quarta-feira, 8 de junho de 2011

08. Um feito da Anistia Internacional

Ano 5

Porto Alegre

Edição 1770

Antes de adentrar no tema que abre o portal: “Um feito da Anistia Internacional” dois toques relacionados com o dia de ontem. O primeiro, comentário acerca de minha maratona de ontem. O segundo, uma palavra a respeito dos densos comentários aditados à última blogada.

Ter viajado mais de 900 quilómetros para participar de uma reunião de um pouco mais de 2 horas foi extremamente gratificante: valeu a pena. 07JUNHO2011 passa para a história da URI Campus de Frederico Westphalen como a data da primeira reunião do colegiado do Programa de Pós-Graduação em Educação. Ontem foi ‘inaugurado’ o curso de mestrado em Educação. Resultado de uma longa preparação. A reunião – para qual fui atenciosamente convidado – prestigiada por autoridades da Reitoria da URI, definiu estratégias para a seleção e detalhes operacionais do curso que se inicia neste segundo semestre.

Meu retorno, como não houvesse transporte coletivo que me permitisse chegar às aulas de Conhecimento, Linguagem e Ação Comunicativa, foi em carro da URI-FW. Sr. Ildo Pinheiro Sarmento percorreu os 450 quilômetros até Porto Alegre, sob continuada chuva em rodovias de trânsito denso e perigoso devido a condições meteorológicas. Os primeiros 430 km foram feitos em 6 horas e os 20 km finais em quase uma hora. Mesmo que cuidadoso motorista me ilustrasse sobre os diferentes da região (da erva mate ao trigo), discorresse acerca de situações acadêmicas da instituição, estivesse atualizadíssimo no noticiário internacional e nacional, comentasse acerca de saberes primevos conhecidos pelo seu pai, reafirmou-se em mim a convicção no preferir transporte coletivo ao invés da aparente mordomia do individual.

O segundo toque: a edição de ontem recebeu quatro comentários de escol. O primeiro respondi desde FW. Dois outros cientistas de escol fizeram estreias aqui e merecem respostas acuradas, até porque preciso em um deles fazer reparos, pois fui mal interpretado. Mas quem atentou a minha maratona de ontem, há de aceitar que não conteste agora, quando a terça-feira se transmuta e quarta-feira, recém chegado de uma aula mesmo com tempo chuvoso, se estendeu até quase 23 horas.

A blogada de hoje é tecida com uma comovente história narrada por Alan Johnston da BBC News, quando uma uruguaia conta como foi salva por enxurrada de cartas em prisão na ditadura. Com meus desejos de uma excelente quarta-feira, eis a história:

Para Maria Gillespie, as lembranças do que ela passou em uma prisão no Uruguai, quando ela tinha apenas 15 anos, são quase insuportáveis. Ela se lembra de ter sido encapuzada, interrogada e torturada. Gillespie teve seus dentes arrancados um a um, até não sobrar nenhum.

Mas ela também se lembra de quanto deve a uma organização cuja ação colocou um fim no horror que vivia e acabou lhe devolvendo a liberdade: a Anistia Internacional, que está completando 50 anos. "Não acho que dizer obrigada é suficiente", diz Gillespie, em referência a militantes da Anistia em todo o mundo que fizeram campanha para que ela fosse libertada.

"Acho que devo minha vida a eles", disse a ex-prisioneira política, que conseguiu sua libertação após uma intensa campanha de cartas promovida pela ONG. Maria foi libertada e recebeu asilo político no Reino Unido, onde vive até hoje. A ONG de defesa dos direitos humanos Anistia Internacional foi fundada 12 anos antes de Gillespie ter sido presa. A entidade pede ação coletiva da população do planeta em nome daqueles que são presos injustamente no mundo.

Maria Gillespie passou a integrar este grupo após os militares tomarem o poder no

Uruguai, em 1973, e instaurarem no país um governo de repressão severa. Ela disse ao programa Witness, da BBC, que embora ainda fosse jovem, já estava casada com um sindicalista procurado pelas autoridades que havia fugido do país. Na ausência do seu marido, apenas algumas semanas após ela ter dado à luz uma menina, Maria Gillespie foi presa.

DOR TERRÍVEL Ela foi acusada de ajudar inimigos do governo e sentenciada a 75 anos de prisão. Assim teve início seu confinamento em uma prisão solitária, um cubículo sem janelas iluminado apenas por uma lâmpada elétrica.

Gillespie descreveu os sons que ouvia através das paredes: "Pessoas gritando. Sons que pareciam ser de pessoas sendo arrastadas de um lugar para outro e, então, tiros. Depois, tudo ficava em silêncio".Com a cabeça encapuzada, ela foi levada várias vezes para interrogatórios. Os militares queriam saber sobre os associados do marido de Gillespie, mas ela não sabia nada a respeito de suas atividades e não tinha respostas.

