Porto Alegre Ano 5 # 1495 |
Um bom assunto para começar esta semana atípica, numa segunda-feira, fazendo-se
vigília de feriado. Na última quinta-feira, físico-celebridade britânico Stephen Hawking aparentemente cansou de bancar o bonzinho com Deus. Em seu mais novo livro, ele afirma que o Criador é dispensável para explicar o Universo.
Parece paradoxal que a obra de Stephen Hawking, 68 anos, tenha recebido o nome enganoso de "The Grand Design" ("O Projeto Grandioso"), pois, junto com o físico e co-autor Leonard Mlodinow, o que ele faz no texto é negar a existência de um projeto divino para o Cosmos.
"Uma vez que existe uma lei como a gravidade, o Universo pode e vai criar a si mesmo a partir do nada. A criação espontânea é a razão pela qual existe alguma coisa no lugar de coisa nenhuma, a razão de nós existirmos. Não é preciso invocar Deus para que o Universo tenha um começo", escreveu a dupla.
Pretendera comentar ontem este assunto da semana, que me foi sugerido por leitora muito atilada, que escreveu, enviando o sítio de ‘El Universo’, de Guayaquil: Muy querido Profesor Chassot, para que conozca, tal vez un tema para un blog. Depois pensei que ‘no dia do Senhor’ o tema poderia parecer um desrespeito. Assim, isto é, hole, dia da Lua.
A notícia está em todos os lugares e em todos idiomas, tanto nos jornais do Ocidente quanto do oriente. The Times destaca no mesmo dia que faz manchete a não necessidade de Criador para o Universo que novo livro será publicado em Londres, uma semana antes de o Papa Bento 16 da visitar o Reino Unido para várias celebrações. Não com deixar de reconhecer uma grande jogada de mercadológica.
Uma leitora me disse, ao comentar o assunto, reconhecendo antecipadamente que ambos não conhecíamos física o suficiente para entender como – criação espontânea é a razão pela qual existe alguma coisa no lugar de coisa nenhuma, a razão de nós existirmos – :“isto para mim é tão a-científico quanto a presença de Deus criador!”. Concordei.
Bento 16 estará na Grã-Bretanha entre 16 de setembro e 19, visitando Londres, Glasgow e Coventry. Nesta visita, no dia 19 de setembro, beatificará o cardeal John Henry Newman (1801 – 1890), um reconhecido teólogo. Newman foi ordenado sacerdote da Igreja Anglicana, tornando-se uma das principais figuras do Movimento de Oxford, que procurou aproximar a Igreja Anglicana da Inglaterra de suas raízes católicas romanas. Então, ele considerava o anglicanismo de seu tempo excessivamente protestante e laicizado e considerava o catolicismo corrompido em relação às origens do cristianismo. Buscou uma "via intermediária" entre os dois, e, pesquisando sobre os primórdios da Igreja Católica, terminou por converter-se. Posteriormente nomeado cardeal pelo papa Leão 13 em 1879.
Não me pretendo condoer com o Papa. Esta sua ida ao Reino Unido que já era atribulada por pelo menos dois motivos, tem agora aditado (e aqui significando adicionar e não afortunar) um terceiro e recém surgida preocupação:
1) beatificar na Inglaterra um ex-líder do anglicanismo sobre o qual pesa suspeição (gostaria de sublinhar: suspeição) de homossexualismo – que a Igreja Romana vitupera! A afirmação de que o cardeal John Henry Newman poderia ter mantido uma relação ‘um pouco mais que amistosa’ com seu assistente, o sacerdote Ambrose St John não tem fundamento, segundo a ZENIT – www.zenit.org uma agência de notícias internacional ligada ao Vaticano –. O principal biógrafo do cardeal inglês, Ian Ker, contesta a possibilidade em um artigo publicado pelo jornal L’Osservatore Romano, respondendo a declarações de lobbies homossexuais. A polêmica se desatou com a decisão do governo britânico, de permitir a exumação do corpo do cardeal visando à sua futura beatificação, já que Newman pediu para ser enterrado junto a seu assistente, o sacerdote Ambrose St. John. Para Ker, esta última vontade do cardeal não constitui uma prova de sua homossexualidade. O biógrafo de Newman recorda que Ambrose St John, que se converteu do anglicanismo junto com Newman, foi muito amigo do cardeal e esteve a seu serviço durante 30 anos. A mim já parece de mau tom beatificar alguém que trocou a Igreja Anglicana pela Igreja Romana, na pátria anglicana.
