sábado, 28 de abril de 2012

28.- UM SÁBADO COM DICA DE LEITURA



Ano 6*** Frederico Westphalen/Porto Alegre    ***Edição 2096
Como a edição anterior, esta postagem ocorre a bordo, agora no sentido inverso de ontem. Depois de um frutuoso dia em Frederico Westphalen, estou retornando para chegar a Porto Alegre, cerca das 6h.
Merece um registro: já ao tomar o ônibus lotado na noite de quinta-feira em Porto Alegre e ao chegar saber que não havia mais vaga em nenhum dos hotéis da região, tomei ciência que minha palestra à noite teria uma estrela de primeira grandeza como concorrente: Michel Teló estava na cidade. Resisti... Os participantes me honraram com atenção até o fim e eu posso registrar que estava no mesmo hotel do astro.
Mas o melhor acontecimento da noite foi encontrar, quando jantava com colegas, o Prof. Dr. Antonio Marcos Sanseverino, que estava na URI em palestra no Programa de Pós-Graduação em Letras. Poder na rodoviária enviar para seus pais um exemplar de Memórias de um professor: hologramas desde um trem misto. A Maria Tereza e o Sanseverino estão densamente presentes no capítulo do ano 1968.
Antes uma nota lateral. Os assuntos que movimentaram a semana, provavelmente granjearam novos leitores a este blogue, para eles um esclarecimento: aos sábados, honrando uma tradição de mais de quatro anos é usual uma dica de leitura. Hoje a sugestão sabática se faz desde Frederico Westphalen, quase nas barrancas do Uruguai, em região fronteiriça com o Oeste catarinense.
Talvez por ontem termos, sentimentalmente, visitado o Uzbequistão e este ser limítrofe do Afeganistão — o mais conhecido desta plêiade de países ***stão, que se vê no mapa que ilustrou a edição de ontem e são uma quase abstração, para mim e certamente para maioria de meus leitores — lembrei-me de O livreiro de Cabul — um dramático relato de uma jornalista norueguesa que viveu com a família do livreiro e conta com crueza e lirismo o cotidiano de personagens que lemos com avidez, como se fosse um romance, mas dolorosamente é um livro acerca da dura realidade de homens e mulheres no século 21.
Li o livro em 2006, quando do lançamento no Brasil e esta resenha é requentada a partir de texto que publiquei então em www.letraselivros.com.br/index2.php?option=com_content&do_pdf=1&id=243
SEIERSTAD, Åsne. O livreiro de Cabul. Rio de Janeiro: Record, 2006. 316 p. ISBN: 85-01-07287-
O livreiro de Cabulque no seu título traduz meu apreço a esse sítio que semeia livros. É um livro que classifico como bonitamente triste. Terminada sua leitura, a sensação que senti foi de uma imensa tristeza. Talvez, não sem egoísmo, dissesse-me ‘ainda bem que aqui não é o Afeganistão’. Mas esse país existe. também é século 21. Ou ainda é tempo de cavernícolas?
Mesmo que seja uma sugestão ‘velha’; afinal o livro já tem seis anos, parece oportuno lembra-lo aqui. Como vimos ontem, parece que a situação não mudou muito. Todavia, peço a indulgência de meus leitores por não trazer ‘novidade’. Também no vou culpar a momentosa “T”DI.
Há época que li a dica de hoje, havia lido vários livrosNiketche: uma história de poligamia, As boas mulheres da China, Amêndoa: um relato erótico e Um lugar chamado Brick Lane e Shrin-Gol e a burca – que nos ensejam conhecer realidades bastante diferentes de nosso mundo ocidental. A estes poderia juntar o admirável Caçador de pipas, que também nos leva ao Afeganistão. Falamos muito em mundo globalizado, porém há, ainda, quistos geográficos que são exóticos aos nossos costumes, muito especialmente na maneira como são tratadas as mulheres. Nenhum dos livros antes mencionados parece ser tão impactante quanto O livreiro de Cabul. Aliás, se pudesse dizer o que me pareceu Cabul, pela leitura desse e outros livros ambientados, diria: um pandemônio.
A autora Åsne Seierstad é uma jornalista norueguesa, nascida em 1970. Ela cobriu a guerra no Iraque e os conflitos em Kosovo e no Afeganistão. Merece, aqui uma referência especial, por ter construído com a renda do livro aqui apresentado uma escola para 600 meninas afegãs, que têm aulas em dois turnos diários.
Åsne escreve seu depoimento feito livro por ter vivido na casa de Sultan Khan, o livreiro de Cabul, conhecendo então as intimidades dos universos masculinos e femininos no fundamentalista Afeganistão, após a ditadura talibã. Sultan é uma figura crucial. Amante dos livros, culto, trabalhador, vítima da tirania em função da profissão – foi preso, teve seus livros queimados – mas um déspota no exercício do patriarcado familiar. Suas esposas, seus filhos e filhos, empregados o temem como se fosse apenas um verdugo. Talvez essa seja uma situação paradoxal do livro: um homem de letras, herói na disseminação de livros não fundamentalistas, não tem essas posturas machistas, como foi a Noruega, não para impedir a circulação do livro, como também para exigir uma reparação judicial, por se sentir difamado no livro.
Não é sem razão que esse livro, lançado no Brasil no mês de junho de 2006, passado um mês do lançamento tivesse vendido 20 mil cópias. No mundo foram dois milhões de exemplares comercializados, com direitos vendidos para 30 países. Logoporque recomendar entusiasticamente às leitoras e aos leitores deste blogue, no último sábado aprilino O livreiro de Cabul.

5 comentários:

  1. Caro Chassot,
    lembro do lançamento e da polêmica em torno desse episódio, à época. Sabemos muito bem como a ideologia introjetada desde a infância é capaz de distorções como essas que mencionas em tua síntese.

    A propósito, fiquei com pena do Michel Teló, tendo como concorrente a tua conferência.

    Um abraço,

    Garin

    Um abraço e bom sábado.

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  2. Caro Chassot,
    Ótima leitura, já o li e recomendo. Abraços sabatinos, JAIR.

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  3. Este comentário foi removido pelo autor.

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  4. Caro Chassot,
    Acho muito oportuno lembrar que o livro de Âsne Seierstad "O livreiro de Cabul", deu azo a que Shad Muhammaad Rais, verdadeiro nome de livreiro afegão "Sultan" que a hospedou e que ela descreveu segundo uma ótica européia totalmente conflitante com os valores Afegãos, escreveu em resposta: "Eu sou o livreiro de Cabul", um livro que ataca a jornalista alegando que ela traiu a confiança que ele depositou nela. Não é um livro totalmente isento, já que aproveitou a trajetória ascendente do livro de Âsne para tirar uma casquinha, mas tem certo valor por mostrar um ponto de vista cultural totalmente oposto àquele que a jornalista descreve. Rais diz que em muitas passagens do livro, ela não foi fiel à realidade, que ficou realmente muito longe dos fatos que testemunhou, ela inventou coisas a meu respeito e de minha família. Ele voou até Oslo para tentar uma indenização por danos morais, mas parece que a justiça da Noruega considerou que a identidade dele está preservada no livro. Pelo sim pelo não, recomendo que após ler o livro de Âsne leiam também o livo de Rais, é uma questão de justiça. Abraços, livreiros, JAR.

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  5. Esta é uma dica fantástica... Boa lembrança Chassot...

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