"Uma vez, você podia ouvir uma criança chorando. Eles disseram que era a minha filha e que se eu não os ajudasse, algo aconteceria com ela - ainda assim, eu não pude ajudar". Então uma nova prática foi adotada: toda vez que ela não respondia a uma pergunta, eles arrancavam um de seus dentes. Os torturadores tiveram de parar quando ela não tinha mais dentes. "Perdi todos", ela disse.

"Simplesmente horrível. A dor. E incapaz de entender por que. Não havia necessidade". Até que, um dia, extraordinariamente, um guarda entregou-lhe um cartão postal. O postal, escrito em inglês, enviado da Escócia, dizia: "Querida Maria. Pensando em você. Margaret."

Ela disse aos guardas que a correspondência não podia ser para ela porque ela não conhecia ninguém na Escócia. Mas eles insistiram que o postal tinha sido endereçado a ela. Alguns dias depois, chegou um outro cartão, desta vez da França, seguido por mais um, do Canadá, e outro, dos Estados Unidos.

SOB PRESSÃO Logo, começaram a chegar torrentes de cartas. Em um dado momento, os guardas disseram que entregariam a ela apenas algumas das cartas mais recentes. Eles lhe passaram 900 postais. Maria Gillespie via as palavras Anistia Internacional nos postais, mas nunca tinha ouvido falar da organização e não entendia por que as correspondências estavam sendo enviadas.

Ela se preocupava, pensando que talvez a Anistia fosse um grupo comunista, e tinha medo de que o apoio da entidade pudesse causar a ela ainda mais problemas. As autoridades, no entanto, estavam cedendo à pressão.

Talvez se sentissem pouco confortáveis com a ideia de que pessoas decentes em torno do mundo estavam observando enquanto eles torturavam uma menina de 15 anos. Finalmente, Maria Gillespie foi levada a uma sala cheia até a metade com sacos de cartas endereçadas a ela.

Ela não tinha dúvida de que toda essa atenção tinha se tornado um problema. Gillespie foi libertada um ano depois. Forçada pelas autoridades a deixar o país, a ex-prisioneira foi colocada em um barco e enviada para a Argentina.

Nas ruas de Buenos Aires, ela viu uma placa com as palavras que tinha visto nos cartões: Anistia Internacional. Ela entrou em contato com os militantes da organização e gradualmente começou a entender como a entidade a havia salvo.

Mais tarde, Maria Gillespie recebeu asilo político no Reino Unido e reencontrou o marido e a filha. Hoje, em seu segundo casamento, a ex-prisioneira vive em Chester, no noroeste da Inglaterra.

4 comentários:

  1. Caro Chassot,

    tua blogada em dois tempos merece comentário duplo.

    Em primeiro lugar, imagino o teu cansaço depois de tão longa viagem. O trajeto de carro deve ter sido muito mais estressante do que o de ônibus. Mas imagino que a tua contribuição na URI, assim como o evento, foi histórica. Há certas coisas que a gente realiza que simplesmente não entende a dimensão e a repercussão - só mais tarde é que se consegue perceber.

    Com relação à Maria Gillespie, é uma história que por si, causa dor em quem lê. A ditadura militar urguaia foi uma das mais crueis da América. A atuação da Anistia Internacional, em tempos em que não haviam meios eletrônicos de comunicação era mais onerosa e complicada. Contudo, a dedicação, o amor às liberdades individuais e consagração dos militantes, não tinha termos de comparação.

    Uma boa quarta-feira, menos cansativa para ti!

    Garin

    http://norberto-garin.blogspot.com

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  2. Caro Chassot,
    Já de volta ao Patropi, leio essa sensacional blogada! Realmente, neste caso da Maria Gillespie a Anistia Internacional foi o fator decisivo de pressão para que os monstros uruguaios enxergassem a enormidade da injustiça que estavam cometendo, pena que em muitos outros a Ditadura não se comoveu e prosseguiu na sanguinária jornada que só fez depor contra a lado piedoso da humanidade. Abraços, fraternos.

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  3. Meu caro colega Garin,
    obrigado pelos votos de uma quarta-feira mais tranquila. Ela ocorre porque afortunadamente uma viagem a Carazinho marcada para esta tarde foi cancelada. Minha ida a Frederico Westphalen, além do significado pessoal foi importante enquanto pertenço, com orgulho, ao Centro Universitário Metodista do IPA.
    Quanto a relato da intervenção da Anistia Internacional na ditadura uruguaia – que adjetivas como das mais cruéis da América – é significativa.
    Com estima

    attico chassot

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  4. Muito estimado Jair,
    fiz uma inferência correta. Ante teu silêncio nas últimas blogadas, imaginei que te deslocavas à pátria amada. É significativa tua emoção bradando contra mostros e exaltando a Anistia Internacional;
    Um muito bom retorno e obrigado pelo privilégio de estares aqui

    attico chassot

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