terça-feira, 7 de junho de 2011

07. - Religiões: ¿(des)ajudam?

Ano 5

A bordo ônibus da Ouro e Prata

Edição 1769

Quando esta blogada entrar em circulação (00h03min) faltará cumprir 5 horas (de um total de 6 horas e 15 minutos) para percorrer os 450 quilómetros entre Porto Alegre e Frederico Westphalen, no norte do Estado, quase na divisa com Santa Catarina.

Na manhã desta terça-feira participo de uma reunião que estuda a implantação do Mestrado em Educação na URI-FW, recentemente autorizada pela CAPES. Tenho uma ligação histórica com a URI de FW. Em mais de uma oportunidade preferi aulas inaugurais e, mais especialmente, ao integrar o corpo docente do mestrado interinstitucional Unisinos/URI. Foi neste mestrado que tive como orientando o Antonio Valmor de Campos, hoje professor da UFFS, no campus de Chapecó.

Após participar da reunião, retorno à Porto Alegre, pois à noite tenho aula de Conhecimento, Linguagem e Ação Comunicativa, no Centro Universitário Metodista do IPA. Trago grandes expectativas na possibilidade de colaborar nesta parceria.

Há, ainda, assuntos do fim de semana a comentar. Não vou falar nem do badaladíssimo aumento da fortuna do Palloci e muito menos em mais uma discutível eleição na Academia Brasileira de Letras. Trago uma pequena notícia: Religião pode encolher cérebro. Ela está no Caderno Vida, de Zero Hora, do último sábado, dia 4. O senso comum, para mim, fazia supor o contrário do que relata a pesquisa referida na notícia. Eis a integra da mesma e adito comentários justificando porque eu eu esperava resultados em direção oposta.

Pesquisadores da Universidade de Duke, nos EUA, observaram os cérebros de 268 homens e mulheres com mais de 58 anos e notaram que o hipocampo região envolvida, principalmente, na formação de memórias era significativamente menor naqueles que se identificavam com grupos religiosos específicos ou que tinham passado por experiências religiosas de mudança de vida.

Segundo os cientistas, certos aspectos da religião podem causar um estado constante de estresse em algumas pessoas. Por exemplo: há quem faça parte de uma minoria religiosa e sofre preconceito, vivendo num estado de nervos mais delicado. Também pode acontecer com quem vive com o medo de ser “punido por Deus” ou que tem ideias conflitantes com certos dogmas da religião.

Ao longo do tempo, a liberação constante dos hormônios do estresse diminuiria o volume do hipocampo. Literalmente, faria o cérebro “encolher”. Amy Owen, coordenadora do estudo, disse ter ficado surpresa com o resultado porque várias pesquisas apontam para os benefícios da religião, como o alívio da ansiedade e da depressão. O levantamento é o primeiro no gênero.

Primeiro há que considerar ser esta uma primeira (e única) pesquisa nesta direção. Logo estas inferências precisam ser vistas com reservas. Parece-me, de maneira usual que as pessoas religiosas desfrutam uma paz interior; logo tudo leva(ria) a prever uma direção aposta. Parece-me que ser coerente com ensinamentos doutrinários é algo que faz os crentes distinguidos. Eles têm horizonte;

Há outra dimensão. Ser religioso é uma ação solidária. Ser ateu é algo solitário. Não sem razão que as igrejas têm os cultos. Mesmo aquele que diz que ‘reza sozinho em casa’ sente-se em comunhão com um mundo maior. A dimensão ‘católica’ (= universal) das igrejas produz um sentimento de pertença.

Há, todavia, algo mais transcendental para os crentes que não-crentes não têm: o credo em uma vida após a morte. O consolo que as igrejas oferecem, por exemplo, quando da ‘despedida’ de ente querido é algo invejável. Destaco particularmente os de fé espírita, como privilegiados nesses momentos.

