domingo, 15 de agosto de 2010

15- Domingo para embalar marcas do sábado

Porto Alegre Ano 5 # 1473

É anda noite cerrada. Aqui na casa da Gelsa onde escrevo – tangido por problemas de internet que desde sexta-feira me incomodam na Morada dos Afagos – chegam os ruídos daqueles que ainda embalam a madrugada nos barzinhos da Goethe esquentando a noite fria.

Tenho algumas evidências empíricas. As mortes ferreteiamem-me de maneira muito especial. Torno-me estéril. Não consigo escrever. Quando minha mãe morreu, há nove anos fiquei semanas sem conseguir escrever. Mais recentemente, quando morreu o Saramago, por dois ou três dias tive dificuldades de produção. Ontem à noite desejei adiantar essa blogada: era impossível escrever algo. Mesmo que estivera fisicamente apenas pela manhã no cemitério do Faxinal, vaguei o sábado inteiro entre sepulturas lendo lapides e conversando com um significativo universo de sepultos, daquele e de outros campos santos.

Lembrei do que falei ontem no sepultamento do tio Afonso. Primeiro apropriei da fala do Ministro católico que disse que devolvíamos a terra uma semente. Disse que pisávamos solo fértil que abrigava sementes muito preciosas. Estávamos perto da sepultura de meus avós João e Suzana Chassot, que agora recebiam seu nono e último filho. O tio Afonso estava sendo sepultado ao lado tia Marcolina, uma de suas irmãs. Eu falava junto da sepultura de minha mãe e de meu pai, ele que fora o primogênito dos nove filhos, de meus avós. Alem de dezena de outros Chassot que agora acolhiam o último de uma geração de meus tios, ali bem perto, já há 14 anos, estava meu irmão José Maria, um dos alguns falecidos da geração que agora assume a ancestralidade entre os vivos.

Depois me apropriei da ideia do pastor luterano de que o falecido era um contador de história, para agradecer ao tio Fonso o privilégio que ele nos dera a quatro anos, comparecendo a festa do centenário dopai e nos ajudando na amealhar história e disse aos seus filhos Luis e Lisete que o tio Fonso poderia continuar entre nós pela maneira que nós continuássemos narrando história.

Esses encontros fúnebres ensejam reaproximações de vivos. Inclusive com promessas de nos reencontrarmos em futuro próximo para celebração festiva. Encontrei primos que não vi a anos. A surpresa maior foi encontrar lépida e faceira a Tia Lúcia, esposa do finado tio Arlindo, irmão de meu pai. Ela estava em seus 93 anos juntos com os meus primos Cacildo, João e Lizete.

Deste reencontro de ontem, no minguar das palavras há fartura de imagens. Assim esta blogada traz o registro da tia Lucia comigo e com o meu irmão Paulo, com quem fui e voltei ao Faxinal ontem ensejando conversas há muito sonegadas. Outra foto mostra a tia Lucia dizendo-me: “Cada vez que vou consultar com o dr. Natanael, que foi teu aluno ele me pergunta por ti, Agora posso dizer que te encontrei e que estás muito bem!”. Na terceira foto estou com minha prima Naldi, agora a decana nos primos no clã Chassot, que me particularmente querida, por ter morado na casa do Tio Arnaldo e da tia Rosinha, seus pais, nos meus primeiros anos de Porto Alegre. Na quarta foto está a minha irmã Clarinha, com a tia Lúcia, já escolhida como a patrona de futuro encontro dos Chassot.







J

Junto a esta blogada, um depoimento de meu irmão Emar, acerca do momento desta perda/ganho do tio Fonso, que encontrei no Skipe quando voltava do Faxinal, ontem já começo da tarde:

Rompendo a decadência: A Quarta feira passada, 11 de Agosto, foi carregada emoções: tinha saído do meu ex-sítio, a Vila dos Sapos no Faxinal em Montenegro onde acabara de anunciar ao meu funcionário o final de uma relação de 24 anos: vendi aquilo que foi por 14 anos o meu grande sonho. Motivo? O lento e continuado processo de decadência daquele lugar. Quebrar aquela inércia foi penoso, mas me sentia aliviado.

Rumei para a casa do tio Afonso, pensando que ele era então, a única motivação para eu permanecer e/ou retornar a Montenegro.

Fui informado pelo meu primo Luis, que o pai estava hospitalizado e, que foi a maior dificuldade para arrancá-lo de casa e interná-lo.

Oito horas da noite devidamente equipado e esterilizado entrei na CTI do hospital para ver o que restava daquele homem, que após a morte do meu pai, passei a ter como referência simbólica.

De pronto entendi porque ele tanto relutou em ser internado: aquele sofrimento que ele estava sendo submetido era em vão: A ajuda que ele precisava era para abreviar aquele sofrimento, para arrancar aquela droga de sonda enfiada no seu pênis! De bonito somente aqueles olhos azuis...

Conseguimos, com dificuldade, trocar algumas palavras. Entretanto nos entendemos muito bem. Saí convicto do quê ele queria.

Com os recursos que temos hoje, corremos o risco de prolongar um inexorável processo de decadência muitas vezes em vão!

Hoje, 13 de Agosto, já aqui em Holambra, o Attico me informou que o tio “Fonso” partiu para outra jornada, me senti aliviado!

Estou trocando os quadros da minha memória: O quadro dele naquela cama, já está sendo substituído por aquele, onde em Julho de 2006 no Lami, ele nos deleitou com os seus relatos. Vamos em frente que atrás vem gente!

