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quarta-feira, 17 de março de 2010

17*QUA* SIM, a Justiça acerta em condenar os pais que...

Porto Alegre Ano 4 # 1322

Abro a blogada de hoje com uma referência a aula de ontem. Realmente parece que os medos de recorrência do dissabor do semestre passado (= nunca ter o mesmo grupos em aula) está exorcizado. Não só estavam todos os alunos, como ao grupo junta-se mais o Ronaldo. Pretensiosamente acredito que dei conta da tentativa de filosofar sobre a Ciência. Uma vez mais, sobrou assunto e faltou tempo. Já rumino a próxima noite de terça-feira.

Ainda algo de ontem: mesmo que no meu Scriptorium (o nome é para dar ares medievos) haja um lindo vitral com um copista pré-Gutenberg e também uma mesa que talvez fosse de cozinha antes que eu tenha nascido, na tarde de ontem fugi dele para fazer algo muito semelhante ao escriba do vitral. Tinha 250 páginas da nova edição (na verdade será apenas uma reimpressão da segunda edição) do Educação conSciência para revisar. Para o cuidadoso trabalha precisava a compenetração do copista. Para tal é fundamental estar distante do computador – com cada vez mais novos adereços para exercer prepotente o seu papel de feitor. Primeiro devo manifestar meu encantamentos com o trabalho de revisão da EdUNISC. Esta revisão de agora se pode dizer se deu em duas dimensões: 1) a adaptação a nova ortografia, que me ensejou uma aula ortográfica, especialmente em relação aos circunflexos, Agora sei que se houver ‘uma assembleia em Basileia ou Pompeia, para que tenham uma ideia aos voos não deem acentos!’ 2) outros erros, que passaram pelas revisões em uma primeira e em uma segunda edição, afloram agora não tão poucos. Vejo também que a profissão de revisor não me assenta. Fico divagando no texto lembrando-me como e porque escrevi isso ou aquilo. Mas hoje devolvo a comprida tarefa cumprida.

Temas como construção de modelos, sementes caipiras,

biopirataria, inquisição, bruxaria, demonologia ou teóricos como Weber e Nietzsche, por exóticos que possam parecer para estar presentes na Escola Básica, têm a ver com a busca de uma alfabetização científica que se envolva na formação da cidadania. Nessa dimensão Educação conSciência traz desafios curriculares procurando a inclusão social para que um outro mundo seja possível. www.unisc.br/deptos/editora/76946.htm

Como anunciei ontem, hoje e amanhã, estará em pauta duas respostas opostas à pergunta: Acerta a Justiça de Timóteo (MG) ao condenar casal que tirou filhos da escola para educá-los em casa? Apropriei-me para estas duas edições da coluna de debates que a Folha de S. Paulo publica aos sábados. No dia 13 a questão foi trazida pelo jornal a propósito do juiz de Timóteo (MG) que condenou a opção de retirar filhos da escola educá-los em casa. Nos Estados Unidos a experiência com a "homeschool" defendida em nome da liberdade de escolha na educação dos filhos. No Japão houve campanha para legalizar a educação em casa, mas teve forte oposição de políticos.

