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quarta-feira, 15 de junho de 2011

15.- Para comemorar: se fez Justiça

Ano 5

Porto Alegre

Edição 1777

Esta blogada é postada quando não faz muito que voltei de minhas aulas das noites de terças feiras, de Conhecimento, Linguagem e Ação Comunicativa, quando tenho um grupo de licenciandos de Educação Física e de Filosofia. Hoje discutimos algo da racionalidade instrumental e da racionalidade comunicativa, iluminados pelo teorizar de Juergen Habermas. Também nos organizamos para nas duas próximas terças-feiras ocorrer as apresentações das pesquisas individuais de cada um dos alunos.

Uma vez mais desejo trazer a sugestão – a possíveis interessados – dos dois mestrados do Centro Universitário Metodista do IPA. As inscrições vão até dia 30 deste mês e a seleção [prova escrita e entrevista] será no sábado dia 2 de julho. No Mestrado Profissional de Reabilitação e Inclusão tenho o privilégio de ser professor e pesquisador. Tenho atualmente neste mestrado cinco orientandos (onde já formei três mestres) e envolvo-me em Seminário de História e Filosofia da Ciência.

Parece, que de uma maneira geral, lemos na imprensa notícias menos boas. No final do mês passado encontrei uma muito boa que me fez vibrar. Salvo que tenha me passado despercebido, teve pouco destaque na imprensa. Não há dificuldades em reconhecer que as forças armadas têm muitos privilégios e isso parece que não seja algo apenas no Brasil. Mas recordo que há muito me instigava o quanto altas patentes possuíam mordomias tendo em seu serviço doméstico pessoal do baixo escalão. Isso no Brasil vai terminar. Eis a notícia que, salvo engano, não mereceu muito destaque na imprensa:

Caso seja mantida decisão judicial proferida em Santa Maria pela Justiça Federal, e que vale para todo país, as Forças Armadas não poderão mais destinar militares subalternos para realizar tarefas domésticas nas residências de oficiais superiores. A prática, atualmente em vigor no Exército, Marinha e Aeronáutica, não teria respaldo constitucional conforme entendimento da juíza federal Simone Barbisan Fortes.

Juíza Simone Barbisan Fortes, em foto de A razão de Santa Maria. No dia 27 de maio, a magistrada santa-mariense decidiu, em caráter liminar, determinar à União que, no prazo de 90 dias, seja suspenso o uso de militares neste tipo de tarefa. A juíza também estabeleceu que, em dez dias após o final deste prazo, a União deverá informar e comprovar as providências adotadas referentes ao cumprimento da medida liminar. Caso a solicitação judicial não seja cumprida, será arbitrada multa diária. A Advocacia Geral da União poderá recorrer da decisão.

Simone Barbisan Fortes julgou ação civil pública ajuizada em conjunto pelo Ministério Público Federal e Ministério Público Militar. Na ação, os órgãos autores relataram que “militares subalternos, normalmente do grau “taifeiros”, são designados para realizar tarefas de natureza preponderantemente domésticas nas residências, inclusive particulares, de autoridades de altas patentes das Forças Armadas, como generais, coronéis e tenentes-coronéis, havendo, até mesmo, normas internas autorizando a prática (Portaria Ministerial nº 585/88 do Exército e Portaria nº C-14/GM-6/98, da Aeronáutica).”

Os representantes do MPF e do MPM argumentam que a situação afronta os princípios norteadores da administração pública, que os militares subalternos alocados nessas atividades são, por vezes, submetidos a constrangimentos, e ainda que o exercício deste tipo de função reflete nas avaliações do militar, provocando até mesmo retardo nas promoções da carreira.

Em trecho de seu despacho, a juíza observa que existem elementos comprovando os fatos narrados na (ação) inicial, os quais aparentemente ofendem diversos princípios constitucionais e infraconstitucionais e, por isso, devem ser suspensos de imediato.” Também é destacado pela magistrada que “Exército e Aeronáutica valeram-se de Portarias para “respaldar” a utilização do serviço de taifeiros nas residências de autoridades militares em atividades puramente domésticas. Tais Portarias, todavia, aparentemente não possuem base em lei (são normas autônomas), do que se pode inferir que lhes falta habilitação legal”. E acrescenta “Em relação à Marinha, vale ressaltar que sequer possuía norma interna autorizando o uso dos serviços de taifeiros para atividades domésticas nas residências de autoridades militares, muito embora o fizessem na prática.”

