terça-feira, 14 de junho de 2011

14.- Jatos não resistem a cinzas vulcânicas

Ano 5

Porto Alegre

Edição 1776

Uma vez mais os meteorologistas aditam algo original em suas sempre ‘infalíveis’ previsões do tempo: agora, informam onde estão as cinzas do vulcão e com isto prognosticam quando, aonde e a extensão do próximo caos aéreo. Então, me dou conta que estamos tendo a reedição, com cenário local, pois em 20 de maio do ano passado escrevia neste blogue:

E de repente ele entrou em cena. Há uma semana um até então ignoto, faz um espetáculo planetário. Como acredito que não exista alguém que saiba dizer seu nome: Eyjafjallajeokull ou Eyjafjallajökull, ele passou a ser chamado simplesmente o Vulcão. Escutei e reescutei o pronunciar de seu nome na Wikipédia. Se o nome é quase impossível de ser memorizado é também impronunciável, pelo menos para mim que tenho minhas naturais limitações com palavras estrangeiras.

Mas, o Eyjafjallajökull não é qualquer vulcão, como esses que alguns países nossos vizinhos colecionam as dezenas. Por exemplo, na Colômbia, em Pasto, onde estive em outubro de 2009, contemplava o imponente Galeras. Ele é um dos 38 vulcões da Colômbia, dos quais 15 estão ativos. Localizado no pico da Cordilheira dos Andes, próximo de Pasto, o vulcão atinge os 4.276 metros de altitude. Nós brasileiros, não temos nenhum vulcão. Certamente, a não posse dos mesmos não nos causa nenhum sentimento de inferioridade. Ao contrário, reforça a tese eivada de senso comum de que Deus é brasileiro.

O Eyjafjallajökull oferece um espetáculo quase dantesco: a lava sendo despejada aos borbotões de dentro de uma geleira. Lembra um pouco uma taça de sorvete flambada com conhaque. Ocorre que a massa fluída e ígnea se encontra com o gelo produzindo um choque térmico que torna ainda mais densa a coluna de fumaça que chega ter altura de mais de dez quilômetros. Essa fumaça, por conter partículas de dióxido de silício (areia que se torna vitrificada pelas altas temperaturas), estabelece o caos nos aeroportos. As partículas expelidas põem em risco as turbinas dos aviões. Há aeroportos europeus que estão fechados há alguns dias, com incalculáveis prejuízos às companhias aéreas e a milhares de passageiros. Depois da desolação nos aeroportos da Europa, a ameaça também chega aos aeroportos da Ásia e da América do Norte.

Mas o Eyjafjallajökull a 10.681 quilômetros de Porto Alegre – com seu nome impronunciável me ensejou durante o esteirar de ontem outras evocações. Claro que não foram recordações tão vulgares como aquela que a palavra "vulcão" deriva do nome do deus do fogo, na mitologia romana Vulcano, ou que a ciência que estuda os vulcões – a vulcanologia – ganhou destaque na última semana, sendo que ignotos vulcanólogos são alçados a opinar acerca de questões: quando o Eyjafjallajökull vai voltar adormecer por mais duzentos anos? Ou quantos outros vulcões do tipo do Eyjafjallajökull existem adormecidos nas geleiras polares?

Se o Eyjafjallajökull (obrigado ao ctrl C + Ctrl V) tivesse o poético nome de Vesúvio ou de Etna, tão frequente em palavras cruzadas para vulcão (de quatro letras) não surgiriam as lembranças que amealhei. Ele trouxe-me o nome de outro vulcão: Popocatépetl, que agora aprendo que é um estratovulcão. Eu o conheci, a 60 quilômetros da capital mexicana. Há registros de que nos últimos dez anos, sempre no mês de dezembro, entra em atividade, soltando colunas de fumaça que cessam gradualmente. Tenho ainda que fazer público meu mais recente conhecimento de vulcanologia: estratovulcão é um vulcão em forma de cone, formado pelo magma extravasado. Linda a explicação.

O astro da temporada chama-se Puyehue. Tem um nome um pouco mais palatável, mas é referido carinhosamente apenas como o ‘vulcão chileno’. Nuvem de cinza vulcânica do Puyehue na cidade de San Martin de Los Andes, na Argentina (Foto: Reuters)

Mas, agora ponho de lado minha incipiente erudição vulcanológica. Também não tenho expertise em aeronáutica. Devia ouvir a recomendação de Apeles ao sapateiro. ‘Oh Sapateiro! Não vás além das chinelas!’ e não me meter a palpitar em duas áreas nas quais sou leigo.

Mas vulcões existem desde sempre. Quando o Criador disse ‘faça-se a luz’ eles devem ter entrado de carona na criação. A ordem foi tão importante, que até virou marca em caixa de fósforos. Em latim, é claro: ‘Fiat lux!’.

