sexta-feira, 21 de maio de 2010

21* ¿A caminho da vida artificial?

Porto Alegre Ano 4 # 1387

Chegamos a uma sonhada sexta-feira que afaga expectativas de um fim de semana. Não foi apenas a quarta-feira que foi agridoce. Essa foi a marca de uma semana na qual as chuvas intermitentes fizeram o frio ser molhado. Sei que violo parâmetros físicos, mas essa é sensação que semana me dá. Esta manhã a umidade é 100%. E aeroporto fechado.

Ontem à noite participei de atividades do IX Simpósio Sulbrasileiro sobre ensino de Filosofia, que se realiza no Centro Universitário Metodista – IPA, Primeiro houve o lançamento do livro ‘A Filosofia e seu ensino: desafios emergentes’ organizado pelos meus colegas José Luis Correa Novais e Marco Antonio Oliveira de Azevedo. Depois houve a aprovação de uma Moção Especial proposta pela Associação dos Licenciados em Filosofia – inclusão da disciplina Filosofia na grade curricular de todas as escolas de Ensino Médio. Assisti ainda a uma Mesa Redonda “Metodologias de Ensino de Filosofia” - André Nilo Klaudat (UFRGS) e Celso Reni Braida (UFSC).

Tinha planejado falar aqui de algo do meu cotidiano de ontem. Minha quinta-feira foi, quase exclusivamente, gasta (ação verbal refinadamente escolhida) com uma dissertação de mestrado da qual devia dar parecer para uma sessão de qualificação. Todavia há uma manchete que toma todos os jornais. Mesmo que não seja propósito de fazer paralelo com a grande imprensa a notícia merece ser trazida aqui. É algo ainda polêmico a anunciada descoberta, a expectativa de possibilidade para uso em vacinas, cuidados com o meio ambiente e outras nos levam a tomar a celebrar esse momento histórico da biotecnologia.

O projeto é liderado por Craig Venter, que ajudou a sequenciar o genoma humano 10 anos atrás. Já acusado como polêmico por ‘brincar de Deus’ Craig busca busca desenvolver uma ferramenta biotecnológica que permita produzir micro-organismos ‘sintéticos’. No caso anunciado ontem, Venter foi ainda mais audacioso. Pegou o genoma sequenciado de uma bactéria, fez uma cópia “sintética” desse genoma, transplantou essa cópia para o “corpo” de uma célula morta (sem DNA), e essa célula passou a ser viva, funcionando e multiplicando-se como se fosse a bactéria original.

– É a primeira espécie autorreplicante no planeta cujo pai é um programa de

computador – definiu Venter.

Pensando no genoma como um software biológico, o que os cientistas fizeram foi “piratear” o sistema operacional de uma máquina, transferir esse programa para outra máquina e fazer com que a máquina funcionasse normalmente.

A operação custou US$ 40 milhões (R$ 73,4 milhões) e levou 15 anos para funcionar. O resultado final, apresentado na edição de ontem da revista Science, é uma linhagem de milhões de bactérias reproduzidas de uma única célula que recebeu o genoma sintético. Em trabalhos passados, publicados ao longo dos últimos anos, a equipe já havia conseguido transplantar o genoma de uma espécie de bactéria (Mycoplasma mycoides) para o corpo de uma outra espécie (Mycoplasma capricolum), que passou a se comportar como se fosse a primeira. Também já haviam mostrado que era possível confeccionar esse genoma em laboratório, letra por letra, usando a sequência original como referência. Mas até agora não haviam conseguido fazer com que esse genoma sintético funcionasse dentro da célula receptora. Conseguiam piratear o software, mas a máquina não rodava.

Agora, finalmente, rodou. As bactérias da linhagem sintética, batizada de M. mycoides JCVI-syn1.0, funcionam e se reproduzem normalmente, como qualquer bactéria na natureza.

Assim parece que está justificada a alteração de pauta. Agora desejo uma muito boa sexta-feira. Eu tenho como usualmente o privilégio de almoçar com meu trio ABC, aditado ainda do Pedro. Permito-me um convite: a dica de leitura de amanhã é ambientada entre 5 e 14 de outubro de 1582, não-período da história, ontem comentado aqui. È uma boa sexta-feira a cada uma e cada um.

6 comentários:

  1. Professor, os comentários de hoje provavelente versarão sobre os avanços da ciência e tal, mas gostaria de fazer uma observação sobre o quanto o relacinar-se virtualmente altera até mesmo os encontros ao vivo e a cores. Tento acompanhar seu blogue diarimente, mesmo que apenas por leitura, e ontem na entrada do auditório, foi estranho: embora faça tempos que não ouça sua voz, sei de parte de suas atividades e reflexões, talvez até mais que as de minhas companheiras de apartamento.

    Bom finzinho de semana, na torcida de que a sexta não enxugue ainda mais o reduzido público deste Simpósio...

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  2. Muito querida Marília,
    foi bom rever-te na noite de ontem. Também me condoo com os organizadores do Simpósio ver tem esmirrado público presente no evento.
    Realmente são cada vez mais tênues os limite entre o humano/não humano e como tu bem colocas sabemos, às vezes, muito mais acerca dos fazeres de pessoas que estão muito distantes se comparado àquelas que coabitam o mesmo teto conosco.
    Que bom que ainda acreditemos que o sol exista e que ele deixará de se esconder de nós.
    Votos de um ensolarado fim de semana
    e obrigado por seres minha tão fiel leitora

    attico chassot

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  3. Muy querido Profesor Chassot,
    Mi primera sensación: susto. Imagínese que se pudieran multiplicar sin control bacterias y viruses... Por otra parte, los quince años de estudio de Craig me hicieron recordar su afirmación sobre los aportes de Needham y lo valioso que una persona dedique su vida a una sola producción.
    Ojalá que este salto en lo microscópico nos ayude en lo macro. Que tenga un lindo día,

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  4. Apreciada Matilde,
    gracias por tu comentario. Ese hecho de Craig es como se el ha estado a brincar de Dios.
    Como has dicho las posibilidades son imprevisibles. Como nunca la ciencia se parece a un Goilen no conoce la fuerza que tiene.
    Que los humanos, ojalá, tengan juicio
    attico chassot

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  5. Boa noite, Professor.
    Apesar da polêmica do "brincar de ser Deus", sobre Craig, não o vejo assim. Acredito que as implicações desta descoberta são muito maiores que este tipo de preocupação apesar de que, com certeza, a mídia deverá, novamente, focar por este lado.
    Mas acredito [pelo menos quero acreditar!]que as intenções do pesquisador, e da equipe, transcende este tipo de comparações.
    A Ciência não é neutra, não é mesmo?!
    =]
    Bom restinho de sexta-feira ao senhor!

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  6. Muito estimada colega Thaiza,
    tens razão a Ciência não é neutra. Mais uma fez a imagem de Golen – o gigante de pés de barro aflora.
    Tomara que nos humanos saibamos aproveitar esse memorável feito.
    Um bom fim de semana
    attico chassot

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