Na decisão proferida por Simone Barbisan Fortes foram suspensas a Portaria Ministerial 585/88 (Exército) e a Portaria C-14/GC-6/98 (Aeronáutica).

De acordo com notícia para a imprensa publicada no site da Procuradoria da República no Rio Grande do Sul, o Ministério Público estima que mais de 600 militares subalternos são utilizados em atividades de cunho eminentemente doméstico nas residências de seus superiores, o que custa aos cofres públicos mais de R$ 1 milhão por mês.

“Essas atribuições não são exercidas em caráter pessoal, mas sim em relação ao próprio nacional residencial, pois mesmo na ausência do oficial-general nele residindo, os militares permanecerão desempenhando suas funções ainda que restritas à guarda e à conservação do material existente nestas residências”. Ainda segundo o Exército, os serviços são prestados pelos militares são nas "áreas de cozinha, copa e dispensa".

Os promotores da Justiça Militar Soel Arpini e Jorge Cesar de Assis e o procurador da República Rafael Brum Miron afirmam que os militares subalternos são designados para realizar tarefas de natureza preponderantemente domésticas nas residências oficiais ou particulares de generais, coronéis e tenentes-coronéis. Para os autores da ação civil, essa situação afronta os princípios norteadores da administração pública porque permite que administradores usufruam de vantagem indevida, em detrimento do interesse público. A petição inicial afirma que a prática configura ato de improbidade, pois enseja enriquecimento ilícito ao representar forma de salário indireto.

Outra situação grave, dizem os promotores e o procurador, é o constrangimento a que os subalternos são submetidos. Ao prestarem serviço nas residências dos superiores, ficam subordinados diretamente à esposa da autoridade militar. Essa atividade, eminentemente privada, acaba refletindo nas avaliações do militar, influindo até mesmo no retardo de promoções da carreira e realização de inspeções de saúde mais frequentemente do que os demais integrantes das Forças Armadas, sem razão aparente.

"Imagine se direito igual fosse conferido a outros cargos relevantíssimos como desembargadores, prefeitos, deputados. Seria um escândalo, pois é completamente indefensável. Nas Forças Armadas ninguém faz qualquer oposição à prática esquecida", conclui o procurador da República Rafael Brum Miron em seu parecer.

Com votos de uma excelente quarta-feira, nesta clausura da primeira quinzena junina. Que as cinzas do vulcão não atrapalhem voos e que a ‘dona meteô’ se dê conta que ainda estamos no outono.

8 comentários:

  1. Caro Chassot,

    o "mundo dos coronéis" não terminou. Vê-se agora, com essa decisão em carater liminar, que se trata de uma prática corrente nos quartéis. Outra situação apontada é a questão do constrangimento. Quando se debate a situação do bullying nas escolas podemos imaginar o que essa praga representa na caserna.

    Boa quarta-feira, caro colega!

    Garin

    http://norberto-garin.blogspot.com

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  2. Muito boa quarta-feira colega e amigo Garin,
    quando celebramos o restabelecimento do respeito do trabalho doméstico ( e o bolso dos contribuintes) não dava-me conta do bullying na caserna que certamente sofriam os taifeiros que serviam as madames dos estrelados.
    Obrigado por tua estada aqui.
    attico chassot

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  3. Ola Meu Caro Meste Chassot
    Tenho dificuldade em julgar o mérito dessa decisão. Se por um lado há uma exploração dessa mao-de-obra por parte do generalato das forças armadas (e isso pude comprovar pelo pouco tempo que frequentei a corporação aeronautica), tambem traz preocupaçao porque uma grande quantidade de jovens se ocupa hoje da atividade militar nessa faixa etária da adolescencia para idade adulta. Isso faz com que estejam longe de atividades ilícitas que a realidade das ruas proporciona muitas vezes. Por sinal, a juiza Simone Barbisan Fortes tem um certo grau de parentesco com minha familia. Ela é sobrinha neta de minha mãe. Abraços do JB

