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segunda-feira, 14 de junho de 2010

14* Newton, Einstein e Deus

Porto Alegre Ano 4 # 1411

Iniciamos já a terceira semana junina onde as festas aos santos de culto milenar são ofuscadas, pelo menos no Brasil, pelo tributo de loas aos deuses do futebol. Mas como disse ontem, esse é um assunto que merece tanto espaço em todas as mídias que aqui não terá vez.

Como nos dois domingos anteriores, que sucederam a viagens, ontem foi um dia de ficar em casa. Houve muita leitura de jornais. Faço hoje a oferta de uma.

Os ouvintes de minhas palestras têm ouvido, quando comparo Religião e Ciência – entre diferentes óculos para lermos o mundo – que mesmo que estes dois tenham exigências muito distintas – fé e razão – que não se prognostica um choque entre o racionalismo científico e a autoridade da fé. Ao contrário, proponho que se possa pensar em uma não dicotomia. Não seria aqui o espaço privilegiado das religiões para o chamamento à concórdia e à recordação de princípios éticos. Assim: à Ciência estaria reservado o papel de explicar e transformar o mundo e às religiões, entre outras práticas que lhes são funções históricas, como a re-ligação dos humanos ao divino, estaria destinado, juntamente com outros grupos organizados de movimentos sociais, garantir que essas transformações sejam para melhor.

Parece pouco? Ao contrário, é muito. São utopias, que sofrem contestações, especialmente dos fundamentalistas. Neste domingo, na Folha de S. Paulo, há um artigo de Marcelo Gleiser que titula esta blogada. Ele é professor de física teórica no Dartmouth College, em Hanover (EUA), e autor do livro "Criação Imperfeita". Mais de uma vez já esteve presente neste blogue. Assim, hoje ofereço o artigo que destaca que os dois gigantes da física tinham uma relação íntima com certa versão do que se costuma chamar de Deus. Eis o texto completo, com ilustrações que acrescentei.

Talvez isso surpreenda muita gente, mas tanto Newton quanto Einstein, sem dúvida dois dos grandes gigantes da física, tinham uma relação bastante íntima com Deus.
É bem verdade que o que ambos chamavam de "Deus" não era compatível com a versão mais popular do Deus judaico-cristão.
Numa época em que existe tanta disputa sobre a compatibilidade da ciência com a religião, talvez seja uma boa ideia revisitar o pensamento desses dois grandes sábios.
No epílogo da edição de 1713 de sua obra prima "Princípios Matemáticos da Filosofia Natural" (1686), Newton escreve que o seu Deus (cristão, claro) era o senhor do Cosmo e que deveria ser adorado por estar em toda a parte, por ser o "Governante Universal". Essa visão de Deus pode ser considerada panteísta, se entendermos por panteísmo a doutrina que identifica Deus com o Universo ou que identifica o Universo como sendo uma manifestação de Deus.
A visão que Einstein tinha de Deus, devidamente destituída da conotação cristã, ecoava de certa forma a de Newton. Einstein desprezava tudo o que dizia respeito à religião organizada, em particular a sua rígida hierarquia e ortodoxia.
Para ele, um Deus que se preocupava com o destino individual dos homens não fazia sentido. Sua visão era bem mais abstrata, baseada nos ensinamentos do filósofo Baruch Spinoza, que viveu no século 17.
Numa carta dirigida a Eduard Büsching, de 25 de outubro de 1929, Einstein diz: "Nós, que seguimos Spinoza, vemos a manifestação de Deus na maravilhosa ordem de tudo o que existe e na sua alma, que se revela nos homens e animais".
Em 1947, numa outra carta, Einstein escreveu: "Minha visão se aproxima da de Spinoza: admiração pela beleza do mundo e pela simplicidade lógica de sua ordem e harmonia, que podemos compreender".
Como essas posições podem ser usadas no debate sobre a compatibilidade da ciência com a religião?
De um lado, ateus radicais como Richard Dawkins, Christopher Hitchens e Sam Harris argumentam que não pode haver uma compatibilidade, que a religião é uma ilusão que precisa ser erradicada, que o sobrenatural é uma falácia.
De outro, existem vários cientistas que são pessoas religiosas e até mesmo ortodoxas, e que não veem qualquer problema em compatibilizar seu trabalho com a sua fé. O fato de existirem posições tão antagônicas reflete, antes de mais nada, a riqueza do pensamento humano. Nisso, vejo um ponto de partida para uma possível conciliação.
É verdade que o ateísmo radical está respondendo a grupos fundamentalistas que tentam evangelizar instituições públicas. "Guerra é guerra e devemos usar as mesmas armas", ouvi de amigos. Mas o pior que um fundamentalista pode fazer é transformar você nele.
Einstein e Newton encontraram Deus na Natureza e viam a ciência como uma ponte entre a mente humana e a mente divina.
Para eles, adorar a Natureza, estudá-la cientificamente, era uma atitude religiosa. Acho difícil ir contra essa posição, seja você ateu ou religioso. Religiões nascem, morrem e se transformam com o passar do tempo. Mas, enquanto existirmos como espécie, nossa íntima relação com o Cosmo permanecerá.

Permito-me ratificar que muitos de meus ouvintes já me ouviram fazer as mesmas críticas a Richard Dawkins.

