ANO
9 |
EDIÇÃO
3031
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Um feriado parece exigir um assunto mais
palatável. Peço que relevem uma carta-denúncia. Talvez eu esteja laborando em
interpretação equivocada. A situação talvez, seja do tipo “tomara que eu esteja
errado’:
Senhor Gerente da Rede ‘Seu melhor
Hotel’,
não sei bem começar. Esta é primeira vez
que escrevo para um gerente de hotel. Já preenchi várias avaliações em hotéis e
leio, vez ou outra, comentários de hóspedes. De vez em vez, até preencho estes
questionários solicitados na internet. O assunto que queria trazer-lhe, senhor
Gerente, não cabe no modelo de assinalar naqueles questionários: pouco satisfeito/ satisfeito/ muito
satisfeito. Até vou antecipar que gostei muito do hotel de Juruá, no qual me
hospedei há uns dias. Hotel novinho é outra coisa. Poucas vezes estive em
hotéis recém-inaugurados. Esta foi, talvez, a segunda. Outra foi no hotel
Machiavello em Florença. Mas, não foi só o novinho que me encantou no hotel que
o senhor gerencia: rede wifi muito boa, de fácil conexão e sem necessidade de toda
hora ter que pedir para conectar, tomadas em abundância e modernas, amenidades
generosas e de qualidade e um detalhe importante: toalhas espessas e macias
para complementar um banho maravilhoso. A cama era soberba. Maçãs disponíveis
na portaria, saborosas. E, mais especialmente, funcionários muito solícitos e dedicados.
Como o senhor pode ver, parece que não
tenho nada a reclamar do Açaí hotel de Juruá. Mas, tenho mais que um reclamo.
Podemos considerar que tenho uma denúncia. Sim, denúncia por sedução ou, talvez,
por abuso de poder.
A cada dia, encontrava um bilhete sobre o
criado-mudo — não sei se ainda se chama assim aquele móvel que acolhe tanta
coisa, como controles remotos, antídotos contra a mudez do móvel. A mensagem
vinha redigida em papel de qualidade, com decoração discreta e letras tipo
manuscrito, com este texto: A vida em um hotel é triste se ninguém se
preocupa com você. Eu me preocupo! Seguia uma
assinatura de próprio punho: Maria de Fátima. Talvez o senhor pergunte: Qual o motivo de denúncia? Muitos
hotéis avisam a seus clientes o nome da camareira para que o hóspede saiba a
quem se dirigir se precisar, por exemplo, mais um travesseiro.
No bilhete não tinha o nome do hotel.
Talvez, eu esteja indiciando quem não tem culpa. Se iniciativa do bilhete é
hotel, o departamento de marketing está mal assessorado, pois anunciar que a
vida em um hotel é triste é no mínimo desmerecer o serviço que oferece.
Se iniciativa for exclusiva da Maria de
Fátima, que acredito pouco provável, posso inferir que ela está usando seu
emprego para aliciamento de fregueses, porque oferecer conversão de tristeza em
alegria, não parece ser das atribuições de seu contrato com a prestigiada rede
hoteleira.
Se a iniciativa não for dela e o hotel
for o responsável, a situação é muito mais grave. Há nesta hipótese duas
classes de vítimas para as quais o hotel deve indenizações. Uma, aos hóspedes,
violados no seu bem estar com ofertas no mínimo indecorosas. Outras, às
funcionárias do hotel, que estão sendo constrangidas a ofertar agrados que,
muito provavelmente, violem seus princípios morais.
Soneto-acróstico
ResponderExcluirConselho
Àquele hóspede que fazes tua oferta
Melhor o faria se o deixasse em paz
Assim lembre que não é pessoa certa
Repouso com tranquilidade lhe apraz.
Invadir portanto sua cara privacidade
Atenta frontalmente contra descanso
Deixe-o curtindo adequada intimidade
Enquanto suprime tal imaturo avanço.
Faça bastante, muito menos fazendo
Álacre essa desmesurada abordagem
Tola e mal interpretada acaba sendo.
Ignore mestre Chassot nessa viagem
Mestre repousando permanece lendo
Além disso cumpre ter ilibada imagem.
Jaime Gross Garcia escreveu no Facebook:
ResponderExcluir"Querido Amigo Mestre Attico Chassot, na minha leitura, é um erro grosseiro de mkt do hotel. Será que não??? Saudades do Amigo!"
Moacir Viegas escreveu no Facebook:
ResponderExcluirNão sei se "pode", Chassot, mas as empresas, as organizações, estão cada vez mais exigindo que se trabalhe feliz e sorridente. É o que alguns chamam de "trabalho emocional". Então isso faz parte do trabalho da força de trabalho. Alguns dizem que não pode ser mensurado. Eu tenho dúvidas. Agora, essa do bilhete no hotel é nova.
Moacir Viegas escreveu, ainda, no Facebook:
Excluir"Attico Chassot, essa é uma questão muito importante e sobre a qual há controvérsias. Entendo perfeitamente teu sentimento, pois o hotel "extrapolou". Porém, não podemos negar que o serviço em muitas áreas, como educação e saúde, implica envolvimento emocional e afetivo. Não tem como não haver, pois ninguém gosta de ser tratado por "robôs" e ninguém consegue agir plenamente como tal. E claro que isso é uma qualidade dos trabalhadores (principalmente das TRABALHADORAS) explorada pelas empresas. A discussão é se é correto ou não pensar que tais "habilidades" (uns chamam de habilidade de "gerenciar as emoções") pode fazer parte do "preço" da força de trabalho. Podemos achar que essa ideia é horrorosa e desumana e que não é possível colocar um preço nessas coisas. Porém, como o capital as utiliza cada vez mais intensamente, então, nesse pensamento, tais capacidades seriam "gratuitas", o que é muito bom para o capitalista. Então não é uma questão simples."
Mestre Chassot,
ResponderExcluirtudo se resume a hipóteses. Assumo a do prof. Jaime Gross. Marketing ingênuo do hotel. Os conselhos do poeta Jair aplicam-se tanto a Maria de Fátima quanto ao hotel. Isso de ter que trabalhar contente que comenta o Moacir, é uma vez mais o capital explorando o trabalhador.
Não é possível crer que a moça seja a autora do bilhete. O hotel (ou os hotéis) deveria(m) se repensar.
L L L
Ola Meu Caro Chassot
ResponderExcluirMe peguei analisando minuciosamente a intenção do conteudo do cartão. Mesmo que eu evitasse maliciar a ação, não pude deixar de pensar numa "proposta indecente". É o tributo que muitas vezes se paga por estar constantemente em exposição ao público. Grande abraço e muito bom restante de semana. JB