante: 60% das adolescentes consideram que falar com o parceiro sobre contracepção seja um tema “difícil”. Na América Latina, 56% dos jovens admitem terem tido relações com um novo parceiro sem o uso de anticonceptivos.

Conclusão: estamos diante de um problema que é claramente social e psicológico e que não será resolvido com castigos ou ameaças, mas sim com a aplicação da antiga frase: conversando a gente se entende. Os jovens e os pais têm de falar sobre gravidez na adolescência. E este domingo é um bom dia para começar.

Desejo que este domingo no qual certamente muito estamos pensando no próximo seja muito agradável. E mais, que está semana pré-pleito seja menos tensa que estes últimos dias eleitorais. Anuncio para manhã um texto muito especial: Por que Dilma, e já no primeiro turno? Pois, posicionar-se, é preciso.

sábado, 25 de setembro de 2010

25- Caminhando pelo mundo: Mitologia terena.

Porto Alegre Ano 5 # 1514

É a manhã do primeiro sábado de primavera 2010. O dia parece cumprir o design previsto para estação. Manha de céu azul, temperatura agradável.

Quando depois de assistirmos a um filme o relembramos e de vez em vez o comentamos, dizemos que o filme entrou em nós. Pois desde que na primeira hora de ontem retornei de Campo Grande o IV Seminário Internacional: Fronteiras Étnico-Culturais e Fronteiras da Exclusão que envolvera a Gelsa e a mim, desde a noite de segunda-feira se fez presente em meus fazeres de maneira inusual, se comparo a outros eventos que assisto. No Seminário de História e Filosofia que ministrei pela manhã, em mais de uma oportunidade nas discussões acerca dos mentefatos culturais que usamos para a leitura de mundo, me referi a temáticas que ouvi no ‘Fronteiras’. Quando do almoço das sextas feiras com meu trio ABC, que ontem teve uma alteração na constituição: a Maria Clara, juntou-se ao André e a a Clarissa em substituição ao Bernardo, que estava fora de Porto Alegre. À tarde na entrevista à jornalista Vera Nunes da revista NovOlhar, da Igreja Evangélica de Confissão Luterana quando falamos sofre História do pensamento científico e do confronto entre ciência e teologia foi natural que eu ‘retornasse’, em alguns momentos a Universidade Católica Dom Bosco. Em leituras do material que amealhei no encontro, especialmente no livro ‘Povos indígenas e Sustentabilidade: saberes e práticas interculturais na universidade’ e em conversas com a Gelsa a semana que encerrávamos voltou densa.

Assim parece natural que a dica de leitura que é tradição sabática aqui hoje tenha marcas indígenas. A UNESCO definiu, para fins estatísticos, na década de 60 que se considera livro “uma publicação impressa não periódica, que tenha no mínimo 49 páginas, sem contar as capas.” Não sei por que o mítico 7 x 7 foi escolhido. Mas concluo que hoje a sugestão sabatina não é de um livro, mas sim de um opúsculo, palavra que para mim tem poesia na designação de um objeto muito querido.

CUNHA, Fátima Cristina Duarte Ferreira (org). Caminhando pelo mundo: Mitologia terena. Texto em português, terena, inglês, espanhol. Campo Grande: Ed.UFMS. 24p. Ilustrado, 21 cm Brochura. 2010, 978-85-7613-259-2

O simpático opúsculo Caminhando pelo mundo: Mitologia terena é um dos produtos da dissertação de mestrado de Fátima Cristina Duarte Ferreira Cunha, no ano de 2008, na Linha 3: Diversidade Cultural e educação indígena do Programa de Pós Graduação em Educação, na Universidade Católica Dom Bosco.

