Porto Alegre Ano 4 # 1388 |
Um sábado onde de novo temos sol no Brasil meridional. Isso dá contornos diferentes ao fim de semana. A blogada hoje também é postada mais tarde numa tradução de um inicio do dia a vagabundear.
Na quinta-feira trouxe aos meus leitores esta questão: o que aconteceu na história da humanidade, pelo nosso calendário, no período de 5 a 14 de outubro de 1582? E vimos porque, para aqueles como nós que seguem há mais de meio milênio o calendário gregoriano, a resposta é nada.
Esse é um não-período que por bula papal quando chegou no dia cinco de outubro se pulou para o dia 16 de outubro. Assim para cristandade (romana, pois como vimos sem a adesão imediata da luterana e da anglicana) esses dias não existiram.
Aquela blogada deu azo à evocação de um livro para a dica de leitura de hoje que li em 2004. Essa semana o reli partes de ‘O Emblema da Amizade’, romance Frances escrito por Jacques Bonnet, se desenrola período de 5 a 14 de outubro de 1582. A publicação conta a história de um massacre em Paris – um livreiro e toda sua família são assassinados. A chacina ocorre em 1582, numa casa próxima ao hotel, onde mora o protagonista do título, Giordano Bruno. Assim, remexo nas minhas resenhas de leituras da era pré-blogue e revisto com novos trajos e brindo meus leitores nesse sábado.
O Emblema da amizade. BONNET, Jacques. São Paulo: Publifolha, 2004. 471p. [Tradução do original francês L’embleme d’amitie por Paulo Neves] ISBN 85-7402-563-1
Jaques Bonnet é um escritor francês. Foi primeiro editor.
Sua obra de mais sucesso é o livro trazido hoje aos meus leitores. Dele só encontrei duas linhas na Wikipédia em italiano.
Na História da Ciência Giordano Bruno é um personagem símbolo. Em O Emblema da amizade há a oportunidade de o encontrarmos em uma situação diferente daquelas que conhecemos: o filósofo que desafiou a Inquisição e que terminou na fogueira aparece travestido de detetive, resolvendo um horrendo crime em Paris no final do século 16.
No romance policial conhecemos um pouco de Paris renascentista. O Emblema da amizade mistura ficção e realidade, suspense e erudição. A isso junta-se a oportunidade de encontrarmos Giordano Bruno em uma situação diferente daquelas que conhecemos: aparece travestido de detetive, resolvendo um horrendo crime em Paris no final do século 16.
Em 1582, houve uma reforma no calendário determinada pelo Papa, com supressão de 10 dias, durante os dias "ausentes" Bruno encontra-se em Paris, é protegido do rei, dá aulas na Sorbonne. Eis que uma ocorre chacina na Casa do Galo, próxima ao hotel onde mora o filósofo. “O Livreiro Nicolas Heucqueville foi morto durante a noite, e também sua esposa, sua irmã, seus dois filhos, e mais um recém nascido, e a ama-de-leite deste, e também seu pai.” Os raciocínios e intuições transformam Bruno em um detetive privilegiado. Podemos imaginar as elucubrações do filósofo-detetive, como protagonista da história na qual Jacques Bonnet no brinda com um romance policial e histórico, onde mescla ficção e realidade, suspense e erudição.
Para tentar desvendar o crime e achar os culpados, Bruno, um filósofo de pensamento transgressor, inicia uma investigação. Seu raciocínio e intuição o transformam em um detetive privilegiado, capaz de pensar com rapidez e buscar sentido em cada um dos fatos.
A trama policial ambientada no final do Renascimento é também um romance histórico que, usando evocações sensoriais, mostra o período conturbado em que se passa a narrativa. Conflitos religiosos, guerras e genocídios deixam de ser plano de fundo para se apresentarem como um dos principais atrativos da história.
Não foi se razão que numa crítica do ‘Le Monde’, de Paris comparou o livro a ‘O Nome da Rosa’. Há ainda no livro uma excelente introdução de 11 página pra conhecermos um pouco acerca do genial filósofo.
