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quarta-feira, 23 de março de 2011

23.- No coração da matéria -- TRÊS

Porto Alegre * Ano 5 # 1693

Uma vez mais a postagem desta edição ocorre quando cheguei há não muito das aulas de Conhecimento, Linguagem e Ação Comunicativa para um grupo de licenciatura em Educação Física e em Filosofia. Parece natural, que tão logo chegue das aulas, esteja excitado intelectualmente, revisando inclusive tópicos que, como esta noite, saíram menos satisfatórios.

Como planejamos na segunda-feira, hoje ocorre a terceira das quatro edições segmentadas do texto No coração da matéria escrito por Cássio Leite Vieira, publicado na edição dominical da Folha de S. Paulo de 20 de março. Hoje são apresentadas algumas analogias da relação raio do átomo e raio do núcçro que são clássicas e que muito usei enquanto professor de Química geral.

Na trazida do segmento de hoje adito meus votos de uma muito boa quarta-feira. E um convite para um encontro amanhã aqui.

TRANSMUTAÇÃO A dupla Rutherford e Soddy não demorou a apresentar resultados surpreendentes sobre a radioatividade. Um deles: a emissão de radiação fazia com que um elemento químico se transformasse em outro. Ganhou o nome de "transmutação nuclear", teoria que derrubava outra propriedade atribuída ao átomo ainda na Antiguidade: a indestrutibilidade.
A transmutação cheirava a alquimia -na época, já morta e enterrada-, e Rutherford foi cuidadoso em buscar apoio para a ideia junto a químicos de renome, como o britânico sir William Crookes. Com base nessa teoria, calculou a idade de rochas em bilhões de anos, desmontando assim argumentos geológicos, biológicos e religiosos sobre a idade da Terra.
Esses e outros resultados (por exemplo, a descoberta do gás radônio) lapidaram a imagem científica e pública de Rutherford -que se tornou o "Sr. Radioatividade"-, reforçada pela publicação, em 1904, de seu clássico "Radio-Activity". No início do século, sua fama ultrapassava a de Henri Becquerel, o descobridor da radioatividade, e do casal Pierre e Marie Curie, que haviam descoberto dois novos elementos radioativos, o polônio e o rádio. O trio recebeu o Nobel de Física em 1903. Inicialmente, Rutherford os tinha como adversários. Mais tarde, desentendeu-se com Becquerel; com os Curie manteve amizade e admiração mútua, especialmente com Marie.

Os resultados no Canadá renderam a Rutherford o Nobel de Química de 1908. Química? Sim, pois o assunto radioatividade, para o comitê do prêmio, pertencia a essa área. Rutherford resumiria a situação com humor: "Lidei com várias e diferentes transformações em diversos períodos, mas a mais rápida com que me defrontei foi a minha própria transformação de físico em químico". Embutida na frase, há seu preconceito em relação à química -para ele, ciência "malcheirosa". Por sinal, classificava todos os outros ramos das ciências naturais como "coleção de selos".

RUMO AO NÚCLEO O esforço e a perseverança de Rutherford se evidenciaram naquele ano e meio em que ele se debruçou sobre os resultados obtidos pelo físico neozelandês Ernest Marsden entre 1909 e 1910. A ideia do experimento, baseado no bombardeio de uma folha finíssima de ouro com partículas alfa (núcleos de hélio) havia nascido de observação um tanto desconfiada de um experimento anterior, no qual um feixe semelhante de partículas, depois de atravessar uma folha fina de mica, formava, em um anteparo, uma mancha difusa, um borrão. A intuição indicava, com base no que se concebia ser o átomo e as partículas alfa (estas últimas, para Rutherford, "gigantescas" como átomos), que o feixe não sofreria esses desvios.

O mistério permaneceu com Rutherford até que ele e seu assistente, o físico alemão Hans Geiger, resolvessem atacar a questão na Universidade de Manchester, na Inglaterra, para onde Rutherford havia se transferido, ocupando a vaga deixada especialmente para ele pelo físico anglo-alemão Arthur Schuster. Para a tarefa, designaram Marsden, aos 20 anos de idade. A engenhosidade -lançar partículas contra um alvo- foi tamanha que o experimento até hoje é o princípio para perscrutar o interior do átomo.
As partículas alfa vinham de uma fonte radioativa e, transformadas em feixe, eram lançadas contra a finíssima folha de ouro (de 0,00006 centímetro), que estava circundada por uma tela cintilante. A maioria das partículas alfa, viajando com velocidade comparável à de uma bala de fuzil, atravessavam a folha de ouro, quase sem se desviar da trajetória original. Algumas sofriam desvios maiores, atingindo a tela em pontos diversos, que brilhavam com a colisão.

Mas – e aí está o que Rutherford macerou mentalmente por um ano e meio- uma em cada 20 mil partículas, em média, ricocheteava de volta em direção à fonte emissora. Os cálculos finais de Rutherford sugerem uma caligrafia trêmula – talvez, uma reação àquilo que ele começava a entender: toda a massa atômica estava concentrada num caroço central, responsável por desviar ou mesmo rebater de volta as partículas alfa. O átomo, portanto, era um grande vazio. Sintetizou a espantosa conclusão afirmando que seria como se canhões de grosso calibre atirassem contra uma folha de papel e os projéteis voltassem em sua direção.

O núcleo era diminuto (cerca de 0,0000000000001 centímetro), ou seja, o diâmetro atômico teria aproximadamente 10 mil vezes o tamanho do núcleo. Se o átomo tivesse o diâmetro do Maracanã, o núcleo teria mais ou menos o tamanho da cabeça de um alfinete. Se juntássemos todos os núcleos dos átomos que compõem o corpo humano, eles não seriam maiores do que um grão de areia.

O modelo atômico nuclear de Rutherford desbancou aquele idealizado por Lorde Kelvin e aperfeiçoado por Thomson, o chamado "pudim de passas", no qual os elétrons seriam "passas" incrustadas em uma "massa" de carga elétrica positiva. Esse tipo de átomo, pela disposição de seus elementos, não explicava por que as partículas alfa batiam contra a folha de ouro e voltavam.
O modelo de Rutherford não recebeu muita atenção, mas deu início à viagem da ciência rumo ao centro da matéria. E, de certa forma, confirmou as ideias de 1903 do físico japonês Hantaro Nagaoka – citado por Rutherford –, cujo átomo tinha um núcleo gigante, rodeado por elétrons, lembrando os anéis de Saturno.

2 comentários:

  1. MARIA LÚCIA,de Curitiba, escreveu:
    "Prezado Mestre, conhecia do meu segundo grau (como era chamado na época) o experimento de Rutherford e achava-o maravilhoso. E, conhecer um pouco da história de seu idealizador é muito bom. A história da ciência é importante ser conhecida por nós e principalmente pelos jovens. Passamos a vê-los também como os pessoas, não como gênios ou pessoas lunáticas.
    Mestre, minhas saudações pelos 50 anos de magistério, creio que serei desculpada pelo atraso, já que nós leitores devemos comemorar e lembrar este feito todos os dias.
    Abraços,
    Malu."

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  2. Muita querida Maria Lúcia,
    realmente enquanto professor me encantava descrever o surpreendente da experiência de Rutherford: “como se uma bala de canhão tivesse sua trajetória alterada por bater em um mosquito!” Imagina a teatralidade que conferia a esta descrição.
    **** Aproveito para registrar que os textos em CAIXA ALTA independem deste editor. ***
    Obrigado pelos teus queridos cumprimentos.
    Um afago emocionado do
    attico chassot

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