ANO 17*** 19/05/2023***EDIÇÃO 2084
Já contei, mais de uma vez, neste blogue uma frase quase diária de minha mãe: O que vou cozinhar amanhã? Éramos sete filhos mais pai e mãe, e não raro, a alimentação era difícil. Eu, na sexta-feira, quando publico o blogue, ao invés de festejar mais edição, me pergunto: qual assunto para blogar, na próxima semana? (Não acredito que nestes 17 anos este blogue, por alguns anos foi diário). Custei em arrumar assunto para hoje.
Estou escrevendo um artigo, encomendado pelos editores de conceituada revista científica. Em mais de um momento, esqueço meus leitores e digo-me: É preciso — aqui e agora — oferecer uma explicação aos meus atenciosos leitores, dizer que este texto não é um artigo científico. Ele é um texto mal comportado. Ele foge à ortodoxia. Meus leitores já leram, inclusive escreveram, artigos científicos bem comportados. De maneira usual estes textos relatam uma pesquisa. Acerca destes artefatos culturais parece dispensável trazer comentários.
Não raro, periódicos científicos estabelecem normas (que muitas vezes, em revistas brasileiras, são disciplinadas pela ABNT) para que um artigo possa ser recebido para análise a possivel publicação. Muitas revistas científicas têm na sua página de abertura informações detalhadas (e facilitadoras) para a produção de artigo adequadamente editorável. Não raro, há um template(1) que favorece uma produção engessada do artigo à submissão.
Dentro das normas usuais este texto não é um artigo científico, mesmo que tenha sido redigido atendendo a convite de uma revista muito bem avaliada. Também é importante referir que editores podem não aceitar artigos submetidos a submissão. Quando fui editor da revista do Programa de Pós Graduação em Educação da Unisinos, mais de uma vez, devolvi artigos pedindo a autores que o texto fosse adequado às normas da revista. Não lembro que então existisse template.
Faço uma interrogação: se qualquer um de nós — enquanto professor — solicitasse um texto para alunos e um deles cumprisse a tarefa apresentando um texto com excelente conteúdo, mas quanto a forma entregasse algo escrito em estilo saramaguiano(2) qual seria nossa avaliação? Eu antecipo: se fosse avaliador, que viveria uma situação difícil!
Qual a pretensão do autor no produzir este artigo? Não é fácil romper com normas há muito estabelecidas. Quando refiro que a Escola, que herdamos da Reforma Luterana no ocaso da Idade Média(3), hoje não serve mais, há os que me acusarão de neoludista(4). Vou, antes de justificar, tentar classifificar este meu texto: (Auto)biografia de uma tênue fronteira entre a História da Ciência e a História das Religiões e a formação de professores.
Esta é uma proposta muito genérica. Parece que se possa englobar em um título tão amplo a diversas (auto)biografias. Um exemplo: redigir uma biografia da fronteira (quase) natural entre Ciência e Religião como está, por exemplo, no livro Os quatro elementos entre ciência e religião (Chassot, Attico & Rosinke, Patrícia, 2021), produzido de uma tese doutoral. Parece válido dedicar-nos no escrever biografias que busquem respostas, por exemplo, as três perguntas capitais que já estudo há um tempo: Por que não houve revolução cientifica no Oriente? / Por que houve revolução cientifica no Ocidente? /Como a ortodoxia dos três monoteísmos abraâmicos imaculou a ciência no inicio da modernidade? outros exemplos: as possíveis biografias envolvendo questões de gênero nas Religiões ou na Ciência como se narra em A ciência é masculina? é, sim senhora! (Chassot, 2019).
