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sábado, 9 de julho de 2011

09.- Quando eu voltar a ser criança

Ano 5

Porto Alegre

Edição 1801

E... já aqui estamos no segundo sábado julino, logo é dia de apresentar sugestão de leitura. A propósito, cabe anunciar, que – muito provavelmente – a próxima dica será em 6 de agosto, pois a partir da próxima quarta-feira, dia 13 e até dia 4 de agosto este blogue será ‘diário de um viajor’. Aqui já fica o convite para tê-lo como companhia. Também votos de um bom fim de semana e a recomendação para algo saboroso na blogada dominical.

Encanta-me como um assunto vai se entremeando com outro. Esta semana li uma sumarenta reflexão norberto-garin.blogspot.com/2011/07/quando-crescer.html acerca da clássica pergunta que fazemos (pelo menos fazíamos) às crianças: O que tu queres ser quando fores grande? Quase que formulei a questão de maneira equivocada: O que tu vais ser quando fores grande? Uns querem ser engenheiro e o acaso (leia-se: não conseguem traçar uma elipse no vestibular...) os faz professor.

Mas a reflexão levou-me a um texto antípoda. Um livro que havia lido há mais de duas

décadas: Quando eu voltar a ser criança de Janusz Korczak. Encharquei-me de saudades. Há época não fazia resenhas. Busquei meu exemplar, cuja capa esta aqui reproduzida, agora surgia rediviva. Minha edição é como mais de uma centena de meus livros do ‘Circulo do Livro’ de quem fui sócio fiel por anos. Das maiores curtição era, a cada mês esperar a revista e fazer a seleção de tentadoras ofertas, limitadas por reduzida disponibilidade de leitura.

Assim esta anunciada e justificada a dica de leitura. Antecipo algo de minha primeira leitura do livro: encantei-me com a história de vida de Janusz Korczak. E então, não havia nem Google e nem Wikipédia. Mesmo assim, então consegui algumas informações. Por tal, ajudado pela Wikipédia, privilegio, hoje, a biografia do autor.

KORCZAK, Janusz. Quando eu voltar a ser crianca.160 p. tamanho: 14.0 x 21.0 cm Peso 0,200 kg Coleção: Novas Buscas em Educação São Paulo: Summus Editorial 16ª ed. 1981. R$ 38,90 ISBN 10: 85-323-0130-4 ISBN 13: 9788532301307

Janusz Korczak, pseudônimo de Henryk Goldszmit (Varsóvia, 22 de julho de 1878 ou 1879 — Treblinka, agosto de 1942) foi um pediatra, autor infantil e pedagogo judeu polonês.

Seu pai Józef Goldszmit morreu em 1896 (provavelmente suicídio), deixando a família sem nenhuma fonte de renda. Durante os anos seguintes, Korczak, ainda adolescente, passou a sustentar sua mãe, irmã e avó.

Em 1898, usou pela primeira vez o nome Janusz Korczak como pseudônimo para participar de um concurso literário. Entre 1898–1904 Korczak estudou medicina em Varsóvia e também escreveu para alguns jornais da Polônia.

Graduado em pediatria, durante dois anos (1905-1906) serviu como médico do exército na Guerra Russo-japonesa. Durante esse período, seu livro Child of the Drawing Room se tornou conhecido nos meios literários. Depois da guerra continuou a trabalhar como médico em Varsóvia.

Entre 1907–1908, Korczak deu continuidade a seus estudos em Berlin. Enquanto trabalhava para o Orphan's Society, em 1909, conheceu Stefania Wilczyńska. Em 1911–1912 se tornou diretor do Dom Sierot, um orfanato para crianças judias na capital polonesa. Wilczyńska se tornou próxima a ele nessa empreitada. No orfanato ele criou uma espécie de república das crianças, com um parlamento, tribunal e jornal próprios.

Em 1914 Korczak voltou a atuar como médico do exército com a patente de tenente durante a I Guerra Mundial. Escreveu um ensaio pedagógico no tempo que tinha livre. Em Kiev conheceu Maryna Falska, que depois se tornou sua ajudante em Varsóvia. Retornou à sua cidade natal quando a Polônia recuperou a independência em 1918.

