Ano
6*** SEXTA-FEIRA SANTA ***Edição 2074
Vivemos,
uma vez mais, uma Sexta-feira Santa, que
envolve crentes e não crentes. É talvez o dia de maior religiosidade do
calendário cristão. Não sem razão que a Elzira, uma muito assídua leitora deste
blogue, já há quatro anos, falava aqui dos ‘cristãos de Sexta-feira Santa’. A
imagem do crucificado, quanto mais parecer dolorosa, mais impregna ‘devoção’. Há
também aqueles que durante o ano não são frequentadores de igreja, mas hoje se
transvestem de penitentes.
A Sexta-feira Santa talvez seja a data da
cristandade de mais densa em tradições. Recordo , em minha infância que nesse
dia não ligávamos rádio (as emissoras de rádio, nesse dia só apresentavam
música clássica, sem qualquer comercial ou noticioso – talvez por isso que no
meu imaginário a música clássica foi por um tempo associada à música fúnebre),
não se varria a casa, não se ordenhava as vacas, falava-se baixo e cantar ou
assoviar jamais; o risco de pecar por assoviar nunca corri, pois até hoje não
sei fazê-lo. A infração mais grave era pregar algo, pois então estaríamos repregando
Jesus na cruz. Como filho de marceneiro pode-se imaginar quanto isto era
cuidado.
Era o dia de colher
marcela, antes que o sol secasse o sereno que ela recebera na noite da prisão
de Jesus. A propósito desta tradição popular — ainda muito presente nos dias de
hoje — escrevi um “Uma sexta-feira (ainda) santa”, conto
que foi premiado no ‘Concurso os botos do
rio Tramandaí’, nos anos 90, promovido pela Prefeitura de Tramandaí e pela
UFRGS.
Em 2002, quando vivi
na Espanha durante o pós-doutorado, tive o privilégio de passar a Semana Santa
na Andaluzia. Acompanhar as procissões — que podem ser lidas como verdadeiros
desfiles de arte, organizadas pelas confrarias que as preparam o ano inteiro —
é algo quase inenarrável. Fiz isto em Córdoba, Granada, Cádiz e Sevilha. Tenho
um livro ‘Memórias de Viagens’ pré-pronto, no qual a Semana Santa andaluz de
2002 é um dos capítulos mais prenhe de emoções. Talvez, se pudesse bisar apenas
uma de minhas dezenas de viagens, esta seria a preferida.
Nesta semana, nas
três turmas de graduação que dei aulas, perguntei como era determinada a data
da Páscoa e o espaço temporal de sua variação. Ofereci pistas: plenilúnio / equinócio.
Mostrei a importância da definição anual da data da Páscoa, pois esta
determina a data do Carnaval, Quarta-feira de cinzas, da Ascensão, de
Pentecostes, e Corpus Christi etc. Não houve entre os meus alunos a associação
de sempre a noite de Sexta-feira Santa
é de plenilúnio, ou seja, a lua é contemplada em sua intensidade máxima (= lua
cheia).
A Páscoa ocorre sempre
na primeira lua cheia do equinócio de primavera no Hemisfério Norte (ou de
outono no Hemisfério Sul). Como o calendário lunar é independente do calendário
solar vemos que essa variação é de trinta e quatro dias, ou seja, cinco semanas
menos um dia. Como o equinócio (quando temos o dia com 12 horas de sol e 12
horas de noite) de outono (no Hemisfério Sul) é em 22 de março, há a possibilidade
de variação entre 22 de março e 25 de abril.
Esta maneira de se definir a data da Páscoa
aconteceu em 325, quando ocorreu Concílio de Niceia, tido na história como
primeiro Concílio ecumênico. Até então
o Cristianismo permanecia tão somente como uma seita do judaísmo tal como os
Fariseus, os Saduceus ou os Essênios - os cristãos eram inicialmente conhecidos como Nazarenos -. É a partir deste Concílio que se pode falar em uma Igreja cristã.
Há denominações cristãs que tem fixada a Sexta-feira Santa em 12 de abril, definida a partir de leituras
dos Atos dos Apóstolos relacionadas com a data da morte de Jesus no suposto ano
33 da era cristã.
Um jornal de Porto Alegre, na véspera da Páscoa
de 2006, em um material de curiosidades acerca da festa, explicou que para
calcular a data da Páscoa bastava adicionar 46 dias a data do Carnaval.
Certamente, ao fazer matéria sobre o Carnaval poderia explicar que para
calcular a sua data basta subtrair 46 dias da data da Páscoa.
Caro Attico,
ResponderExcluirEu fiz a mesma pergunta a meus estudantes acerca da Quarta Feira de Cinzas e Carnaval, em fevereiro.
É interessante notar inserções de um calendário lunar dentro de um calendário solar.
Ainda sobre calendários, seria interessante explicar porque um dia tem a duração de vinte e quatro horas (ou dois ciclos de doze horas).
Abraços,
PAULO MARCELO
Meu caro Paulo Marcelo,
ResponderExcluiro sistema sexagesimal é uma das grandes evidência da construção humana do conhecimento. Surpreende-me que estamos criando uma geração que não sabe ‘ler as horas’ em um relógio analógico. Pergunte a um adolescente: ¿Por que quando o ponteiro grande está no 4 lemos 20, ele terá dificuldade de entender?
Um curtido plenilúnio esta noite na linda Olinda,
attico chassot
Caro Chassot,
ResponderExcluirParabéns pela postagem da Paixão. Abraços, JAIR.
Grande Chassot, não podemos nos furtar de levar estes conhecimentos as novas gerações. E, não por "coincidência" a lua estava maravilhosa em Porto Alegre. Grande abraço. Jaime Gross Garcia
ResponderExcluirAmigo Chassot,
ResponderExcluirfaço um comentário atrasado; envolvi-me numa visita a familiares no interior e passei batido, mas retomo agora. As lembranças sobre as sextas-feiras santas são prenhes de significados. Por cerca de 36 anos estive a frente de paróquias nas quais deveria presidir os atos litúrgicos, mas sempre foi uma data na qual percebia a diminuição dos crentes em virtude do aproveitamento do feriado para viagens diversas. Muitas vezes busquei inspiração na narrativa de João que enxerga no sacrifício e morte de Jesus o ponto de maior glória.
Um abraço,
Garin
Muito legal.
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