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  4. Muito querido Jairo,
    primeiro uma homenagem a família de tua mãe em ter em sua estirpe uma juíza Simone Barbisan Fortes. Segundo, não vejo porque reticência a medida: cabos e soldado tem nas forças armadas outra funções que não a de taifeiros da cozinha e dos jardins das mulheres dos oficiais superiores.
    Obrigado, pela tua presença como comentarista deste blogue.
    attico chassot

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  5. Professor Chassot,
    fui seu aluno no Pedro Schneider, em São Leopoldo, nos anos sessenta. Fui dez anos militar. Fiz muito serviço enquanto cabo em casa de oficiais. Pintei casa, instalei rede elétrica, desentupi vaso sanitário, abri fossa, arrumei jardim, fantasie-me de garçom para ser servir em festa. Fui assediado (na época não se dizia assim: cantado, era o termo) por filha de comandante. Preferi ser chamado de ‘veadinho’ a ir para a cadeia ou expulso da corporação.
    Vibrei com a notícia, que não conhecia. Obrigado do um ex-aluno que recorda suas aulas de Química Orgânica no Pedrinho, um abraço do qwert

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  6. Meu caro Qwert,
    – e entendo por que te resguardas num pseudônimo – teu comentário é precioso. Posso imaginar o que significa, quase depois de meio século trazer estas evocações.
    Lecionei no Pedrinho em 1962/66. Logo estava ali nos dias do golpe de 64. Havia muitos alunos militares dos diferentes quarteis. Vários vinham fardados para aula. Lembro da sala do segundo científico. Não consigo te achar na turma, isto é bom. Se falava com cautela na sala de aula.
    Posso imaginar a pressão que se faziam nesses serviços que enumeras. De faxineiro a garçom. Não é difícil imaginar a situação de constrangimentos que vocês eram submetidos. O duplo comendo (quartel e doméstico) certamente era exigente, pois um e outro que garantiam a promoção. Também dá para inferir o quanto devia ser difícil, e necessário, resistir as seduções de esposa e filhas dos medalhados.
    Obrigado por trazeres este depoimento quando vibramos que um Brasil mais democrático não precisa mais mandar seus soldados para a senzala dos coronéis.
    attico chassot

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  7. Caro Chassot,
    Matéria delicadíssima, a maioria das pessoas que opinam sobre isso, em geral, não conhecem a exata natureza do "problema". Fui militar durante trinta anos, nunca desfrutei de qualquer mordomia, mas acho que o assunto deve ser olhado com judiciosidade para não se cometer injustiça em nome de uma moralidade discutível. Em Brasília é comum funcionários do congresso prestarem serviços nas residências dos deputados e senadores, como foi denunciado pela imprensa com relação a um "mordomo" dos Sarney que ganha mais de 15 mil reais oriundos do dinheiro público para servir na residência daqueles próceres. Os oficiais generais que são servidos por taifeiros estão muito longe das libertinagens com nosso dinheiro que adornam as atitudes dos políticos de Brasília. Não quero desculpar os militares, vejo somente que o problema é muito mais arraigado e maior que um simples taifeiro ajudando nas lidas domésticas de uns poucos brigadeiros, almirantes e generais.

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  8. Meu caro Jair,
    quando editei as edições de ontem (cinzas) e de hoje (taifeiros) disse-me: assuntos para o comentarista-polímata deste blogue.
    É bom sermos chamados a atenção para o outro lado. Apenas uma ressalva: parece que nas forças armadas não são apenas almirantes, brigadeiros e generais.
    Há patentes mais baixas que tem os seus limpa-patente. Aqui patente numa acepção dicionarizada mais corrente no Rio Grande do Sul: Vaso sanitário, latrina, especialmente de louça (porque os primeiros, importados da Inglaterra, traziam impressa a palavra patent, privilégio de fabricação). Usada por extensão como a ‘casinha’ ou ‘quarto de banho.
    Com admiração
    attico chassot

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