Depois da guerra, fundou outro orfanato chamado Nasz dom (Nosso lar) e deu

continuidade a seu trabalho no Dom Sierot. Durante a guerra entre a Polônia e a União Soviética serviu novamente como médico do exército. Nesse período, contraiu tifo e sua mãe morreu dessa doença.

Em 1926 permitiu às crianças do orfanato começarem seu próprio jornal, o Mały Przegląd, que acompanhava semanalmente o jornal judeu Nasz Przegląd. Monumento "Janusz Korczak e a criança" em Yad Vashem [(em hebraico: יד ושם ou Yad VaShem, a "Autoridade de Recordação dos Mártires e Heróis do Holocausto") é o memorial oficial de Israel para lembrar as vítimas judaicas do Holocausto].

Entre 1934–1936 Korczak viajou anualmente para a Palestina para visitar os kibbutzim. Isso aumentou os ataques anti-semitas contra ele. O que o levou a parar de trabalhar no orfanato não judeu em que atuava. Apesar disso, não quis se mudar para a Palestina mesmo quanto Wilczyńska foi em 1938.

Em 1939, com o início da II Guerra Mundial, Korczak, com mais de 60 anos, tentou se alistar no exército polonês mas foi recusado por causa da sua idade. Ele testemunhou a chegada do Wehrmacht (nome do exército alemão durante a segunda grande guerra) à Varsóvia. Quando os nazistas criaram o gueto de Varsóvia em 1940, seu orfanato foi obrigado a se mudar para dentro do gueto. Korczak foi junto, por sua vontade, para não abandonar suas crianças.

No dia 5 de agosto (para alguns 6 de agosto) de 1942, soldados alemães levaram as cerca de 200 crianças que estavam no orfanato, aproximadamente 12 funcionários e Janusz Korczak para o campo de concentração de Treblinka. Não se tem claro o que aconteceu com Korczak após entrar no trem para Treblinka, o mais provável é que tenha morrido numa câmara de gás ao chegar ao campo de concentração.

Acerca do livro a marca é que nos proporciona olhar as crianças com os olhos de crianças e não de adultos soberbos. Com o convívio das crianças ele se colocava sempre no lugar delas e com os seus pensamentos.

Janusz Korczak escreveu muito, deixou uma obra extensa. Escreveu para crianças e adultos, e também livros que, aparentemente “infantis”, dirigiam-se talvez mais aos adultos do que às crianças. Os livros de Korczak. Para crianças e sobre crianças, são belos e sábios, porque o mundo neles criado não é visto por um prisma de didatismo simplório, mas através do prisma do amor e da compreensão, através da sua utopia, do seu “sonho impossível”.

Em nosso século 20, poucos educadores conheceram tão a fundo a alma da criança e do adolescente como Janusz Korczak, o mestre polonês que levou sua dedicação aos pequenos a ponto de – com um grupo deles – fazer a viagem final, em meio ao extermínio da Segunda Guerra Mundial. Eis um livro raro, tocante, sensível, comovente. Belo e terno, ele não discursa sobre a criança, mas se faz de porta-voz dela, voltando a ser criança e revivendo um mundo através dos olhos, sensações, tristezas e desencantos que toda criança vive. Um livro envolvente e sábio, mostrando as dificuldades de ser criança neste mundo feito, pensado e mandado pelos adultos.

A história inicia-se com uma criança pensando no futuro dela. Ele pensava que ao crescer construiria uma casa no mesmo terreno para seus pais, iria se casar, ter filhos e também bem sucedido financeiramente.

Eis o que escreve Tatiana Belinky na apresentação da edição brasileira, "o livro, que é uma espécie de 'ficção psicológica', está escrito na primeira pessoa, como o relato de um professor primário que, cansado dos seus problemas de mestre-escola e adulto, se lembra com saudade da decantada "aurora da minha vida" - e magicamente volta à infância; volta a ser criança, mas sem perder a memória de adulto". Nesse livro ele revive a sala de aula, a vida em família, as humilhações sentidas no contato com os adultos, os sustos diante de tantas coisas desconhecidas e de um ambiente feito para o tamanho dos adultos.

