quinta-feira, 18 de novembro de 2010

18. Por que modelamos a realidade?

Porto Alegre Ano 5 # 1568

Não acredito que algum de meus leitores chegue aqui por aquilo que faço manchete a cada dia. Se a aqueles para quem aquele anúncio faz atração, hoje a ‘portada’ pode até tornar leitores desinteressados. Peço que revisem a posição e não tenham como exótico este blogar.

Tenho justificativas. Esta semana, por facilitações de agenda (não tenho viagem) estou me dedicando mais intensamente às tessituras do livro que anunciei aqui no dia 6 de novembro. Por tal, tenho me envolvido em textos que escrevi. Revisito alguns. Parece oportuno repartir com meus leitores, antecipando o que estará no futuro livro.

Assim, peço indulgência, mas trago essas considerações aqui com sobradas razões. Antecipo que considero um dos assuntos curriculares mais relevantes na área de formação de professoras e professores para a área de Ciências.

A necessidade de trabalharmos com modelos é própria do ensino das Ciências em geral. Antecipo aqui sua importância e para tal sempre destaco algo que me foi muito particular nesse assunto. Quando fiz o primeiro ano do curso colegial, tive um professor de biologia que era também um excelente desenhista. Ainda hoje, evoco suas muito bem produzidas representações de células que fazia com giz colorido no quadro-negro. Ocorre que nunca chamou a atençãopelo menos que eu me lembre – que o que víamos em duas dimensões, precisava ser pensado em três. Por exemplo, para mim o núcleo era uma circunferência e eu não o imaginava sendo uma esfera! Assim para mim os tecidos celulares seriam apenas filmes! Então e por muito tempo depois, quando imaginava células não pensava em três dimensões. Talvez seja essa a razão que me parece mais significativa para trazer as considerações que seguem e as faço, mais especialmente, para aquelas e aqueles que necessariamente não estão enfronhados nas discussões de ensino de Ciências.

Uma das perguntas usuais que professoras e professores de Química fazem, principalmente quando trabalham no ensino médio, é: Qual o modelo de átomo que devo ensinar? Uma boa resposta poderia ser: Depende para que os átomos modelados vão ser usados depois... Construímos modelos na busca de facilitação de nossas interações com os entes modelados. Assim os modelos (que podem ser gráficos, ou matemáticos, ou redacional ou uma maquete), quando da descrição de algo nas Ciências sãoinstrumentospara facilitar nossa interação com a realidade É através de modelos, nas mais diferentes situações, que podemos fazer inferências e previsões de propriedades.

Temos, por limitações que são consequências de nossas maneiras de interagir com a natureza, dificuldades de imaginar, por exemplo, a luz com comportamento dualístico. É mais fácil pensá-la ora como onda, ora como partícula. Assim como é difícil imaginar uma célula nas suas três dimensões, é muito mais complexo imaginar um raio de luz comportando-se como onda e partícula, ao mesmo tempo.

Fazer modelos, isto é, imaginar átomos – e vale insistir que imaginar é fazer imagens – tem limitações e exigências que transcendem àquelas interações que são mais usuais no nosso cotidiano. Em função de nossas vivências é muito mais fácil imaginar um elétron corpuscular do que um elétron ondulatório. É ainda mais difícil imaginá-lo comportando-se, ao mesmo tempo, como onda e partícula.

Há uma questão capital: Para que construímos modelos? Se quisermos explicar as ligações que ocorrem em um cristal de cloreto de sódio, o modelo atômico proposto por Bohr (1875-1962) é razoavelmente adequado e nos ajuda a compreender como ocorre a formação de cátions e ânions e como entre estes se estabelecem interações para a estruturação de um edifício cristalino. Se quisermos explicar uma molécula, aparentemente simples, como a de hidrogênio: H2, este mesmo modelo oferece muitas limitações. Para explicar, mais consistentemente, como dois átomos de hidrogênio formam uma molécula H2 é preciso que se tenha o conceito de orbital, que não está presente no modelo de Bohr. Logo os diferentes modelos são modificados em função de novas leituras que se faz sobre natureza da matéria.

Permitam-me não alongar muito este papo hoje. Para antecipadamente não perder leitores para amanhã já anuncio a manchete: Por que o Lego é o jogo mais genial do mundo? E para responder vou me valer da instigante novela de Jostein Gaarder acerca da história da filosofia, O Mundo de Sofia. Com este aceno, meus votos de uma muito boa quinta-feira.

Um convite: leia o apelo do Presidente da Wikipédia.

2 comentários:

  1. Bom dia Professor!
    Importantíssima esta postagem do senhor hoje!
    E engraçado como me colocava a pensar sobre esse assunto dias atrás.
    =]
    Assim como o senhor faz referência a seu professor de biologia do colegial, eu tive um de química que me "perturbou" com as benditas moléculas!
    Rsssss!
    Desenhava no quadro as moléculas de sal reagindo com as de água em um copo e eu ficava looooouca por ver aquilo de verdade!
    Os cristaiszinhos de sal e as "orelhinhas de mickey" da água!
    Nem precisa dizer que não enxerguei nada, né?!
    Hoje tomo um cuidado danaaaaaado em muitas referências e situações que faço em sala, para que, mais adiante, meus alunos não se frustem tanto!
    Mas SIM, concordo que os modelos são necessários!Mas concordo mais ainda que o professor deve ter senso de dizer ao seu aluno que trata-se de um modelo!Em nossa inocência secundarista, muitos de nós acreditamos que é daquela forma e pronto!Cabe ao professor já ir mostrando aos seus alunos como funciona na realidade!
    Ao menos é o meu ponto de vista, e é o que tenho feito ultimamente com meus alunos.
    Um mol de abraços, Professor!
    ^^!
    Uma abençoada quinta-feira!

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  2. Muito querida Thaiza,
    fico muito gratificado que estas minhas reflexões tenha subsidiado tuas análises acerca de nossa necessidade de modelarmos a realidade, mas estarmos atentíssimos que fazemos idealizações que são pálidas (¿será que elas têm cores?) representações da realidade.
    Amanhã vou um pouco adiante e tu és uma vez mais minha convidada.
    Obrigado pelo mol de abraços e os retribuo com um mol de acarinhamentos a nascitura Ellen
    attico chassot

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