Trago hoje o posicionamento pelo acerto do juiz defendido por Rudá Ricci, 47 anos, doutor em ciências sociais, consultor educacional do SindUTE-MG (Sindicato Único dos Trabalhadores em Educação de Minas Gerais) e do Sinesp (Sindicato dos Especialistas de Educação do Ensino Público Municipal de São Paulo).
O caso recente em que a Justiça de Timóteo (MG) condenou pais que retiraram seus dois filhos adolescentes da escola para ensinar-lhes em casa, prática que nos EUA é conhecida como "homeschooling", abre um importante debate sobre o papel da educação brasileira ("Juiz condena pais por educar filhos em casa", Cotidiano, 6/3).
O juiz apoiou-se no artigo 55 do Estatuto da Criança e Adolescente, que obriga pais a matricular seus filhos na escola. Mas a questão não se atém à interpretação da lei. Ela é mais complexa e merece maior reflexão. Destaco quatro pontos que merecem maior aprofundamento:
1) Nossa cultura privilegia a responsabilidade da comunidade. É o oposto da cultura anglo-saxônica, que imputa ao indivíduo em qualquer idade a responsabilidade e a punição de seus atos julgados improcedentes. Em países latinos como o nosso, compreende-se que os adultos e a comunidade são responsáveis pela passagem da criança à vida adulta. Daí que um ato infracional de uma criança é depositado como responsabilidade de seus pais ou responsáveis. No caso dos adolescentes, a situação é mais complexa: considera-se que são responsáveis por seus atos, mas não imputáveis, justamente porque ainda transitam para a vida adulta. As medidas socioeducativas são ações de reeducação e socialização.
2) Esse desconhecimento atinge mais fortemente a classe média brasileira. Estudo recente de Amaury de Souza e Bolívar Lamounier apresenta um quadro estarrecedor, em que a família aparece como o mais importante agrupamento social confiável (para 85% dos pesquisados), superando em muito o segundo, de amigos (confiável para apenas 43%). A participação em organizações sociais é praticamente desconsiderada. Esse é um elemento cultural que compõe a "ideologia da intimidade", em que se desconsidera a solidariedade societária, as instituições e os espaços públicos. O caso de Timóteo reforça, na prática, a resolução de problemas com as políticas públicas pela própria família. No limite, estaríamos nos desgarrando socialmente, esgarçando a sociedade em ações individualistas.
3) Há outros exemplos que poderiam ter gerado inspiração nos pais no caso de Timóteo e que também são originários dos EUA, como é o caso da Charter School, escolas administradas por pais que são avaliadas periodicamente pelo Estado e até mesmo recebem subvenção pública. Mas essa opção não faz parte da cultura da classe média brasileira porque ela desconfia de tudo o que não é família.
4) O mais grave, contudo, é a banalização da educação como prática ao alcance de não profissionais. Tão grave quanto a situação da educação pública é a saúde e a segurança públicas. Mas não houve nenhum movimento de cidadãos para operar os filhos em suas próprias residências ou para perseguir bandidos com armas privadas. O que faz uma família acreditar que sabe educar seus filhos em suas casas, desconsiderando a formação de tantos profissionais da área, sem que tenham habilitação, estudo e experiência? Por que não criamos uma articulação de pais para lutar pela melhoria da educação? Por que não se pensa o futuro dos outros filhos, dos brasileiros desconhecidos por nós?
A educação é um ato solidário e de socialização. Autores reconhecidos, como Lev Vygotsky, comprovaram o quanto estímulos de turmas heterogêneas criam situações de desenvolvimento de muitas áreas da inteligência humana, além de desenvolver a tolerância diante do diferente. A educação restrita ao seu próprio lar é pobre e meramente instrumental.
Vivemos um período de banalização de tudo o que é público. Não percebemos o efeito bumerangue, que nos atinge em cheio, assim como atinge o futuro de nossos filhos. A saída isolada, de mero benefício aos membros de nossa família, a redução da educação ao sucesso individual é uma triste declaração de falência de nossa sociedade, da esperança de viver juntos, entre diferentes que se respeitam e que constroem soluções coletivas.
Talvez esses pais de Timóteo não merecessem punição em virtude de sua boa vontade e intenção. Mas eles erraram e não podem ser exemplo para nenhuma criança ou adolescente.

Agradeço a companhia de meus queridos leitores. Ao convite de amanhã acompanharmos o posicionamento oposto adito os votos de uma muito boa quarta-feira.


12 comentários:

  1. “Por que não se pensa o futuro dos outros filhos, dos brasileiros desconhecidos por nós?”

    Gostaria que todos se deparassem com esta questão, todos.

    Recentemente, uma amiga advogada retirou seu filho de três anos da escola de educação infantil onde estava matriculado por que, após a criança ter chegado com marcas na orelha, soube que a diretora punia os alunos com, pasmem, puxões na orelha.
    Simples assim: retirou da escola, escolheu outra e o problema foi resolvido para ela e para seu filho. Mas e os que lá continuam? E os pais que ignoram esta prática?

    Triste. É o egoísmo mais uma vez nos engolindo.

    Abraços, professor

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  2. Querida Marília,
    se entendi não aderes ao posicionamento de Rudá Ricci e aceitas que as crianças possam ser educadas fora da Escola, que terá defesa na blogada de amanhã. Antecipo aqui minha posição: Eu não optaria pela Educação exclusiva em casa. Mas jamais condenaria a quem assim optasse.
    Vale ver a blogada de amanha.
    Um afago do

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  3. Mstre Chassot, não sei dizer de que lado devo me colocar ao analisar o caso em Timóteo. Como educador, vejo um país que está tentando valorizar os professores em um momento muito tardio, pois boa parte da sociedade já não confia mais no nosso trabalho.

    Como cidadão, fico enraivecido com as posturas e ações as quais tem que se recorrer para tentar oportunizar um ensino de "qualidade" para nossas crianças e adolescentes (a adultos em muitos momentos).