A prof. Dra. Marina Vinha, Coordenadora do Curso de Licenciatura indígena Teko Arandu da Faculdade de Educação da Universidade Federal da Grande Dourados escreve na apresentação que a relação de Fátima Cristina com as questões do ambiente e, principalmente, com ambiente da Aldeia Bananal, localizada no município de Aquidauana foi o mote para que elementos culturais de uma das versões da mitologia terena, escrita em 1947 pelo antropólogo Baldus, fosse detalhada citando as aves e os bichos que precederam a existência do povo Terena.

A apresentadora da sugestão de hoje conclui dizendo que ‘foi a palavra, ou a língua Terena, trazida por um desses seres, quem trouxe para esse povo o lugar da diferença; A diferença cultural, em mundo que todos eram iguais. A pesquisadora teve o esforço de transformar esses elementos constitutivos da identidade dos Terena em um livro dedicado as crianças, mas que alegra jovens e adultos’.

Em http://pib.socioambiental.org/pt/povo/terena aprendemos que o Mato Grosso do Sul abriga uma das maiores populações indígenas do país. Os Terena, por contarem com uma população bastante numerosa e manterem um contato intenso com a população regional, são o povo indígena cuja presença no estado se revela de forma mais explícita, seja através das mulheres vendedoras nas ruas de Campo Grande ou das legiões de cortadores de cana-de-açúcar que periodicamente se deslocam às destilarias para changa, o trabalho temporário nas fazendas e usinas de açúcar e álcool. Essa intensa participação no cotidiano sul-matogrossense favorece a atribuição aos Terena de estereótipos tais como “aculturados” e “índios urbanos”. Tais declarações servem para mascarar a resistência de um povo que, através dos séculos, luta para manter viva sua cultura, sabendo positivar situações adversas ligadas ao antigo contato, além de mudanças bruscas na paisagem, ecológica e social, que o poder colonial e, em seguida, o Estado brasileiro os reservou.

Acerca da Cosmologia e do xamanismo no mesmo endereço antes citados se conhece que, apesar do longo tempo de contato, os Terena, sobretudo aqueles residentes nas aldeias mais "tradicionais", como Cachoeirinha e Bananal, utilizam os poderes dos seus "porangueiros", como dizem, ou curadores (xamãs, em terena: koixomuneti). Recorrem a estes para a cura de doenças, interpretadas como "males do espírito" que afetam o corpo do indivíduo (não há separação entre o corpo e o espírito na concepção dos curadores terena). Também possuem o poder de descobrir feitiço que terceiros podem ter colocado no doente, causando sua morte. Estas acusações são uma constante fonte de fuxicos, que geram crises políticas internas nas aldeias de Cachoeirinha, por exemplo. O koixomuneti age por meio de um "espírito companheiro" (koipihapati) que na verdade é quem "descobre" as coisas encobertas e lhe orienta na cura.

Em Cachoeirinha, no mês de maio, quando as plêiades voltam a aparecer no horizonte, realizam uma festa (oheokoti) em que os vários koixomuneti, paramentados e pintados, utilizando seus instrumentos básicos de trabalho (o "porango" ou maracá - itaaká e um tufo de penas de ema - kipahê) passam a noite cantando em invocação dos seus "espíritos guia" para que tragam boas colheitas, abundância e para livrar a aldeia dos "feitiços".

O mito de origem do povo Terena, um longo relato de como o herói civilizador duplo (tem uma parte "gêmea" que age como um anti-herói) Yurikoyuvakái tirou-os de debaixo da terra e ensinou-lhes o uso do fogo e das ferramentas agrícolas, é ainda passado de geração a geração, pelo menos em Cachoeirinha. É essa dupla face do herói que fundamenta o comportamento dos membros das metades xumonó (gozadores, "bravos") esukirikionó (sérios, "mansos"), ainda presentes em muitos aspectos da vida social e cerimonial Terena.

Assim, ainda marcado pelo IV Seminário Internacional: Fronteiras Étnico-Culturais e Fronteiras da Exclusão, ofereço aos meus leitores o convite para conhecermos algo de um povo que é fundante de nossa brasilidade. Um muito Com sábado a cada uma e cada um.