Porto Alegre Ano 4 # 1420 |
Para fazer a blogada de hoje faço uma associação não tão livre. Disse ontem aqui, que a terça-feira me reservava palestrar em cenário inusual. Só nesse ano, e já contei aqui, falei em bar, livraria, happy hour, universidades etc. Pois minha maratona junina, que teve palestras em cinco cidades, reservou para a terça-feira, aqui em Porto Alegre uma palestra no Colégio Militar. E Isso ocorre depois de há uma semana depois de ter trazido aqui algo relacionado com o ensino de História do Brasil nas escolas militares.
Antes de contar algo de ontem, trago um texto, formado por excertos de um capítulo de um livro que estou preparando para celebrar no próximo março meus cinquenta anos de magistério. Para o livro estão previstos 50 capítulos, um de cada um de meus anos de magistério, que depois de uma abertura, trazem evocações. Para edição de hoje escolhi alguns fragmentos de um dos capítulos, que, como se verá, muito a propósito.
[...]
Outra evocação, bem mais recente, para completar de uma assemblage. Está já é do professor. No quente fevereiro de 2010 (onde em Porto Alegre houve sensação térmica de + 44ºC que no mesmo mês troquei por –14ºC em Ålborg) estava em um taxi rumo a Policia Federal para retirar o meu passaporte.
Encantei com a nova pintura do Colégio Militar, que ocupa um imenso quarteirão em área privilegiadíssima, se constituindo talvez na maior edificação de dois pisos de Porto Alegre. Disse ao taxista, sem grandes reflexões. Não sabemos o que ocorre ai dentro. Eu e a maioria da população nunca entramos aí. Logo me dei conta de meu engano. No final dos 60s, entrei uma vez no enigmático prédio. E contei ao taxista – sempre digo que eles são os grandes psicanalistas ambulantes a nosso dispor – algo que nunca mais me havia lembrado. Trago-o aqui neste memorialismo.
Havia uma seleção para professor de Química no Colégio Militar. Prestei a prova, sabendo que eu era o único candidato. Primeiro: uma prova escrita de Química e depois, teria uma prova didática. Era uma prova extensa que incluía dois ou três problemas, envolvendo trabalhosos cálculos estequiométricos. Não havia ainda calculadoras eletrônicas e com as réguas de cálculos nunca tivera significativas habilidades. Faltava uma meia hora para terminar a prova. Então o Professor XYZ, um dos professores de Química do Colégio Militar e meu ‘colega’ em outra instituição, disse: ”Vamos ter que encerrar isso mais cedo. Deixa os problemas apenas indicado, já que és candidato único. Dias depois, por telefone, busquei me informar acerca da data da prova didática, soube do resultado. Ouvi algo como: “Ficaste com 6,5 (precisava 7,0 para poder fazer a prova didática) pois não concluíste os problemas!”
Nunca mais me lembrara disso. Quando contei depois o episódio para a Gelsa, ela também o desconhecia, pois em nossos 23 anos juntos nunca me ocorrera mencionar a atitude de um colega que não me queria fazendo concorrência para ele.
Talvez tenha sido muito bom. Ou como diria minha mãe fora providencial, pois Deus quando fecha uma janela, logo abre uma porta. Logo em seguida tornei-me professor de Química Geral e Inorgânica na Faculdade de Filosofia da UFRGS na vaga gerada com aposentadoria do Professor Bernardo Geisel, depois viria ser o Patrono do Diretório Acadêmico do Curso de Química da UFRGS. Bernardo Geisel era irmão de General Ernesto Geisel, um dos presidentes militares da ditadura de malfadada memória. [...]
Até aqui os excertos, aos quais não vou aditar nenhum comentário. Trago agora algo de ontem.
Realmente o episódio antes descrito estava obliterado há mais de 40 anos. Ele fora ressuscitado quase ao acaso em fevereiro sem nada ter que ver com meu retorno de ontem a mesma escola. Esse se deveu ao Cap. Queiroz, doutor em Historia pela USP, que assistira uma fala minha em Osório em abril. Assim essa volta foi quase ao desconhecido, pois não encontrei um vestígio do passado.
Devo confessar que estava nervoso antes de começar a fala. Na lâmina de abertura, que tanto revisara e que estava aberta antes de começar a fala havia um erro no título que me infelicitava [Das disciplina à indisciplina: um caminho ao avesso]. Havia pelo menos duas razões para um ‘cancheiro’ em palestras se atrapalhar: uma minha recente trazida acerca do ensino de História do Brasil militarmente enviesado sobre a ditadura militar e outra falar de indisciplina em uma instituição ícone do disciplinamento. Acerca da segunda, defendi que estava falando da indisciplina do conhecimento e não da disciplina dos corpos de que trata, por exemplo, Foucault.
Essa segunda situação foi reforçada ao ver os rituais de minha recepção, da instalação dos trabalhos, no aguardo respeitoso do Coronel Antonio Augusto Vianna de Souza, Comandante do Colégio e que foi recebido com honras militar (todos se levantam a sua entrada) até as formalidades de apresentações.
Depois de um começo trôpego, deslanchei vendo um auditório muito atento de mais de 100 professoras e professores militares e civis, uns e outros em sua maioria envergando guarda-pós alvíssimos com insígnias. Havia vários que haviam sidos meus alunos, alguns inclusive dos temos de cursinhos pré-vestibulares nos anos 60s. Fui especialmente indisciplinado no uso do tempo, mas nisso tive o beneplácito prévio da Tenente Alice e da Tenente Sharlene da Supervisão Escolar.