Ainda uma palavra acerca do nome do livro. Em tempos mais remotos, na França, e também em outros países da Europa, os endereços comerciais eram dados pela menção do símbolo ou da imagem, expostos sobre a porta de entrada. Chamavam-se "enseignes", insígnias, emblemas. Isso explica o título do livro. Emblema da Amizade foi, na realidade, o endereço do livreiro de Paris que editou Candelaio, a comédia de Giordano Bruno, que posteriormente nos muitos interrogatórios inquisitórios são decisivos para a condenação de seu autor.
" O livro de Bonnet vem confirmar a suspeita de que a verdadeira, grande e boa literatura de nossos dias refugiou-se em alguns poucos gêneros, ditos "menores", entre eles o policial. O "Emblema da amizade" é também um romance histórico. Restitui, por evocação sensória, visual, olfativa, tátil, auditiva, o meio e as ações humanas daqueles tempos perturbados (a história se desenrola em 1582). A trama é engenhosa. Personagens verdadeiros e documentos autênticos se misturam com os forjados, e a história não se mostra apenas como pano de fundo.(..) Em meio às trevas, emerge a figura do filósofo. Ela estabelece a fragilidade do pensamento diante dos fatos. Porém seu papel mostra-se crucial, já que não cessa de interrogar, de buscar sentidos diante do caos instaurado pelas certezas convictas e tirânicas." (Jorge Coli, Folha de S. Paulo).
Como professor de História da Ciência discorro, com muita frequência, sobre Giordano Bruno. Cada vez me interrogo acerca da coragem de um dos filósofos mais lúcidos do Renascimento. A história de sua vida, que se consumou em uma tragédia – foi levado vivo a fogueira – já foi descrita por diferentes autores.
Há um filme Giordano Bruno (1973 - 114 minutos) no qual Giuliano Montaldo fez um dos mais extraordinários e elogiados dramas do cinema baseado numa história real. Retrata a vida do astrônomo, matemático e filósofo italiano, frade dominicano na juventude, Giordano Bruno. Pensador de opiniões audazes e independentes, Bruno foi queimado vivo na fogueira da Inquisição em 17 de fevereiro de 1600, na praça de Flores, em Roma. Ele defendia, entre outras coisas, a infinidade do Universo, a existência de vida em outros mundos e via na religião apenas superstições e símbolos. Herege convicto escreveu inúmeros trabalhos refutando os dogmas fundamentais do catolicismo. Suas críticas científicas à religião fizeram com que a Santa Sé o considerasse um inimigo perigoso da Igreja. Submetido a cruel tortura, enfrentou com altivez os interrogatórios, sustentando suas idéias acerca da presença de Deus em cada fração da matéria. O ator Gian Maria Volonté faz o papel de Giordano Bruno neste belíssimo filme produzido por Carlo Ponti, com trilha sonora assinada por Ennio Morricone.
Assim, aos giordanistas e não giordanistas leitores deste blogue um convite: conheçam o Emblema da Amizade. Vale a pena. Palavra ‘insuspeita’ de alguém que tem vitrais em seu gabinete de trabalho homenageado a duas figuras emblemáticas da História da Ciência: Hipácia (370-415) e Giordano Bruno (1548-1600).
No mais, votos de um muito bom sábado. Aqui ainda muito curtido, pois adornado de sol.
Prof Chassot
ResponderExcluirA indicação do livro trata bem das relações humanas o que tanto permeia a vida de um Assiste Social, não deixarei de lê-lo.
Muito obrigada e até breve...
Abraços,
Estimada Alessandra,
ResponderExcluirobrigado por teu comentário e também pela tua a adesão a minha sugestão de leitura.
Como não deixaste teu endereço, não te posso agradecer pessoalmente.
Apareça aqui de vez em vez,
attico chassot
Estimada Alessandra,
obrigado por teu comentário e também pela tua a adesão a minha sugestão de leitura.
Como não deixaste teu endereço, não te posso agradecer pessoalmente.
Apareça aqui de vez em vez,
attico chassot