ANO
10 |
EDIÇÃO
3106
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Teço esta blogada em três movimentos: #1) Uma pavana chamada saudades, onde se evoca marcas fortes que tem a data de hoje. #2) Uma sonata que marcada pela tolerância, que mostra a disseminação do bom nas redes sociais. #3) Um sinfonia para se aprender a viver juntos, numa realidade chamada cidade.
#1) Uma pavana chamada saudades. Há datas que tem marcas fortes em nossas histórias. 24 de
novembro é talvez para mim a de mais densas emoções. Hoje é dia de aniversário
do Sirne (1940-2002). Erámos sete filhos. Eu o primeiro. Ele o segundo. Um ano
e 18 dias de diferença. Houve tempo que passávamos por gêmeos. Já faz 13 anos
que ele partiu. Mas parece que a cada dia se aviva mais a saudade. Ter ele
morrido quando estava em pós-doutorado em Madri, parece que potencializa a saudade.
Minha saudade é incomparavelmente menor que a daqueles que
perderam pessoas queridas nos ataques terroristas. A dor deles, especialmente
de Melvil e Antoine, que estão no segundo movimento, se faz exemplo para
aprendermos a ser tolerantes.
#2) Uma sonata que marcada pela tolerância. Nesta segunda lemos na aula da Universidade do Adulto Maior uma
carta que já foi disseminada, em dezenas de idiomas nas redes sociais. Meus
alunos pediram que a colocasse no blogue. Antoine Leiris é o nome de um jornalista francês,
até aqui desconhecido do grande público, mas que está inspirando o mundo após
perder uma das pessoas mais importantes em sua vida nos atentados da última
sexta-feira, 13 de novembro, em Paris: a mulher e mãe de seu filho.
O jornal Libération divulgou a carta
do recém-viúvo e ela tem se tornado viral. Os motivos são óbvios: inspiradora,
tocante, a carta é uma prova de que o amor vencerá.
“Vocês não terão o meu
ódio
Na noite de sexta-feira vocês acabaram com a vida de um ser excepcional, o amor da minha vida, a mãe do meu filho, mas vocês não terão o meu ódio. Eu não sei quem são e não quero sabê-lo, são almas mortas. Se esse Deus pelo qual vocês matam cegamente nos fez a sua imagem, cada bala no corpo da minha mulher terá sido uma ferida no seu coração.
Na noite de sexta-feira vocês acabaram com a vida de um ser excepcional, o amor da minha vida, a mãe do meu filho, mas vocês não terão o meu ódio. Eu não sei quem são e não quero sabê-lo, são almas mortas. Se esse Deus pelo qual vocês matam cegamente nos fez a sua imagem, cada bala no corpo da minha mulher terá sido uma ferida no seu coração.
Por isso eu não vos darei o presente de
vos odiar. Vocês procuraram-no, mas responder ao ódio com a cólera seria ceder
à mesma ignorância que vos fez ser quem são. Querem que eu tenha medo, que olhe
para os meus concidadãos com um olhar desconfiado, que eu sacrifique a minha
liberdade pela segurança. Perderam. Continuamos a jogar da mesma maneira.
Eu vi-a esta manhã. Finalmente, depois
de noites e dias de espera. Ela ainda estava tão bela como quando partiu na
noite de sexta-feira, tão bela como quando me apaixonei perdidamente por ela há mais de doze
anos. Claro que estou devastado pela dor,
concedo-vos esta pequena vitória, mas será de curta duração. Eu sei que ela nos
vai acompanhar a cada dia e que nos vamos reencontrar no país das almas livres
a que nunca terão acesso.
Nós somos dois, eu e o meu filho, mas
somos mais fortes do que todos os exércitos do mundo. Eu não tenho mais tempo a
dar-vos, eu quero juntar-me a Melvil que acorda da sua sesta. Ele só tem 17
meses, vai comer como todos os dias, depois vamos brincar como fazemos todos os
dias e durante toda a sua vida este rapaz vai fazer-vos a afronta de ser feliz e livre. Porque
não, vocês nunca terão o seu ódio.“
#3) Um sinfonia para se aprender a viver juntos.
Na noite desta segunda ocorreu a última
das oito sessões do Fronteiras do
Pensamento 2015. Ouvimos Janette Sadik-Khan,
uma jovem urbanista estadunidense. Ela ficou conhecida ao transformar, em
questão de dias, ruas e avenidas como a Broadway, reduzindo as pistas para os
carros e ampliando o espaço para as pessoas. Formada em Ciências Políticas pela
Faculdade Occidental e mestre em Direito pela Universidade de Columbia, foi
Secretária de Transportes de Nova York de 2007 a 2013, durante a gestão do
prefeito Michael Bloomberg. Em seus projetos, mudou o cenário da cidade,
privilegiando o pedestre, o ciclista e o transporte público.
Em sua gestão, liderou quase 5 mil colaboradores e administrou
mais de 10 mil quilômetros de ruas e centenas de pontes, apresentando novos
conceitos e aproveitamentos à população nova-iorquina, através de testes
rápidos e ensaios regulares. Além da Broadway Boulevard e da área na Times
Square, criou outras dezenas de novas praças para pedestres, aumentando a
circulação e incentivando o comércio local. Com mobiliário simples e
provisório, estudava os impactos para, posteriormente, sugerir mudanças a longo
prazo, com design melhorado. Também criou mais de quatro centenas de novas
ciclovias e vias compartilhadas.
Atualmente, é presidente do Strategic Advisory Board da National
Association of City Transportation Officials e diretora de transportes da
Bloomberg Associates, onde trabalha com prefeitos de todo o mundo para redesenhar
cidades com projetos rápidos e de baixo custo. Usuária das ciclovias, em 2013
colaborou para o projeto de compartilhamento de bicicletas em Nova York,
tornando a cidade uma das capitais mais amigáveis à bicicleta nos Estados
Unidos.
Janette Sadik-Khan defende que somente a criação de ciclovias
não promove mudanças, pois é necessário negociar com o comércio e criar
atrativos para que as pessoas frequentem as novas vias. Suas contribuições
foram agraciadas com os prêmios da Fundação Rockefeller e do American Institute
of Architects.
Os humanos optaram por morar em cidades. É cada vez maior o êxodo
rural. O aumento da população urbano só é viável se diminuirmos os automóveis.
O homem moderno precisa aprender a viver e a conviver em cidade harmonicamente, em que o respeito ao outro como outro seja a chave da necessária tolerância. O mundo é uma grande pequena aldeia com recursos materiais finitos. É como uma grande casa comum na qual as pessoas são mais importantes que qualquer material. Porque, por exemplo, destruir árvores que servem aos humanos para priorizar enormes ruas/estradas que priorizam o indústria automobilística? Ou inutilizar espaços comuns em detrimento da especulação financeira?
ResponderExcluirAbraços, mestre.
Muito estimado Vanderlei,
ResponderExcluirobrigado por agregares qualidade a este blogue com as reflexões do filósofo que se faz professor.
Realmente a nossa aldeia não foi feita para sua 'majestade o automóvel'. No momento que pensarmos que a polis é para os humanos, talvez estaremos sendo mais racionais. Vale ouvir o Papa Francisco na Laudato Si'.
Renovo meu encantamento com tua presença marcada, aqui, pela lucidez de teus comentários,
achassot