2) escritores Richard Dawkins – aqui já mais de uma vez comentado: autor de Deus é um delírio e acerca das frases ateísta nos ônibus – e Christopher Hitchens, dois importantes ateus britânicos, planejam uma emboscada legal para prender o Papa durante sua visita à Grã-Bretanha. Eles defendem que Bento 16 deve ser detido e julgado por “crimes contra a humanidade” e acreditam que pode usar o mesmo princípio legal usado na prisão do ex-ditador chileno Augusto Pinochet quando ele visitou o país em 1998. Os dois alegam que o pontífice “não é imune à prisão no Reino Unido” porque, apesar de ser o chefe do Vaticano, não é um chefe de Estado reconhecido pela ONU. Em resposta, o porta-voz do Vaticano, Federico Lombardi, ridicularizou a possibilidade de que o Papa seja preso quando visitar o Reino Unido, em setembro. Um advogado de Dawkins disse em Londres, que tentará fazer com que o pontífice seja detido para ser interrogado sobre as acusações de que a Igreja teria acobertado casos de abusos sexuais de crianças por padres. É uma ideia no mínimo bizarra. Parece que a intenção é chamar a atenção da opinião pública. Acho que eles deveriam procurar algo mais sério e concreto antes de respondermos - disse Lombardi. Devo dizer que adiro ao porta-voz. Mais uma vez reafirmo que me desagradam os ateus que fazem militância de sua ‘fé’.
3) e como se não bastasse, há o livro de Hawking, que faz estardalhaço. A imprensa britânica chegou a pintar o livro como uma virada de casaca. "Parece que levaram ao pé da letra a afirmação dele sobre Deus na obra "Uma Breve História do Tempo", de 1988", diz o físico Leandro Tessler, da Unicamp. Nesse best-seller, Hawking disse que entender as leis do Universo seria como ler "a mente de Deus". Mais tarde, porém, deixou claro que se tratava de uma metáfora e afirmou que não era religioso. Quase totalmente paralisado e com fama de gênio, Hawking tem aura de profeta da ciência, mas não há nada de realmente novo no que escreveu. Claro que tudo são conjecturas que o livro promete. Aguardemos.
Preocupar-nos com a visita do Papa ao ‘vaticano do anglicanismo’ pode ser um bom assunto para uma segunda-feira que para alguns brasileiros está imersa em feriadão. Como serão seus sermões? Contestará Hawking? Provavelmente dirá em uma de sua homílias, a guisa de resposta: Desejo recordar, que há exatos 12 anos, em 14 de setembro de 1998, meu antecessor, o memorável Papa João Paulo 2º em sua muito ainda oportuna encíclica “Fides et Ratio, lembrava: "A Fé e a Razão (fides et ratio) constituem como que duas asas pelas quais o espírito humano se eleva para a contemplação da verdade. Foi Deus quem colocou no coração do homem o desejo de conhecer a verdade e, em última análise, de o conhecer a ele, para que, conhecendo-o e amando-o, possa chegar também à verdade plena sobre si próprio". Se pudesse, então, assoprar algo ao ouvido ao ouvido de Bento 16, diria de minhas lembranças da infância, quando com uma machadinha, cuidadosamente cortava as penas de uma das asas das galinhas para que elas não mais voassem da ‘encerra’. Com asas dispares ela não mais podiam voar. Fé e razão, me parecem, salvo meus desconhecimentos teológicos, asas muito díspares. Mas como o papa não me ouve ele conclui solene sua prédica: Assim seja! E a imensa massa humana é convidada a recitar e meditar o Credo, pois nele estão verdades eternas e estas permanecem para sempre.
Aguardemos os próximos dias. Por ora: uma muito boa segunda-feira!
Agora, há uma alternativa: Comentar como ANÔNIMO. Neste caso, se pede para assinar e colocar o endereço eletrônico.
Mestre!
ResponderExcluirEste assunto de Deus me chama atenção...nossa cabeça esta moldada pela nossa educação na fé...como é dificel pensar diferente, mas ao mesmo tempo muito instigante,li e releio o livro Uma breve historia do tempo...muito dificel...mas é....agora vem outro...
Não sei se estou tendo uma visão equivocada...mas como podemos comentar este assunto numa esfera ainda restrita...a grande maioria tem visão pequena sobre o assunto Deus....
Elzira.
Bom dia Professor!
ResponderExcluirQue situação complicada...
"A criação espontânea é a razão pela qual existe alguma coisa no lugar de coisa nenhuma, a razão de nós existirmos."
Sinto em não concordar...apesar de não ter embasamento para provar nem que sim, nem que não...ainda prefiro minhas crenças; apesar de ser curiosa o suficiente para comprar um exemplar e me inteirar acerca do mesmo.
Bom início de semana!