Peço aos meus leitores que relevem ter tecido esta blogada com reflexões tão pessoais. Pode-se conceder isso a uma blogada dominical. Um bom domingo a cada uma e cada um. Que esta segunda quinzena agustina seja plena de muitos fazeres e muitas agradáveis realizações. Na expectativa de um encontro na segunda-feira... até então.

8 comentários:

  1. Professor, Professor....
    Antes de inciar meus passeio pela internet, quis, primeiro,lhe visitar... E meu abraço por este momento triste que o senhor está passando.
    Ontem, quando eu estava lendo Wittgenteins, me lembrei do senhor. Nao sei porque me lembrei do senhor, mas lembrei. Fala sobre fé. E como sei que o senhor gosta deste papo de igreja, aí vai,

    "O que é que me faz até sentir inclinação para acreditar na Ressurreição de Cristo? É como se eu brincasse com o pensamento. Se ele não tivesse ressuscitado, então ter-se-ia decomposto no túmulo, como qualquer outro homem. Está morto e decomposto. Nesse caso, é um professor como outro qualquer e já não pode ajudar; e, de novo, somos órfãos e nos encontramos sós. Temos assim de nos contentar com a sabedoria e a especulação. Estamos numa
    espécie de inferno onde não podemos fazer mais do que sonhar, cobertos como que por um telhado e separados do céu. Mas se vou ser REALMENTE salvo - necessito de uma certeza - não de sabedoria, de sonhos ou de especulação - e esta certeza é a fé. E a fé é a fé naquilo de que necessita o meu coração, a minha alma, e não a minha inteligência especulativa. Pois é a minha alma com as suas paixões, por assim dizer, com a sua carne e sangue, que tem de ser salva, e não a minha razão abstracta. Talvez possamos dizer: Só o amor pode acreditar na ressurreição. Ou: é o amor que acredita na Ressurreição. Poderíamos dizer: o amor redentor acredita até na Ressurreição; apoia-se com firmeza até mesmo na Ressurreição. O que combate a dúvida é, por assim dizer, a redenção. A adesão a ela deve ser a adesão a esta crença. Assim o que tal significa é: deves, primeiro, ser redimido e apoiar-te na tua redenção (agarrar a tua redenção) - em seguida, verás que te estás a agarrar a esta fé (...). (WITTGENSTEIN, Ludwig. Cultura e Valor, 1980, p. 55 e 56)
    Um bom domingo para vocês....

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  2. Muito querido Edmar,
    obrigado pela solidariedade com meus lutos. Obrigado por teus dois comentários. Esta para postagem de hoje e, mais especialmente aquele a postagem do dia 12 acerca de novos horizontes para a adoção.
    Surpreende-me a trazida que fazes de Wittgenstein. Jamais imaginaria tão arraigada convicção na Ressurreição.
    Com redobrados e surpresos agradecimentos.
    Um bom saldo de domingo e uma excelente semana,
    attico chassot

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  3. Boa tarde Professor.
    Não nos peça,a seus leitores,para relevar tal exposição,uma das finalidades de um blog também é esse compartilhamento pessoal.Deixo meus sentimentos ao senhor,pois toda perda acaba por nos desconcertar,de uma forma ou de outra.No entanto,permita-me compartilhar de minha alegria e,quem sabe,alegrar-te um pouco:meu bebê,minha "jabulani",hehehe,é uma menina!Terei uma princesa em casa agora também!!
    =]
    Desejos de um domingo ameno e abençoado ao senhor e aos seus!

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  4. Muito querida colega Thaiza,
    celebro contigo a maravilhosa notícia.
    Viva! Será uma menina! Maravilhoso.
    Os votos mais especiais a princesa que chega.
    Que saibamos cada vez mais a ajudar a cuidar do Planeta para que ela aqui tenha uma ‘casa’ mais acolhedora.
    Obrigado por compartilhares aqui a notícia.
    O mais especial dos afagos para ti, para teu esposo, para teu menino e especialíssimo para a menina que chegará em dezembro.
    attico chassot

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  5. Querido Prof. Chassot!
    Espero que esteja melhor a cada dia depois destes tão tristes...
    Penso que a morte deve ser o momento mais reflexivo desta vida, além de toda dor e tristeza que vem acompanhada. Tive uma perda dolorosa por demais, qdo há 5 anos meu único filho, de 18 anos, faleceu. O chão some... a vida parece perder o sentido... mas Deus nos pega realmente no colo em momentos assim e, derrepente, a vida continua...
    Sinta-se muito feliz por compartilhar seus momentos pessoais, sejam tristes ou alegres; são palavras assim que nos fazem entender o quão somos iguais perante Deus e o quão importante e gloriosa será passagem por esta vida de ensaios.
    Um lindo início de semana...
    Abraço bem gordão,
    Neusa

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  6. Muito querida colega Neusa,
    li tu mensagem com os olhos lacrimejando. Encanta-me tua força e a tua fé.
    Hoje não consigo te escrever mais nada. Realmente é algo de esboroar-se o chão.
    Afagos de admiração
    attico chassot

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  7. Attico,
    bonito texto de despedida!
    Obrigada por dividir e me ensinar a falar da dor.
    bjs Carla

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  8. Muito querida Carla,
    tu que sabes cultuar os ancestrais entende o que significa não ter mais um ancestral aqui (nesta dimensão da Vida).
    Penso que é um bom aprendizado valarmos de nossos lutos.
    Obrigado por teus ensinamentos nesta dimensão do transcendental.
    Um afago carinhoso do

    attico chassot

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