sexta-feira, 19 de abril de 2013

19.- MILHO CRIOULO versus MILHO HÍBRIDO



ANO
7
Porto Alegre /
 Frederico Westphalen
EDIÇÃO
2452
Mais uma vez uma edição começa a circular quando já cumpri a primeira das seis horas de viagem de minhas jornada bimensais à Frederico Westphalen. Dois são os catalisadores que determinam a eleição do tema de hoje:
Um, a blogada da última terça-feira, quando se denunciou aqui a biopirataria da Monsanto e outras transnacionais que se apropriam do patrimônio da humanidade, para fazerem suas várias espécies de cultivares tradicionais.
Outro, meu dia de hoje na URI, onde além de encontros individuais com minhas quatro orientandas, há sessões da oficina da escrita no Programa de Pós Graduação em Educação.
Estes catalisadores trazem evocações fortes e por tal emociono-me contar de maneira muito panorâmica como Antônio Valmor de Campos mostrou o quanto agricultores que cultivam milho crioulo são pesquisadores e por esta razão detêm propriedade intelectual sobre as sementes às quais agregam valores.
Antônio é graduado em Biologia e em Direito. Em 14 de agosto de 2006 se fez mestre em Educação. Obteve seu título no mestrado Interinstitucional que a URI Campus Frederico Westphalen realizou com a UNISINOS. Hoje ele é professor na UFFS no campus de Chapecó.
A dissertação “O reconhecimento de agricultores do município de Anchieta-SC, que cultivam sementes de milho crioulo, como pesquisadores e detentores de direito da propriedade intelectual sobre a melhoria dessas sementes” narra o trabalho de agricultores de Anchieta, SC e de municípios lindeiros, na seleção e na produção de sementes de milho crioulo. Estes resistem aos oligopólios das sementeiras que seduzem os agricultores para que adiram ao plantio de milho híbrido, cujas ‘sementes não são sementespois na safra seguintes são estéreis, obrigando-os a comprar, a cada plantação, novas sementes.
Antônio acompanhou durante quase um ano o processo de seleção de mais de uma dezena de variedade de semente de milho e o cruzamento destas para a produção de novas variedades que apresentam características nutricionais e de resistência a pragas com vantagens se comparadas, inclusive, com as alardeadas sementes híbridas. Uma característica fundamental destas sementes caipiras ou crioulas: por não serem patenteadas por transnacionais, elas continuam sendo patrimônio da humanidade, como foram/são a milênios. Lamentavelmente aqui não se pode colocar o tempo verbal serão. Em uma analogia com os softwares livres na área de informática, na dissertação foi defendida a busca de alternativas para que esses agricultores tenham seu trabalho de pesquisa protegido pela outorga de propriedade intelectual sobre o mesmo, para a preservação contra a biopirataria.
O trabalho foi reconhecido pela banca que o avaliou como de profundo significado político e ético, destacando o consistente balizamento teórico-metodológico, recomendando a publicação do mesmo. No trabalho trazido à defesa foi destacado como homens e mulheres que resistem ao ato predador das apátridas empresas de sementes, não estão apenas defendendo a biodiversidade de espécies, mas estão lutando pela não ruptura cultural. Esta consequência danosa determinada pelo oligopólio sementeiro tem custo ambiental difícil de mensurar. Também, no caso das sementes, e vale também para as matrizes animais como as galinhas ou suínos, estamos cometendo um epistemicídio, pois se está terminando com toda uma cultura a respeito da preservação da biodiversidade. Não é sem razão que Anchieta, SC, hoje é reconhecida como capital nacional do milho crioulo.
Quando, enquanto orientador da dissertação, visitei com o Antônio os agricultores do Oeste Catarinense, apenas me convenci o quanto aqueles homens e mulheres que resistem a sedução do milho híbrido que encantou a nossos avós assim como as sereias seduziram a Ulisses e seus navegadores, como aprendemos na Odisseia. Elas e eles são realmente geneticistas que repetem com milho aquelas experiências que monge agostiniano Gregor Mendel fazia com ervilhas nos jardins do monastério onde vivia há 1,5 século. Não sei quantos dos leitores deste texto conseguem imaginar o que significa resistir a promessa de lucros fáceis quando se passa a usar sementes produzidas por empresas biopiratas? É uma situação desigual. No meu livro Educação ConsCiência ao tratar desse assunto evoco o bíblico duelo Davi lutando contra Golias. Ainda um adendo ao relato daquela que é muito provavelmente entre as produções de mestres e doutores que orientei a mais significativa.
A dissertação se fez livro. O Antonio soube tornar um texto acadêmico, às vezes árido, em livro muito palatável: “Milho crioulo: sementes de vida. Pesquisa, melhoramento e propriedade intelectual” [Frederico Westphalen: Editora da URI, 2007]. Tive o privilégio de escrever a apresentação. Conclui assim o prefácio do livro. “Esse é um livro que vale a pena, pelo menos, pelo desafio que trás: oferecer opções para ações possíveis. Ouçamos o Antônio nos dizer. Ousa fazer diferente. Não deixa que apenas os poderosos digam qual o caminho. Então, uma muito boa leitura.” Se algum dos leitores quiser enveredar por uma leitura que vale a pena, encomende o livro diretamente ao autor: prof.antoniocampos@gmail.com

Um comentário:

  1. Limerique

    Vês esta bela gramínea, meu filho?
    Oriunda da América, é o milho
    Mas a Monsanto que diz:
    Dela fiz clone que quis
    E até semente crioula eu pilho.

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