segunda-feira, 21 de fevereiro de 2011

21- Relógio: um feitor

Porto Alegre * Ano 5 # 1663

O domingo foi assíncrono! Quantos relógios a acertar? Quantos foram acertados automaticamente? E aqueles que nosso baixo cat (=coeficiente de alfabetização tecnológica) não nos permitiu acertar. Eu, por exemplo, não consegui e não que não tentasse várias vezes acertar o relógio deste blogue. Optei por editar um novo, que se assemelha a um grande que tenho em meu scriptorium, junto a um vitral de um copista medieval.

O relógio – este feitor pós-moderno – que constantemente martela nossas mentes sua máxima às vezes ensandecedora (que nos torna sandeu ou pateta): tempus fugit, neste fim de semana resolveu dar um bônus de uma hora, ou melhor, devolver àqueles a quem surrupiara uma hora em outubro.

O relógio utilizado como medidor do tempo desde a Antiguidade, em variados formatos, é uma das mais antigas invenções humanas. Este 21 de fevereiro registra um fato histórico, intimamente assoaciado a contagem das horas trabalhadas. O Manifesto Comunista, originalmente denominado Manifesto do Partido Comunista (em alemão: Manifest der Kommunistischen Partei), publicado pela primeira vez em 21 de Fevereiro de 1848, é historicamente um dos tratados políticos de maior influência mundial. Comissionado pela Liga Comunista e escrito pelos teóricos fundadores do socialismo científico Karl Marx e Friedrich Engels, expressa o programa e propósitos da Liga.

No capítulo ‘A vingança da tecnologia’ do ‘Sete escritos sobre Educação e Ciências’ escrevi que o relógio, já há mais de 5.000 anos antes do presente, mesmo que seu uso como regulador do sistema de vida seja muito mais recente e coincida com a Revolução industrial.

O mais antigo instrumento para medir a duração do dia do qual se tem registro é o relógio solar. Consistia em um mastro vertical fincado sobre uma base. Com esse dispositivo o tempo é medido de acordo com a sombra projetada pelo mastro, como é o processo com os ainda atuais relógios solares. Há cerca de 2.800 AP esses instrumentos se tornaram mais preciosos, à medida em que marcas foram inscritas na base onde se projetava a sombra. Em tempos que a cultura grega vivia seu apogeu (2500 AP) surgiu o relógio astronômico. Este associou aos relógios solares sistemas de considerável complexidade, nos quais se mediam momentos de posições do Sol, da Lua e das estrelas. Outro marco importante na história da medição do tempo surge com a solução de um problema: como medir o tempo à noite ou em dias que não houvesse sol? A solução, mesmo que engenhosa, é aparentemente simples: em um recipiente cheio de água, com um pequeno furo no fundo, se deixava escorrer o líquido para outro recipiente, marcado com escalas. De acordo com o nível da água, podia-se saber o tempo. No Museu do Cairo existe um relógio assim datado de um período de 3.800 AP, período do faraó Amenófis III. Foi apenas no inicio da era cristã que surgiu o mais conhecido dos medidores de tempo anteriores ao relógio mecânico: a ampulheta. Ela mede o tempo de acordo com a passagem da areia de um recipiente de vidro para outro, através de uma estreita ligação. Nos séculos 16 e 17, havia ampulhetas que marcavam tempos de quinze ou trinta minutos e também de uma hora.

Pelo que se pode inferir de relatos históricos ainda na Idade Média, a percepção do tempo era algo naturalizado. Ao inverno seguia-se a primavera, o verão, o outono. Tempos de semear, sucediam-se a tempos de cuidar das plantações, para então vir tempos de colheitas, para então se recomeçar o ciclo. Vale a pena ver como eram os nomes dos meses no Calendário Revolucionário surgido com a Revolução Francesa, já no Século das Luzes.