Mesmo que em meus tempos universitário chamávamos a instituição de ‘fábrica de gorilas’ no momento eu era o ator principal atenciosamente acolhido no chamado "Colégio dos Presidentes’ pois, como me ensina a Wikipédia, ali transitaram, como alunos, oficiais ou praças, sete presidentes da república (Getúlio Vargas, Eurico Gaspar Dutra, Humberto de Alencar Castelo Branco, Artur da Costa e Silva, Emílio Garrastazu Médici, Ernesto Geisel e João Baptista de Oliveira Figueiredo), além de um primeiro-ministro (Francisco de Paula Brochado da Rocha), um vice-presidente (Adalberto Pereira dos Santos) e vários heróis militares brasileiros. Também foram eminências da vida civil em todos os campos do conhecimento, como o poeta Mário Quintana, o artista plástico Vasco Prado, o ex-reitor da UFRGS José Carlos Ferraz Hennemann. Vale recordar que também foram alunos do CMPA Luís Carlos Prestes, líder comunista e Carlos Lamarca, guerrilheiro, morto em luta contra o regime militar no ano de 1971. Mesmo que mais recentemente o colégio admita meninas seu panteão de ex-alunos é exclusivamente masculino.
O Colégio Militar de Porto Alegre (CMPA) é uma instituição militar de ensino, voltada aos Ensinos Fundamental (6º ao 9º ano) e Médio com mais de mil alunos. Localizado na zona central de Porto Alegre, o "Colégio Casarão da Várzea", como também é conhecido, é uma das mais tradicionais e reconhecidas instituições de ensino do país, prestes a completar 100 anos.
O portentoso prédio em que funciona, sem dúvida nenhuma, faz parte do patrimônio histórico da cidade de Porto Alegre. A bela arquitetura que o caracteriza, onde predomina o estilo neoclássico. As estátuas de Marte/Ares (deus da guerra) e Minerva/Atena (deusa guerreira da sabedoria), existentes no seu frontispício, são as maiores estátuas de adorno de Porto Alegre.
O torreão existente sobre o Salão Nobre do CMPA é chamado de torre-lanterna, ou simplesmente de lanterna, tendo sido colocado para simbolizar "a lanterna do saber com que os antigos Mestres conduziam seus discípulos pelas trevas da ignorância". A iluminação colocada em fins de 2006, ressaltando a lanterna, os deuses e a Bandeira Nacional, tornou-se um espetáculo noturno na cidade.
Ao final da palestra participei de uma confraternização de final do primeiro semestre, onde o Coronel comandante, que assistira à palestra na primeira fila, na fala de abertura da festividade referiu a importância de minha presença no Colégio.
Assim um registro de mais uma das emoções de uma das falas deste movimentado ano. À noite, as aulas com a turma da Filosofia foram gostosa sobremesa à tarde com emoções. Com votos de uma muito boa quarta-feira o convite para nos lermos amanhã.
Bom dia Proessor!
ResponderExcluirEstava ansiosa por esta postagem de hoje e, confesso que curiosa acerca de suas 'sensações' sobre o Colégio Militar. Trabalho em duas Unidades dos mesmos aqui em Goiânia: o Ayrton Senna, que já estou há 8 anos[desde que a instituição se tornou militar, rss.Os alubos dizem que vou acabar me tornando patrimônio históricoo da escola, rsssss!Maldade!!Rsss!], a outra unidade é o Polivalente Modelo Vasco dos Reis, na qual entrei este ano, praticamente, pois anteriormente só trabalhava com substituições por lá.
É um ambiente pelo qual sou apaixonada e, ao menos aqui em Goiânia, uma parceria que tem dado muito certo!Principalmente em relação à questão disciplinar, como o senhor falou, e a organização que, bem sabemos são ímpares em qualquer instituição de ensino!
É triste ver a situação pela qual o senhor passou quando da tentativa de ingressar na unidade de Curitiba, no entanto, infelizmente sabemos que estamos rodeados desse tipo de 'gente' em nosso dia-a-dia.Mas, como o senhor mesmo disse:Portas se fecham, janelas se abrem!
=D
Uma ótima e abençoada quarta-feira, Mestre!
Muito obrigado querida colega Thaiza,
ResponderExcluirescrevi imaginando que o tema te envolveria, só não sabia que trabalhavas em dos Colégios Militares. Aliás, não sabia que houvesse em uma mesma cidade (Goiânia) duas unidades de CMs. Algo que deve distinguir essa rede é realmente aquilo que trazes: a disciplina. Uma das mais significativas queixa de professoras e professores de Educação Básica é a rebeldia dos estudantes, Isso deve ser diferente nos CMs.
Uma pequena correção: o episódio que relato foi em Porto Alegre e não em Curitiba.
Uma vez mais obrigado por teu comentário,
attico chassot
Ah sim!
ResponderExcluirPerdão pelo equívoco!
Mas em relação às unidades de Colégios Militares aqui em Goiás, são 6 no total [por enquanto]:
3 aqui em Goiânia, 1 em Itumbiara, 1 em Rio Verde e 1 em Anápolis.
=]
Mais uma vez, me desculpe pelo erro...
Thaiza querida,
ResponderExcluirobrigado pelas informações. Desconhecia esses dados,
Afagos
attico chassot