ANO
7
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Frederico Westphalen
/
Porto Alegre
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EDIÇÃO
2474
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Esta edição
circula quando estou partindo rumo à Porto Alegre. Ela faz a clausura de meu tríduo
missioneiro (e missionário, segundo alguns) que nos últimos três dias levou-me
a sucessivamente à São Luiz Gonzaga / Cerro Largo / Frederico Westphalen.
Pela agenda
cumprida (e comprida) é dispensável justificativa para não trazer uma usual
dica de leitura sabática. Mas não deixo o espaço em branco. A inspiração:
quarta feira à tarde, antes de minha fala para professores do ensino
fundamental, promovida pela 32º CRE de São Luiz Gonzaga, no espaço cultural, a
professora Alice Moraes declamou uma laudação a algo usualmente esquecido. Impressionou-me
a originalidade do tema. Teço com texto de Pablo Morenno esta blogada.
Com votos de
frutuoso sábado, o poema também antecipa votos às mães pelo dia de amanhã.
Afinal foram elas que nos legaram o sinal de beleza agora aqui cantado:
O UMBIGO
Detenha-se um
instante. Se for homem, abra a camisa. Se for mulher, desabotoe o vestido,
levante a blusa. Se as gorduras atrapalharem, use um espelho. Se mesmo assim
for impossível, solicite ajuda. Há algo imprescindível para a felicidade, algo
a ser feito urgentemente pela vida: você tem de ver seu umbigo. Quer dizer,
olhá-lo simplesmente é pouco. É preciso mais. Muito mais. Faça um filme, tire
fotografias, elabore uma maquete. Seu umbigo, como você, é único.
Analise-o como
a uma conta a ser paga. Pense nele como se pensa em grandes investimentos.
Admire-o como um agricultor ao céu nublado em tempos de semeadura. Dedique-se a
ele como algumas mulheres à cútis, como alguns homens aos músculos. De hoje em
diante, dedicar-se ao umbigo deixa de ser mesquinhez.
Nestes tempos
econômicos, do umbigo dependem a alegria e a esperança. O amor. O paraíso exige
reconstrução. Adão e Eva já tiveram suas chances. Eles não têm para onde olhar.
Nós, sim. Somos seres cortados de outros seres. Somos humanos originados de
outros. Temos procedência e o mapa das trilhas.
Procuram-se homens e mulheres construtores da
paz; eles precisam amar seus umbigos. Procuram-se homens e mulheres solidários,
generosos, entulhados de afeto; eles devem estar reconciliados com seus
umbigos. Procuram-se homens e mulheres ternos e tolerantes; de seus umbigos
devem ter resgatado as bagagens dos antigos navegantes.
Nestes tempos
econômicos, enxergar o próprio umbigo tornou-se rara oportunidade de
compreensão do todo. O umbigo é um espelho côncavo e convexo, uma lente para
perto e para longe. No umbigo há histórias e profecias. Primeiro, respiramos e
gritamos. Depois, nos cortaram do útero para o mundo. A cicatriz está ali para
exibir respostas complexas. O umbigo é a caixa-preta do voo humano.
O umbigo diz
muito sobre nossa natureza. Não somos ovíparos, por exemplo. Não fomos
engendrados fora, expostos às intempéries. Não precisamos ser salvos da boca de
lagartos e do bico de gaviões. Somos vivíparos, mamíferos. Fomos gerados num
ventre. Tivemos calor, afeto, cuidado. Estávamos ligados a alguém, recebemos
seu sangue e nutrientes. Ouvíamos sua voz antes mesmo de destrinchar o sentido
das palavras.
Se você até agora não olhou seu umbigo, anda
desinformado. Procure ler mais jornais, revistas, assista à televisão. O umbigo
está super na moda. (Não me refiro às calças de cós baixo.) O umbigo virou
assunto científico. As células do cordão umbilical guardam segredos. Podem
trazer a cura de doenças incuráveis até hoje e, com isso, prolongar a
expectativa de vida.
Olhe seu
umbigo atentamente. Você nunca mais será o mesmo. Não desista. Tente de novo.
Curve-se. Não se envergonhe. Faça-lhe uma reverência. Quanto maior a curvatura
para dentro, maior será a abertura para o universo. Faça um abdominal
reflexivo.
Pelo umbigo
tomamos consciência, tivemos ligados a alguém. Ela. Mulher. Mãe. Nos deu abrigo,
amor e alimento. Cortado o cordão umbilical, deu-nos seu peito, seu coração e
nos fez herdeiros de coisas e valores. O umbigo jamais será sinal de egoísmo,
ou símbolo de quem tem medo do mundo. Quem teve uma mãe e foi realmente amado
jamais olhará o umbigo para fugir da realidade ou para esquecer-se dos outros.
Limerique
ResponderExcluirPois eu cá pensando mesmo comigo
Nos acompanha do berço ao jazigo
Um buraco na barriga
Que quase ninguém liga
Essa cicatriz de nascenca, o umbigo.
Muito interessante o apelo metafórico do escritor na ode ao umbigo, embora na realidade acredito que o problema atual seja que a maioria só pense no próprio umbigo...
ResponderExcluirabraços
Antonio Jorge
Ao Grande Mestre Chassot: "Procuram-se homens e mulheres" respondo mestre eles estão tão atarefados com seus próprios problemas que estão perdendo a capacidade de se dar e de se doar aos outros,e até mesmo de perceber quem precisa de sua atenção. Será que perderam a sensibilidade de ver a vida? ou não consegue enxergar seu próprio umbigo? Um forte abraço ley
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