Na história da medição do tempo, a descoberta do relógio mecânico, no entorno do século 14, foi dos momentos mais significativos. A diferenciação deste para daqueles medidores de tempos anteriormente citados, é que os de agora independiam do sol ou de astros; logo não importava o tempo atmosférico. Qual a característica central do relógio mecânico? Ele é movido pela energia gerada pela queda de um peso; energia essa transmitida a uma engrenagem que movimenta uma sucessão de rodas dentadas conectadas umas às outras, que giram em determinados tempos (segundos / minutos / horas). Essa movimentação é registrada pelos ponteiros no mostrador. A sacação mais genial nesse relógio foi fazer uma oposição à aceleração, produzida pela continuidade da queda do peso e que imprimiria um movimento cada vez mais rápido à engrenagem. A descoberta de um dispositivo de retardamento capaz de bloquear o peso, frear o movimento das rodas dentadas e impedir a aceleração dos ponteiros, criando um movimento de oscilação com um batimento regular, é o vaivém contínuo característico dos relógios de pêndulo.

Há divergências quanto ao período de invenção do relógio mecânico. Ele parece ter surgido no final do século 13. Na Divina Comedia de Dante Alighieiri (1265-1321) há menção a relógios mecânicos, isso pode indicar um provável inicio dos mesmos nos começos do século 14. Se considerarmos a introdução do pêndulo devemos a sua inovação ao cientista holandês Christian Huygens (1629-1695 - matemático importante na área do cálculo, físico que estabeleceu as bases teóricas da luz com onda e astrônomo que descobriu Titã uma das luas de Saturno) que, em 1656, construiu e patenteou o primeiro relógio baseado no pêndulo. A utilidade desta invenção é fácil de se perceber comparando com os relógios anteriores. Galileu Galileu (1564-1642) teria feito um projeto para um relógio de pêndulo - é famosa, ainda na juventude, sua constatação da regularidade das pulsações com a frequência do pendulo, observando as oscilações de um candelabro, durante um ofício religioso na catedral - mas que provavelmente não tenha sido executado enquanto ele estava vivo.

Os primeiros relógios pessoais utilizados foram os relógios de bolso. Eram muito raros e tidos como verdadeiras joias, pois poucos tinham um. Os relógios de bolso eram símbolo da alta aristocracia.

Comenta-se que foi Alberto Santos Dumont quem inventou os relógios de pulso. A amizade de Santos Dumont com Louis Cartier vinha do fim do século 19. Uma noite, lhe disse que não tinha como ler a hora em pleno voo em seu relógio de bolso; com o auxílio do mestre relojoeiro Edmond Jaeger, Cartier apresentou uma solução para Santos Dumont, um protótipo do relógio de pulso, em 1904, o qual permitia ver as horas mantendo as mãos nos comandos.

Logo, é fácil de entender o quanto a invenção do relógio mecânico deva ser reconhecida como uma das mais significativas invenções, podendo estar colocada no mesmo nível de importância com a invenção da imprensa, numa leitura ocidental da história. As consequências que o uso do relógio mecânico determinou na vida das populações, especialmente daquelas que vendiam sua força de trabalho como empregados, mudanças em relação aos valores culturais, à organização política e social, com consequências particulares, especialmente, quanto a mudanças nos modos de viver e fazer. O relógio assumiu o controle das ações de homens e mulheres para que tivessem assim possibilidades de terem aferidos seu desempenho e sua produtividade.

Vivemos tempos de cronolatria. Ainda volto a valar do Cronos e Cairos marcando nossos tempos. E nesta semana se inicia, com as aulas na graduação no Centro Universitário Metodista do IPA é também tempo de olhar o relógio. Por tal, uma boa segunda-feira.

2 comentários:

  1. Ave Chassot,

    adorei as alusões ao meu favorito Dalí. A "Persistência da Memória" é uma obra prima.
    A vi pessoalmente há algumas semanas.
    Meu primeiro dia de aula foi um sucesso e repleto de alegria, completado por esta leitura gostosa.
    Grande abraço, na expectativa de brevemente sorver um raro chá de jasmim (que um amigo trouxe da China) em vossa companhia.
    Guy

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  2. Meu estimado Guy,
    sempre me imagino que mundo via Dali.
    Obrigado pelo convite ao chá.
    Esta semana viajo á Blumenau para uma tríplice jornada.
    Mas semana que vem poderemos pensar em um encontro.
    Com expectativa sempre na escuta.
    attico chassot

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