Permito-me espraiar algo mais neste meu pomposo título: (Auto)biografia de uma tênue fronteira entre a História da Ciência e a História das Religiões e a formação de professores. Antes alerto: me abandona, agora, a modéstia. Não raro uma leitora anuncia: Professor! quando eu lhe escuto em uma aula ou em uma palestra parece que eu estou lhe lendo. Por outro lado, um leitor ora me afirma: Mestre! quando eu estou te lendo parece que eu estou te ouvindo em uma aula ou em uma palestra. Alguém já diagnosticou — não posso deixar de adjetivar como muito pretensiosa a informação que segue — uma possível existência de uma maneira chassotiana de escrever Ciência. Isso posto, está de maneira tênue justificado o prefixo ‘auto’ no meu título, que pretende destacar: a formação de professores. Poderia, aqui e agora, referir mais de uma edição do bem sucedido seminário: A arte de escrever Ciência com Arte. Ser pretensioso e/ou intimista parece também não caber em um artigo cientifico.
A classificação genérica que está no título se faz específica em pelo menos três mentefatos culturais: História, Ciência e Religião. Um exemplo de possibilidades estão nas três perguntas lapidares, trazidas anteriormente.
Mas agora surge um novo questionamento. Uma interrogação: — assim como a Escola, nestes primeiros anos do Século 21, perdeu ser o lócus de transmissão do saber e ao invés de se questionar o professor — houve um tempo, não tão distante, que se creditava que o professor exercia seus fazeres transferindo conhecimentos aos alunos — hoje, se pergunta, cada vez mais, ao Google. Em algumas comunidades primevas, talvez ainda se precise de velhos para serem depositários do saber, de maneira particular em uma sociedade ágrafa? Porém, lá também parecem presentes os detentores de informações (ATENÇÃO: não referi conhecimentos e, menos ainda, saberes) como o professor Google / o médico Google / o pastor Google / o padre Google / a bispa Google / o arquiteto Google / o veterinário Google /advogado Google… eles, se diz, ‘sabem tudo’ e… muito mais.
Hoje, diferente dos anos que marcaram a virada do Século 20 para o Século 21 -- não é fazer do professor transmitir informações. Isto o Google faz com mais competência, assim como a Wikipédia é imbatível na transmissão de conhecimentos. O que pode -- ou melhor: o .que se deve fazer, enquanto detentores de informações e de conhecimentos, com estes produzir novos saberes. É mais difícil? Sim! É muito mais gratificante? Sim? Vale pelo menos experimentar. Obrigado por tentar. Vou terminar meu artigo mal comportado! Qualquer dia volto aqui para contar: foi aceito para publicação! ou Ele h abita agora uma lixeira!
NOTAS
Um processador de modelo (também conhecido como um mecanismo de modelo ou analisador de modelo, em inglês template processor é um software ou um componente de software que é designado a combinar um ou mais modelos com um modelo de dados para produzir um ou mais documentos como resultado. A linguagem que os templates são escritos é conhecida como linguagem de modelo (template language).
O estilo saramaguiano ou estilo saramaguenho pode ser assim descrito: o único Nobel de língua portuguesa brinca com a pontuação, desconhecendo parágrafos, maiúsculas, acentos…
Vale ver o podcast que gravei para HISTORY OF SCIENCE da Universidade de Coimbra e da Universidade Aveiro.
Forte movimento trabalhista na Inglaterra entre 1811 e 1816, o ludismo caracterizou-se pela destruição de máquinas por trabalhadores insatisfeitos com a mecanização. O ludismo foi um movimento de trabalhadores que se uniram e revoltaram-se contra as máquinas no princípio da Revolução Industrial. O termo deriva de Ned Ludd, personagem feminina fictícia criada a fim de difundir o movimento entre os trabalhadores. Os ludistas chamaram muita atenção pelos seus atos: invadiam fábricas e destruíam máquinas, que, na sua visão, eram usadas "de maneira fraudulenta e enganosa", para contornar práticas laborais estabelecidas e impor extensas jornadas de trabalho, sob condições frequentemente insalubres. De todo modo, os ludditas ficaram conhecidos como simples "quebradores de máquinas" contrários ao progresso técnico (Wikipédia, acessada 07MAR2923).
Pronto, sexta-feira se completa ao ler o blogue do Professor Chassot.
ResponderExcluirbom dia mestre....obrigada por ter voce
ResponderExcluirComo sempre palavras necessárias, obrigado!
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