Reconheço que o autor de “Deus é um delírio’ – um dos maiores best-sellers mundiais – é um dos maiores darwinistas, porém a sua militância ateísta fundamentalista, termina dando-lhe feições de um fanático (anti-)religioso. Ela já foi objeto aqui por sua militância, por exemplo na campanha dos ônibus que falam da não existência de Deus e associam isso ao ‘desfrutar’ a vida (desregradamente). Uma crítica não muito diferente fiz a Saramago – dos intelectuais que mais admiro – quando resenhei aqui Caim, seu último livro. Na expectativa que tenham apreciado Newton, Einstein e Deus, adito meus votos de uma muito boa segunda feira.

9 comentários:

  1. Bom dia, Professor!

    [Esta discussão sobre ciência, conhecimento me empolga]

    Bom, se diz que as religiões são ilusórias, mas a Ciência também provoca entre os leigos, incluindo a mim, um efeito de ilusão: ninguém entende mas respeita e a compreende como a dona das verdades do mundo. E diferente das religiões, suas verdades são bem mais transitórias e passíveis de questionamentos, não?

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  2. Querida Marília,
    o assunto é empolgante pois polêmico. Sempre que nossas certezas são abaladas nos atrapalhamos. Lembra do Ilya Prigogine – Nobel de Química 1977 – só tenho uma certeza: as minhas incertezas.
    Obrigado pelo prestígio que dás a este blogue,
    attico chassot

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  3. não só por ser polêmico, nem toda polêmica merece empolgação, mas por que me preocupa que como professora possa estar na posição de receptora e transmissora passiva destes dogmas.

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  4. Querida Marília,
    tu como filósofa jamais será uma receptora/transmissora passiva.
    Teu ser crítico será um facilitador para delinear divisores de água e definires óculos para olhares o mundo.
    Um afago com carinho do
    attico chassot

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  5. Un tema que sin duda merece de profundización para la humanidad como especie que es consciente de su evolución colectiva.
    En Uruguay, desde 1875 se dio un salto cualitativo en este tema tan sensible, cuando se logró diferenciar la definición de Laicidad de la definición de Laicismo.
    Un Estado Laico era interpretado como un Estado en donde había que no tratar temas que "eran controversiales, fueren de carácter religioso, político, étnico, etc.
    Sin embargo, con aportes como el de José Pedro Varela, y posteriormente Carlos Vaz Ferreira, se construye el principio del laicismo, interpretado en un sentido en donde el principio de la autonomía de las actividades humanas, o sea la exigencia de que tales actividades se desarrollen según reglas propias, que no le sean impuestas desde fuera.
    Para quien desee un exposición un poco más extensa sobre el tema, tengo a disposición un artículo del profesor Julio Cano, profesor de filosofía de Enseñanza Secundaria, actualmente investigador de la denominada filosofía ecológica.(enzofag@gmail.com)
    Para terminar, dentro de la tolerancia que debemos tener por quienes piensen diferente y al menos no pongan en peligro a quienes pensen antagónicamente, el problema de las religiones, quizá tratado en el Tratado de Ateología de Onfray, pueda citarse en un poema de Leon Felipe: "Parábola".
    Parábola


    "Más Él hablaba del templo de su cuerpo " San Juan, II:21.
    "Y tomé el libro de las manos del ángel y me lo comí." Apocalipsis X: 9,10

    Había un hombre que tenía una doctrina.
    Una doctrina que llevaba en el pecho(junto al pecho, no dentro del pecho),
    una doctrina escrita que guardaba en el bolsillo interno del chaleco.
    Y la doctrina creció. Y tuvo que meterla en un arca, en un arca como la del Viejo Testamento.
    Y el arca creció. Y tuvo que llevarla a una casa muy grande. Entonces nació el templo.
    Y el templo creció. Y se comió al arca, al hombre y a la doctrina escrita que guardaba en el bolsillo interno del chaleco.
    Luego vino otro hombre que dijo:
    El que tenga una doctrina que se la coma, antes de que se la coma el templo;
    que la vierta, que la disuelva en su sangre,
    que la haga carne de su cuerpo...
    y que su cuerpo sea
    bolsillo, arca y templo.
    Saludos desde Uruguay a nuestro estimado Attico y sus visitantes de este Blog.

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  6. Muy apreciado colega y amigo Enzo,
    hoy ese blogue ha ganado un plus con tu estreno aquí. Tu tan precios comentario merece destaque. Ya que has citados textos bíblicos, permítame decirte que no se haciende una vela para ponerla en bajo de la mesa y si en un puesto más alto, para más distante leve su luminosidad. En la blogada de mañana convidaré nuestros lectores a leerte.
    Por ora solamente:
    Muchas gracias, encantado.
    attico chassot

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  7. se deus nao existe por que a terra gira e voces se movimentam é ciencia o que ocorre é que ninguem acredita no ar que se respira por que nao o ver a vida se alimenta de ar,agua o universo deus ta entre e dentro de cada que se move todo tempo obrigado olhe o ceu esta a cima de ti e o chão abaixo de ti qual a novidade.

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  8. golfrei@hotmail.com a dispor

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  9. Meu caro ‘Frei Gol’
    é bom ver que uma edição com mais de um ano de publicação ainda não é lida. Não propus polêmica, fui utopista. Tu e eu usamos óculos diferentes para ler o mundo. Não tenho a pretensão de reconhecer qual é melhor. O teu (a religião) me encanta, mas não explica tudo. O meu (a Ciência) me instiga e também traz interrogação.
    Agora estou saindo para a Abadia de Westminster.
    Conheça algo sobre “Tesouros do Paraiso: santos, relíquias e devoção na Europa medieval” na edição de hoje do blogue
    Obrigado por teu comentário e aparece aqui de vez em vez
    attico chassot

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