quarta-feira, 7 de março de 2012

07.- AÇAFRÃO: ESPECIARIA, CORANTE E REMÉDIO



Ano 6 *** www.professorchassot.pro.br *** Edição 2044
As edições das quartas-feiras, neste semestre, como em anteriores, são postadas não muito depois de eu voltar das aulas. Na noite desta terça-feira tive a tive a segunda rodada com aulas de Conhecimento, Linguagem e Ação Comunicativa para um grupo de Educação Física e de Historia e Filosofia da Ciência para Ciências Biológicas.
Hoje trago um assunto mais palatável, mesmo que muito temperado. Espero que saboreiem.
Quando contei aqui de minhas férias em Santiago do Chile/Mendoza/ Buenos Aires (edições 15-25JAN2012) fiz destaques a duas odes: uma, a Baco, em Mendoza, quando visitei quatro ‘bodegas’ produtoras de vinho; outra, a Atena — deusa da Sabedoria — quando me deleitei por horas em livrarias, na capital portenha. Nesta última entre os livros que comprei, está “La ciencia del color: historias y pasiones en torno a los pigmentos” escrito pela artista plástica e investigadora argentina Ana von Rebeur, autora de mais de trinta livros.
Muito provavelmente em um sábado apresento este livro em uma dica de leitura. Não sei bem explicar porque o inclui, por exemplo, entre dois livros do filósofo Michel Onfray, com os quais também acenos dicas sabáticas, que sei serão polêmicas.
O livro que catalisa esta edição tem 16 coloridos capítulos, dos quais 10 têm títulos de cores adjetivadas: Branco luminoso / Marrom tentador / Vermelho paixão / Rosa doce / Laranja crocante / Atenção: Amarelo / Verde sexi / Azul profundo /Violeta exótico / Negro luto.
No capítulo sobre o amarelo, a cor da advertência, por exemplo, nos semáforos, aprendo que desde a Antiguidade esta cor assustou aos humanos, daí ser chamado de ‘amarus’ em latim: amargo. Se diz que os bebês choram mais em quartos amarelos. Mas, foi com algo acerca de um valioso amarelo presente La ciencia del color: o do açafrão, que se temperou esta blogada. Açafrão [em espanhol, azafrán ;em inglês saffron] tem origem árabe za’far = amarelo.
O açafrão é extraído dos estigmas de flores de Crocus sativus, uma planta da família das Iridáceas. Cada planta tem apenas três estames assim se requer cerca de 10 kg de flores (em torno de 8.000 unidades) para obter 100g de filamentos.
É tida como uma das mais caras, talvez, a mais cara especiaria do mundo uma vez que, para se obter um quilo de açafrão seco, são processadas manualmente cerca de 150.000 flores, e é preciso cultivar uma área de aproximadamente 2000 m². O açafrão mais econômico custa cerca de 2.000 dólares o quilo, mas há os que chegam custar 15.000, pois chega a tingir na proporção de 1:200 000.
Entre os vários componentes há dezenas de óleos voláteis, dos quais merecem ser citados três: a crocina (cor), a picocrocina (sabor) e safranal (aroma).
É utilizado desde a Antiguidade como especiaria, principalmente na culinária do Mediterrâneo — região de onde a variedade é originária — no preparo de risotos, aves, caldos, massas e doces. É um item essencial à paella espanhola. Há muitos outros usos: pintura, tingimento de tecidos, perfumes corporais.
O açafrão também tem sido empregado para fins medicinais, há séculos. Historicamente foi utilizado no tratamento do câncer e de estados depressivos. Tais aplicações têm sido pesquisadas atualmente. Efeitos promissores e seletivos contra o câncer têm sido observados in vitro e in vivo, mas não ainda em testes clínicos. Efeitos antidepressivos também foram encontrados in vivo e em estudos clínicos preliminares. Há, portanto, interessantes perspectivas de uso dos extratos de açafrão como fitoterápico.
Ana von Rebeur conta que na Europa com a queda do Império Romano o cultivo declinou, mas se reavivou na península Ibérica no período Otomano. Com a peste bubônica, que no século 15 dizimou a Europa, o preço disparou, pois o açafrão foi usado como remédio contra a peste negra. A demanda obrigou importação da Grécia e do Iran. Começaram então saques a estas embarcações. Houve então a Guerra do Açafrão.
Para evitar ataques em alto mar, decidiu-se cultivá-lo em terra. A Suíça, por não ter praias e ser cercada de montanha pareceu o local inexpugnável aos piratas. Isto redundou em ganhos significativos ára a região, enriquecendo a Suíça. Parece natural que um produto tão valioso sofresse falsificações, que chegou tornarem-se escandalosas tendo a Alemanha editado o Safranschou Code que autorizava multar, encarcerar e executar os falsificadores dos preciosos estames.
Com a entrada de produtos originados da América no século 16, novas variedades de corantes e especiarias passaram a concorrer com o açafrão. Todavia, ainda hoje ele tem custo elevado e quando estamos em um mercado nos surpreende seu preço.
Na Wikipédia e em outras páginas da Web se encontram informações mais completas. Vale saborear.