Muito querida Elzira,
ResponderExcluirrealmente o assunto é complexo. É significativo que quando escrevi esta blogada me imaginei tu a lendo, pois lembro de vezes anteriores quando trouxe esse assunto, que sempre te envolveste.
Tive/tenho as mesmas dificuldades que tu com o “Uma breve história do tempo”. Teu comentário de hoje me remete a David Hume (1711-1776) filósofo e historiador escocês. O iluminista nos recorda que:
“Se acreditamos que fogo esquenta e a água refresca, é somente porque nos causa imensa angústia pensar diferente”
Muito obrigado pelo teu precioso comentário e uma boa curtição do feriado adventício.
attico chassot
Muito querida colega Thaiza,
ResponderExcluirtrago ao teu comentário aquela que escrevi há não muito a Elzira, uma leitora muito especial, que pode voltar a postar comentários graças a tua ajuda, no deslinde do ‘anônimo’: Me remetes a David Hume (1711-1776) filósofo e historiador escocês. O iluminista nos recorda que:
“Se acreditamos que fogo esquenta e a água refresca, é somente porque nos causa imensa angústia pensar diferente”
Aguardemos o livro e tentemos deslindar mistério.
Há diferentes para olharmos o mundo natural. Podemos fazê-lo com os óculos das religiões, dos mitos, da ciência, do senso comum, do pensamento mágico, dos saberes primevos...
Não afirmamos qual desses mentefatos culturais é o melhor e tampouco que haja a necessidade de nos valermos apenas de um deles.
Espero que possas curtir esta véspera de feriado vivendo teus credos.
attico chassot
Olá Professor,
ResponderExcluirConcordo com os comentários, pois este é um assunto muito delicado. Ainda penso que somente a ciência não é capaz de explicar tudo que nos cerca. Talvez seja imaturidade minha sobre o assunto mas...
Como disse exemplificando com a frase de David Hume é muito difícil para uma sociedade que pensa dessa forma há muito tempo mudar completamente o pensamento, mas também será neste livro ele conseguirá provar mesmo esta ideia?
Abraços
Maria Helena
Muito querida Maria Helena,
ResponderExcluirtenha presente que a Ciência é um dos óculos para lermos o mundo. Vi que leste os comentários que fiz para a Thaiza e para a Elzira. Davi Hume nos ajuda um pouco.
Um afago e obrigado por teu comentário
attico chassot
Boa noite, mestre Chassot,descobri a pouco tempo que quanto nenos acredito em Deus, mais passo a acreditar em mim, em minhas possibilidades de ser cada dia melhor, enquanto pessoa e aprendiz que sou.
ResponderExcluirAbraços Mateus de Andrade Rio do Sul- SC.
Meu prezado colega Mateus,
ResponderExcluirprimeiro celebro teu retorna a este blogue. Recordo minha passagem por Rio do Sul há quase um ano.
Realmente o assunto é complexo. Digo que ser ateu tem pelo menos duas marcas. É necessária uma conversão. Ao nascer trazemos um DNA religioso ou de crente. A conversão que tu vives tem essa dimensão muito significativa. Segundo, é uma situação solitária (enquanto as igrejas são solidárias).
Certamente leste as respostas que dei a Elzira e a Thaiza, citando David Hume.
Um afago celebrando teu comentário.
attico chassot
Li e reli este post (uma vez pela manhã e outra pela tarde) e encontro dificuldades em tecer um comentário significativo, dada a complexidade do tema.
ResponderExcluirMas, arrisco compartilhar alguns sentimentos.
Então hoje pela manhã, ao abrir a porta -após ler o post, olhei para o jardim da casa da minha mãe. Percebi ele de uma foram diferente, senti-me emocionado e leve, admirado com a beleza do verde e das flores que aos poucos começam a se preparar. E aí penso, porque toda essa "briga" com a exitência ou não de um deus, é uma dimensão que nos escapa. Meu encanto para com a natureza e com a vida, me faz acreditar cada vez mais nele. Que mania de deus tem o homem.
Professor Chassot, convido-o a uma visita na cabanadolui.blogspot.com
*Desculpe a falta de cientificidade no comentário.
Forte abraço e parabéns pela ótima postagem.
Desejo de um bomd escanso neste feriado que se aproxima.
Ass. Luís Dh.
Muito estimado colega Luis,
ResponderExcluirvisitei um pouco o jardim de tua mãe na Cabana do Luis. Lindo... Ante o extasiar com o mesmo me parece muito natural que alguém use os óculos da religião para contemplá-lo e ver um Deus ou uma Deusa (não teria sido obra de Ceres?) ou Deuses para criá-lo. Outros poderão vê-lo como diferentes mutações genéticas que produziu maravilhas. É tudo uma questão de óculos...
Um muito bom feriado
attico chassot