Mas se vulcões têm idades não sabidas e aviões já têm mais de 100 anos; seja na invenção de Santos Dumont ou dos Irmãos Wright e os jatos, que parecem ser as vítimas de intoxicações cinéreas, já tem quase 60 anos, ¿como só agora cinza de vulcão passou a ser perigo?

Quando embarco nestas mega-aeronaves que levam em seu bojo mais de 200 passageiros, ante meu descrédito que possam voar (incólumes) sou informado que elas são construídas para resistir a grande variações de temperatura, atravessarem tempestades atmosféricas, receberem raios, granizos até meteoritos ou sugarem pássaros. Então, por que elas se incomodam com cinzas? E repito, como antes não se falava destas restrições.

Desejei compartilhar meu desconhecimento. Talvez alguém me explique, porque cinzas sendo aspiradas pelas turbinas podem causar este gigantesco caos.

Com curiosidade votos de uma boa terça-feira agradável a cada uma e cada um. Amanhã pretendo voltar para nos lermos.

Uma da série de fotos que podem ser vistas em blogs.denverpost.com/captured/2011

Volcanic lightning is seen over the Puyehue volcano, over 500 miles south of Santiago, Chile, Sunday June 5, 2011. Authorities have evacuated about 600 people in the nearby area. The volcano was calm on Sunday, one day after raining down ash and forcing thousands to flee, although the cloud of soot it had belched out still darkened skies as far away as Argentina. (AP Photo/Francisco Negroni, AgenciaUno) #

4 comentários:

  1. Caro Chassot,

    quando a gente pensa que já viu (e ouviu) tudo sobre as possibilidades meteorológicas aparece mais um entrave para a aviação. Já fui vítima do Puyehue: sexta passada precisava fazer uma viagem doméstica, mas fiquei retido no aeroporto Salgado Filho.

    Entretanto, convenhamos, as fotos noturnas, tiradas do vulcão em erupção, são primorosas, de uma beleza comparável às grandes obras dos artistas do pincel.

    Boa terça-feira!

    Garin

    http://norberto-garin.blogspot.com

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  2. Meu caro colega Garin,
    não te sabia vítima do ‘vulcão chileno’. Hoje há depoimento em jornal que talvez esteja havendo excessos nestas ‘prevenções’.
    Claro que não se imagina que os jatos vão atravessar nuvens de fumaça como se vê em algumas fotos.
    Uma muito boa terça-feira e a manifestação de meu orgulho em te ter como leitor,
    achassot

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  3. Caro vulcanólogo honorário Chassot,
    Li com grande gosto essa blogada quente como lava vulcânica. Curiosamente, também escrevi sobre o Eyjafjallajökull na época em que ele era a estrela ascendente da vulcanologia: "Vou iniciar o texto citando minhas próprias palavras: “Um vulcão islandês com um nome impronunciável (Eyjafjallajokull) até para quem é fluente no idioma daquele país, mostrou quanto o Homo sapiens é impotente e quanto pode ser refém das forças da natureza”. A maioria das pessoas tende a confundir a história do Planeta com a do homem, esquece que a terra tem mais de quatro bilhões de anos e o Homo sapiens ergueu-se sobre suas próprias pernas há menos de um milhão de anos."
    Pois é, hoje a aviação tornou-se refém desses fenômenos porque as turbinas evoluíram e são mecanismos de extrema precisão os quais não toleram desgastes maiores. Como você bem observou, as cinzas vulcânicas contém partículas de dióxido de silício que são particularmente abrasivas e podem comprometer de maneira fatal o bom funcionamento das turbinas. Antigamente, motores convencionais a pistão não tinham esse problema por que eram máquinas não requintadas que absorviam avarias múltiplas sem comprometer o desempenho, hoje a delicadeza e a sofisticação das turbinas não permitem esses excessos. Abraços e parabéns pela blogada, JAIR.

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  4. Meu caro Jair,
    o titulo de vulcanólogo honorário soa-me pomposo.
    Vivemos um paradoxo, quando mais se aperfeiçoa uma tecnologia, menos eficiente ela é.
    Alguns grãos de areia (=dióxido de silício) numa turbina de um jato são mais danosos que um urubu nas hélices de um avião convencional.
    Hoje a imprensa traz opinião de experts que se aliam a minha dúvida: exagero na prevenção. Há que que reconhecer que os que tomam decisões de cancelar voos o fazem com sobradas evidências.
    Por outro lado, tuas considerações de maio do ano passado são válidas: o homo sapiens é impotente até para controlar um chuvisqueiro, que dirá faze-lo com lavas vulcânicas. Há fotos de dramática beleza.
    Obrigado pela tua contribuição de experto em aeronáutica.
    attico chassot

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