8 comentários:

  1. Olá professor Chassot,

    Achamos o texto sobre açafrão interessante pelo fato de ter abordado várias áreas para falar sobre o mesmo tema. E também pela inspiração do livro das cores. Gostamos de saborear a leitura do seu blog.
    Bjos e abraços,
    Turma de Metodologia de Ensino de Ciências e Biologia da UFJF.

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  2. Caro Chassot,
    Açafrão, quem diria! Como é de difícil produção e, em consequência, caríssimo, deduzo que vimos apreciando colorau no lugar de açafrão nos restaurantes da vida por aí. Abraços, JAIR.

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  3. Caro Chassot,
    trouxeste uma saborosa postagem. Um dos pratos que tenho prazer em preparar é a paella marinera, de origem espanhola, resultante de um misto de frutos do mar, arroz, pimentão e o indispensável açafrão.

    Um abraço,

    Garin

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  4. Muito obrigado professor, ótima postagem!
    Essa notícia me fez refletir sobre como direcionamos nossa atenção ao conhecimento de acordo com o desenvolvimento e produção.
    Por trazer tantos benefícios para o ser humano "escravizamos" uma flor para que possamos extrair seus componentes, mantendo essa espécie ao nosso alcance, em NOSSOS solos, em NOSSAS mãos.
    Lembrei-me das viagens que fiz no interior do estado e percebi a quantidade imensa de eucaliptos e pinus dispersa por diversas regiões. Essas espécies são de extrema importância atualmente para a nossa economia, logo devastamos a mata Atlântica e plantamos esses geradores de riqueza que são inclusive exóticos.
    Quantas outras espécies tão importantes que possuem sabores e aromas, com cores tão vibrantes quanto a do açafrão estamos matando sem ao menos ter conhecido?
    E por que não trocar toda essa riqueza capitalizada que o açafrão movimenta para alimentar uma população que sofre com a fome?
    Acredito que para a peste negra a ciência já possui outras descobetas, assim como para as doenças psicossomáticas. Além do mais, por que não deixar sua raridade de cor e beleza para seus polinizadores?

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  5. Puxa, só conhecia o açafrão da terra, de onde se extraem o corante do bulbo (ou raiz??). Este que adquirimos nos mercados será feito que qual tipo?
    Seu blogue me instiga a googlar sempre, rsrsrs

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  6. Dirceu Aparecido Borges7 de março de 2012 às 21:33

    Caro Chassot,
    eu compartilho das palavras da Marília Müller - eu cutivo o bulbo (de cor amarela), que eu chamo carinhosamente de "açafrão". Esta planta (que eu cultivo) é semelhante ao gengibre.
    Mas, em todo caso amei o conteúdo da bloglada do dia.
    Se eu não me engano, a(uma das) substância responsável pela cor do açafrão é uma das citadas no livros "Os botões de Napoleão..."
    Um abraço carinhoso!
    Dirceu (candongas)

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  7. Meus muito estimados comentaristas,
    faço um agradecimento coletivo: por primeiro saúdo a estreia aqui da Graziele. Ela é minha aluna em Historia e Filosofia da Ciência no curso de Ciências Biológica do IPA. Vibrei com os muito significativos comentários dela. Vibro com o retorno da Turma de Metodologia de Ensino de Ciências e Biologia da UFJF que em sala de aula analisa este blogue. Aumenta minha responsabilidade. Vibro com a presença Marília da minha querida ex-aluna da Filosofia, que como o sul-mato-grossense Dirceu parecem ter açafrão em seus cultivares.
    Por fim dois comentarista parceiros de cada dia: o Jair que recordou a cozinha de minha mãe com o colorau, que há um tempo cultivei um arbusto e o Garin, que me atiçou com sua paella. (Quase) senti-me convidado.
    Obrigado a cada uma e cada um de voçes por mexerem a caçarola onde estamos usando açafrão.
    attico chassot

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  8. Muito boa a "aula' que nos deu..
    a maioria das coisas eu não sabia.
    E incrível esse instinto curioso, que o fez partir de um livro para publicar no blog.
    impressionante como coisas que nos parecem ( e são) simples nos revelam tanta história, tanta vida.

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