Porto Alegre Ano 4 # 1381 |
Manhã de sábado. Não há neblina hoje. Diferentemente de ontem, o aeroporto está aberto. Isso significa que teremos jornais do centro do país. Parece um paradoxo, em tempos que se transportam bits, ainda se precisa transportar átomos para termos noticias em um suporte mais amigável.
Vejo que é dia de Santo Isidoro, o lavrador do século 12. Há festas por uma semana em Madrid. Não confundir com Santo Isidoro, o etimologista do século 5º, que dizia que a mulher devia andar encurvada, para lembrar a costela do homem que lhe deu origem.
Tomo conhecimento da notícia do falecimento do pai de
muito querida ex-aluna (e também leitora desse blogue) Ieda Giongo. Não tive o privilégio de conhecer o pai da Ieda. Nem lhe sei o nome. Mas sei da alegria daquele agricultor quando sua filha se fez doutora. Lembro de meu pai, quando chegou de uma formatura de um filho de um ferroviário colega seu e disse que sonhava que um dia seus filhos também se formassem no ginásio.
Pois o seu Giongo certamente nunca soube bem o que era fazer doutorado, mas vibrou muito quando a Ieda se fez doutora. Ela foi minha aluna no mestrado e no doutorado. Se verdadeiro o saber primevo que diz pelos frutos conhecereis a árvore, posso assegurar que seu Giongo foi de boa cepa.
A Ieda mora no interior de Roca Sales (lembro de sua surpresa quando falamos das razões do nome de seu município). Pois lá em Roca Sales, nesta quarta-feira, a Ieda e muitos outros colonos se entristeceram, pois uma pessoa querida da comunidade voltou a ser semente enterrada em solo que será ainda mais fértil, agora.
Ontem – pré-anunciado a dica sabatina – trouxe um pequeno informe histórico acerca da história da Espanha. O golpe militar liderado pelo general Francisco Franco em julho de 1936 na Espanha pretendia ser rápido e decisivo. Em vez disso, levou a uma guerra civil que durou três anos e devastou o país. Meio milhão de pessoas morreram e um número equivalente foi para o exílio, do qual alguns nunca voltaram. Depois de 1939, centenas de milhares de republicanos ainda definhavam na prisão, e muitos enfrentaram pelotões de fuzilamento e foram enterrados em sepulturas sem identificação. Os que lutaram contra Franco viveram anos de repressão e mesmo quando o ditador morreu, em 1975, muitas pessoas na Espanha continuaram a manter silêncio sobre suas experiências.
Devo dizer que nos seis meses que vivi em Madrid, em 2002, pouco consegui aprender sobre o assunto. E, não que não buscasse. Convivi com intelectuais para os quais o assunto era algo desagradável de falar. Nas bibliotecas era mais fácil encontrar farto material sobre a tenebrosa e longa inquisição espanhola do que sobre como o Juan Carlos se torna Rei ungido por ‘El Caudilho’. Aceito que esteja fazendo uma interpretação equivocada. Mas vi, ainda mais de uma estátua de Franco em Madrid.
Agora, sob o governo do primeiro-ministro socialista José Luis Rodrígues Zapatero, cujo avô foi executado por franquistas, uma nova Lei da Memória Histórica foi aprovada em outubro de 2007. A lei formalmente condena a rebelião e a ditadura de Franco, proíbe os símbolos e referência ao regime em espaços públicos e determina a remoção de monumentos em honra de Franco.Também declara ilegais os julgamentos políticos de adversários de Franco durante a ditadura e obriga as prefeituras a auxiliarem na exumação de corpos dos que foram enterrados em sepultura sem identificação. O ‘pacto de olvido’ ou pacto do esquecimento está finalmente sendo quebrado.
Esse preâmbulo é para fazer de ‘O retorno’ a dica de leitura sabatina. Mais da metade do livro de Victoria Hisplop foi lido na viagem Porto Alegre/Rio Grande/Porto Alegre nestas 4ª e 5ª feiras. Como sempre, a ficha técnica, algo da autora e do livro.
O retorno HISLOP, Victoria. [Original inglês The return. Tradução Maria Luiza Newlands] Rio de Janeiro: Intrínseca. 405 p. ISBN 978-85-98078-75-5
Esse livro foi recém lançado no Brasil e os direitos de publicação foram já vendidos para mais de 13 países. Ele é segundo romance da autora inglesa .
Victoria Hislop (née Victoria Hamson) graduou-se em Letras no St. Hilda’s College, na Universidade de Oxford. Escreve artigos sobre turismo e viagens para os jornais
Sunday Telegraph e Mail on Sunday e para a revista Woman & Home. Seu livro de estreia, ‘A ilha’, publicado em 2008, vendeu mais de 10 mil exemplares no país, excedeu 1 milhão de cópias comercializadas no mundo e rendeu à autora o prêmio Galaxy British Book de 2007 e rendeu-lhe o título de ‘Melhor estreante do ano’ além da vitória no concurso Leitura de Verão, do clube do livro Richard & Judy. A autora mora em Kent, com o marido o editor Ian Hislop e os dois filhos, Emily Helen (nascida em 1990) e William David (nascido em 1993).