No livro Quando eu voltar a ser criança, Korczak diz que a criança é uma "classe oprimida": "nós vivemos como um povo de pigmeus, subjugados por sacerdotes gigantes que detêm a força dos músculos e a ciência secreta. Somos uma classe oprimida que vocês desejam manter viva às custas do menor esforço e com o mínimo de sacrifício. Somos criaturas extremamente complexas, fechadas, desconfiadas e camufladas; e nem a bola de cristal nem o olho do sábio lhes dirão qualquer coisa a nosso respeito, se vocês não tiverem confiança em nós e identificação conosco" (p. 83). Korczak chamava essas crianças de rua de "proletários de calças curtas" e se dizia decidido a se tornar o "Karl Marx das crianças". Ele se tornou criança para poder, entendendo-as melhor, melhor defendê-las. Como poucos, penetrou nesse mundo impenetrável da infância para conhecer a fundo o que se passava no íntimo do seu coração.

Eis algumas passagens significativas, que é uma espécie de diário íntimo da sua própria infância.

- "Acabou o primeiro dia da minha nova infância. Quanta coisa em um só dia! Só registrei algumas das experiências, aquelas que a lembrança por acaso me passou, aquelas que levaram mais tempo. Se impressões caem em cima da gente que nem enxurrada de verão, como guardar e descrever todas as gotas da chuva? É possível, por acaso, contar as ondas agitadas de um rio que está transbordando? (p. 53).

- "Vocês pensam, quem sabe, que nós também batemos um no outro. Mas nossas mãos são pequenas e nossa força é pouca. E mesmo tendo a maior raiva, nunca batemos de modo tão sanguinolento. Vocês não sabem como são as nossas brigas" (p.77).

- "Acordei triste. Estar triste não é ruim. A tristeza é um sentimento suave e agradável. Bons pensamentos nos vêm à cabeça. Sentimos pena de todo mundo: de mamãe, porque as traças estragaram o seu vestido, de papai porque precisa trabalhar, da avó, porque está velha e não demorará a morrer, do cachorrinho, porque está com frio e da florzinha, porque suas folhas ficaram flácidas e ela parece doente. Queremos ajudar a todos, e queremos nós mesmos tornar-nos melhores.

Contos de fadas tristes também nos agradam, o que indica que temos necessidade de tristeza, como se ela fosse um anjo que para, olha, põe a mão na nossa cabeça, e parece estar respirando pelas asas.

Dá vontade de ficar sozinho, ou então de estar com alguém e conversar sobre diversos assuntos. Ficamos com medo de que alguém venha estragar a nossa tristeza; estragar, não; espantar" (p. 85).

"O que me magoa é que todos os nossos assuntos são liquidados às pressas e de qualquer maneira, como se para os adultos a nossa vida, as nossas preocupações e insucessos não passassem de acréscimos aos problemas verdadeiros que eles têm. É como se existissem duas vidas; a deles, séria e digna de respeito; e a nossa, que é como se fosse de brincadeira. Somos menores e mais fracos; daí, tudo que nos diz respeito parece um jogo. Por isso o pouco caso.

As crianças são os homens do futuro. Quer dizer que elas existirão um dia, mas por enquanto é como se ainda não existissem. Ora, nós existimos; estamos vivos, sentimos, sofremos. Nossos anos de infância são anos de uma vida verdadeira. Por que nos mandam aguardar, e o quê?

E eles, os adultos, será que se preparam para a velhice? Não desperdiçam levianamente as suas forças? Gostam, acaso, de ouvir as advertências de velhos ranzinzas?

Na cinzenta monotonia da minha vida de adulto, lembrei-me das vivas cores dos anos da infância. Voltei atrás, deixei iludir-me pelas reminiscências. E eis que ingressei na cinzenta monotonia dos dias e das semanas de criança. Nada lucrei, mas perdi o tempero da resignação. Estou triste. Sinto-me mal. Estou terminando o meu estranho relato" (p. 152).

10 comentários:

  1. Caro Chassot,

    é um lindo texto. Emociono-me também com a história do autor. Amar as crianças é até fácil, caminhar com elas para a última viagem, por amor representa outro nível de amor: esse não é fácil.
    Vou colocar na minha lista de leituras.

    Desde agora te desejo uma linda e saborosa viagem. Sei que irás 'curtir' cada segundo dessa 'epopéia'.

    Bom shabbat!