Todavia, não sou teólogo, e devo lembra-me da história do sapateiro que quis fazer uma segunda correção no quadro de Apeles. Ouço a reprimenda: ”Ó Sapateiro não vás além de tuas chinelas!”

Com esta vestida de carapuça, só me resta desejar a melhor terça-feira para cada uma e cada um. Amanhã voltamos a nos ler de Porto Alegre, onde quero estar chegando quando este 7 de junho se fizer noite.

ATENÇÃO: A postagem de comentários ficou simplificada. Agora eles independem de aprovação do editor. Este se reserva o direito de, posteriormente, eliminar aqueles ofensivos o que incitem discriminação. Pede-se comentários assinados e se possível com endereço para resposta.

12 comentários:

  1. Caro Chassot,

    a tua blogada me deixou preocupado: vou solicitar uma medição do meu cérebro, afinal de contas, a vida toda sou religioso. Brincadeira é claro: tu não és o pesquisador e só estás repercutindo a pesquisa, até porque não a notícia não se reporta a malefícios desse "encolhimento" do cérebro.

    Gostaria de te estimular a aprofundar um pouco mais a afirmação que fazes de que "ser ateu é algo solitário" em oposição a afirmação de que "ser religioso é uma ação solidária".

    Espero que tua viagem à FW tenha sido tranquila e os resultados dessa empreitada muito gratificante.

    Um abraço,

    Garin

    http://norberto-garin.blogspot.com

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  2. Meu caríssimo amigo Garin,
    primeiro uma realidade: dois noctívagos postam simultaneamente nos blogues um do outro.
    Viste que eu descaracterizei a pesquisa em outra direção.
    Quanto ao binômio: religioso=solidário //ateu=solitário, já escrevi algo sobre isto em um texto [“Diálogos de Aprendentes”] publicado em julho passado pela Editora Unijuí.
    Te parece (ou parece-te, como querem os da ‘norma culta’) que vale adensar?
    Obrigado pelos votos de bons fazeres em Frederico Westphalen onde a madrugada é com trovejares;
    Com estima
    attico chassot

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  3. Querido mestre
    Seus dois últimos posts enriquecem uma discussão que tem havido nas turmas de pedagogia onde discuto fundamentos de ensino de ciências: como a morte aparece na escola de ensino fundamental e nos materiais didáticos utilizados pela mesma? Percebemos em nossos estudos que não aparece. Ontem à noite discutimos a questão de como falar sobre a morte para as crianças... Com viés religioso? sem esse viés? É uma questão difícil, que ficou em aberto, mas para a qual seus últimos posts contribuirão em muito. E sabe um aspecto interessante? O que motivou essa discussão foi o fato de os PCN's orientarem a abordagem do tema AIDS no primeiro ciclo do ensino fundamental. Bem, como disse anteriormente, a discussão está em aberto. Seguiremos pensando... Um forte abraço e desejo de uma boa semana: Cris Flôr

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  4. Bom dia Chassot,
    Também sou pesquisador da área de ensino de ciências e sigo silenciosamente seu blog. Entretanto, nesta postagem, me senti mobilizado a fazer dois comentários.

    O primeiro é que, pelo que se pode inferir das informações sobre a pesquisa contidas na reportagem, há uma boa dose de sensacionalismo na forma como foi apresentada a reportagem (como sempre). Simplesmente porque correlação não significa relação causal e, dito isto, fica claro que a ideia de que as situações de stress vividas por religiosos impedem o desenvolvimento do seu cérebro não é mais que uma hipótese dentre muitas possíveis. Para mim, pelo menos, parece que seria muito mais razoável inverter a relação causal, isto é, considerar que pessoas com cérebro menos desenvolvido estão mais propensas a aderir a uma religião (sem ofensas aos leitores religiosos. Não quer dizer que pessoas muito inteligentes também não possam aderir).