Algo acerca do romance. Sonia Cameron está na Espanha, em férias, para comemorar o aniversário de 35 anos da melhor amiga com aulas de flamenco. Sua intenção é apenas dançar e se divertir. Em Londres, deixou a aridez e as exigências do cotidiano e um casamento em crise. Em um café sossegado de Granada, contudo, uma conversa casual com o proprietário e uma intrigante coleção de fotografias antigas a atraem para a história extraordinária da Guerra Civil Espanhola e da vida de personagens locais encantadores e marcantes, como toureiros, dançarinas, músicos e o poeta García Lorca. Setenta anos antes, o café era o lar dos Ramírez, família que, em 1936, presencia as piores atrocidades do golpe militar liderado pelo general Francisco Franco, e vivencia o despedaçar do frágil equilíbrio do país. Divididos pela política e pela tragédia, todos escolhem um lado e travam uma batalha pessoal à medida que a Espanha se dilacera. O retorno é uma cativante e complexa lição sobre perdas e lealdade, narrada em um contexto histórico fascinante e muito bem-construído. Encantador e profundamente comovente.
A minha eleição, quando vi o anúncio em jornal foi, mesmo através da ficção conhecer um pouco mais da guerra civil espanhola. Nessa dimensão não fui fraudado. Houve a vantagem que Victoria Hislop, ou melhor seus personagens, são ma maioria pró-republicanos;
Minhas lembranças de infância – e o acontecimento recém ocorrera – eram de revistas católicas, que exaltavam os mártires executados pelos comunistas (republicanos anti-franquistas).
Não li “A ilha’ de tanto sucesso. Como obra literária ‘O retorno’ me decepcionou. Parece ser um texto não muito bem construído. Há descrições exaustivas de dois temas que me desagradam, mesmo sabendo que são paixões dos espanhóis: dança (flamenco) e corrida de touros. Ainda assim, recomendo, pois a trama é envolvente e prende a atenção do leitor.
Na expectativa de um bom sábado, votos de um bom fim de semana. Um convite encontremo-nos amanhã aqui.
Mestre Chassot! Pelo teu Blog diário tomo conhecimento da passagem do pai da Ieda Giongo, ex-colega de Pós-Graduaçao na Unisinos. Gostaria de dizer a Ieda o quanto nos tornamos impotentes nessas horas, e muitas vezes egoistas, pois não queremos repartir com ninguem o amor dessas pessoas queridas. Ieda, por certo encerrou-se por aqui o ciclo de teu pai em nosso mundo; e em outra dimensão terá ele a continuidade dessa bela tarefa de proporcionar alegrias a quantos puder ajudar, como o apoio emprestado à tua formação. Meus sentimentos e a certeza de que o exemplo deve ser seguido. Abraço JB.
ResponderExcluirMeu muito querido Jairo,
ResponderExcluirmuito obrigado pelas palavras bonitas que transmites à Ieda. Seu pai continuará a existir nas histórias que contarmos dele.
Com admiração
attico chassot
Querido Attico,
ResponderExcluiren tu escrito de hoy hablás del estado del tiempo en Porto Alegre, te cuento que en Buenos Aires la tarde es gris como un tango. Melancólica y fría. Tengo saudade del fuego de tu corazón de hogar, de Gelsa, de nuestras charlas.
Gracias por tu amistad,
un abrazo
Esther Díaz
Muy apreciada Esther,
ResponderExcluirtu no lo podes imaginar el significado de este blog recibir tu comentario. Muchas gracias por una tan insigne honor de leerme.
Guardo la más grata recordación de los preciosos momentos que hemos pasado juntos y las dulces horas que charlamos en el hogar de Morada dos Afagos son indelebles.
Es ditoso saberte mi amiga,
con creciente admiración un cálido abrazo
attico chassot
Professor Chassot!
ResponderExcluirMuito obrigada pelas palavras de conforto e pelo envio do comentário do
Jairo. Nem sei como agradecer pelos escritos em seu blog. Ler os escritos
sobre meu pai no blog de alguém que tanto admiro como pessoa e
profissional emocionou a mim e minhas irmãs.
Muito, muito obrigada!
Um carinhoso abraço
Ieda
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Muito querida Ieda,
a Gelsa e eu curtimos muito fazer essa homenagem a teu pai.
Nossa admiração por ti e pelo que nos transmites acerca de te pai catalisaram a escritura.
Com carinho
attico chassot
Prof Chassot
ResponderExcluirA indicação do livro parece bem interessante, acredito poder tirar muito proveito para minha futura profissão Assiste Social, não deixarei de lê-lo.
Muito obrigada e até breve...
Abraços,