    Como educando, fico entristecido por ver como o ensino público vem em uma derrocada constante, afastando cada vez mais os demais educandos deste meio, que se dirigem para a escolas particulares, tornando a educação, mais do que nunca, uma moeda comercial.

    Não dá para dizer se a atitude foi certa ou errada, o que devemos tentar analisar é se a educação nesse país caminha a passoas acertados ou tortos.

    Ótimo dia.

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  4. Meu caro Marcos,
    muito bem posta tuas analises te colocando em diferentes dimensões.
    Na discussão em tela: ser (ou não) a Escola como lócus de educar, parece não ser difícil de creditar a mesma, também, a função de imersão do educando na sociedade. Isso ela faz – com dificuldades que tu enumeras – com relativa competência. O texto de amanhã, que faz a defesa de pais que optam pelo ensino domiciliar, não me convenceu, Prelibo teus comentários de amanhã.
    Uma muito boa noite,
    attico chassot

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  5. Caro Mestre. Assim como o Marcos, minhas reflexões oscilam entre prós e contras. Envolve opções e como bem lembrou "é uma triste declaração de falência de nossa sociedade, da esperança de viver juntos, entre diferentes que se respeitam e que constroem soluções coletivas." Além disso, há vários pontos a serem questionados, dentre eles, a questão da abertura de precedentes, o que é extremamente perigoso, não?

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  6. Estimada colega Jenny.
    ~~ começo lamentando não ter teu endereço para te enviar essa resposta. Esse é problema do blogspot, Sei que es professor no estado do Rio de Janeiro. Realmente o precedente complicado. A escola como espaço de socialização merece consideração. Obrigado por teu comentário. Faço cópia ao Marcos – nosso comentarista Estrela – pois teve menção de seu nome.
    Um afago do
    attico chassot

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  7. Não, não. Com o exemplo da minha amiga, quis ilustrar o quanto as pessoas se satisfazem com o bem-estar do SEU filho, da SUA Família, da SUA saúde... enquanto que os demais, os brasileiros desconhecidos, padecem.

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  8. Olá professor Chassot,
    Apego-me na discussão que nos faz refletir a importância de se estar com o diferente e exercer a tolerância, a valoração dfa pluralidade, a necessidade de ouvir diferentes discursos e reinventarmos a prática da família, os hábitos colocados em xeque, a necessidade de fazermos o questionamento reconstrutivo, a idéia da autoria... Isso não se encontra em casa, só afirmação do que todos já sabem? A escola pública nos convida a ampliar o olhar, a falar do nosso lugar, que se abre ao Outro, mas, com a escuta sensível que nos faz redescobrir a palavra e ressignificar o sentido nas diferentes narrativas. É um assunto bem pertinente a um debate entre educadores para nos fazer ampliar mais as concepções e as possibilidades do fazer...
    Adorei passar por aqui. Vim a convite da Jenny, que faz parte do Blogs Educativos.
    Vou voltar!
    Maria do Rocio

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  9. Querida Marília,
    bem posta tua retificação, Entendera equivocado. Viva tua disposição comunitária.
    Um afago do
    attico chassot

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  10. Prezada Colega Maria do Rocio,
    ~~ nome que evoca muito meus tempos de Madrid ~~
    Obrigado pela tua estreia neste blogue, Seja bem vinda. Diz a Jenny, por favor, que não consegui enviar a ela meu comentário, por não ter seu endereço eletrônico. Parece muito bem postos os diferentes comentários no SIM e no NÃO, mas tu aditas algo muito pertinente e que a Escola mostra com competência: o reconhecimento da autoria. Vale muito essa discussão. Repito o meu encerramento de hoje: Eu não optaria pela Educação exclusiva em casa. Mas jamais condenaria a quem assim optasse.
    Alegra-me tua promessa de voltar aqui mais vezes.
    Com estima
    attico chassot

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  11. Caro Mestre, muito me honra visitar seu espaço e com prazer leio suas respostas. Meu e-mail é jennyhorta@gmail.com, mas não há motivo para preocupação, pois voltarei sempre que possível. Coloquei uma enquete em meu blog e tomei a liberdade de indicar suas postagens a respeito do assunto.
    Um fraterno abraço

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  12. Estimada Jenny,
    obrigado por me trazeres teu endereço e também por tua nova visita aqui. Fico muito honrado com ligações que possamos fazer entre nossos blogues tecendo parcerias na busca de mais ampla alfabetização científica,
    Um muito bom outono

    attico chassot

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