    O segundo comentário que gostaria de fazer é que discordo fortemente das diferenças que você constatou entre ateus e religiosos. Não considero que religião implica em uma postura mais solidária que o ateísmo, assim como não considero que religião defina caráter. Uma pessoa pode muito bem ser atéia e ter uma postura extremamente solidária, talvez influenciada por alguma ideologia, talvez simplesmente sob efeito dos valores morais que recebeu em sua formação sem o intermédio da religião. Um bom exemplo disso é a LiHS (http://bulevoador.haaan.com/), entidade atéia e flagrantemente solidária, como sugere o "Humanista" em seu nome. Da mesma forma, uma pessoa pode ser religiosa e extremamente individualista/egoísta (será que algum de nós considera Edir Macedo ou Malafaia pessoas solidárias?). Enfim, a campanha da ATEA censurada, embora um tanto rude, é boa para questionar este tipo de mito (http://goo.gl/kgTIR).

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  5. Caro Chassot. Coincidência ou não depois de um certo tempo que não nos víamos pessoalmente o meu celular automaticamente ligou ontem para você e conversamos rapidamente. Hoje numa rápida passada pelo facebook verifiquei essa postagem e resolvi fazer um comentário. Como sabe o cérebro e a aprendizagem é o meu campo atual de atividades de pesquisa.
    Claro que a matéria é coberta pelo reducionismo dos fisiologistas, mas sobre isso não quero comentar, minha posição é demasiadamente conhecida. Queria apenas chamar a atenção de que conforme ressonâncias magnéticas recentes feitas em diversos estudos a atrofia do hipocampo em idade mais avançada é considerada quase inevitável. São vários fatores sociais que podem afetar a diminuição do hipocampo e a perda de memória. No perfil desta população estudada com mais de 50 anos o sedentarismo pode ser a causa principal.
    Porém, o que quero contribuir aqui é que as pesquisas também mostram que essa redução pode ser reversível. Em nossas atividades da neuroaprendizagem que pesquisamos com crianças lesionadas descobrimos o quanto a fisiologia do cérebro é muito mobilizada de plasticidade e reconfiguração (inclusive a memória) também descobrimos que a relação das redes sinápticas com os eventos macro-sociais não são tão lineares como pensam os neuro-psico-cognitivistas e nem tão desconsideradas como pensam os behavioristas.
    Uma das atividades mais importantes para a reversão da atrofia do hipocampo é a atividade física regular nessa idade. Assim. mesmo com exercício moderado por um ano (alongamentos) pode-se aumentar o tamanho dessa importante estrutura para consolidação de fatos-eventos (hipocampo). Isso pode ocorrer principalmente. no hipocampo direito.
    Então as manifestações carismáticas de aeróbicas do senhor tão criticadas por diversos setores do catolicismo pode ser uma adequação interessante entre religião e aumento do hipocampo para maiores de 50 anos.
    Abçs!
    Gilson Lima

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  6. Muito querida Cristhiane,
    fico satisfeito que estas blogadas envolvendo ‘tanatologia’ tenham trazido contribuições a um estudo que usualmente minimizamos ou até deletamos.
    O momento que desejares trazer uma contribuição mais ampla acerca deste tema, faço de teu texto uma edição especial.
    Com expectativa

