segunda-feira, 15 de novembro de 2010

15. -“Se cerraron dos ojos... se abrieron millones

Porto Alegre Ano 5 # 1565

Mais uma edição desde Porto Alegre. As últimas cinco edições desde Buenos Aires parecem ter significado um distanciamento de semanas da Morada dos Afagos. Serei, uma vez mais, repetitivo: é bom viajar, mas o melhor é voltar.

Mesmo que neste semestre, repetidas segundas-feiras como feriados tenham me desagradado, pela perda das aulas da Universidade do Adulto Maior, chegar em casa, nas franjas de um domingo e saber que o dia seguinte é feriado tem sabor especial, mesmo quando o dia festivo seja para comemorar um golpe de Estado (desejável): a derrubada da Monarquia e a imposição da República.

A viagem de ontem, que classifiquei como a viagem do corvo teve três etapas que, cada uma de per si (eis uma arcaica, mas sonora locução!), poderia quase representar o segmento único: Buenos Aires/Porto Alegre de 1h20min. Assim o primeiro: Buenos Aires/Asunción, de 1h30min, iniciou-se com um atraso de 50 minutos; na metade do trajeto o comandante diz que "estamos sobrevoando as cidades de Uruguaiana e Paso de los Libres, fronteira do Brasil e Argentina", e acrescenta algo que arrepia a qualquer aluno que uma vez estudou geografia “separadas pelo rio Iguaçu’. A segunda etapa: Asunción/Curitiba de uma 1h10min frustra um pouco porque não se tem a desejada mirada da capital guarani. Depois de hora em Curitiba, onde houve imigração e alfândega, partimos com um atraso de 20 minutos para Porto Alegre em voo de 1 hora.

A manhã de domingo teve a visitação de dois lócus históricos. A Plaza de Mayo, com a monumental e histórica “Casa Rosada’. É a praça das ‘madres’ agora já ‘abuelitas’ que pedem justiça pelos filhos e netos desaparecidos na dolorosa ditadura militar. A outra visita foi, na mesma praça a Catedral Metropolitana de Buenos Aires. Reconstruída diversas vezes. O prédio atual é uma mistura de estilos arquitetônicos, com uma nave e um domo do século 18 e uma severa fachada neoclássica do século 19, sem torres. O interior mantém estátuas preciosas do século 18, bem como retábulos, bem como uma rica decoração neo-renascentista e neobarroca.


A saída na manhã de ontem também foi significativa para coletar alguns registros para saldar uma promessa feito no encerramento da blogada de ontem: alguns comentários acerca dos significados da viuvez de Cristina que ouvi e vi nestes dias aqui.

A recente morte Néstor Carlos Kirchner (25 de fevereiro de 1950 – 27 de outubro de 2010) traumatizou a Argentina. Foi um advogado e político argentino, presidente de seu país, governador de Santa Cruz e pertencente ao Partido Justicialista (peronista). Foi casado com Cristina Fernández, que o sucedeu na Casa Rosada. Ela nasceu em La Plata, 19 de fevereiro de 1953 e é advogada e ex-senadora pelas províncias de Santa Cruz e Buenos Aires.

Assim chegávamos a Buenos Aires cerca de duas semanas depois da morte de Néstor quando ainda afloram muitas manifestações de ‘estar com Cristina’. Talvez uma das dezenas de frases diferentes que vimos pichadas ou em cartazes bem traduza as transformações: “Se cerraron dos ojos... se abrieron millones”. Não é sem razão que faço dela a manchete desta blogada.

Outra imensa pichação que já me chamou a atenção no primeiro dia junto ao Teatro Colón: “Néstor com Perón, el Pueblo com Cristina”

Não pode alguém, que está poucos dias em um país como estrangeiro, com algumas conversas com colegas, com taxistas ou com vendedores se alçar a comentarista político. Isso jornais e revistas fazem a rodo. Trago apenas anotações de um viageiro, pretendo entender significados e desejo de reparti-los com seus leitores.

Um detalhe importante. Não foi apenas um ex-presidente que morreu subitamente. Foi também uma presidenta que ficou viúva. É sempre significativa a solidariedade à viúva, na tradição judaico-cristã (não conheço os significados maiores da viuvez na tradição islâmica ou budista, por exemplo) Esta tão usual solidariedade parece ser maior, no Ocidente, à viúva que ao viúvo, talvez na marca da mulher ser dita ser do sexo frágil.

Se me fosse pedido uma síntese do que senti nestes quase cinco dias diria: “Morreu Néstor, ressuscitou Cristina!” Ela, uma política com luz própria, agregou dividendos políticos com a perda do marido. Ainda na sexta-feira, na capa de La Nación tinha a manchete: Há duas viúvas: Cristina e a oposição.

Os argentinos, tomados pela morte imprevista (e as mortes inesperadas comovem: Airton Sena, Lady Di...) fizeram lei a máxima latina: De mortuis nil nisi bonum que recomenda que “Dos mortos só se diz o bem”. Mais ainda já canonizam Néstor, que foi um presidente não corrupto e que fez só o bem pelo do povo. Como se pode ver na foto que tirei na manhã de ontem, a Rua Rivadávia, uma das mais importantes ruas portenhas não distantes da Plaza de Mayo, já teve seu nome trocada.

Tenho jornais e revistas que preciso ler com mais vagar. Mas, realmente parece que se fecharam dois olhos, mas se abriram milhões. Um muito curtido feriado a cada uma e cada um.

4 comentários:

  1. Meu caro Mestre Chassot! Observava-se na Argentina um descredito muto grande em rcao a classe politica. Mas parece que a morte do Sr. Kirchner reacendeu essa credibilidade, agora com foco principal na viuva do Senador, a atual Presidente Cristina. O Professor Daniel Mainero, meu colega argentino, ja afirmava, tao logo houve a morte do ex-presidente, que a oposiçao sofreria um duro golpe. E me parece que essa é a realidade por lá neste momento. Tenho grande admiraçao pelos vizinhos argentinos e torço para que retomem o crescimento economico e o bom governo com Cristina. Abraço - JB

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  2. Muito caro Jairo,
    ao fazer o relato da blogada de hoje, lembrei-me de ti que estás em muito permanente contato com ‘los hermanos porteños’. Realmente a morte de Kirchner pode significar a ressureição do peronismo.
    Observações como a do nosso colega Daniel Monteiro estão presentes em algumas análises que li nesses cinco dias de Buenos Aires tão imediatos a comoção ocorrida em 27 de outubro.
    Obrigado por teu comentário,
    attico chassot

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  3. Sempre gratificante ler as blogadas do Mestre! Obrigado pela mensagem carinhosa! Um grande abraço e boas aventuras!!!

    Karina Soares

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  4. Muito querida Karina,
    obrigado por dois comentários hoje neste blogue.
    Permito-me repetir-te o que disse em resposta ao teu comentário da blogada de sábado: é muito bom ter uma parceira como tu envolvida em alfabetização científica como leitora deste blogue.
    Apareça aqui de vez em vez e um comentário como o teu é um balsamo para um bloguista.
    Um afago com admiração do
    attico chassot

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