    Garin

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  2. Bom dia, caro amigo!
    Enfim, nesse sábado, o Sol voltou a brilhar no Rio de Janeiro. Como o seu personagem de hoje, os cariocas não são afeitos à cor cinza...
    Gostei muito de ler sobre esse pediatra polonês, que não conhecia. Mais uma vez você nos brinda com uma história interessante e comovente.

    Um ótimo shabbat, também!

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  3. Meu querido Renato,
    que o sol que volta a dourar a tua linda Rio de Janeiro faça frutuoso o shabath. Janusz Korzak foi um destes mártires do século 20. Sua obra é maravilhosa e nesta o ‘Quando voltar a ser criança’ merece destaque. Depois de tu teres acessado a edição de hoje, legendei a última figura: Monumento "Janusz Korczak e a criança" em Yad Vashem [(em hebraico: יד ושם ou Yad VaShem, a "Autoridade de Recordação dos Mártires e Heróis do Holocausto") é o memorial oficial de Israel para lembrar as vítimas judaicas do Holocausto].
    Permita-me declinar o orgulho de ter como leitor.
    attico chassot

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  4. Mui estimado colega Garin,
    obrigado por teus votos pela viagem, mas mais grato sou por catalisares a revisitação de Janusz Korczak e sua excelente obra.
    Um bom sábado

    attico chassot

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  5. Caro Chassot,
    O que me encanta na prosa de Korczak é a capacidade de entrar na cabeça da criança e pensar como ela, e aqui vai uma confissão: Estou há muito tempo tentando escrever um conto infantil e o que me falta é justamente isso, capacidade de viver a história do ponto de vista da criança. Meu conto vai e vem porque estou sempre tentando "arrumá-lo" ao jeito do Ziraldo. Se estiver escrito nas estrelas, algum dia eu o termino e doo a uma entidade de caridade voltada para crianças carentes, os direitos autorais. Abraços e bom fim de semana, JAIR.

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  6. Meu caro Jair,
    a “imersão no ser criança’ não é algo trivial.
    Quando tive filhos pequenos vivi isso intensamente, Tenho inclusive três contos publicados em antologias resultante de concursos de literatura infantil.
    Tenho tentado, mais recentemente, sem muito sucessos.
    Janusz Korzak teve sucesso pois escreveu como criança tanto para adultos como para crianças.
    Obrigado pela presença aqui e já estou na torcida pelo sucesso de teu conto,
    attico chassot

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  7. Desculpa, mestre..foi um pequeno lapso!
    A verdade é que quando li o título na mesma hora já pensei:"não quero deixar nunca de ser criança!"
    =]
    Apenas fiquei meio desconsertada com os elogios do senhor e do Prof.Sérgio, que acabei me esquecendo de escrever...
    Rsss!
    Mil desculpas!
    "O que me magoa é que todos os nossos assuntos são liquidados às pressas e de qualquer maneira, como se para os adultos a nossa vida, as nossas preocupações e insucessos não passassem de acréscimos aos problemas verdadeiros que eles têm. É como se existissem duas vidas; a deles, séria e digna de respeito; e a nossa, que é como se fosse de brincadeira. Somos menores e mais fracos; daí, tudo que nos diz respeito parece um jogo. Por isso o pouco caso."
    O pior é que é a pura verdade!Tento me policiar o tempo todo para não fazer isso com meu filho, nem com meus[as]sobrinhos[as]!Omundo deles é tão importante quanto o nosso!Afinal, estamos no mesmo mundo!A realidade deles é que é diferente da nossa, os interesses...por isso quero ser criança a vida toda!
    Deus me permita um espírito jovem sempre!
    =]
    Um abençoado domingo ao senhor e aos seus!

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  8. Thaiza querida,
    não há nada a desculpar. Quando se tem alguns leitores queridos como tu, há blogadas que têm endereço. A de ontem escrevi pensando em ti e na tua duplinha, que vi esta manhã no Facebook.
    Agradeço e retribuo os votos de um abençoadp domingo para ti e para os teus

    attico chassot

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  9. Este livro me acompanha e o deixo sempre num lugar visível,alias a capa de sua edição é igualzinha a minha. Volta e meia abro em alguma página e releio trechos: alimento doce da profissão.

    Obrigada por compartilhar esta delícia aqui no blogue!

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  10. Marília,
    filósofa querida,
    o livro realmente é uma preciosidade.
    Afagos com saudades

    attico chassot

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