    attico chassot

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  7. Muito estimado Nathan,
    ~~ busquei, sem sucesso, um endereço eletrônico para responder-te; faço cópia aos Professores Gilson & Garin, pela relação com comentário que aditaram~~,
    acerca de teus dois comentários, posiciono-me:
    1) Concordo com tua análise quanto ao sensacionalismo e falta de base empírica para as inferências feitas a partir da pesquisa. Devo reconhecer que o assunto pode dar margem a preconceitos contra os religiosos. Isso é tudo que não permito-me estimular.
    2) Discordo de tua posição, pois ela está marcada pelo não entendimento (por falta de clareza de minha exposição) da tese religioso=solidário //ateu=solitário. Primeiro, jamais poderia insinuar a ‘não solidariedade’ de ateus e também não me aventuraria a imaginar que os fundadores de religiões pós-modernas possam ser exemplos de solidariedade. Minha tese religioso=solidário //ateu=solitário está marcada pela prática do crente e do não-crente. O crente encontra na igreja momentos de apoio a suas crenças (ainda em outro momento quero mostrar o quanto as igrejas neopentecostais são espaços privilegiado de entreajuda espiritual e também material). Os não crentes curtem, usualmente, seu ateísmo sozinhos, numa solidão marcada pela ‘imparceria’. Isso não quer dizer que não sejam solidários com o próximo, eles são solitários nas suas ‘não-crenças’. A ATEA, cujo trabalho admiro, mesmo que discorde de sua militância modelo Dawkins, não é (e nem deseja ser) uma igreja que ‘conforte’ os irmanados no ateísmo.
    Nathan, preciso dizer que acolho com muito orgulho tua participação aqui.
    Obrigado por teu comentário muito pertinente

    attico chassot

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  8. Muito estimado Gilson,
    primeiro dizer que a ligação modelo ET que me fizeste quando partia para uma longa viagem catalisou boas evocações. Ao retornar encontro tua preciosa contribuição, como um especialista em estudos do cérebro. Estares junto com o Garin num comentário aqui, me fez distinguido.
    Concordo com tua defesa: a reducionismo empírico da pesquisa. Mas quero destacar a tua informação preciosa e que eu desconhecia do quanto essa redução possa ser revertida.
    Muito obrigado por tão importante trazida.
    Obrigado pela tua distinguida presença aqui,
    attico chassot

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  9. Caro Chassot,
    Apenas opinião de um leigo que não perde oportunidade de dar pitacos mesmo em matéria que nada entende: Não seria o caso de pessoas que tem hipocampo menor optarem por serem religiosas? Outra hipótese: Todas as opções que envolvem crença ao invés de raciocínio fazem o hipocampo diminuir. Afinal, para que pensar se as fórmulas religiosas já vêm prontas, não é mesmo? Abraços, fraternos.

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  10. Olá Chassot,

    Grato pela atenção e pela resposta. Concordo com muito do que disseste. Vou refletir sobre sua resposta, mas ainda me parece que sua tese faz uma generalização com a qual não concordo. Se for o caso retorno aqui para tecer mais alguns argumentos.

    Saudações e parabéns pelo interessante blog.


    Ps.: Quando eu comento em uma postagem os comentários posteriores chegam diretamente no meu e-mail. Obrigado pela preocupação.

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  11. Muito estimado Nathan,
    todas as generalizações – e vou fazer uma agora –: têm o risco de fazermos inclusões/exclusões de pontos fora da curva.
    Claro que a tese: religioso=solidário //ateu=solitário é uma afirmação generalista.
    Um ermitão que jejua e medita sozinho no deserto (acredito que não exista mais isto) é um solitário na sua religiosidade. Aqueles amigos ateus que se encontram para teologizar acerca do quanto deus não é todo poderoso, pois deve ser incapaz de fazer uma pedra tão pesada que ele não possa carregar (obrigado! Prof. Garin), são solidariamente fortalecidos em seu ateísmo.
    Não sei como possam te chegar esses comentários, mas posso acreditar, ante teu anuncio, que eles chegam.
    Agradeço tua atenciosa avaliação deste blogue e obrigado pela parceria intelectual.

    attico chassot

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  12. Meu caro Jair,
    em comentário ao Nathan, publicado aqui, dizia que todas as generalizações correm o risco de incluir/excluir pontos fora da curva. Tua tese me parece preconceituosa. E os renomados pensadores e filósofos religiosos ou até expertos charlatões que enganam em alguma religiões... não teriam o hipocampo aumentado. Esse assunto faz-me lembrar as concepções machistas de Aristóteles, dizendo que as mulheres eram seres inferiores aos homens pois tinham menos cérebro e menos espermas. Mas isto foi há 2.400 anos AP.
    Obrigado pelos teus pitacares.

    attico chassot

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